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HISTÓRIAS E LENDAS DE SANTOS - BAIRROS DE SANTOS - SÉCULO XXI - [10]
Caruara

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Publicado em 15/2/2010 no jornal A Tribuna de Santos, página A-3


BAIRRO ESBANJA NATUREZA MAS SOFRE SEM INFRA-ESTRUTURA - Morar no Caruara, na Área Continental de Santos, é ao mesmo tempo desfrutar do contato com a Mata Atlântica e sofrer com a falta de infra-estrutura. Bairro tem cerca de 4 mil moradores, que podem mudar de vida caso a Sabesp cumpra a promessa de instalar 12 mil metros de rede coletora de esgoto

Imagem: reprodução parcial da primeira página de A Tribuna de 15/2/2010

CARUARA

Natureza e carências lado a lado

Bairro na Área Continental mistura cenário tranqüilo com falta de esgoto e de títulos de propriedade

Flávio Leal

Da Redação

Uma fazenda que virou chácaras, depois fatiadas em lotes e que formaram um bairro onde sobra tranqüilidade e falta quase tudo em infra-estrutura.

O Caruara é santista, mas a sua localização o fez metropolitano à força, ao reunir gente que veio de Bertioga e Guarujá, municípios vizinhos separados pelo Rio Itapanhaú, no caso do primeiro, e pelo Canal de Bertioga, no segundo.

Juntos, estes moradores da Área Continental, que não passavam de uma centena há menos de 40 anos e agora são cerca de 3 a 4 mil, dividiram um pedaço de terra que foi território das bananas por décadas e cuja história secular, se existe, é desconhecida. Tudo ainda está em projeto no Caruara, o que já é um avanço comparado há 25 anos, época em que nem havia energia elétrica por ali.

O tempo trouxe melhorias, mas ainda faltam esgoto, melhores acessos e título de propriedade, principalmente. Este último detalhe empurraria tudo para o fundo das gavetas da burocracia, porque o Caruara, originalmente, fica no Parque Estadual da Serra do Mar, de preservação ambiental.

"Carecemos de infra-estrutura aqui, nunca foi novidade, murmura o professor Wagner Mem de Sá, morador do Caruara há 16 anos, e que por oito presidiu a sociedade de melhoramentos do lugar.

A prioridade para o Caruara sair do atraso em que se encontra sob o manto da mais rica cidade do litoral paulista são as escrituras definitivas dos imóveis, na opinião de Mem de Sá.

"Toda a questão urbanística decorre da regularização", acredita o professor. "Por causa da questão ambiental, as melhorias se arrastam há 12 anos e todos os prazos que nos deram foram frustrados", constata.

O ex-líder comunitário escreveu uma monografia quando de formou em Geografia, em 2006, com o título: Diagnóstico de Identidade Territorial da População do Caruara.

Nas suas investigações, Mem de Sá encontrou uma população sem vínculo com o lugar, dividida entre pessoas vindas de Bertioga (20%), Guarujá (20%) e Santos (60%).

Sim, Santos é quase considerada outra cidade para os moradores da Santos Continental, que tem também os núcleos Caiubura e Iriri.

"É um processo lento a regularização", reconhece Cláudio Marques Trovão, chefe do departamento da Prefeitura na Área Continental.

Trovão recebe as mesmas queixas que seus antecessores. "Temos projeto para revigorar o Portinho e a Praça", diz, sobre dois locais do Caruara, um recanto de pescadores em que ficam biblioteca, posto de Saúde, Correios e Administração Municipal.


Às margens do Canal de Bertioga, Portinho é uma espécie de cartão postal do bairro, que reúne gente que veio de Bertioga e Guarujá

Foto: Fernanda Luz, publicada com a matéria

Lendas permeiam a área

A nomenclatura Caruara, entre os amazonenses, significa mal ou enfermidade causada por feitiço, quebranto ou mau-olhado. Em Alagoas, significa o vento que sopra trazendo chuvas e trovoadas. Índios sempre existiram por ali e até a década de 1960 há relatos que não eram poucos os que passavam pelas matas e mantinham algum tipo de comércio com os sitiantes próximos. Hoje, não são vistos.

Os mais velhos contavam que o local foi refúgio de piratas, antigos conventos que existiram e sumiam, entre outros relatos quase esquecidos, [que] foram contados à Reportagem de A Tribuna em 1983, quando uma série de matérias retratou os bairros de Santos.

Naquela época, a luz elétrica ainda não tinha chegado e a economia se resumia a cinco barzinhos. Naquele mesmo ano, foi comemorado o primeiro carnaval no lugar e uma marchinha marcou a festa: "Bate o bumbo/Na luz da lua clara/Carnaval é no Caruara"; a luz elétrica só chegou seis anos depois, em 1989.


MUITO POUCO - Luiz Antonio, morador do bairro há 16 anos - Luiz Antônio foi morar no Caruara com a família há 16 anos. Gostou do lugar, onde construiu um sobrado e deixou a vida de motorista de transporte escolar. Gosta de ficar na praça, no banco, nos fins de tarde. Mas não deixa de reclamar com o que tem acontecido com o bairro nos últimos anos. "Pagamos IPTU também e não temos nada. O serviço que nos oferecem é muito pouco"

Foto: Fernanda Luz, publicada com a matéria

Lugar tem cesta de promessas

Uma cesta de promessas do Governo do Estado e da Prefeitura promete mudar a vida dos que por necessidade, escolha ou pura casualidade se viram quase isolados na Mata Atlântica.

A Sabesp informa pela sua assessoria de imprensa que tem um projeto pronto para acabar com as valas de esgoto a céu aberto. Serão, segundo a concessionária, 550 ligações com 12 mil metros de rede coletora, cinco estações elevatórias. O método utilizado será não destrutivo, segundo a companhia. No momento, estão sendo feitos, ainda segundo a Sabesp, os relatórios ambientais para licenciamento da rede. Concluída esta fase, em prazo indefinido, será contratada a obra.

A Prefeitura, por sua vez, acena com um Plano de Regularização Sustentável, por meio da Secretaria de Planejamento, que será enviado ao Cidade Legal, de concessão de escrituras, do Governo do Estado, além de um levantamento social.

PORTINHO

Durante os últimos 30 anos, a economia no Caruara girou, invariavelmente, em torno da venda e parcelamento de terrenos e do Portinho. Às margens do Canal de Bertioga, o lugar só tem um acanhado quiosque e recebe, segundo os comerciantes próximos, cerca de 100 pescadores durante os finais de semana. Em outros tempos, recebia muito mais, segundo esses comerciantes

 

Pica-paus, goiabas e silêncio

Cenas típicas de uma cidade interiorana, daquelas bem pequenas, ainda são encontradas no Caruara, a despeito dos problemas do conflito entre o rural ameaçado e o urbano precário que o lugar exibe.

Dois garotos, com a ajuda de um bambu, derrubam goiabas, pessoas sentam nos bancos da praça só para o tempo passar silencioso, sem barulho de veículos motorizados por longo tempo, talvez meia hora.

O cachorro tem tempo para se coçar calmamente bem na rotatória principal, em meio à área de rodagem das bicicletas, principalmente, com seus pneus roçando a terra e a fina camada de lama asfáltica, isso mesmo, que reveste a Andrade Soares, a via principal.

O silêncio só é cortado na hora da entrada e saída das crianças da escola municipal, com a sua alegria e correria costumeiras. A moradora Beatriz de Menezes veio da Capital há 13 anos e teve os dois filhos, um de três anos e outro um ano e nove meses, em Santos. "Na época em que mudei, só tinha a minha casa na rua em que moro. Hoje, são nove", contabiliza Beatriz.

Chácaras de veraneio, por sinal, são a origem do bairro em 1953, a partir da fazenda de banana de Alonso Soares, divididas em 143 chácaras (uns 700 mil metros quadrados), cortadas posteriormente pela BR-101, a Rio-Santos e atualmente Manoel Hipólito do Rego (SP-55).

Teve de tudo no Caruara. Alambique, olaria e até ruínas, contavam os mais antigos, do que seriam construções dos jesuítas, que também estiveram naquelas terras.

Prevaleceu sempre, com a sua força, a natureza, que botou no local cachoeiras, Mata Atlântica e uma variedade de pássaros como tucanos e pica-paus. aros, mas que ainda estão por perto, segundo moradores, para quebrar o silêncio dos finais de tarde.


Garotos tentam pegar goiaba na árvore: cena tipicamente interiorana

Foto: Fernanda Luz, publicada com a matéria

Asfalto só depois do esgoto

O chefe do departamento que administra a Área Continental, Cláudio Marques Trovão, admite que as vias andam em estado ruim no Caruara.

"Reconhecemos as críticas, mas a comunidade tem que entender que não podemos asfaltar sem que seja feito todo o serviço de drenagem e rede coletora de esgoto", diz Trovão.

De acordo com ele, na avenida principal do bairro é lama asfáltica que foi colocada, um quinto do que seria a camada de asfalto. "Vamos refazê-la", garantiu.

A cobertura definitiva, com asfalto pelo menos, das vias principais do Caruara, somente depois que a Sabesp concluir o seu serviço, que precisa passar ainda pela burocracia do licenciamento ambiental, de prazos sempre não estabelecidos.

"Para ter o asfalto definitivo, é preciso ter toda micro-drenagem, que só pode sair junto com a coleta de esgoto", condiciona Trovão.

Todos os dias praticamente, ele ouve queixas como a do advogado Carlos Eduardo Salles, morador da Área Insular até 2004 e que se mudou para o Caruara para fugir da cidade grande. "Nos sentimos abandonados aqui. De positivo, só a tranqüilidade e a natureza".

"Só temos telefone via rádio. Mas falta luz e ficamos sem linha também", continua Salles. Ele acredita que a questão fundiária seja secundária.

Salles reclama também do serviço de Saúde oferecido na pracinha do bairro. "Se o médico entra, o paciente tem que sair", ironiza. As pessoas têm que esperar o atendimento do lado de fora", lembra.

Saúde - Segundo Trovão, um novo posto de Saúde, orçado em R$ 500 mil, com verbas da Agência Metropolitana (Agem) da Baixada Santista, deve ser construído ainda neste ano no Caruara.

Veja o bairro em 1983
Veja Bairros/Caruara

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