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HISTÓRIAS E LENDAS DE SANTOS - URBANISMO (P)
Santos debate seu futuro e o do Brasil (3)

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Metropolização, conurbação, verticalização. Os santistas passaram a segunda metade do século XX se acostumando com essas três palavras, que sintetizam um período de grandes transformações no modo de vida dos habitantes da Ilha de São Vicente e regiões próximas.

Tais assuntos foram bastante discutidos na época. Uma época em que os santistas se sentiam sufocados pela falta de autonomia política (a cidade era considerada pelo regime militar brasileiro como área de segurança, motivo pelo qual o prefeito era nomeado pelo governo federal), e o Brasil começava a debater a transição política de retorno à democracia (a abertura política já começava a interessar a setores do governo militar). Registrando um dos vários debates então promovidos, o jornal A Tribuna publicou, em 3 de dezembro de 1979, esta matéria, em três páginas de jornal tamanho padrão:

Santos busca seu caminho


A muralha à beira-mar gera o Imposto Predial, um sub-resultado em termos turísticos

Viabilidade natural se houver autonomia

Santos é viável sem autonomia política? (Viável no sentido econômico-social).

Sílvio F. Lopes - "Não há dúvida de que a restrição à autonomia política de uma cidade, à eleição do seu prefeito, produz uma frustração muito grande. Mas o fenômeno maior que empobreceu Santos, em termos de recursos fiscais, foi a reformulação tributária de 1967. Ela objetivou que a maioria dos recursos fosse canalizada para a área federal. Não bastava V. criar autonomia política, inclusive com eleição de governador, prefeito, desde que você mantivesse o poder fiscal nesses estados.

A reforma tributária de 1967 teve um objetivo político muito claro, foi exatamente de retirar, principalmente dos estados, o seu poder econômico, tanto que São Paulo, o estado mais rico da Federação, é hoje, fiscalmente falando, um estado pobre. Sobretudo, de uns quatro ou cinco anos para cá, para que possa enfrentar seus compromissos de oferta de serviços, está na dependência de empréstimos federais.

Eu daria apenas um dado. No orçamento de 1969, 93% dos investimentos do Estado foram baseados em recursos do Tesouro do próprio Estado; no orçamento de 1979, caiu para 37% e no próximo será da ordem de 29%. O imposto-base do Estado é o ICM, sobre o qual o Estado não tem a menor ação política. Sobre ele o Governo Federal dá isenções, oferece vantagens e o manipula como bem entende. De modo que os estados e os municípios, que vivem de transferências, foram empobrecidos em benefício do Governo Federal.

Então V. vê coisas antológicas. Chegou agora um representante da EBTU (Empresa Brasileira de Transportes Urbanos, da União), com uma mala de oferta a São Paulo, da ordem, parece-me, de Cr$ 27 bilhões, dos quais Cr$ 19 bilhões a fundo perdido. É uma concentração brutal de recursos na área federal. E esta devolução, geralmente com recursos do BNH, com correção monetária e outros esquemas que todos conhecemos, são altamente onerosos para os estados, e dá no que deu."

 

"Todo processo que não é de participação comunitária, através de eleição, tira autoridade daquele que exerce o poder. Tudo isso se juntou para que Santos tivesse ao longo desses anos uma fase bastante negativa."

 

Santos, em razão dessa reformulação, como ficou?

Sílvio F. Lopes - "Além desses aspectos, Santos teve um outro, porque quando se modificou a estrutura do ICM, procurando prestigiar as atividades primárias e secundárias, beneficiou a indústria e a lavoura, o que não temos. O resultado é que empobrecemos de cara. Antes, a participação em IVC (Imposto sobre Vendas e Consignações), Santos era a maior arrecadação e participação do Estado, e hoje nós somos, me parece, a 33ª ou 34ª. É só olhar aí para Cubatão, que tem duas vezes e meia o ICM de Santos.

Então, esses dois aspectos se juntaram, um de caráter político, porque realmente há uma frustração, devido à menor participação da coletividade e nós ainda tivemos infelicidades, através de indicações, até por acaso, na interventoria. Poderíamos ter creditado ao Governo Federal, com ela, uma série de vantagens, mas, ao contrário, só tivemos aspectos negativos. Todo processo que não é de participação comunitária, através de eleição, tira autoridade daquele que exerce o poder. Tudo isso se juntou para que Santos tivesse ao longo desses anos uma fase bastante negativa. (...) Acredito que a volta da autonomia supera os outros aspectos.

O outro, é a luta que vamos ter, dentro do modelo político nosso, na reformulação do ICM, mas não acredito que o melhor caminho seja o seu aumento, porque há atividades que não comportam isso. (...).

Aquele que é eleito tem contas a prestar diariamente. Então, há um esforço muito maior; a própria equipe de trabalho é retirada dos quadros de participação; são aqueles que vivem o problema juntos. É um aspecto humano que ninguém pode... pode até um prefeito eleito ser um mau prefeito, mas essa não é a regra. A regra é que o prefeito eleito é muito melhor que o indicado, não há dúvida alguma.

O segundo aspecto, de caráter econômico, isso depende de modificações do nosso modelo, que não está em nossas mãos, mas dentro do debate nacional, que deve resultar em alguma coisa".

 

"A Baixada, Santos, seria uma opção,
mas não temos meios de garantir uma boa condição para o morador local, 
e muito menos para os que vêm de fora"

 

Reginaldo E. Souza - "Um aspecto que poderia ser evidenciado, no campo político, parte de alguém que viesse a justificar o sistema de nomeação. Uma vantagem que o processo representaria, mas sentimos que nunca ocorreu, era um bom relacionamento em termos de atrair para o município uma série de favores, melhoramentos e/ou ajudas, devido à ligação direta com quem o indicou. Sentimos aqui em Santos que isso não funcionou, e o dr. Sílvio mesmo mencionou que foi até certo ponto negativa. Sob este ângulo (político) que seria eventualmente a única forma de obterem-se resultados positivos, mas que não vieram, conclui-se que não há condição.

Acho que para a viabilidade, esse aspecto é fundamental, pois estamos anestesiando a nossa população, principalmente numa cidade onde há um índice alto de jovens, cria-se um desestímulo. Nós que lidamos com alunos na faculdade, sentimos essa alienação, pois eles não estão vendo como participar, não se interessam pelos problemas da Cidade, da comunidade. 'Que adianta eu discutir o problema, se não tenho condição de opinar', eles dizem. Então esse é um problema fundamental.

Além do problema da autonomia, temos que lutar por outro, também importante. É a capacidade da Cidade de dispor de mecanismos para atender a seus problemas, que às vezes não são exclusivamente nossos. Temos um caso aqui específico. No momento em que o Governo aumenta violentamente o custo do combustível, ele está colocando em xeque a população de São Paulo, que fica a cada dia mais distante de qualquer opção de lazer. Quanto mais caro o combustível, mais difícil para o paulistano - que luta a semana inteira com problemas de táxi, de trânsito - sair de S. Paulo e descansar.

A Baixada, Santos, seria uma opção, mas não temos meios de garantir uma boa condição para o morador de Santos e muito menos para os que vêm de fora. Assim, fica-se frustrado de ver no final de semana um milhão de pessoas, 150 mil veículos, que não têm o que fazer em Santos. O sujeito fica aqui, perdido, jogado; se chover o coitado não tem o que fazer, fica andando de lá para cá; agora tem o Shopping no Gonzaga para o coitado se distrair... É altamente frustrante para nós santistas ver que a Cidade não está preparada para atender a esse objetivo.

Vejo dois aspectos. Primeiro, criar condições para que a Cidade possa escolher um elemento da terra, que vive o problema, que se cerque de pessoas que têm o mesmo objetivo. O segundo, de criarem-se meios de o Estado, o município, reivindicar o que é direito dele. Esse negócio de ficar na mão do Governo Federal para que a gente vá de chapéu na mão, está superado. Temos o direito de exigir o que é nosso".

 

"No momento em que houver, democraticamente, a escolha do líder, prefeito, este vai ter uma voz, representatividade, um respaldo reivindicatório a nível estadual e federal, muito maior do que alguém que depende de uma nomeação..."

 

Bento de Pinho - "Segundo consta, herdamos o municipalismo de Portugal e a federação veio com a República; são duas instituições que estão destruídas no Brasil, hoje. O municipalismo é conversa fiada, e a Federação, apesar de o Brasil chamar-se República Federativa do Brasil, é uma ficção jurídica. Inclusive como advogado, apesar de que sou professor de Economia, queria ressaltar esse aspecto. Nossa preocupação com a democracia no Brasil tem sido mais jurídica e formal, do que uma preocupação essencial ou estrutural. E nosso problema não é de forma, mas de essência.

(...) O problema de Santos é de ordem tributária e sobre o qual não tem nenhuma ingerência; o município recebe a solução pronta e, em função da estrutura existente, em nada pode influir. O problema de Santos está no contexto dos grandes problemas nacionais, de democracia, participação e opção. Vejam bem. Para esta discussão V. convidou, entre outras pessoas, dois políticos que se impuseram pelo voto popular; que atingiram dimensões extramunicipais em função do voto popular. Nenhum dos dois construiu sua carreira política a partir de uma nomeação. Então, a própria autenticidade dessa liderança emana do voto, da participação e do debate. Então, além do aspecto econômico, Santos tem o político. Democracia é voto, debate, é o contraditório, respeitando o quem ganhar leva, ou seja, o princípio da alternância no poder. Resolvido esse problema, aí sim, podemos pensar em viabilidade econômico-política da Cidade...

No momento em que houver, democraticamente, a escolha do líder, prefeito, este vai ter uma voz, representatividade, um respaldo reivindicatório a nível estadual e federal, muito maior do que alguém que depende de uma nomeação, que como tal pode ser revogada a qualquer momento".

Mário Covas Jr. - "É evidente que não se pode debitar todos os problemas que a Cidade enfrenta à ausência de autonomia política, mas um fato é inconteste. O único argumento aqui lembrado em favor da perda da autonomia, que seria a de um nomeado manter relações de vínculo com seu nomeante, ficou inteiramente irrelevante, na medida em que se observam os fatos presentes. Entre nomeante e nomeado não há vínculo de coordenação, mas de subordinação. É um problema de lealdade. Autonomia não implica apenas na existência de eleição; implica na aceitação de todo um conjunto de idéias e circunstâncias que o processo político-democrático traz. A democracia é um mecanismo que parte do reconhecimento de que uma sociedade vive de grandes dissídios e de grandes conflitos e que o processo único, válido e pacífico de conduzir esses dissídios é a negociação.

Esse mecanismo traz algumas implicações; a primeira delas é o respeito à vontade das maiorias. A devolução da autonomia não significa apenas a eleição direta de um prefeito. Significa a fixação de determinadas lealdades fundamentalmente voltadas para a coletividade que o elegeu e não para os eventuais nomeantes. Implica na capacidade da sociedade se auto-organizar e se auto-mobilizar em todos os seus níveis. Lembro que Santos foi uma das primeiras cidades onde as chamadas sociedades de melhoramentos de bairros proliferaram, como instrumento de afirmação de natureza popular, como expressão dos anseios e vontades dessas comunidades...

Até onde isso implica?

(...) A autonomia política que se há de reivindicar para Santos é uma autonomia que implique em todos os seus níveis de organização, ela nasce pela vida sindical, pela vida do bairro, pela vida de todas as suas comunidades, e deriva, finalmente, para a escolha pelas grandes maiorias, daqueles que devam ser a sua representação.

O Sílvio citava aqui o fato de a EBTU chegar em S. Paulo hoje, em face dessa anomalia federativa em que vivemos, com uma bagagem através da qual ela tinha condição de vincular o Estado a uma possibilidade maior do Governo Federal. Inversamente, tenho informações de que o Banespa em seu último balanço apresentou grande parte de seu lucro como derivado do setor que faz atendimento aos municípios, seja ele que tipo for.

Autonomia é um problema de saber quem comanda o quê e quem delega o quê. Mas a ela não podem ser debitados todos os problemas que geram a presente crise de natureza econômico-financeira de Santos, mas sem dúvida, ela é um dos parâmetros e uma das componentes que se traduzem hoje nessa resultante altamente negativa".

 

"...por mais que se queira dissociar o agravamento da 
situação econômica em Santos, houve absoluta coincidência 
com a inexistência de sua vida política autônoma..."

 

Você usou um termo mobilização - que equaciona bem a questão. Então, pergunto: a classe empresarial de Santos ressente-se da falta de lideranças, capazes de garantir à Cidade meios para desenvolver-se?

Reginaldo E. Souza - "...eu pensava justamente na falta de diálogo entre empresários e Governo. tenho participado ativamente de contatos com órgãos do Governo e observo que o mesmo se ressente da falta de informações sobre a Cidade. Sempre procuro dizer que isso se dá pela falta de participação do empresariado. Este não tem a informação para orientar a sua atuação. Nós temos condições, dispomos de elementos altamente capacitados para apoiar qualquer tipo de iniciativa que venha em favor desse desenvolvimento. Temos exemplo de que Santos tem-se destacado, inclusive atualmente, com a presença de representantes da Cidade em órgãos de importância do Estado - o dr. Sílvio, Mário Covas. Isso demonstra que a Cidade tem elementos que talvez não tenham tido chance para atuar mais decididamente, por falta de convite ou de oportunidade que o Governo deveria dar".

Sílvio F. Lopes - "Não creio que se possa forjar lideranças: estas devem surgir espontânea e naturalmente. É inegável que a supressão da autonomia da Cidade restringiu - apesar de não ter eliminado - a atividade política de um modo global e não setorizado. Isto ocorreu, igualmente, com maior ou menor intensidade, nos demais municípios brasileiros que tiveram sua autonomia política reduzida ou cortada.

Ao mesmo tempo, sabemos que se de um lado o empresário é hoje força ativa do movimento político nacional, de outro, reconhecemos que a classe empresarial santista está ligada, primordialmente, aos setores econômicos da prestação de serviços e à de meios de distribuição. É inegável que estes setores têm menor peso, no quadro econômico, do que a área dos meios de produção. Política é prática, é exercício, aprimoramento. Durante alguns anos, a atividade política foi relegada a segundo plano no quadro nacional. (...) Parece claro que à medida que o aprimoramento político se acentuar, igualmente o empresário, o trabalhador, o estudante, aprimorarão suas conceituações. Por isso, creio que não há falta de lideranças. Há, isso sim, necessidade de adaptação ao novo clima político, sem o que todos correrão o risco de ficar à margem do novo processo brasileiro".

Mário Covas Jr. - "O problema não se ressente de características de natureza subjetiva, mas de natureza objetiva. Evidentemente você agravará o problema na medida em que o meio-ambiente ou as condições de natureza política ou econômica sejam melhores ou piores. Insisto em que não se trata de deficiências a nível empresarial ou de qualquer outra classe. (...)

É muito comum, hoje, para quem transita em S. Paulo e nas grandes cidades do Interior, encontrar um grande número de filhos de Santos ocupando posições de liderança em empresas e outros setores de atividade, cuja educação, formação e complexo intelectual fez-se nesta Cidade. O que não lhes oferece ou o que falta localmente são muito mais condições objetivas que subjetivas. Evidentemente, isto não é um problema circunscrito à atividade política. Na medida em que não se pode dissociar o político do econômico, ainda mesmo a nível municipal, é evidente as condições políticas faltarem à Cidade, uma cidade que palpitou no passado, que viveu intensamente no passado. É importante notar que por mais que se queira dissociar o agravamento da situação econômica em Santos, houve absoluta coincidência com a inexistência de sua vida política autônoma...

 

"...o prestador de serviços. Ele não recebe com muito boa vontade o nosso visitante; não temos mentalidade turística. Esse o primeiro aspecto."

 

Já tivemos fases bem melhores...

... Esta cidade foi, no passado, uma cidade extremamente viva em todos os setores de atividade, por sua população trabalhadora, sua população estudantil, universitária, enfim, por todos os segmentos e a própria presença política da Cidade em todos os cenários demonstra com que vivacidade esta sociedade responde, quando estimulada devidamente.

Não há condições subjetivas a deplorar. Imaginar isso seria admitir que alguém, porque nasce nesta terra, cujas tradições nesse aspecto foram sempre pioneiras, tivesse desde logo algum tipo de conotação negativa. Condições subjetivas até sobram, tanto que nos damos ao luxo de emprestá-las a outros setores e municípios. O que nos faltam são condições objetivas, de natureza política, econômica e social, sempre entendendo que o econômico e o social estão intimamente ligados à liberdade de natureza política".


O porto impõe uma vocação de serviços 
com rentabilidade desproporcional à sua importância para o País

Indústria, turismo e mar
para mais renda e emprego

- Que setores da cidade poderiam desenvolver-se para aumentar a renda e o emprego dos santistas? Peço que Sílvio F. Lopes inicie o debate, colocando, como secretário de Estado, o que S. Paulo programa em investimentos para Santos e esta região.

Sílvio F. Lopes - "Eu diria que ainda sob o enfoque tributário, a primeira grande saída para Santos, como analisei na época, há quase uma imposição geográfica, para a instalação do distrito industrial, na área continental. Porque se a regra do jogo ainda hoje - a legislação tributária - prestigia as atividades dos setores primário e secundário, teríamos a saída pelo nosso distrito industrial, que por fatalidade geográfica chegará lá.

O nosso objetivo foi apenas o de acelerar o processo; lamentavelmente a nossa saída foi frustrada. Quando as condições econômicas do País entraram no seu plano inclinado, se pretendeu levantar e não havia mais condições, mas que vai chegar lá vai e sob o enfoque atual, da nossa tributação. E isso servirá de campo para recursos fiscais, de mercado, de mão-de-obra e aceleração de nosso progresso.

Mas admitindo as condições locais, de prestação de serviço, indiscutivelmente, somente através do turismo (a ampliação do porto é um dos enfoques; é claro que isso aumenta o mercado; somos um grande porto e tão logo nossa economia se estabilize, terá reflexos naturais na economia local). (...) Costumo dizer que temos a matéria-prima: o povo que desce; basta que faça sol. Até o aspecto do preço da gasolina, ainda que os postos não abasteçam no fim de semana, também nos favorece, porque passa a ser a grande área de lazer, dentro da região metropolitana, mais próxima.

Mas por uma série de razões, nós nunca nos preparamos, e quando falo em turismo não me refiro apenas em criar a estrutura turística, às obras de urbanização, que são fundamentais: falo em mentalidade turística. Aqui vai a nossa mea culpa. Na verdade, e eu quando me refiro a este problema não me refiro à grande massa que tem condições de sair da Cidade nos fins de semana, mas ao santista em geral, o prestador de serviços. Ele não recebe com muita boa vontade o nosso visitante; não temos uma mentalidade turística. Esse, o primeiro aspecto.

O segundo, e isso a legislação deve progredir, quando se fala em turismo na Espanha, em várias partes do mundo, esquece-se de que a legislação favorece esses países, àquilo que chamamos de cobrança direta do turismo. Em razão de sermos a grande área de lazer do Estado, só levamos uma vantagem: temos imensa área imobiliária, junto às praias, de pessoas não residentes e que pagam o Imposto Predial. O resto, praticamente tiramos quase nada do nosso turista.

E oferecemos também muito pouco, em razão de não termos recursos. De modo que esse aspecto, bem analisado, não é fácil chegar lá. Evidentemente, nós poderíamos chegar a criar, dentro desse setor, que não é o que dá mais recursos, uma melhora em termos de mercado de trabalho e até de recursos para o Município.

Quanto ao Governo do Estado de São Paulo, acho que há grande contribuição que vem sendo dada à nossa região (V. não pode pensar em condições turísticas sem uma infra-estrutura, sem saneamento básico). Nós estávamos defasados nesse setor; o Governo atual tem feito sua obrigação e outros continuarão a cumprir para que Santos tenha infra-estrutura de saneamento básico que atenda às suas necessidades. Esse projeto não atende só a população física da Cidade e da região, mas prevê o aspecto das grandes populações flutuantes que aqui aportam, basta fazer sol. Por isso é que digo que a matéria-prima nós temos, gente. Nós temos que inventar um jeito de tomar dinheiro, usando uma expressão chã, mas real, positiva. E cobrar realmente o que vale, porque na verdade isso se observa em todo o mundo onde o turismo é um fator importante da economia, tudo é pago e diretamente. (...)"

 

"Temos imensa área imobiliária, junto às praias, de pessoas não-residentes e que pagam o Imposto Predial. 
O resto, praticamente tiramos quase nada do nosso turista."

 

Há prazos fixados?

"Essa grande infra-estrutura está em andamento. Todo mundo reconhece que depois de aproximadamente dez anos, os primeiros índices de balneabilidade de nossas praias estão acusando em algumas oportunidades resultados favoráveis. Isso é um processo demorado, cerca de 3 anos, porque o problema de balneabilidade não está apenas ligado ao do esgoto de Santos, mas também às áreas próximas daqui. Inicia-se agora a parte do tratamento dos esgotos de Vicente de Carvalho, Guarujá, de Cubatão, e a integração da Companhia Docas na rede da Cidade, que eram fatores de poluição das praias, restando apenas o problema dos efluentes industriais de Cubatão, ainda em concentração não acima das taxas aceitáveis e que estão sendo suportados pelo que nós chamamos de cunha salina, a água salgada, mas na verdade é um problema que deve ser estudado.

Não é apenas uma questão de saúde. É que a grande atração de Santos e da região são as praias; se elas não tiverem condições bastante favoráveis, nós estaremos eliminando grande parte daqueles que gostam de vir para cá. As inversões para o próximo ano são da ordem de Cr$ 1 bilhão e a programação deste Governo é da ordem de Cr$ 3,5 bilhões em valores correntes, reajustáveis, porque os empréstimos também são reajustáveis. Esta é a grande obra.

A outra será melhorar as condições das vias de acesso, agora com a duplicação da Piaçagüera-Guarujá, a construção da ponte Santos-Guarujá, que é claro, não tem apenas o enfoque do turismo, ainda que este seja um grande agravamento da área; mas ela vai reverter também como meio de transporte para a população que trabalha e vive em Vicente de Carvalho. Temos o problema do chamado entreposto de carga, que vai evitar a entrada em grande escala, na Cidade, de caminhões pesados. São obras programadas e que deverão ser executadas a partir do próximo ano. São obras de maior porte, inclusive a ponte Santos-Guarujá implicará em obras viárias dentro da Cidade. Temos a questão da água, por exemplo, que é fundamental, estamos a níveis bastante razoáveis para a Cidade de Santos, mas vai ser construído um túnel-reservatório que é o maior do Brasil. Assim, sob aspectos gerais, essa é a programação do Estado para a região".

 

"...os primeiros índices de balneabilidade de nossas praias estão acusando, em algumas oportunidades, resultados favoráveis."

 

Bento de Pinho - "Uma das fórmulas para elevar a renda e o emprego seria mesmo o distrito industrial, que não obteve os resultados propostos por uma série de razões. Há também dificuldades na medida em que o poder municipal não encontra, à parte de outras considerações, condições de oferecer um determinado tipo de incentivo, além da isenção do Imposto Predial, a fim de carrear investimentos para essa área industrial..."

 

"Uma das fórmulas para elevar a renda e o emprego 
seria mesmo o distrito industrial, 
que não obteve os resultados propostos por uma série de razões"

 

Bento de Pinho - "Outro aspecto, pois se falou em turismo, acho que a nossa vocação é para o mar. Está aí o porto, que não rende para o município aquilo que deveria; o porto gera despesas, porque a prefeitura tem que calçar ruas, investir para que a malha viária atenda à demanda de transportes, mas o município não é ressarcido por esse desinvestimento. O mar é o que atrai o nosso turista; é o que traz os navios. À parte de outras opções, poderia ser o grande centro gerador de recursos para aumentar a renda e o emprego em Santos (...).

Nós, para isso, dependemos de outras decisões a nível federal. Acho que um dos pontos que ficou mais claro, para onde convergiu a unanimidade de opiniões, é o problema das decisões a nível federal. Que pontos poderemos explorar e que dependem de decisões a esse nível? Por exemplo, pesca. Outro, construção naval, que se tem falado. Nós já temos aqui uma infra-estrutura pequena de estaleiros, que se dedicam à pequena construção, porque não existe um mercado. E por quê? Porque a navegação de cabotagem no Brasil foi praticamente liquidada. Esse é um paradoxo. No momento em que essa navegação ressuscitasse, Santos teria aí um potencial imenso a ser explorado.

Volto à pesca. É uma atividade desenvolvida com sofisticações extremas e em grande parte dos países do mundo, que têm a sua receita proveniente da pesca em percentuais significativos. Não obstante, somos uma cidade marítima, dentro da água, que poderíamos viver da pesca, temos aí uma pesca que chamaria de quase artesanal. Não a temos explorado como poderia, com abertura de maiores oportunidades para a Cidade. Caímos no lugar comum. Dependemos não apenas do oferecimento dessas oportunidades, mas de uma atitude reivindicatória, na medida em que a abertura da oportunidade está concentrada em mãos federais...".

Reginaldo E. Souza - "Acho que, fundamentalmente, Santos tem que partir para esses campos. Mas se verifica que os dirigentes que vêm de fora não têm condições de assimilar a Cidade. Então se percebe que eles ficam transportando de suas viagens ao exterior uma série de projetos inviáveis para nossa condição. Por isso, no momento em que conseguirmos eleger um elemento da Cidade, tudo vem automaticamente. É questão de se criar uma mentalidade local, coisa que não temos há 15 anos".

 

"Santos não é apenas espoliada na sua receita; 
ela vê sua despesa agravada em função de certas circunstâncias, 
por ser um grande entreposto"

 

Mário Covas Jr. - "Santos não é apenas espoliada na sua receita, ela vê sua despesa agravada em função de certas circunstâncias, por ser um grande entreposto. (...) Os setores primários, a que Santos está ligada, em certa época ofereceram certa capacidade de industrializar a área, como o café tipo Santos. Industrializava-se aqui, em Santos - as misturas que se faziam aqui eram vendidas no exterior -, um produto agrícola ou até a banana., cujo comércio básico se fazia por Santos, e que oferecem hoje perspectivas senão apagadas, pelo menos pálidas, em relação ao que foram no passado.

Quanto ao setor secundário, há muito que se fazer nele, embora, evidentemente, as oportunidades sejam circunscritas a certos fatores. E finalmente, o setor terciário, aquilo colocado como a grande alternativa. Mas é preciso fundamentalmente devolver essa vivacidade. Os mecanismos econômicos têm uma componente de natureza participativa, que a nível de nação acabam por estabelecer diferença entre o que seja desenvolvimento e crescimento econômico.

O que ocorreu no País, por exemplo, foi um crescimento econômico que não se pode negar; entretanto, não significou desenvolvimento econômico, porque não conteve a componente da participação popular e, mais do que isso, é o rateio dos resultados do crescimento, exatamente em função dos setores menos favorecidos. Na medida em que se consiga devolver à Cidade a dinamicidade e a vivacidade da qual sempre foi portadora, não tenho dúvida de que ela reativará cada um desses setores e encontrará por suas próprias mãos os caminhos próprios.

As soluções não virão da elucubração de nenhum de nós. As soluções virão ou não virão, na medida em que a sociedade como um todo seja capaz de oferecer a ela as alternativas melhores para os seus próprios rumos".

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