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HISTÓRIAS E LENDAS DE SANTOS - Crônica policial - 20
Cafetão ousado processou...

...por calúnia, mas perdeu o processo e o recurso!

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Esta história foi noticiada pelo jornal paulistano O Estado de São Paulo, na página 6 da edição de 23 de julho de 1909 (Acervo Estadão - ortografia atualizada nesta transcrição):

Imagens: reprodução parcial da pagina com a matéria, no Acervo Digital Estadão

Santos

O cafetão Antonio Soares

Está findo o processo que me moveu o cafetão Antonio Soares, português,natural de Arouca, e estabelecido com um botequim à Rua Martim Afonso, n. 57, nesta cidade.

Tendo eu, numa publicação feita pel'A Vanguarda, dito que Antonio Soares era cafetão e explorava a cafetina Annita Blid, o mesmo indivíduo constituiu seu advogado o sr. dr. Antenor de Moura e chamou-me aos tribunais. Nomeei meu advogado o sr. Benjamin Mota, então diretor d'A Vanguarda, e o meu patrono, desde a primeira audiência, protestou pela prova da verdade, e, findo o sumário, em minha defesa apresentou sólida argumentação, acompanhada da prova de que Antonio Soares, apesar de ser negociante e proprietário, era um cafetão.

O íntegro magistrado sr. dr. Luiz Porto Moretzsohn de Castro, julgando o processo, proferiu o seguinte

DESPACHO

Vistos etc.

Considerando que, para dar-se a pronúncia, é indispensável que o juiz tenha pleno conhecimento do delito e que existam indícios veementes de quem seja o delinquente (Cód. de Proc. Criminal, arts. 144 e 145);

Considerando que, para existência do crime de calúnia, é elementar que seja "falsa" a imputação a alguém feita de fato que a lei qualifica crime (Cód. Pen., art. 315);

Considerando que o ., em sua defesa, PROVOU SER VERDADEIRA A IMPUTAÇÃO FEITA AO QUEIXOSO NO IMPRESSO DE FLS. 6, e objeto da queixa de fls. 2;

Considerando que, assim sendo, nos termos do art. 145, do Cód. do Proc. e 315 do Cód. Penal, e em vista da inexistência do crime atribuído ao R. na queixa de fls. 2, julgo improcedente a mesma queixa e condeno o queixoso nas custas. Pub. int.

Santos, 29 de março de 1909.

Luiz Porto Moretzsohn de Castro.

O cafetão Antonio Soares ousou recorrer deste despacho para a Egrégia Câmara Criminal do Tribunal de Justiça.

Então, o dr. promotor público da comarca de Santos, dizendo sobre o recurso assim se expressou:

Egrégio Tribunal

O despacho de que se recorreu deve ser mantido, não obstante as alegações do recorrente que não procedem, porquanto o crime de calúnia se caracteriza nos termos do art. 315 do Código Penal, isto é, que seja falsa a imputação feita e que a lei qualifique crime.

Ora, DESDE QUE FICOU PROVADO que A IMPUTAÇÃO NÃO FOI FALSA E SIM VERDADEIRA, ficou o querelado isento de pena nos termos do § único do citado art. 315 do Código Penal. Em tais condições não podia deixar de ser julgada improcedente a queixa de fls. 2, sendo portanto o despacho recorrido dado de acordo com a lei. Entretanto este Egrégio Tribunal resolverá com a sua costumada justiça.

Santos, 30 de abril de 1909.

O promotor público
Norberto Cerqueira.

O íntegro magistrado sr. dr. Luiz porto Moretzsohn de Castro, sustentando o seu despacho e mandando subir o recurso, disse:

Egrégio Tribunal

Sustentando o despacho recorrido, pelos seus fundamentos, aguardo a decisão desse Egrégio Tribunal, que fará a costumada justiça. Siga o recurso, independente de traslado.

S. Paulo, 4 de maio de 1909.

Luiz Porto Moretzsohn de Castro.

O Tribunal proferiu no recurso o seguinte

ACÓRDÃO

Acórdão em Tribunal:

Que, vistos, relatados e discutidos estes autos, em que é recorrente Antonio Soares e recorrido Manuel Cardoso Loureiro, depois do sorteio dos juízes adjuntos, negam provimento ao recurso para confirmar, como confirmam, pelos seus fundamentos, que são jurídicos o estar de acordo com a prova dos autos, a sentença de fls. 91, que julgou improcedente a queixa de fls. 2. E assim julgando condenam o recorrente nas custas.

S. Paulo, 5 de julho de 1909.

XAVIER DE TOLEDO, P.

ALMEIDA E SILVA

CAMPOS PEREIRA

CUNHA CANTO

--

Eu podia fazer ponto aqui. Acusado, como um caluniador, pelo cafetão Antonio Soares, proveu, perante os meus juízes, que não havia caluniado, e que, efetivamente, Antonio Soares era um cafetão.

Despendi dinheiro e perdi tempo para prestar serviço à sociedade em que vivo.

O honrado magistrado sr. dr. Luiz Porto Moretzsohn de Castro, juiz de direito da segunda vara de Santos, o sr. dr. Norberto Cerqueira, promotor público, e o Tribunal de Justiça do Estado declararam ser Antonio Soares um cafetão.

Resta, pois, que, sendo o lenocínio um crime previsto nos arts. 277 e 278 do Código Penal, e estando judicialmente provado que Antonio Soares é cafetão, que o sr. dr. promotor público de Santos, pedindo o traslado do meu processo, instaure contra Antonio Soares o competente processo.

Assim a sociedade santista ficará livre de um indivíduo que se entrega a tão baixo e aviltante meio de vida.

Era o que eu tinha a dizer aos meus amigos e à sociedade que me acolhe.

Santos, 21 de julho de 1909.

Manuel Cardoso Loureiro.

Aliás, a vizinhança do referido cafetão era povoada de outros representantes do submundo santista, como a mundana encontrada na Rua Martim Afonso, 53, que procurou a polícia após receber dinheiro falso de um marítimo inglês que fez "algumas despesas" em sua casa, como discretamente noticia o mesmo jornal O Estado de São Paulo, na página 5 da edição de 28 de junho de 1912 (Acervo Estadão - ortografia atualizada nesta transcrição):

Imagens: reprodução parcial da pagina com a matéria, no Acervo Digital Estadão

Libra falsa - Santos, 27 - O inglês A. Waler, foguista do vapor inglês Labriam, hoje, pela manhã, entrou em casa da mundana Paulina marques Machado, à Rua Martim Affonso, 53, e, depois de fazer algumas despesas, pagou com uma libra esterlina falsa.

Paulina, desconfiando da moeda, chamou uma sua companheira e pediu para conferi-la.

A companheira de Paulina, ao deparar Walker, declarou que no dia antecedente havia sido vítima desse mesmo indivíduo.

Walker foi preso e recolhido ao xadrez.

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