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HISTÓRIAS E LENDAS DE SANTOS - QUILOMBOS (12)
Onde a liberdade nasceu

A importância do Quilombo do Jabaquara no processo que levou à Lei Áurea
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Um estudo sobre o papel do Quilombo do Jabaquara na libertação dos escravos brasileiros foi o tema de matéria publicada no jornal santista A Tribuna, em 13 de maio de 2006:
 


Quilombo do Jabaquara, liderado por Quintino de Lacerda, foi um dos mais impotantes do Brasil e recebeu fugitivos de todo o Estado
Foto: reprodução, publicada com a matéria

ABOLICIONISMO
Santos, berço da liberdade

Quilombo do Jabaquara foi fundamental no processo que resultou no fim da escravidão no Brasil com a Lei Áurea, em 13 de maio de 1888

Simone Tobias
Da Reportagem

Há aproximadamente 125 anos - em um local onde hoje é o bairro do Jabaquara - um lugar em que fatos importantes da abolição brasileira aconteceram foi a acolhida de escravos refugiados de fazendas do interior de São Paulo e de outras regiões. Tratava-se do Quilombo do Jabaquara, que surgiu em meados de 1881, a sete anos de assinatura da Lei Áurea pela princesa Isabel, no dia 13 de maio de 1888, data comemorada hoje.

Esta foi uma das maiores colônias de fugitivos da história e se situava mais precisamente atrás da atual Santa Casa até a encosta do Morro do Bufo, no trecho compreendido entre o túnel Rubens Ferreira Martins e a subida do Morro da Nova Cintra.

As informações são do historiador Carlos Eduardo Finochio, coordenador do curso de História da Universidade Católica de Santos (UniSantos), baseados no livro Poliantéia Santista, de Fernando Martins Lichti.

A decisão de cessão dos terrenos onde foi instalado o refúgio partiu de uma reunião secreta de santistas abolicionistas. O lugar para se criar o reduto foi os fundos da propriedade de Mathias Costa, em uma extensa área de mata virgem e várzea, cortada por inúmeros riachos.

Para manter a ordem entre os abrigados do quilombo, foi apontado o nome de Quintino de Lacerda, ex-escravo de Lacerda Franco que ainda vivia na casa do antigo senhor.

O Quilombo do Jabaquara era formado por uma série de casas unidas umas às outras e precedidas de armazéns, que abasteciam os negros de alimentos e outros produtos.

O quilombo se organizava em torno da casa de campo do abolicionista e os quilombolas erguiam seus barracos com dinheiro recolhido entre pessoas de bem e comerciantes de Santos. A região permaneceu como quilombo alguns anos depois da abolição da escravatura e depois se transformou no que hoje é o bairro.

Pai Felipe - A Cidade abrigou ainda o Quilombo do Pai Felipe, em um local junto à encosta do Monte Serrat, na parte interna da CET. Foi fixada uma placa de identificação onde teria existido o reduto do "Rei Batuqueiro", como era conhecido.

Pai Felipe liderava um bando de escravos fugidos do Engenho Nossa Senhora das Neves, situado em terras continentais. Inicialmente, ele se fixou no Jabaquara com seus comandados. "Como Pai Felipe não quis se submeter a Quintino de Lacerda, foi para o sopé do Monte Serrat", declara Finochio.

O local ficava no meio de um bambuzal, bem perto da Vila Mathias, e era onde o público assistia ao "tambaque", instrumento musical que era batucado pelos africanos chefiados por ele.

Garrafão - José Theodoro Santos Pereira, mais conhecido como Santos Garrafão, acolheu alguns escravos em uma destilaria. "Ele era branco, amigo de Quintino de Lacerda e se envolveu com a ex-escrava chamada Brandina Fiúsa e o quilombo se encontrava na Ponta da Praia", declara o historiador Waldir Rueda. "A acolhida dos escravos pode ter sido influenciada pela relação com a ex-escrava", supõe o historiador.

O Quilombo do Jabaquara de Quintino de Lacerda, o de Pai Felipe e o de Santos Pereira (Santos Garrafão) tinham a proteção de toda Cidade, incluindo a sociedade santista.

Sinônimos - Independentemente do que acontecia no restante do País, a Cidade fez sua abolição. Santos e liberdade eram sinônimos para a comunidade negra, de acordo com Carlos Eduardo Finochio.

"Santos antecipou em dois anos a libertação dos escravos. No começo de 1887, o presidente da província paulista mandou um telegrama ao Governo Imperial dizendo ser 'impossível conter a evasão dos escravos porque os soldados tinham feito causa comum com os abolicionistas, favorecendo a passagem dos fugitivos para a cidade de Santos'", afirma Finochio.

Os abolicionistas acolhiam escravos e financiavam quilombos, como o Jabaquara, por exemplo, além da compra de alforrias e as custas de pendências judiciais.

Finochio: ajuda abolicionista
Foto: Nirley Sena, em 23/12/2005,
publicada com a matéria

Rueda: pesquisa documental
Foto: Carlos Marques, em 28/7/2005,
publicada com a matéria

Quilombo, lugar de gente perseguida, buscada e ameaçada

"Lugar de gente alerta ou de prontidão. Perseguida, buscada, ameaçada e, por isso mesmo, em defesa". Segundo o livro Poliantéia Santista, de Fernando Martins Lichti, esta é a definição para quilombo, como mostra o historiador da Fundação Arquivo e Memória de Santos José Dionísio de Almeida.

Muito antes da abolição da escravidão no Brasil, há exatos 118 anos, Santos recebia escravos refugiados e os abrigava. Os historiadores entrevistados por A Tribuna confirmam a atuação de três quilombos na Cidade; do Jabaquara, de Pai Felipe e do Garrafão.

O processo de formação dos quilombos em Santos, segundo o historiador Carlos Eduardo Finochio, coordenador do curso de História da UniSantos, antecede o surgimento destes três. "No entanto, as informações históricas são especulações".

Muito antes da assinatura da Lei Áurea - que declara libertos todos os escravos do País - pela princesa Isabel, no dia 13 de maio de 1888, o santista José Bonifácio chocou a sociedade, libertando os escravos da Chácara de Outeirinhos, de sua propriedade. O ano era 1820.

Também houve uma movimentação de mulheres na Cidade em favor da abolição, aproximadamente em 1870. A santista Francisca Amália de Assis Faria abrigava negros fugidos transformando o quintal de sua casa em um "pequeno quilombo" e convidava as amigas a fazer o mesmo, em Santos. "Centenas de reclamações foram feitas às autoridades contra as famílias santistas que acolhiam escravos fugidos, mas nada podia ser feito".

A santista Anna Benvinda Bueno de Andrada funda a "A Emancipadora", uma sociedade feminina que promovia alforrias de escravos e se especializou em libertar escravas moças, na Capital.

Informação - Pesquisando em documentações históricas, o historiador Waldir Rueda encontrou uma cópia da ata de uma reunião da Sociedade Portuguesa de Beneficência, do dia 13 de maio de 1888, em que consta a seguinte frase: "...sua alteza a princesa imperial, está talvez a esta hora assinando o decreto pelo qual se extingue a escravidão no Brasil".

"Com este documento, podemos esclarecer que, diferentemente da bibliografia existente, a elite santista tinha conhecimento da possibilidade da assinatura da lei naquele dia. Pode até ter sido um reboliço em Santos, mas não tão grande como dizem".

A Santa Casa se reuniu mais de um mês depois, em 26 de junho de 1888, e cita um convite da Câmara Municipal a assistir as festividades promovidas em comemoração pela assinatura da Lei Áurea. "Significa que a festa oficial ocorreu dias depois da assinatura", aponta Rueda.

Santos: falta planejamento
Foto: Alberto Marques, em 21/9/2005,
publicada com a matéria

Eliane: participação tímida
Foto: Alberto Marques,
publicada com a matéria

Falta de inclusão transforma Abolição em data de protesto

Para a comunidade negra, o dia de hoje - da Abolição da Escravatura - é tido como uma data de protesto porque não existiu uma política de inclusão do negro à sociedade brasileira após a assinatura da Lei Áurea. Para os movimentos negros, a principal data é o Dia Nacional da Consciência Negra, comemorado em 20 de novembro, data da morte do negro Zumbi, líder da resistência no que foi o maior quilombo do País, o Palmares.

As opiniões são divididas por José Ricardo dos Santos, da Coordenadoria de Promoção da Igualdade Racial e Étnica (Copire) e pela mestre em Comunicação pela Universidade Metodista e pesquisadora de assuntos relacionados à comunidade negra e africana Eliane de Souza Almeida.

"Até os dias de hoje os negros sofrem as conseqüências da escravidão e desta abolição executada sem planejamento. Que liberdade é essa que não é acompanhada de medidas de compensação? São necessárias políticas de integração para direitos iguais, o que não temos até hoje", declara Santos.

Participação - A pesquisadora Eliane declara que a escravidão não foi, para a comunidade negra, um movimento pacífico e que "desde a captura houve a resistência do povo negro". No entanto, a participação do negro na luta por seus ideais ainda se mostra "tímida".

"Eu ainda acredito que os negros da nossa região têm uma posição muito tímida. O grande problema é não se enxergar negro. É importante que os jovens se conscientizem de sua negritude e busquem seu espaço como brasileiros. Nós somos os ingredientes que construíram esta nação".


Casa onde viveu Quintino de Lacerda, negro e um dos principais defensores do fim da escravidão
Foto: reprodução, publicada com a matéria

Trechos de depoimentos
"Quando se falar em abolição no Brasil, não se poderá dizer que ela foi obra exclusivamente popular e principalmente paulista. Quem assistiu ao espetáculo soberbo do abolicionismo, em São Paulo e Santos, não poderá pensar de modo diferente, porque jamais esquecerá as cenas desenroladas, os trabalhos desenvolvidos, as lutas maravilhosas em torno do ideal de libertação (...) Santos foi o baluarte máximo da abolição, o eixo de todo movimento popular que venceu políticas e governos e tem sido esquecido por quantos têm escrito sobre abolição no Brasil". - Júlio Conceição

"Ao movimento abolicionista em São Paulo está intimamente ligada a existência do famoso Quilombo do Jabaquara, na cidade de Santos, para onde, em regra, convergiam todos os evadidos das senzalas das vizinhanças (...) Onde, porém, o abolicionismo dominou todas as consciências, numa impressionante unanimidade de opiniões, foi na cidade de Santos. Desde que um escravo conseguia pisar as ruas daquele porto, era de fato homem livre, e, de mais a mais, encontrava emprego remunerador para seus braços. Na cidade de Santos guiavam o movimento popular Quintino de Lacerda e Santos Garrafão, fundadores do Quilombo do Jabaquara, Júlio Maurício e Vanssuitem, antigo sargento do exército". - Evaristo de Morais. (N.E.: Wansuit e não Vanssuitem, conforme corrige Francisco Martins dos Santos)

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