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HISTÓRIAS E LENDAS DE SANTOS - CANAIS - BIBLIOTECA NM
Posicionamento da Prefeitura - 13


Clique na imagem para voltar ao índice do livroA polêmica acirrada entre o idealizador do sistema de canais para Santos e os vereadores santistas, que marcou o início do século XX, levou o jornalista Alberto Sousa a escrever o livro A Municipalidade de Santos perante a Comissão de Saneamento, publicado em 1914 pelas Officinas Graphicas do Bureau Central, em Santos, em que polemiza com o engenheiro Saturnino de Brito.

O exemplar, com 257 páginas, foi cedido a Novo Milênio para digitalização pela Biblioteca Pública Alberto Sousa, de Santos, através da bibliotecária Bettina Maura Nogueira de Sá, em maio de 2010. A ortografia foi atualizada, nesta transcrição (páginas 85 a 90):

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A Municipalidade de Santos perante

a Comissão de Saneamento

Alberto Sousa

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PARTE I - EXPOSIÇÃO E DEBATE
XII - A carda do dr. Bouvard e outros assuntos

Em face dos considerandos que vimos fazendo nesta longa série de artigos - quem pode mais tomar a sério as opiniões do sr. Saturnino de Brito, as suas idéias, os seus planos, a sua capacidade profissional, a fama dos seus talentos?

Em abono dos seus créditos de especialista, s.s. publica trechos de uma carta do sr. Bouvard. Não sabemos até que ponto esses trechos isolados possam merecer confiança, porque, como já dissemos e provamos, em artigos anteriores, o sr. chefe da Comissão de Saneamento é habitualmente capcioso e de má-fé na transcrição e citação de autores. Duvidamos até que s.s. seja capaz de publicar, na íntegra, o contexto da epístola daquele arquiteto francês.

Mas, nos próprios retalhos dados à publicidade, encontra-se a prova de que Bouvard não teve francos louvores para o seu plano. Ele é "contra as vias desmesuradamente largas, salvo casos excepcionais, que não devem ser numerosos".

O sr. Saturnino, ao receber a carta, leu esse trecho, olhou para a planta e disse para os seus botões: "O meu colega tem razão, atendendo à simples vista da planta, à qual faltam absolutamente detalhes. É por isso que as avenidas parecem excessivamente largas". E, sem demora, preencheu o vácuo das avenidas - com os seus cento e vinte metros de largura - plantando na faixa central frondosos bosques, cortados de jardins, hotéis, casas de diversões, campos de desporto, jardins zoológicos e jardins botânicos, sanatórios, escolas e museus.

As matas, porém, assevera com a sua romba ironia do costume, o sr. engenheiro-chefe, "não serão propriamente fechadas para não se tornarem propícias ao esconderijo de criminosos". De um outro detalhe importante se não deve esquecer o sr. Brito: a construção de um hospício ao lado dos sanatórios da planta, destinado à internação dos engenheiros lunáticos, prestes a perder completamente o siso.

Depois de dizer que, em virtude da opinião do sr. Bouvard, sobre as vias excessivamente largas, teve que acrescentar ao projeto os grandiosos detalhes que lhe faltavam, afirma s.s. "ser possível que aquele especialista não se refira propriamente às suas avenidas, mas sim às avenidas Ana Costa e Conselheiro Nébias, uma com 30 meros de largura e outra com 22".

É uma insinuação feita com a mais indigna má-fé. O sr. Saturnino, quando enviou sua planta ao sr. Bouvard, foi para que este emitisse opinião sobre o que s.s. projetava fazer, e não sobre o que já estava feito antes de sua vinda para Santos. Na sua planta devia estar forçosamente assinalado o que era trabalho seu - e que devia provocar o juízo do especialista francês.

É evidente que a opinião do sr. Bouvard contra as vias demasiado largas devia referir-se às futuras avenidas de cento e vinte metros de largura, antes que às avenidas já existentes de 30 e de 22 metros. Ele não podia condenar as mais estreitas e aprovar as mais largas, nem criticar, num plano de expansão, as vias já prontas, poupando justamente as que se acham apenas projetadas.

O sr. Saturnino diz mesmo, textualmente: "É possível que o sr. Bouvard não se refira propriamente às nossas avenidas, porquanto nelas não se terá a impressão de largura considerável; esta é absorvida pelo bosque, conforme mostramos...".

Mas, se só depois da carta do sr. Bouvard, criticando as vias excessivamente largas, é que s.s. disse: "Ele tem razão"; se só depois de receber tal carta é que s.s. acrescentou ao projeto o detalhe dos bosques de eucaliptos na faixa central; se s.s. confessa que "uma vez conhecido esse detalhe, o sr. Bouvard não manterá sua sentença" - como quer sustentar que a opinião do engenheiro francês se não entende com as suas futuras avenidas e sim com as que já existiam ao tempo da confecção da planta?

Na época em que escreveu a carta, o sr. Bouvard só viu na planta avenidas excessivamente largas, "criadoras da tristeza, da solidão e também, algumas vezes, da monotonia". Reprovou-as por isso; e o sr. Saturnino corrigiu-as, apensando-lhes os tais bosques e mais detalhes que o sr. BOuvard só viria a conhecer mais tarde, modificando, então, sua sentença.

O sr. Saturnino, porém, no intuito de iludir o público, quer convencê-lo de que o sr. Bouvard, que ainda nada sabia dos seus bosques, condenou, não as projetadas avenidas de cento e vinte metros de largura, mas as avenidas Ana Costa e Conselheiro Nébias, cuja largura é quatro vezes inferior à daquelas.

Pois concordemos que assim seja. Nesse caso, a sentença do sr. Bouvard modificar-se-á logo que ele saiba que, mesmo sem ser conhecida a sua carta ao engenheiro Brito, já a nossa engenharia municipal, modesta, mas competente, tinha atenuado a possível tristeza, solidão e monotonia da avenida mis larga - a Ana Costa - construindo nela três renques de canteiros arborizados, em toda a sua extensão, sendo dois renques laterais e um na faixa central; e da mais estreita - a Conselheiro Nébias - levantando aí canteiros idênticos de cada lado.

Termina o sr. engenheiro-chefe o seu sexto artigo, insistindo nas suas despóticas exigências relativas a desapropriações, que já combatemos, longa e frutuosamente, julgando-nos por isso dispensados de voltar ao assunto.

O artigo sétimo é dedicado à comparação entre a planta municipal de 1896 e a da Comissão de Saneamento. O sr. Saturnino, que timbrou sempre em desprezar aquela planta, considerando-a como não existente, tanto que, em seu ofício de 26 de abril de 1913, explica que a Comissão fez a planta geral, "porque era necessário fazer uma, e disto não cuidou a Municipalidade" - agora mudou de opinião. Já considera existente a planta e vem discuti-la, estabelecendo comparação com a sua.

Condena-a porque nela prepondera o xadrez, defeito de que também se ressente a sua. Depois disso, trata de provar que a execução de sua planta é economicamente menos onerosa à Municipalidade que a da antiga planta de 1896!

Seríamos forçados, neste particular, a dizer que o sr. Saturnino não conhece nem mesmo as quatro operações fundamentais da aritmética - se não tivéssemos absoluta convicção de que é por má-fé incorrigível que ele faz aplicação errada dessas operações.

Do quadro numérico publicado no artigo que estamos analisando, verifica-se que o projeto Brito ocupa uma superfície maior (704 hectares) que a planta da Câmara (648). Como, pois, com uma área maior a desapropriar, vem s.s. afirmar-nos que o seu projeto custa menos que o da Municipalidade?

O mais interessante, porém, é que s.s., depois de dizer, com grande arrogância, que vai provar que o seu projeto é mais vantajoso do que o da Câmara e que os ônus de expropriação que acarreta são inferiores aos deste, limita-se a publicar a tabela numérica e comparativa da área ocupada por um e por outro - e não diz uma só palavra, não apresenta um só argumento, não deduz uma só prova, demonstrativa da proposição que avançou! Faz a afirmação - e muda repentinamente de assunto, dissertando, filosófica e poeticamente, sobre a sensibilidade dos seres vegetais e pregando o amor carinhoso às árvores.

É de topete este positivista! Prega o amor às árvores simpáticas, boas e úteis, e aconselha a Municipalidade a destruir os eucaliptos das futuras avenidas, para, com o produto de sua venda, compensar-se das despesas feitas!

Estamos, finalmente, chegando ao termo desta campanha. Vamos analisar o último artigo da série.

Imagem: reprodução parcial da obra de Alberto Sousa (página 86)