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HISTÓRIAS E LENDAS DE SANTOS - PROCISSÕES - 17
Procissão de Nossa Senhora da Boa Morte

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A Confraria de Nossa Senhora da Boa Morte completou em 1993 seu bicentenário, e alguns detalhes da organização dessa festa são contados por um dos organizadores, o professor e pesquisador de História Francisco Carballa, em artigo enviado a Novo Milênio em 12 de maio de 2013:


Francisco Carballa, tocando os sinos da igreja em 1993
Foto: acervo de Francisco Carballa

 

Procissão de Nossa Senhora da Boa Morte

Terceiro domingo de agosto

A Irmandade de Nossa Senhora da Boa Morte teve sua origem com os escravos, havendo quem desse a informação que a mesma devoção era do tempo dos jesuítas e achou abrigo na Ordem do Carmo. Fora qualquer conversa, em 1993 a confraria completaria 200 anos de oficialização - como tantas outras irmandades que são mais antigas, apenas não possuíam um registro civil, motivo pelo qual têm datas mais recentes, ligadas à sua fundação oficial, embora a verdadeira fundação seja anterior.

Era o provedor o senhor Manuel Ramos e diretor espiritual o frei Rafael,  e eu fiquei incumbido da parte paralitúrgica da festa. junto com o irmão terceiro carmelita Waldemar Tavares Junior, responsável pela liturgia, ainda tendo nós dois que montar uma exposição, aos moldes da relativa aos 400 anos da presença carmelita em Santos comemorados em 1989, e que como aquela ficou aberta três dias para visitação.

Para resolver de início a falta de um andor adequado para a Virgem, pedi emprestado o da Igreja de São Jorge, que me cedeu o do padroeiro. Por falta de recursos, vim andando com o mesmo nas costas do bairro do Estuário até o Convento do Carmo, onde retirei a imagem que fica no oratório interno do consistório da confraria e a prendi no andor.

 

Nas festas sempre tem as histórias de bastidores eu fui protagonista de muitas. Entre elas, a de que, ao som da famosa frase: "Ficou pra vestir Santo!", me deram a responsabilidade de trocar as roupas da imagem da Virgem da Assunção. Levei a imagem para o consistório da Confraria, e de lá saí com o rosto corado de vergonha. Frei Rafael me perguntou o que havia ocorrido para eu estar daquele jeito, e lhe respondi que a imagem da Virgem tinha seios rosados e entalhados e eu os vira; o bom frade, sorridente, disse que era assim mesmo nas imagens antigas, mas que a coloração rosada fora dada pelo restaurador Marcos Lamouche nos anos 80, pois gostava de muito realismo nas obras sacras; antigamente decerto as imagens não eram assim. Finalmente troquei as roupas e devolvi a Virgem ao seu nicho no altar.

Para retirar a imagem do seu altar, fui instruído por uma irmã mais velha, que me ensinou a puxar o nicho para frente e, por duas argolas de ferro que existem na parte escondida, puxei a vidraça para cima, pois é ela que protege a imagem da curiosidade do povo e da poeira. Nessa festa aproveitei para trocar as flores de seda, sendo ainda as que lá estão neste ano.

No dia que antecedeu a festa - ou seja, dia 17 de agosto, às 18 horas -, a imagem do corpo da Virgem em seu esquife foi solenemente transportada pelos irmãos para o presbitério da igreja; entre eles eu. O esquife secular estava sem o baldaquino, apenas coberto por um tule branco, e a imagem da senhora morta adornada com anéis e joias. Tudo ao som do Magnificat, entoado em latim por dona Elza, organista antiga e mor do convento. Assim foi a celebração do passamento de Nossa Senhora, para comemorarmos no dia seguinte sua assunção ao céu.

Recordo o que explicou nesse dia frei Rafael (falecido em 1998), que assunção é quando a pessoa é arrebatada e ascensão quando a pessoa sobe por sua própria divindade, sendo que só Jesus subiu assim aos céus. Logo após a missa, foi oferecido um coquetel e aberta a exposição de fotos e objetos antigos, entre eles as duas coroas de Nossa Senhora feitas em prata e vindas de Portugal (uma no século XVII e outra no século XVIII), e a cruz de prata maciça onde foi gravado "Confraria de Nossa Senhora da Boa Morte".

No dia seguinte, a imagem da Virgem ressuscitada por seu Filho e pelos anjos, subindo aos céus, estava em seu andor enfeitado com flores muito coloridas. Começou a Santa Missa e eu era o sineiro do Carmo, tocando os sinos com alegria, embora com medo dos urubus que fizeram ninho na torre.

Depois de ser incensada a imagem, chegou a hora da procissão. Subi para a torre e lá ocorreu um pequeno incidente: um filhote de urubu, fazendo um barulho estranho (que pensei ser um som de ameaça), vomitou em mim, sujando minha opa, mas toquei os sinos em tom festivo como de costume, e ainda sobrou tempo para lavar a opa e carregar a imagem da Virgem por um pequeno trajeto.

A procissão foi bem aos moldes do que pede Roma, a cruz nos guiando (pois Jesus veio antes de todos), ladeada por duas lanternas, em seguida a confraria em fila, o clero, os anjinhos da Santa Casa trazidos pela irmãzinha Zefa e o andor da Senhora da Glória.

 

A banda Carlos Gomes tocou os hinos, pela ordem: Queremos Deus, Treze de Maio, Levantai-vos Soldados de Cristo, Com minha mãe estarei, Eu confio em Nosso Senhor, Ave da Azinheira e a tradicional Marcha Militar para que a procissão adentrasse o templo cristão.

 

O percurso foi pela Rua Visconde do Rio Branco, até a Rua Braz Cubas, de onde fez o retorno pela mesma rua até a Praça Barão do Rio Branco, alcançando finalmente o convento, onde, depois da bênção final, foi oferecido aos devotos, no consistório, um lanche com o bolo e suas velas representando o número 200. Infelizmente, devido ao horário, a irmã Zefinha, da Santa Casa, teve que retornar com as crianças (que estavam de olho no bolo), antes dele ser partido e distribuído.

Bom, o andor foi devolvido, transportado da mesma forma como veio.

 

A procissão, em 18 de agosto de 1993
Fotos: acervo de Francisco Carballa

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