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HISTÓRIAS E LENDAS DE SANTOS - OS IMIGRANTES - 2012/13
Os imigrantes - 2013 [22 - Russos]

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Trinta anos depois da primeira série de matérias, o jornal A Tribuna iniciou em agosto de 2012 uma nova série Os Imigrantes, abordando em páginas semanais as principais colônias de migrantes estrangeiros estabelecidas em Santos. Esta matéria foi publicada no dia 14 de janeiro de 2013, na página A-8:


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A cada Sol, outro mundo

Vivendo há pouco mais de um ano no Brasil, casal russo celebra nova vida, em que se pode sorrir sem ser "louco"

Ronaldo Abreu Vaio

Da Redação

Quando entramos na tropicalíssima casa do joalheiro Sergei Sazonov, de 45 anos, e da bailarina Erina Sazonova, de 43, as opções de sua cortesia eram café e chá preto com leite. "O café é muito bom no Brasil", justificaram. Se não fosse por isso, talvez prevalecesse mesmo o chá-preto com leite. Já o superlativo tropicalíssima, em referência ao lar desse casal russo há um ano morando no Brasil, não foi usado por acaso. À sombra do chá-preto, escancara-se uma das muitas dicotomias que pululam pelo caminho de quem parte para uma cultura tão diferente: no jardim, uma das primeiras providências do casal foi plantar um pé de maracujá. "Olha como já está grande", comemoram.

O exotismo, a esses olhos estrangeiros que até há bem pouco tempo não conheciam caquis, carambolas ou lichias, se estende à bacia de figos frescos na mesa da sala – "na Rússia, só tem seco" – e à maravilhosa possibilidade de se chupar uma manga até o caroço sem ter de pagar estrambóticos R$ 20,00, como calculam beirar o preço da fruta em sua terra natal.

Aliás, a incompatibilidade entre custos e salários foi um dos motivos que os fizeram deixar Moscou, com destino ao Brasil. Como professora de balé – ela é formada pela Academia Vaganova, fundada em 1738, ligada ao Balé Imperial, em São Petersburgo –, Erina ganhava cerca de R$ 300,00 por mês. O aluguel de um quitinete na capital, sozinho, saía em torno de R$ 200,00. A isso, some-se Sergei vendo seu negócio de joalheria minguar a cada ano, e o que se tem é uma boa motivação para buscar novos desafios. Mas o que os trouxe mesmo ao Brasil é o desejo de ter filhos. Por incrível que pareça, um desejo que esbarrou na atual condição sociopolítica russa.

"Vocês não sabem o que é corrupção" - Sergei analisa: os primeiros anos depois da queda do Império Soviético, em 1989, até que foram bons. Depois, as coisas começaram a degringolar, segundo dão a entender. Ao ponto de considerarem o regime atual tão comunista quanto o anterior, só que com outro nome. Se durante o comunismo de fato havia racionamento de comida, as roupas eram escuras, todas iguais, e era preciso pedir permissão até para mudar de residência, o comunismo atual impõe flagelos como ter que pagar uma taxa à polícia para que devolva o carro roubado ao legítimo dono, depois de recuperá-lo.

A própria Erina passou pela experiência surreal de ter a bolsa sequestrada em um supermercado. Depois de alguns dias, recebeu o telefonema de alguém exigindo dinheiro em troca dos documentos. "Vocês não sabem o que é corrupção", afirma Erina, com pesar.

Essa corrupção seria também o motivo de lhe negarem tratamento para a trombofilia que lhe dificultava a gravidez – ela chegou a sofrer um aborto por conta disso. A trombofilia é uma doença que leva à propensão de desenvolver coágulos no sangue, prejudicando a alimentação do feto pela placenta. Mas é um mal perfeitamente controlável.

"Eles (os médicos russos) diziam que não podiam fazer nada". Acreditaram que nos Estados Unidos, na Inglaterra ou no Brasil, os médicos poderiam fazer alguma coisa. Como o visto para os EUA era muito difícil de ser obtido, e a Inglaterra, um país ainda muito frio para Sergei – que vinha contraindo pneumonia a cada inverno russo –, escolheram então o ensolarado Brasil. "O Sol é maravilhoso, era nosso sonho. E vocês são ricos de coração", diz ela.

Sergei vive essa riqueza todos os dias, no box de joalheiro em uma galeria de Praia Grande: quando ele não consegue se haver com a máquina dos cartões de crédito e débito, recebe a ajuda solícita dos outros comerciantes. Na chegada ao Brasil, em São Paulo, um dos poucos sustos por que passaram neste ano no País: uma imensa barata voadora que fez Erina berrar de pavor. Na Rússia, elas são menores.

Mas o primeiro contato real que tiveram com o Brasil foi ainda na Rússia. No início dos anos 90, Rabinha Isaura, ou Escrava Isaura, com Lucélia Santos, esvaziou as ruas por lá – tanto como fizera por aqui, 15 anos antes. "Minha mãe dizia que trabalhava tanto quanto a escrava Isaura", comenta Erina. A mãe – as famílias, aliás – resume a saudade da Rússia. Nem mesmo a comida mais tradicional é empecilho: é possível ser feita no Brasil. No dia em que receberam A Tribuna, tinham na geladeira a kapusta, repolho com sal e suco de limão. Se sentirem falta de um vareniki, é só comprar um ravióli, com carne ou queijo. E também não é um problema encontrar boas beterrabas para preparar o borscht, a tradicional sopa do tubérculo, vermelha como o sangue.

A vida brasileira de Erina e Sergei vem florescendo como as orquídeas que também mantém no jardim. "É meio ano com flores. Na Rússia, só ficam dois meses. E lá, custam US$ 100 (cem dólares)". Com a trombofilia sob controle, o casal agora sonha com frutos. Este ano, querem ter um filho. Um brasileirinho. "Nós, aqui, sorrimos. Lá, todos são sérios. Quem sorri é louco".


O casal e o quadro com a imagem de Nossa Senhora de Kazain, cidade às margens do Volga onde nasceu a avó de Erina. O estilo da pintura, pelas cores e o dourado, imita a arte bizantina
Foto: Davi Ribeiro, publicada com a matéria

Ortodoxia Russa - A tradição é da Igreja Cristã Ortodoxa, que, no país, tem uma ramificação própria, a Igreja Ortodoxa Russa. Forma, como se diz na Ortodoxia Cristã, um patriarcado independente, o de Moscou. Tem por volta de 100 milhões de adeptos apenas na Rússia e há outros 90 milhões estimados pelo mundo.

Calendário Juliano - O Natal russo é comemorado em 7 de janeiro, um resquício do antigo calendário Juliano, que fincou raízes no país – há, inclusive, uma festa de ano-novo antigo, baseada nesse calendário.

Como o nome indica, o Juliano foi instituído pelo imperador Júlio Cesar, em 46 a.C., ao perceber que as festas primaveris do antigo calendário romano estavam caindo em pleno inverno. A reforma adicionou dois meses ao final de 46 a.C., unodeciembres e duodeciembres, fazendo com que januarius e februarius fossem deslocados para o início do ano seguinte.

No século 16, para coincidir novamente o equinócio da Primavera com a data de 21 de março e para corrigir uma discrepância de dez dias, o papa Gregório 13 reformulou o antigo calendário, criando o Gregoriano. A partir de 15 de outubro, o ano de 1582 ganhou mais dez dias, e a diferença entre as datas natalinas foi criada. Como na Rússia a adoção do calendário Gregoriano só aconteceu em 1918, a tradição do Natal em 7 de janeiro permaneceu inalterada.

"A Terra é azul" - A frase, mundialmente famosa, foi pronunciada no dia 12 de abril de 1961, pelo cosmonauta Yuri Gagárin – o primeiro homem a viajar pelo espaço. O voo aconteceu na nave Vostok 1, que quer dizer oriente. Outra frase célebre de Gagarin na mesma viagem: "Olhei para todos os lados, mas não vi Deus".

Escritores e músicos - A Rússia tem uma grande tradição nas áreas de Literatura e Música. Entre escritores mundialmente conhecidos e afamados, incluem-se os nomes de Fiódor Dostoievsky (1821-1881), Leon Tolstói (1828-1910), Nikolai Gogol (1809-1852) e Anton Tchekov (1860-1904). Na música, o solo russo já viu nascer para o mundo nomes como os de Piotr Tchaikovsky (1840-1893) e Igor Stravinsky (1882-1971).

Casamento russo - Erina e Sergei se casaram na igreja no Brasil, no Rio Grande do Sul. Mas fizeram tudo à moda russa, em uma cerimônia ortodoxa que reúne algumas diferenças e peculiaridades, em relação ao que se está acostumado por aqui. Por exemplo, quem inicia a colocação das alianças nos dedos dos noivos é o padre. E os votos são repetidos três vezes. Em seguida, juntos, dão três voltas ao redor de uma mesa – símbolo do caminho que trilharão na vida. No final, colocam uma coroa, para mostrar que serão o rei e a rainha da casa.

O maior do mundo - A Rússia é, territorialmente, o maior país do mundo, com 17.098.242 km² – o dobro do Brasil, que possui 8.515.767 km².


Balé Bolshoi
Foto publicada com a matéria

Bolshoi - A origem de um dos mais famosos corpos de balé do mundo é a mais prosaica possível: começou como escola de dança para crianças de um orfanato, em 1773. Três anos depois, os professores foram contratados pelo príncipe Pyotr Urusov e pelo empresário teatral inglês Michael Maddox, para formar em conjunto uma nova companhia.

Durante quase 150 anos, o Bolshoi, baseado em Moscou, teve dificuldades para competir com o Mariinsky Ballet, o corpo imperial, baseado em São Petersburgo – a capital da Rússia czarista. Com a mudança do governo soviético para Moscou, o Bolshoi ganhou espaço e notoriedade. Hoje, com 220 bailarinos, é um dos maiores do mundo e se apresenta em seu próprio teatro, o Bolshoi.


Mikhail Gorbachev
Foto publicada com a matéria

Dos czares a Gorbachev - Uma monarquia enriquecida convivendo com um povo paupérrimo. O roteiro lembra muito o da Revolução Francesa, de 1789, mas se passou também na Rússia do início do século 20. Esse foi o panorama que precipitou a Revolução Russa, em 1917, capitaneada por Vladimir Lênin, líder do Partido Comunista Russo. Mas, ao contrário do que aconteceu na França, o fruto da revolta na Rússia foi um regime autoritário, que deu origem a uma congregação de países, conhecida como União das Repúblicas Socialistas Soviéticas (URSS). Em seu auge, nos anos 1960, a URSS tinha 15 países sob o jugo de Moscou e foi um dos pilares da polarização mundial que se seguiu após à Segunda Guerra, sob o nome de Guerra Fria. O outro foram os Estados Unidos. Em 1989, depois de sete décadas, Mikhail Gorbachev, então líder do partido comunista russo, começou reformas internas que culminariam na mudança de regime.

Federação Russa (Rossiyskaya Federatsiya)

Capital - Moscou

População - 142.905.200 (censo 2010)

Línguas oficiais - Russa e outras 27, em várias regiões

PIB - US$ 1,85 trilhão (estimativa, 2011)

Renda per capita - US$ 17 mil (estimativa, 2011)

Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) - 0,755 (elevado, 2011)

Datas nacionais - 12 de abril (Dia dos Cosmonautas), 12 de junho (Declaração de Soberania do Estado da Rússia) e 4 de novembro (Festa da Unidade Nacional)

Colônia na região - Sem informações.

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