Pedaço do mundo, abrigo de culturas

Santos recebeu imigrantes de diferentes países no último século. A partir de amanhã, A Tribuna conta suas histórias em série especial

Ronaldo Abreu Vaio

Da Redação

Até abril deste ano, segundo o Ministério da Justiça, havia no Brasil 1,54 milhão de imigrantes estrangeiros regulares - a metade deles, no Estado de Sâo Paulo. Como é costumeiro nas cidades portuárias, Santos e a região absorveram uma boa parte desse contingente. Estima-se que a Cidade abrigue mais de 20 nacionalidades não nativas, ou seja, sem contar sua descendência.

A partir de amanhã, A Tribuna inicia uma série semanal de reportagens, a ser publicada todas as segundas-feiras e na qual se pretende contar um pouco da História e das histórias dessa gente que nem sempre fala a mesma língua, mas chora, ri, ama e sofre como todo mundo.

Sofrimento, aliás, é a tônica de toda imigração, especialmente a compulsória. Mudar de um país a outro representa muito mais do que uma troca geográfica: é adotar uma visão de mundo e de valores.

"A gente é criado em um meio cultural, com concepções de família, trabalho, relações. A gente aprende a ver o mundo desse cabedal cultural próprio e tende a considerá-lo universal", explica a psicóloga Sylvia Duarte Dantas, criadora do Núcleo de Estudos de Orientação Intercultural, do Instituto de Psicologia da Universidade de São Paulo (USP).

No ano passado, Sylvia iniciou um núcleo similar em Santos, na Universidade Federal de São Paulo (Unifesp). "Santos tem uma rica história nesse sentido. Era a porta de entrada do Brasil", justifica.

... dos japoneses, amostras de jogos e artesanato; ...
Foto: Carlos Nogueira, em 19/6/2012, publicada com a matéria

Estresse - Não existe uma fórmula geral que descreva o impacto psicológico da imigração. Ele é pessoal e depende de inúmeros fatores, como a condição emocional do imigrante no momento da mudança e os motivos da imigração, passando pela similaridade cultural entre os países de origem e de destino.

Curiosamente, a segunda geração - os filhos dos estrangeiros, já nascidos no novo país - tende a viver mais o conflito entre dois mundos do que os próprios pais, que deixaram a terra natal. "Eles vivem em casa uma cultura diferente da vida na rua".

Em contrapartida, a experiência de nascer em uma família bicultural pode ser extremamente rica. "Amplia a visão de mundo".

Seja como for, do ponto de vista psicológico, uma palavra pode resumir todos os embates envolvendo a imigração: o estresse.

"Você tem que reaprender tudo. Quanto maiores as diferenças entre as culturas, maior o estresse. Às vezes, um simples cumprimento pode ser muito diferente de um lugar para outro e causar mal entendidos".

... e o tradicional tamanco português. São exemplos do que povos trouxeram ao Brasil
Foto: Vanessa Rodrigues, em 27/6/2012, publicada com a matéria

Tolerância - Nesse aspecto, em comparação a ouros países, o Brasil é considerado por Sylvia um país flexível e tolerante a novas culturas. Mesmo assim, ainda não consegue fugir da face negra de seu passado.

Segundo Sylvia Duarte Dantas, os africanos sofrem preconceito - reflexo da antiga sociedade escravocrata. "No geral, o brasileiro sabe lidar com novas culturas, diferentes religiões".

Nova imigração

A missão do Núcleo de Estudos e Orientação Intercultural é o apoio psicológico e o acolhimento a imigrantes e a brasileiros que retornam de longos períodos no Exterior. Segundo Sylvia, os números, tanto de um quanto do outro grupo, vêm aumentando. "Por causa da crise lá fora, o Brasil está novamente recebendo imigrantes, e muitos brasileiros estão voltando".

Ao contrário de outras épocas, a imigração de agora tem trazido gente qualificada, que vem buscar no Brasil um espaço que não encontra mais no mercado de trabalho em seus países.

O endereço do Núcleo de Estudos e Orientação Intercultural é Rua Silva Jardim, 133, sala 214, Vila Mathias. O telefone é 3878-3805.