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HISTÓRIAS E LENDAS DE SANTOS - URBANISMO (X)
Porto disputa espaço com a cidade (7-A)

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Metropolização, conurbação, verticalização. Os santistas passaram a segunda metade do século XX se acostumando com essas três palavras, que sintetizam um período de grandes transformações no modo de vida dos habitantes da Ilha de São Vicente e regiões próximas.

O avanço portuário sobre o território urbano marcou e foi marcado pelo aumento no número de veículos transportadores de carga que circulam pela cidade. Como foi anotado numa série de matérias do jornal santista A Tribuna, que começou a ser publicada em 28 de setembro de 1980:


(Avenida Ana Costa, próximo à Rua Cunha Moreira)
Foto publicada com a matéria

"Em nome dos moradores da Rua Campos Melo, no trecho entre Luísa Macuco e Emílio Ribas, através desta vimos solicitar que sejam tomadas enérgicas providências para coibir os abusos que estão ocorrendo em face do estacionamento de caminhões nos dois lados daquela movimentada via pública, para descarregar e carregar containers e grandes volumes de caixaria. Os pesados veículos dificultam o trânsito; bloqueiam as garagens residenciais; dificultam a entrada e saída dos alunos do Ginásio Docas de Santos; destroem as calçadas e ainda colocam em risco a vida das pessoas (particularmente das crianças) que residem na citada área. Recorremos ao auxílio desse jornal, visto que as reclamações dirigidas às autoridades ditas competentes para esse tipo de ocorrência, não surtiram o efeito desejado".- Antonio Carlos Prieto e mais 21 assinaturas.

Ninguém duvida da autenticidade das 22 assinaturas do memorial, que poderiam ser 220 ou 2.200, ganhando pela fé as colunas da Tribuna do Leitor. Se o documento chegasse à Redação apenas como queixa do leitor Antônio Carlos Prieto, ainda assim ganharia divulgação, porque o problema existe, não apenas na Campos Melo e não somente na área delimitada, mas na Rua Rodrigo Silva, na Constituição, na Monsenhor Paula Rodrigues, na Manoel Tourinho e também nas grandes avenidas, como por exemplo a Rodrigues Alves, a Afonso Pena e outras de menor importância do sistema viário.

O problema da Campos Melo já chegou à Ana Costa e à Conselheiro Nébias. Se as autoridades não solucionarem o tráfego rodoviário em Santos, qualquer dia as praias amanhecerão servindo de estacionamento aos veículos de carga.

Texto: Áureo de Carvalho
Fotos: Rafael Dias Herrera


(Valongo)
Foto publicada com a matéria

A invasão dos caminhões

De janeiro a agosto de 1980 (dados da Delegacia de Trânsito de Santos), foram licenciados na Cidade 1.557 caminhões de carga e frete (de aluguel) e 4.925 de carga própria, totalizando 6.482 veículos de carga que, quando parados, ocupam em média, cada um, uma área de 10 metros de comprimento por 4 metros de largura, ou 40 metros quadrados. Só os licenciados em Santos representam uma área útil de solo ocupada que chega a 259.280 metros quadrados.

Se todos os caminhões licenciados em Santos decidissem viajar para São Paulo, comporiam uma grande fila na Via Anchieta, de mais de 65 quilômetros, desde o Chico de Paula até o Sacomã.

Em agosto (dados da Cia. Docas de Santos), cerca de 60 por cento das cargas de importação ou cabotagem foram movimentadas por caminhão (600.903 toneladas), que também transportaram 38% do total das cargas de exportação (309.867 toneladas), além de 9.376 containers com 95.249 toneladas de carga. No total, incluindo os containers, os caminhões transportaram 1.017.009 toneladas de carga do porto. Se cada caminhão transportou apenas 20 toneladas por viagem, só no porto operaram, em agosto, 50.850 caminhões. Ou o dobro, porque quando o caminhão entra carregado na faixa portuária volta vazio, e quando ingressa vazio na área da Cia. Docas retorna carregado, fazendo duas viagens completas: é visto no percurso sempre duas vezes.

Isso significou a presença diária de 1.695 caminhões no porto em agosto, ocupando, quando parados, uma área de 67.800 metros quadrados das vias públicas de Santos.

Mas, além dos 1.695 caminhões que operaram no porto em agosto, e além dos 6.482 licenciados na Delegacia de Trânsito, existem outros - cerca de 1 mil num cálculo por baixo, porque inexistem meios oficiais de apuração - que são licenciados em outros municípios, mas permanecem na Cidade. Esses transportam mercadorias e carga de terminais e armazéns fora da Cia. Docas, para outros terminais e armazéns do parque industrial de Cubatão ou mesmo para a região do ABC ou da grande São Paulo. Eventualmente operam com granéis sólidos, de Conceiçãozinha (Guarujá) para Cubatão, Santos e o Planalto, mas seus motoristas residem, na grande maioria, em Santos, parte em São Vicente e parte em Cubatão. Porém, conservam a base de operações na área do Valongo, em Santos.

Excluídos os caminhões-tanques, que transportam derivados de petróleo de Cubatão para os postos de revenda de Santos, Baixada e Litoral, e sem contar também os que operam com produtos químicos mas têm seus motoristas residindo em Santos, a Cidade tem em operação diária nada menos que 9.177 caminhões nas vias públicas urbanas.

A Dersa, por outro lado, engrossa essa estatística, afirmando que, em média, de 4 mil a 4.500 caminhões descem a serra diariamente, passando pelos boxes de pedágio da Via Anchieta e Rodovia dos Imigrantes, rumo a Santos (principalmente), Baixada e Litoral.


Foto publicada com a matéria

Sem um terminal, onde estacionar?

O Ministério dos Transportes programou e executou em Santos vultosas obras de ampliação do porto, a partir da criação da Portobrás. Esta, por sua vez, deu seqüência aos programas de expansão da Cia. Docas, que inicialmente construíra o cais até o Canal da Mortona, ampliando-o posteriormente até o Canal 4 (Avenida Siqueira Campos), e depois até o Canal 5 (Avenida Almirante Cócrane). Depois veio a construção do cais até o Canal 6 (Avenida Coronel Joaquim Montenegro), onde foram recuperadas extensas áreas de mangue, e, por último, o cais chegou no extremo da Ponta da Praia, quase emendando com o píer do Entreposto de Pesca e com o terminal do ferry-boat Santos-Guarujá.

Foram criados os Corredores de Exportação, com a instalação de sofisticados equipamentos para a rápida descarga de cereais em grão, transformando o porto - já então de grande renome - no superporto do Brasil, citado em todas as estatísticas como recordista na movimentação das cargas. Paralelamente à ampliação do cais aportável, foram levantados novos armazéns, desde o Canal 4 até o ferry-boat, enquanto, também no Valongo, o cais recebia ampliação e cresciam as instalações na Margem Esquerda.

A Física ensina que dois corpos não podem ocupar o mesmo lugar no espaço, e por isso a Cidade de Santos ficou menor nos lados do estuário. Bairros com ruas tipicamente residenciais perderam essa característica, abrangendo uma larga faixa que começa junto ao Canal da Mortona, segue pela Avenida Rodrigues Alves, Senador Dantas e contorna a Avenida Afonso Pena, até a Praça Gago Coutinho.

Toda essa expansão - em função do superporto - não foi suficiente, porque havia a necessidade de mais e mais novas áreas. Velhos cinemas, que serviam à diversão do santista, foram transformados em armazéns, e os terrenos baldios em terminais e depósitos de cargas que já não cabiam nos limites fixados para o novo porto. A própria Avenida Senador Dantas, que funcionava como um paredão simbólico nunca ultrapassado, acabou cedendo e foi cruzada, até quase chegar com terminais e armazéns às imediações da Avenida Conselheiro Nébias, desde a Afonso Pena até a área do Mercado Municipal

O exemplo dessa distorção é experimentado pelos moradores das outrora tranqüilas ruas Campos Melo, Silva Jardim, Manoel Tourinho, Batista Pereira, 28 de Setembro e Padre Anchieta, hoje servindo exclusivamente às atividades portuárias.

O porto foi mais além, com a sua voracidade de espaço. Apareceram terminais de carga na Avenida Washington Luiz, na Braz Cubas, na Barão de Paranapiacaba, na Pedro Américo, na Constituição, na Monsenhor Paula Rodrigues, na Paraná e até na Avenida Bernardino de Campos.

No dia-a-dia, o santista nem percebeu que o Valongo, onde a História de Santos estava plantada, transformou velhos prédios em depósitos de adubo, e suas ruas em pátios de estacionamento de caminhões.

Com o crescimento do porto, veio a deterioração dos bairros residenciais, cuja qualidade de vida ganhou sério comprometimento. Só uns poucos, os mais espertos, conseguiram vender em tempo suas casas e apartamentos para fugir ao superporto, instalando-se em outras áreas onde as cargas de exportação e importação ainda não chegaram. Aos que ficaram - vender para quem a moradia? - só restou a queixa, agora sistemática, contra a presença incômoda dos caminhões e contra a operação barulhenta dos improvisados terminais de carga, hoje espalhados por toda área santista da Ilha de São Vicente.

Desesperado com a situação, o santista recorre às autoridades de trânsito da Cidade - que, como de resto, não cresceram em material humano e recursos na mesma proporção do porto e nada podem fazer. O passo seguinte é a coluna dos jornais, onde se fazem apelos e muitas perguntas. Uma delas, bastante simples, é freqüentemente repetida ao Governo Federal e ao Ministério dos Transportes: "Vocês pensaram no superporto, construindo-o. Pensaram na encantada Avenida Portuária, que, por enquanto, só leva do zero ao nada. Mas não pensaram nos quase dez mil caminhões/dia que operam no porto, nem imaginaram que, além da circulação, esses caminhões precisam de um lugar onde possam parar enquanto aguardam a vez da descarga ou um novo carregamento?"


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