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HISTÓRIAS E LENDAS DE SANTOS - INSEGURANÇA
Fogo! A Baixada Santista corre perigo? (B-02)

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De 16 de dezembro de 1984 a 1º de janeiro de 1985, o jornal santista A Tribuna publicou uma série especial de reportagens, Roteiro da insegurança, sobre os riscos a que estavam expostos os habitantes da Baixada Santista.

Esta matéria foi publicada no dia 17/12/1984:
 
 

ROTEIRO DA INSEGURANÇA - 2


Foto: arquivo, publicada com a matéria

Isocianato, Butano, Amônia, Dicloretano, Silicone, Óleo Antacênico, Xileno, Hexano

(Aprenda a conviver com esses nomes em Cubatão; você ainda ouvirá falar deles)

Texto de Manuel Alves Fernandes e Lane Valiengo
Fotos: Arquivo

As indústrias de Cubatão manipulam uma infinidade de produtos químicos no processo de transformação que faz gerar matérias-primas que são o orgulho da comunidade. Afinal, dão emprego, movimentam enormes somas de capital e trazem dólares para o País, além de concederem à Prefeitura um invejável orçamento que, em 1985, será de Cr$ 150 bilhões.

Quem passa pelas vias Anchieta e Cubatão-Guarujá vê uma enormidade de tanques, instalações industriais, chaminés fumegantes e chamas que brilham na escuridão de tochas destinadas a queimar resíduos químicos.

A Cidade é recortada por tubos que atravessam estradas e núcleos densamente povoados. Pelas suas duas vias férreas passam vistosos tanques sobre rodas, pintados de branco, com o símbolo das indústrias neles pintados.

O que levam esses tanques, guardam esses reservatórios, produzem essas fábricas? Pouca gente sabe. Sexta-feira da semana passada, ao participar de uma reunião do Conselho Estadual de Meio-Ambiente, o engenheiro Antônio Carlos Satti, representante da Federação dos Trabalhadores na Agricultura, foi taxativo:

"É preciso acabar com essa história de segredo de fórmulas. Nós nem sabemos que veneno está diante do nosso nariz".

O que está guardado em Cubatão?

"Tudo de ruim, ou quase tudo, que você possa imaginar. Sem exagero ou sensacionalismo, os moradores de Cubatão deviam receber adicional de periculosidade e ter máscaras em casa, para colocá-las em situações de emergência. E essas situações de emergência já ocorreram pelo menos duas vezes, este ano. Podemos morrer com gases, numa explosão ou num incêndio".

A declaração é do presidente da Câmara Municipal de Cubatão, vereador Florivaldo de Oliveira Cajé.


Imagem: publicada com a matéria

Indústrias e oleodutos

I

Em Cubatão há 23 indústrias de grande porte. Porém, tecnicamente convencionou-se adotar como correta a informação de que há na Cidade 111 fábricas, uma vez que cada uma dessas indústrias possui em seus complexos unidades que produzem várias matérias-primas. Não existe, praticamente, uma indústria que produza apenas uma matéria-prima básica. É por causa disso que os moradores de Cubatão ouvem dizer que moram no maior pólo petroquímico da América Latina.

O parque industrial de Cubatão foi construído numa região imprópria para o controle ambiental, segundo admitem os próprios representantes das fábricas. O Vale do Rio Mogi, por exemplo, é cercado por montanhas que formam uma ferradura onde a dispersão de poluentes é difícil.

O parque nasceu a partir da instalação da Refinaria Presidente Bernardes, em 1955. O petróleo cru veio do Porto de Santos, por um oleoduto antigo, que subia a Serra mantido pela São Paulo Railway. E também, mais tarde, do Porto de São Sebastião, margeando o que é hoje a Estrada Cubatão-Guarujá.

Os dutos que vêm de Santos são muito antigos, estão apodrecidos segundo denúncia de líderes sindicais ligados ao Sindicato dos Petroleiros. Um dos tubos vazou em fevereiro, matando quase uma centena de pessoas, na Vila Socó.

O outro oleoduto atravessa o parque industrial e, em alguns pontos, passa sob o acostamento da Estrada Cubatão-Guarujá. No subsolo de Cubatão, outros dutos interligam indústrias e no sopé da Serra de Cubatão está o Terminal de Derivados de Petróleo do Estado de São Paulo - Tedep, cujos canos subindo a serra dão a impressão de uma serpente prateada e sobretudo perigosa.

Há poucos meses travou-se terrível polêmica porque alguém denunciou que esses dutos conduziam tanta gasolina e nafta como álcool, estando portanto corroídos. O superintendente dos terminais, Romilson Longo Bastos, acusou este jornal de má fé e tentou provar que isso era mentira.

Na confluência das vias Anchieta e Cubatão-Guarujá estão os tanques da Base de Provimento de Santos - Basan, também pertencentes ao Tedep.

O fato curioso de ser uma base de provimento de Santos, embora localizada em Cubatão, não traz nenhuma vantagem à Cidade. Os moradores têm pavor desses tanques e os vereadores já pediram, assim como o prefeito José Osvaldo Passarelli, a relocação dessa base para o interior do parque industrial.

Os tanques - entre eles alguns pintados de branco, caracterizando o armazenamento do álcool negado por Romilson - são "bombas atômicas", segundo os vereadores Romeu Magalhães, Agrimaldo Rocha da Silva, Florivaldo Cajé, Armando Campinas Reis, Manuel Ubirajara, Dojival Vieira dos Santos e Gigino Aldo Trombino. Todos pregam a necessidade urgente da remoção dessa tancagem onde é armazenada uma infinidade de produtos, desde gasolina até nafta, diesel e álcool. A menos de 500 metros dos tanques estão os conjuntos habitacionais 31 de Março e Metalúrgicos.

Há duas semanas, um dos dutos que leva nafta da Refinaria para a Basan rompeu-se sob a Estrada Cubatão-Guarujá, inundou um canal de uma avenida que corta esses dois núcleos acima referidos e perto de 15 mil pessoas passaram a noite sem dormir, com medo de morrer.

II

Quando a Refinaria Presidente Bernardes se instalou, grupos industriais vieram no seu rastro, aproveitando os produtos que ela fazia para fabricar subprodutos. Foi assim que surgiram a Alba, que produz formol, metanol e resinas sintéticas; a Companhia Brasileira de Estireno, que faz monômetro de estireno e tolueno; a Copebrás, com seu negro de fumo, superfosfato, ácido sulfúrico, ácido fosfórico e tripolifosfato de sódio; a Engeclor, com o cloreto de amônio; a Liquid Carbonic, com gás carbônico e gelo seco; a Petrocoque, com coque calcinado de petróleo; a Rhodia, com clorofenóis e solventes clorados; a Union Carbide, com polietileno e Temik.

Outras indústrias aproveitaram subderivados e instalaram-se aproveitando a proximidade do Porto de Santos. Surgiram a Carbocloro, produzindo soda cáustica, ácido clorídrico, cloreto de alumínio e cloro; a Cimento Santa Rita, que faz cimento de alto forno tipo 320, usando escória da Cosipa; a Gespa, que faz gesso peletizado e gesso calcinado aproveitando resíduos da Copebrás; as fábricas de fertilizantes: IAP, Manah, Adubos Trevo e Solorrico e a Ultrafértil. Esta última trabalha produtos como o fosfato de diamônio, nitrato de amônio, nicrocálcio, amônia, ácido sulfúrico, fosfato de monoamônio.

A Refinaria Presidente Bernardes tem uma infinidade de produtos, descritos pela empresa como gases, fração C3/C4, produtos claros, destilados médios, produtos para petroquímica e produtos pesados.

A principal indústria da região é a Cosipa, que emprega mais de 14 mil pessoas para produzir aço. O produto final envolve a fabricação de ácido sulfúrico, hidróxido de sódio, óleo creosoto, benzol, toluol etc.

A mais antiga é a Santista de Papel e a Hidrelétrica Henry Borden é classificada como indústria e para efeito de produção, como geradora de energia elétrica. Todas essas indústrias preocupam a comunidade por causa das emanações que liberam para o meio-ambiente.

A Cetesb - organismo criado pelo Estado para fiscalizar a preservação da política ambiental - nada pode fazer quanto à obrigação de exigir das indústrias instalações mais seguras. Na verdade, não existe no País uma entidade, responsável, por esse setor.

Hoje, em Brasília, haverá uma reunião de técnicos do Ministério do Interior, Transportes, Saúde, Agricultura e da Indústria e Comércio. Eles procurarão definir as responsabilidades de cada um desses setores no tratamento das substâncias perigosas manipuladas no País para a fabricação industrial.


Instalação da Refinaria atraiu diversas outras indústrias
Foto: arquivo, publicada com a matéria

A relação dos "venenos"

Segue-se uma relação de produtos químicos produzidos pela Refinaria Presidente Bernardes, da Petrobrás, e armazenados em Cubatão para que o leitor saiba, como observou o representante da Federação dos Trabalhadores da Agricultura do Estado de São Paulo, Antônio Carlos Sarti, "o nome do veneno que está passando diante do nosso nariz":

Morfolina, hidrato de hidrazina, chumbo-tetraetila, silicone, polifosfatos, biocidas (Nalcoi 7321, 7325 e 8339); trióxido de antimônio, sulfeto de sódio, sulfato de alumínio, nitrogênio, metanol, fosfato trissódio, dicromato de sódio, dicloroetano, cloro, cloreto de sódio, amônia, barrilha, ácido sulfúrico e petróleo. Agora, com a inauguração da Unidade de Gasolina de Aviação, a Refinaria manipula também o ácido fluorídrico, um veneno ativíssimo.

"Os operários que trabalham perto dessa unidade vestem escafandros", alerta Florivaldo Cajé.

Com esses produtos, a RPBC fabrica desde gasolina comum e de aviação, também gás liquefeito de petróleo, nafta, diesel, óleo combustível, coque de petróleo, asfaltos, benzeno, tolueno, xileno, hexano, eteno, butano e gás ácido. Guarda 33.880 metros cúbicos de eteno, propano e butano em 15 tanques. Além disso, armazena 670.660 metros cúbicos de produtos intermediários diversos em 63 tanques.

A Cosipa guarda em reservatórios ácido sulfúrico, hidróxido de sódio, óleo creosoto e solvey, benzol, toluol, xilol, BTX, óleo antacênico, fenolato de sódio e naftaleno.

As outras indústrias manipulam uma série de produtos perigosos, cuja guarda deve ser feita com a máxima segurança. Além do isocianato de metila (Carbide), há o diclorometano, o trimetilamina, o naftil-metil-carbamato e o éter fosfórico de polioxi propileno glicol, dióxido de titânio, o cloreto de rutênio, o aluminato de sódio, o pergamanato de sódio, o ácido esteário e o anidrido maleico.

Vamos verificar o risco de alguns deles, de acordo com o glossário de termos e corpos químicos de Ezequiel da Silva Martins:

Benzeno (benzol, hidreto de fenila, óleo de alcatrão), líquido, incolor, insolúvel na água, inflamável líquido e tóxico.

Naftaleno - os seus vapores, em altas concentrações no ar, formam mistura explosiva.

Nafta - mistura de pequenas quantidades de Benzeno e Tolueno com xileno. Em mistura com o ar é explosiva. Seus vapores são mais pesados que o ar, venenosos e sufocantes.

Chumbo tetraetila - tóxico perigoso, líquido incolor, com ação severa nos centros nervosos orgânicos. Provoca impotência, cancerígeno.

Amônia - irritante, pode cegar por contato, em 30 minutos; gás tóxico, não inflamável, possuindo perigo de explodir.

É melhor parar por aqui. Raros são os produtos inofensivos. A maioria deles é explosivo, tóxico, mortal. A exemplo do xileno, tolueno e benzeno, são insolúveis na água.

Por ironia ou humor negro, se você tiver que ficar exposto a um desses produtos (Deus o livre e guarde), prefira o hexano.

É um hidrocarboneto líquido, incolor, de odor próprio, com ação tóxica, mas anestésico.


O oleoduto do Tedep, uma serpente prateada subindo a Serra
Foto: arquivo, publicada com a matéria