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Publicado em 5 de outubro de 1992 no jornal santista A Tribuna
Última modificação em (mês/dia/ano/horário): 03/29/03 19:32:48
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HISTÓRIAS E LENDAS DE SANTOS - CIDADE FESTIVA
Os bailes de Santos (2) - Ritmos

Bandeira Jr. (*)
Colaborador

Quais seriam as danças na Sociedade Harmonia?

A preferência recairia sobre a Quadrilha, grande sucesso na Europa, nessa época. As primeiras valsas de Johann Strauss (1825/1899) foram êxito e escândalo na Corte de Viena; havia a permissividade dos pares dançarem abraçados! O Kaiser germânico jamais permitiu tal liberdade em seu país, e a Inglaterra, com resquícios de moral vitoriana, somente aceitou a valsa a partir de 1912...

A Polka, vinda da Polônia, por ser mais desenvolta, só foi popular nos meios boêmios: era considerada dança de peignoir.

Da miscigenação da polca eslava com o mulato lundu nasceu o brasileiríssimo Maxixe, outra dança proscrita, fora das revistas teatrais, mas que fez furor na Capital do Mundo (Paris), levado pelo bailarino baiano Duque (Antônio de Amorim Diniz) e sua partner, a portuguesa Lina.

Retornando da Europa deflagrada, Duque, com a francesa Gabi, trouxe na bagagem a novidade do tango argentino - não havia ainda a política da boa vizinhança - que empolgou a sociedade carioca, e logo chegaria à terra de Braz Cubas. Vemos, então, o Derby Clube (sediado no Parque Balneário Hotel) promover sorvete-tango no verão e chá-tango no inverno. O negócio era tangar, o que acontecia até nos bailes de carnaval, concorrendo com o samba e a marcha carnavalesca.

Passada a Primeira Grande Guerra, a grande novidade nos salões veio da América do Norte: o Charleston (nome de capital ianque de onde procedeu), e com ele a moda do cabelo à la garçonne para as filhas de Eva; as melindrosas vestiam mini-saia, busto achatado, blusas folgadas e tinham lábios bem pintados, enquanto os almofadinhas usavam paletó curtinho e calça boca-de-sino. A moda do cabelo cortado das mulheres foi violenta e até trágica, antes de ser aceita.


O imortal Carlos Gardel ao lado do amigo e parceiro Le Pera

Já na década de 30, o hit veio de Cuba: a Rumba, lançada pela dupla George Raft-Carole Lombard, no filme Rhumba, de Hollywood e suas co-irmãs, a Conga, o Mambo (de Perez Prado), o Merengue e o Chá-chá-chá. A Segunda Grande Guerra teve a violência aplacada, neste lado do mundo, pela música maviosa "del México"; o Bolero, na interpretação de grandes cantores: Pedro Vargas, Don Ortiz Tirado, Chucho Martinez, Bienvenido Granda, Elvira Rios, Margarite Lecuona etc.

Desse período é também o trepidante ritmo do Swing, logo seguido do Boogie-Woogie, Twist, Rock'n Roll (Rock Around The Clock) do seu principal intérprete, o rebolativo Elvis Presley...

Músicas que ganharam a preferência dos teen agers da famosa geração Coca-Cola, nas ensurdecedoras discotecas...

Compositores - Já dissemos que Santos e a Inglaterra jamais serviram de berço a um grande musicista; em compensação, as Ilhas Britânicas produziram o maior dramaturgo da Humanidade, William Shakespeare, e Santos, o maior dos brasileiros, José Bonifácio de Andrada e Silva, o Patriarca.

No século XIX, sabia-se de composições dos Trindade, bem como do grande pianista Dr. Eduardo Ferreira, mas tudo de êxito apenas local.

Neste século (N.E.: século XX), o maestro Giusepe Vetró deixou algumas composições no gênero ligeiro, como Ode a Santos, poema sinfônico para orquestra e coro; Canto Elegíaco, para orquestra; Suíte Brasileira, idem, Concerto para Violino e Orquestra; Impressões da Calábria, rapsódia para orquestra; Serenata Burlesca, Suíte Infantil e Dança de Tzigano, para quinteto de cordas; músicas sacras e pequenas peças para piano, canto, violino e violoncelo.

Há fortes indícios de que o amigo e parceiro de Carlos Gardel, o letrista Le Pera, seria santista de nascimento, fato que continuamos apurando, até termos prova irrefutável, para, assim, homenagear um dos maiores compositores brasileiros de todos os tempos.


O crítico José Ramos Tinhorão, em bico-de-pena do artista Lauro Ribeiro da Silva (Ribs)

Na sonorização momesca temos alguns nomes como Armando Rosas, cuja marcha Eu vou, Helena, do Carnaval de 1939, chegou a ser gravada pelo famoso Trio de Ouro (Dalva de Oliveira, Herivelto Martins e Nilo Chagas); porém, um incêndio destruiu a gravadora, impedindo a reprodução de cópias em acetato.

Mais sorte teve seu companheiro Gentil Castro, ambos da PRG5, cujo samba É o pau, com letra de malicioso duplo sentido, foi gravado em long-play e adotado pelo Bloco Bafo De Onça, do Rio de Janeiro, como número de empolgação.

Ainda no setor carnavalino, temos alguns bons compositores: os saudosos Tião (Dengosas), Jorge Duarte (Brasil), Alvinho (Agora Vai) e Nahum (X-9). E os amadores Sibira (Babies); Nivaldo e Nílton Banana (Taba); Pinguim (Urubuquessamba); Buru (Banda Mole); Miguel Santana (Frei Gaspar) e Formigão (Banda-lheira).

Nas alas de compositores de nossas escolas de samba há bons sambistas como Ode (X-9) e Bicalho, que ascendeu à Império Serrano, do Rio de Janeiro.

Fora do Reinado de Momo, a taça fica com o radialista Caruso que, em 1960, gravou, na voz da santista Leila Silva, o choro-canção Não Sabemos, sucesso nacional. Alguns meses depois, Caruso foi receber seus direitos autorais e a respectiva sociedade só lhe prestou conta de 160 discos vendidos - quando, só na Baixada, as estatísticas mostram a venda de 60 mil cópias!

Ainda bem que é "direito!"... Já imaginaram se fosse "torto?"...

Mário Soares, organista, cantor dos bons (apelidado Roberto Carlos em negativo), é co-autor da canção Pense em mim, êxito internacional da dupla caipira Leandro e Leonardo; caipiras mesmo - até o ano passado (N.E.: 1991), esses dois irmãos plantavam tomates numa fazenda de Goiás.

Se Santos não tem grandes compositores, está compensada por ter sido o berço de José Ramos Tinhorão, autor de umas dezenas de obras sobre a MPB e, reconhecidamente, o seu maior crítico. Tinhorão, o autor de O Samba Agora Vai..., nasceu na Rua General Câmara, próximo ao Largo Dona Thereza Cristina.

Falando em Armando Rosas, permitam, meus pios leitores, pequena digressão relativa ao antigo diretor da Rádio Atlântica de Santos, então com o prefixo de PRG5.

Todas as noites, ao microfone dessa emissora, Armando Rosas apresentava a Piada Sin.. Crônica, crítica humorística aos fatos de evidência do dia santista.

Certa feita, a nossa Portuguesa perdeu jogo importante, em pleno Ulrico Mursa. Com a música da marcha Rasguei a minha Fantasia, a Piada Sin... Crônica gozou a derrota da Mais Briosa, com esta estrofe:

Rasguei a minha caderneta
Da Portuguesa, não sou mais sócio, meu bem
Rasguei a minha caderneta
Nem faço parte da banda também!

Quando o movie star (N.E.: astro de cinema) Clark Gable passou por Santos, num liner (N.E.: transatlântico de linha regular) do qual nem desceu, Armando Rosas, com a marcha junina Acende a Fogueira, sapecou esta gozação:

Um vapor lá no porto
Muita gente subindo
Muita moça gritando
E o Clark Gable sumindo
Clark Gable, ai love iú
Me leva contigo lá pra Roliú...

Esse programa radiofônico pode não ter sido o melhor, mas, com toda certeza, foi o mais gozado!

(*) Bandeira Jr. é historiador e escritor em Santos. Este artigo foi publicado em duas partes, nas edições de 28 de setembro e 5 de outubro de 1992, no jornal santista A Tribuna. As imagens são reproduções do arquivo do autor.

Veja a parte [1] desta série