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HISTÓRIAS E LENDAS DE SANTOS - RADIOFONIA
Do Brucutu ao ministério

Uma curiosa história, paralela aos primeiros tempos das rádios santistas, é contada pelo radialista Reynaldo C. Tavares em seu livro Histórias que o rádio não contou (1997, Negócio Editora Ltda., São Paulo/SP):

Lá pelos idos de 43, vindos de Brodósqui, interior de São Paulo, berço do grande pintor Cândido Portinari, chegaram a Santos-SP dois moços, filhos de um rico fazendeiro da região de Ribeirão Preto, onde cultivava café, produto que exportava como a grande maioria dos plantadores da nossa maior riqueza.

Floriano Pereira Ramos era o nome do fazendeiro e seus filhos, José e Luiz Carlos, iriam se fixar em Santos para poderem concluir seus estudos, iniciados na acolhedora cidade de Ribeirão Preto, a poucos quilômetros de Brodósqui.

José era alegre e extrovertido e Luiz Carlos, o mais moço, com aquele jeitão interiorano sempre meio desconfiado, era mais tímido, agindo sempre com muita prudência.

Após instalarem-se numa pensão à beira-mar, matricularam-se no Ginásio Santista, dos tradicionais irmãos maristas, da venerável ordem do Padre Marcelino Champagnat, cujo ensino era um dos melhores do Brasil!

Como havia diferença de idades, cada qual, à sua maneira, foi formando o seu círculo de amizades e a integrar o que a juventude de hoje chama de tribo... Naquela época, já existiam essas tribos, só que os tempos eram outros, mas a convivência entre rapazes e moças era muito comum, sendo chic os grupos reunirem-se para dançar ao som do rádio ou dos discos das orquestras de Glenn Miller, Tommy Dorsey, Artie Shaw, Benny Goodman, Count Basie, Duke Ellington, Harry James, dos cantores Bing Crosby, Frank Sinatra, Ella Fitzgerald, Lena Horne e vários outros...

José integrou-se à conhecida turma do José Menino, que se reunia na altura do Posto Um, naquele bairro, onde com uma vitrola de corda e os pesados 78 rpm, aconteciam reuniões dançantes, que avançavam até a madrugada.

Aqueles descontraídos rapazes e moças pertenciam à classe média alta de Santos, não lhes faltando uma caverna, onde os mesmos trocavam de roupa todas as vezes que as delícias de um banho de mar assim exigissem. Era a célebre Caverna do Brucutu.

Os mais ousados, no verão, após aquela sessão de bate-coxas, que era familiar, apesar de se dançar agarradinho, resolviam cair no mar nuzinhos (os rapazes), deixando seus pertences na Caverna do Brucutu, que dava frente para o oceano e ficava nos baixos (um porão) de uma das residências dos pais de alguns membros do grupo.

Isto quer dizer que, para ganhar a praia, nossos heróis teriam que atravessar a Av. Presidente Wilson: mesmo de madrugada, atravessar a principal avenida praiana peladinho, por onde trafegavam os bondes, era um acontecimento heróico, principalmente se considerarmos os padrões morais da década de 40.

Nos dias de hoje, no lugar onde existiu a Caverna do Brucutu, no José Menino, quase em frente à ilha Urubuqueçaba, existe um majestoso prédio de apartamentos, a enterrar essas agradáveis lembranças e divagações.

Voltemos à nossa narrativa.

José crescera na fazenda do pai, junto aos cafezais, e era natural que gostasse de música cabocla e, entre seus ídolos, estava Francisco Alves, O Rei da Voz, de quem José conhecia e cantava todo o repertório.

O tempo foi passando e o moço de Brodósqui, mais ambientado, recebeu até um apelido: Capitão Bigode; começou a praticar basquete e ingressou no juvenil do Santos Futebol Clube, onde o técnico era o professor Gilberto Casatti, sucedido pelo professor Oscar da Silva Musa, ambos do interior do estado, mais especificamente de Ribeirão Preto.

O José ou Capitão Bigode, todas as vezes que ouvia rádio, sentia algo estranho e questionava-se com freqüência: - Ouvir é muito bom, mas fazer rádio não seria melhor ainda?

Desde a sua chegada à cidade de Braz Cubas que haviamo-nos tornado amigos quase inseparáveis, tanto que em nossas férias escolares tivermos a oportunidade de conhecer a fazenda do velho Coronel Floriano, onde desfrutamos de uma hospitalidade só encontrada na realeza imperial - Que saudades do tio Belô e o seu alazão... E as esticadas a Ribeirão Preto, onde havia moças lindas, geralmente de pele bronzeada, e de olhos verdes ou azuis! Que saudades...

Numa das noites enluaradas, vividas naquelas férias em Brodósqui, José tomou uma decisão que não mais abandonou: encontrar uma maneira de ingressar no rádio.

A Rádio Atlântica de Santos PRG-5 mantinha um programa que era produzido e dirigido exclusivamente para o público jovem, O Teatrinho de Brinquedo, criação da radialista Alayde Camargo, conhecida como Dindinha Sinhá. O Teatrinho de Brinquedo era levado ao ar aos domingos à tarde, e pelas suas mãos já haviam sido revelados vários nomes para o meio radiofônico. Esse seria o caminho do José.

Feitas as apresentações, Alayde Camargo, que era uma mulher esperta, com enorme visão artística, não titubeou: - Você fica conosco, José, e a partir do próximo domingo passará a dividir a apresentação do programa com o Alaor Pereira e a Ladi Martinez, que já integram o nosso quadro de locutores.

Na semana seguinte, lá estava o José, de script na mão, como se fosse um veterano nas coisas do rádio, apresentando, entrevistando, lendo crônicas etc., um tremendo sucesso.

A Dindinha Sinhá não cabia em si de contentamento, exultando todas as vezes em que era cumprimentada pelo sucesso do mais novo apresentador do Teatrinho de Brinquedo.

Moço inteligente como sempre foi, José não descuidou dos estudos, buscando nos bancos escolares o complemento de seus objetivos, que era o curso de Bacharel em Direito.

Mas o seu sucesso no Teatrinho de Brinquedo não parou aí. Em pouco tempo, revelou-se poeta e cronista e passou a apresentar a cada semana uma crônica no transcorrer do programa, o Boa Tarde para Você, a exemplo do que faziam Carlos Frias no Rio de Janeiro pela PRG-3 Rádio Tupi e Manoel da Nóbrega em São Paulo, pela PRE-4 Rádio Cultura, onde todas as noites mandavam para os céus do Brasil o célebre Boa Noite para Você. Aqueles dois famosos narradores valiam-se de um redator, que escrevia as crônicas, o que não acontecia com José, já que o seu Boa Tarde para Você era de sua própria autoria, e produzido de improviso, no momento da sua apresentação, ali mesmo, diante do microfone.

Sua vocação para a literatura era inata, tornando-se conhecido nos meios intelectuais como o Poeta do Café, editando algumas obras sobre o assunto, ressaltando-se a poesia que dedicou ao seu pai.

Na década de 50, ingressou no jornal A Tribuna de Santos como repórter, cobrindo todos os setores da redação, até ganhar a sua própria coluna, o Semanascópio, que abordava assuntos gerais, com acentuado espaço dedicado a política, onde, de forma inteligente e mordaz, levantava temas sempre contundentes e polêmicos. Sua coluna era temida pelos poderes públicos do País, já que o Semanascópio era de expressão nacional.

José teve uma curta passagem pela televisão, na subestação da TV Paulista Canal 5, pertencente à Organização Victor Costa, quando a retransmissora funcionou em Santos, sendo um dos seus executivos, dividindo a apresentação do Telenotícias com os jornalistas Juarez Bahia e Nemézio Prado.

Quando Jânio Quadros se elegeu presidente da República em 1960, nomeou-o assessor especial para assuntos do café brasileiro. Após a inesperada renúncia do presidente, José, já diplomado em Direito, transferiu-se para São Paulo, onde, com seu irmão Luiz Carlos, foi trabalhar no escritório do jurista e professor Vicente Rao. Paralelamente ao escritório de advocacia, José, ainda com o vírus do rádio nas veias, emprestou seu talento à Rádio Tupi de São Paulo PRG-2 e à PRB-9 Rádio Record de São Paulo.

Como os leitores devem estar lembrados, em 15 de janeiro de 1985, Tancredo de Almeida Neves elegeu-se presidente da República pela via indireta e, antes mesmo da sua posse, veio a falecer, após vários dias de agonia que traumatizaram a nação. Estava criada mais uma, entre as tantas crises que ocorreram sistematicamente no Pais. De pronto, surgiram duas correntes, havendo os que entendiam que o vice-presidente eleito pelo colégio eleitoral na chapa do sr. Tancredo Neves, o sr. José Sarney, não encontrava apoio legal para sentar-se na cadeira presidencial, e a segunda que achava que seria apenas um ato de rotina.

José foi convocado ao Palácio da Alvorada em Brasília, recebendo a incumbência de encontrar uma solução jurídica, que assegurasse ao sr. Sarney uma posse tranqüila e sem obstáculos.

- Afinal era legal ou não a sua pretensão?

Após a posse do sr. José Sarney como presidente da República, José acabou transformando-se em seu assessor especial, chegando a ser nomeado ministro da Justiça, num governo que ele mesmo, com seus pareceres, ajudou a instalar de forma juridicamente legal. O presidente Sarney ficou numa posição tão cômoda, que conseguiu até ampliar de quatro para cinco anos o seu mandato. (...)

O Dr. José Saulo Pereira Ramos, com justo orgulho, na atualidade ostenta o garboso título de Maior Jurista Vivo no Brasil, à frente do seu próprio escritório, luxuosamente instalado em São Paulo, a Advocacia J. Saulo Ramos.

José Saulo Pereira Ramos, o José da história acima (foto extraída do livro citado)
José Saulo Pereira Ramos, o José da história acima 
Foto extraída do livro citado