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HISTÓRIAS E LENDAS DE SANTOS - CARNAVAL
Tempo de Carnaval (17)

Uma das agremiações carnavalescas mais antigas foi fundada em 1944
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Em 6 de maio de 1994, o jornal santista A Tribuna publicou esta matéria:
 

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X-9 comemora cinqüentenário

J. Muniz Jr. (*)
Colaborador

A Escola de Samba X-9 está comemorando 50 anos de existência. Meio século de profícuo labor. Um acontecimento memorável de transcendental importância para a Cidade, pois a escola pioneira vem lutando ao longo dos anos para manter acesa a chama do samba santista, bem como pelo engrandecimento de Santos no cenário carnavalesco do Brasil.

O admirável percurso cumprido pela X-9 é um fato auspicioso que muito honra a nossa Cidade e o Estado, uma vez que, no Rio de Janeiro, foram poucas as agremiações que se consagraram jubilosamente completando meio século a serviço do samba, sem nunca ter deixado de desfilar no Carnaval.

De fato, sua trajetória foi brilhante, notável mesmo, e, apesar dos obstáculos, prosseguiu firme, avante sempre, incessantemente, sem fraquejar diante das adversidades. Suas virtudes sempre foram a firmeza e a constância, tornando-se assim uma escola aguerrida, contando até com a proteção de um santo guerreiro.

 

"A radiante pioneira realizou seu sonho dourado na cadência do samba em plena passarela do asfalto"

 

Somando as emoções dos anos e decênios de sua fulgurante caminhada, verificamos que se trata realmente de um episódio memorável, uma vez que a vetusta X-9, que tanto elevou e glorificou o mundo do samba santista, concretizou no último tríduo momístico uma jornada gloriosa de cinqüenta carnavais consecutivos. Dessa forma, a radiante pioneira realizou seu sonho dourado na cadência do samba em plena passarela do asfalto, com toda magia, encanto e fascinação, unindo o passado ao presente no ensejo do seu jubileu de ouro.

Sua fulgurante jornada a serviço do samba e do Carnaval também teve uma marcante participação junto à comunidade do bairro, onde se encontra até hoje. Quem não ouviu falar no decantado Vulcão do Macuco, que assustou muita gente no século passado (N.E.: século XIX), fumegante, expelindo fagulhas ruras amareladas, acompanhado de ligeiro tremor? O fenômeno geológico ocorreu entre 1896 e 1897, nos terrenos alagadiços à beira-mar, no Macuco onde ficava a Rua Dona Ana Carvalhaes (depois Almirante Tambandaré), considerado um fato extraordinário para a época, uma vez que a sedução misteriosa do suposto vulcão deixou a população aterrorizada.

No entanto, estranhos rumores subterrâneos já prenunciavam a erupção de algo estranho e buliçoso. E uma corrente impetuosa, mística e sutil espalhou-se pelo espaço de forma misteriosa, cuja atmosfera enigmática carregada de magnetismo permaneceu no ar durante quase meio século, como se fosse um turbilhão maravilhoso, até proporcionar o surgimento do samba no famoso reduto.

Assim é que, em princípios de 1944, como que envolto pelas forças enigmáticas do lugar, um pequeno grupo de batuqueiros (Manezinho, Catarina, Acácio e outros) foi animar um baile pré-carnavalesco do Santos Dumont F.C., bem próximo de onde outrora ocorreu o fenômeno assustador. No Carnaval daquele ano o grupo desfilou pelas ruas do bairro e no dia 1º de maio transformou-se em escola de samba, conservando o fortuito cognome X-9, que havia ganho no clube anteriormente.

Uma vez envolvidos pela estranha fascinação, o primitivo grupo saiu pela primeira vez da Rua Almirante Tamandaré nº 9 e posteriormente, já escola, ficou provisoriamente no número 104 da mesma rua. Do ponto final do bonde da linha 5, na Vila Macuco, foi para junto do final da Linha 15, na Bacia do Macuco, reduto da pesada, onde predominavam os botequins, a malandragem e as batucadas.

 

"Naqueles áureos tempos, os batuqueiros não eram vistos com bons olhos"

 

Tendo surgido numa época romântica e aventureira (de guerra), cheia de preceitos e preconceitos, participou da chamada resistência do samba, uma vez que, naqueles áureos tempos, os batuqueiros não eram vistos com bons olhos e enquadrados como malandros e desordeiros. Em 1946 a pequena escola foi para o número 94 da Almirante Tamandaré, tendo sido até então adotada pelo casal Cabo Roque-Tia Inês, incorporando-se definitivamente naquela modesta e acolhedora casa através de um místico e maravilhoso ciclo, consagrando-se como um verdadeiro reduto de bambas, um relicário do samba.

Já vitoriosa em Santos, foi disputar concursos em São Paulo, a partir de 1948, tornando-se a primeira escola de samba do Interior a triunfar na capital bandeirante. Prosseguiu com toda a sua mística nos anos 50, destacando-se, inclusive, na capital paulista, iniciando ainda, em meados daquele decênio, um intercâmbio com o mundo do samba do Rio de Janeiro.

Pela sua constante atividade, a casa da legendária Tia Inês ganhou a pomposa denominação de Quartel General do Samba Praiano Bandeirante, onde, no despontar dos anos 60, deu início ao movimento de se fazer samba o ano inteiro, inclusive comemorar condignamente o I Dia Nacional do Samba (2 de dezembro de 1963).

Dois fatos marcantes ocorreram ainda na década de 60: o batismo do seu pavilhão, que foi sacramentado pela tradicional Estação Primeira da Mangueira, sua escola-madrinha, e quando teve a primazia de desfilar como convidada de honra no Carnaval em Maio no Meier, consagrando-se então (1968) na capital do samba.

 

"Prosseguiu com toda a sua mística nos anos 50, destacando-se, inclusive, na capital paulista"

 

Durante mais de um quarto de século, a velha Xisnove permanece na Rua Almirante Tamandaré, mostrando todo o encanto mágico do samba. Todavia, teve que deixar aquele tradicional reduto em fins de 1972, instalando-se em janeiro do ano seguinte na Avenida Siqueira Campos, 97, onde foi inaugurada a Quadra Tia Inês. E ali, sempre envolvida pela sua magia e encantamento, veio a florescer a fase áurea de sua trajetória inabalável.

E assim, ao atingir o seu cinqüentenário - uma das glórias almejadas por todas as agremiações -, a pioneira continua orgulhosamente bem perto do seu lugar de origem, na decantada Bacia do Macuco, reduto batuqueiro por excelência, na área do consagrado Macuco, o Bairro Encantado do Samba. Que este acontecimento magno do mundo do samba perdure por muito tempo na memória de todos. Que fique gravado com letras de ouro nos anais de nossa história para comprovar que samba é magia, é folclore, é arte, é cultura, é civismo, é turismo e que, acima de tudo, é povo.

(*) J. Muniz Jr. é jornalista-pesquisador e estudioso das manifestações afro-brasileiras.