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HISTÓRIAS E LENDAS DE SANTOS - Demografia-1913
Mudanças no crescimento populacional (3)

Os problemas de um recenseamento, apesar dos critérios adotados

Em 1914, foi publicada pela Prefeitura Municipal de Santos a obra Recenseamento da Cidade e Município de Santos em 31 de dezembro de 1913, que faz parte do acervo do historiador santista Waldir Rueda. Além de uma análise sobre o estado do município nesse ano, o livro apresenta a metodologia e os resultados do censo, e faz ainda comentários sobre os recenseamentos anteriores (ortografia atualizada nesta transcrição):

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PRIMEIRA PARTE
PREMIÈRE PARTIE
II - A população de Santos no passado

Os governos coloniais e os dos primeiros anos de nossa independência política dedicaram aos recenseamentos da população de São Paulo cuidados especiais. De 1830 para cá, nunca mais nenhuma administração dispensou assíduos esforços a esse importante serviço público. Sob o regime imperial fizeram-se duas tentativas regulares, uma em 1854 e outra em 1886, por iniciativa e decisão do Governo Provincial.

O Governo Geral apenas levou a cabo, com grande esforço e ação morosa, um censo completo de todo o país, em 1872. A República, então, nunca tomou a sério tal serviço. Os únicos recenseamentos gerais que ela fez, em obediência ao preceito constitucional, foram o de 1890, para fixar o número de representantes dos Estados ao Congresso Nacional, e o de 1900; e, esses mesmos, deficientíssimos.

Os governos de S. Paulo, depois da implantação do novo regime, têm-se revelado, a tal respeito, muito abaixo dos governos coloniais e dos governos provinciais. Ao passo que no tempo de Colônia e nos primeiros anos de nossa independência política os recenseamentos paulistas eram feitos anualmente; ao passo que, sob o segundo Império, a Província realizou aquela operação por duas vezes; os governos surgidos da autonomia republicana não cogitaram nunca de conhecer os estados da população paulista, apesar do desenvolvimento maravilhoso que se operou no Estado em vinte e tantos anos de vida federativa!

O primeiro conhecimento que temos da população de Santos, no seu passado, é o que resulta do recenseamento a que mandou proceder, em toda a Capitania, em 1772, o respectivo governador e capitão general, d. Luís Antonio de Sousa Mourão.

Os dados referentes a Santos constam do Mapa Geral da Capitania de S. Paulo de todos os fogos homens mulheres meninos velhos, e Escravos que se achárão nas Villas e Freguezias segundo as listas que se mandárão tirar neste anno de 1772 (textual). Este mapa, que se encontra no Arquivo do Estado, é um belo trabalho que se recomenda, não só pela minuciosidade e clareza com que foram grupados os algarismos, como pela forma estética da sua disposição geométrica e caligráfica, próprias a amenizar a natural aridez do assunto.

Do mapa se verifica que, há 142 anos (N.E.: em 1772...), a população do Município de Santos era de 942 indivíduos do sexo masculino e 1.139 do sexo feminino, ou seja, um total de 2.081 almas, a saber:

Ano de 1772

Grupos de idades

 Homens

Mulheres

Total

Homens de 15 até 60 anos
445
644
1.089
Velhos de 60 até 90 anos
98
154
252
Meninos de 7 até 15 anos
161
146
307
Meninos até 7 anos
238
195
433
Soma
942
1.139
2.081

As mulheres representavam 54% e os homens 46% da massa geral da população.

Nos mapas referentes ao recenseamento feito 4 anos depois, isto é, em 1776, nada encontramos relativamente a Santos, e só em 1814 é que vemos figurar, de novo, o nosso Município, com uma população total de 5.128 almas, sendo 2.293 indivíduos livres (N.E.: SIC - correto é 2.993) e 2.135 escravos. Em 42 anos a população aumentou de mais do dobro, devido, naturalmente, ao tráfico da escravatura, pois vemos que o número de cativos estava quase equilibrado com o de homens livres.

Estava assim discriminada a população daquela época, quanto aos habitantes livres:

Ano de 1814

Homens
1.319
Mulheres
1.674
Total
2.993
Escravos dos dois sexos
2.135
Total geral
5.128

Em relação ao estado civil da população livre, encontramos os seguintes dados sumários:

Indivíduos casados
748
     "        solteiros
2.083
     "        viúvos
162
Soma
2.993

A percentagem de mulheres sobre o total de habitantes, era, então, de 54, e a de homens, de 56 (N.E.: SIC - além dessa discrepância de totalizar 54%+56%=110%, os números apresentados apontam, não considerados os escravos, percentuais de aproximadamente 55,9% de mulheres e 44,1% de homens).

Dois anos depois, em 1816, depara-se-nos outro censo geral da Capitania, com inclusão da Vila de Santos. Este censo acusa um decréscimo de população, tanto em relação aos de condição livre, como aos escravos: o total de habitantes é de 4.880, assim discriminados:

Ano de 1816

Homens livres
1.236
Mulheres  " 
1.591
Total de habitantes livres
2.827
Escravos dos dois sexos
2.053
Total geral
4.880

No ano da Independência - 1822 - fez-se um recenseamento mais detalhado e mais completo em toda a Capitania. Os dados referentes ao nosso Município eram os que constam do quadrinho que damos abaixo:

Ano de 1822

Estado civil

*

Brancos

*

Pretos

*

Pardos

*

Total das raças

H.

M.

Total

H.

M.

Total

H.

M.

Total

H.

M.

Total geral

Solteiros
420
435
855
1.116
607
1.723
440
661
1.101
1.976
1.703
3.679
Casados
197
186
383
123
109
232
127
149
276
447
444
891
Viúvos
29
77
106
17
18
35
20
50
70
66
145
211
Soma
646
698
1.344
1.256
734
1.990
587
860
1.447
2.489
2.292
4.781

Vê-se do quadro acima que a população, nesse ano, diminuiu ainda: acusa menos 99 indivíduos que em 1816. A diferença de 8 anos - de 1814 a 1822 - é de 447 pessoas de ambos os sexos, para menos, e entre livres e escravos (N.E.: SIC - a conta 5.128 - 4.781 resulta em 347 pessoas, não 447...).

Quanto à sua condição e estado civil, constam deste mapazinho:

Estado civil

*

Livres

*

Escravos

*

Total

H.

M.

Total

H.

M.

Total

H.

M.

Total geral

Solteiros
785
1.041
1.826
1.191
662
1.853
1.976
1.703
3.679
Casados
342
351
693
105
93
198
447
444
891
Viúvos
46
131
177
20
14
34
66
145
211
Soma
1.173
1.523
2.696
1.316
769
2.085
2.489
2.292
4.781

A proporção entre cativos e livres era a mesma que nos anos anteriores, isto é, quase que se equilibravam as duas populações. As mulheres, ao contrário do que refletiram os censos atrás, desceram a 48%, ao passo que o elemento masculino galgou a escala, atingindo a 52%.

O movimento da população nesse mesmo ano foi o seguinte:

Nascimentos........................... 237
Óbitos................................... 205
Saldo a favor do crescimento
natural da população...............   32

Os casamentos foram em número de 22.

O coeficiente da natalidade era muito elevado: = 49! O da mortalidade também era muito alto: = 42! O da nupcialidade era perfeitamente normal = 4. Veremos, quando estudarmos o resultado do censo de 1913 que, embora muito menor, o coeficiente da natalidade em Santos é um dos mais altos que registram as estatísticas de todo o mundo.

Em 1826 e 1827 fizeram-se novamente recenseamentos gerais da Província, mas os papéis referentes a Santos não foram achados no Arquivo do Estado. Encontramos, porém, os de 1828 que nos fornecem os dados que seguem:

Ano de 1828

Estado civil

*

Raças

Branca

*

Preta

*

Parda

*

Total

H.

M.

Total

H.

M.

Total

H.

M.

Total

H.

M.

Total

Solteiros
493
415
908
1.343
757
2.110
440
608
1.048
2.276
1.790
4.066
Casados
223
221
444
89
97
186
142
113
255
454
431
885
Viúvos
28
74
102
6
18
24
15
54
69
49
146
195
Soma
744
710
1.454
1.438
882
2.320
597
775
1.372
2.779
2.367
5.146

(N.E.: SIC - para corresponder às somas horizontais e verticais, na raça preta o número de mulheres deveria ser 767 e não o originalmente citado 757)

Em 1928, a população cresceu novamente, como consta do mapa, ultrapassando as de 1814, 1816 e 1822. Os pretos continuavam a ser em maior número que os brancos, e, somados com os pardos (incluídos, naturalmente, nesta última designação, os caboclos), constituíam mais de metade da população.

Quanto à condição, os dados informam o seguinte:

Estado civil

*

Condição

Livres

*

Escravos

*

Total

H.

M.

Total

H.

M.

Total

H.

M.

Total geral

Solteiros
879
1.013
1.892
1.397
777

2.174

2.276
1.790
4.066
Casados
372
355
727
82
76
158
454
431
885
Viúvos
43
136
179
6
10
16
49
146
195
Soma
1.294
1.504
2.798
1.485
863

2.348

2.779
2.367
5.146

Ainda em 1928 a população escrava era pouco inferior à população livre.

Em 1829 houve também o censo geral da Província, porém nada encontramos a respeito do estado estático da população de Santos. Quanto ao seu estado dinâmico, porém, depararam-se-nos estes algarismos:

Nascimentos........................... 218
Óbitos................................... 167
Saldo a favor do crescimento
natural da população...............   51

Depois de 1829, só conhecemos o recenseamento provincial, em proporções mais vastas, executado com mais luxo técnico, pelo brigadeiro José Joaquim Machado de Oliveira, no ano de 1854, por ordem do presidente, dr. José Antonio Saraiva.

Esse recenseamento acusou, em relação à nossa terra, o seguinte resultado geral:

Ano de 1854

Condições

 Homens

Mulheres

Total

Indivíduos livres
1.957
1.999
3.956
     "        escravos
1.759
1.430
3.189
Estrangeiros
483
227
710
Soma
4.199
3.656
7.855

Em 26 anos, a população do Município aumentou de 50%, havendo 9% de estrangeiros. A população escrava atingiu quase a metade da soma geral de habitantes.

O estado dinâmico da população, isto é, o seu movimento natural, consta dos algarismos que seguem:

 

Nascimentos

Total

 

Óbitos

Total

Livres
101 h.
85 m.
= 186 indivíduos

 

81 h.
79 m.

= 160 ind. 

Cativos
32 h.
39 m.
=   71 indivíduos

 

32 h.
33 m.

=   65   " 

Soma
133 h.
124 m.
= 257 indivíduos

 

113 h.
112 m.

= 225   " 

Saldo a favor do crescimento natural da população = 32;

Os casamentos foram em número de 40 entre pessoas de condição livre e de 2 entre cativos. O coeficiente da natalidade era muito inferior ao de 1822: = 32; o da mortalidade descera a 28; o da natalidade subira um pouco = 5.

Dezoito anos mais tarde, em 1872, o Governo Imperial mandou fazer o censo geral do país, que corre impresso. Os mapas relativos ao Município de Santos acusam uma população total, assim resumida:

Ano de 1872

Raças

*

Condição

Livres

*

Cativos

*

Total

H.

M.

Total

H.

M.

Total

H.

M.

Total geral

Branca

2.779

2.233

5.012

-

-

.-

2.779

2.233

5.012

Parda

  746

  682

1.428

377

274

  651

1.123

  956

2.079

Preta

  423

  412

  835

531

413

  944

  954

  825

1.779

Cabocla

  126

  113

  239

-

-

-

-

-

-

Soma

4.074

3.440

7.514

908

687

1.596

4.856

4.014

8.870

(N.E.: SIC - notado que no quadro acima não foram transportados para as três colunas à direita os números referentes à raça cabocla, que assim não aparecem nos totais finais, que seriam respectivamente 4.982 homens, 4.127 mulheres e 9.109 indivíduos no total geral)

Acrescentando-se a esses 8.870 habitantes, 134 ausentes acidentalmente e 118 em trânsito, teremos um total de 9.122 habitantes (N.E.: excetuados os 239 caboclos). Por esse tempo, já havia 835 pretos livres e a população escrava achava-se reduzida quase à metade da existente nos anos anteriores.

O recenseamento foi o mais detalhado a que se procedeu até aquela data, mas os quadros dados oficialmente à estampa estão errados, os algarismos totais não combinam com as somas parciais e os resultados de uns mapas se contradizem com os de outros. Vejamos, entretanto, o que se pode colher de aproveitável nessa confusão.

Quanto ao estado civil, a população estava assim discriminada:

Estado civil

*

Condição

Livres

*

Cativos

*

Total

H.

M.

Total

H.

M.

Total

H.

M.

Total geral

Solteiros

2.435

1.888

4.323

847

639

1.486

3.282
2.527

5.809

Casados

1.345

1.352

2.697

 43

 39

    82

1.388
1.391

2.779

Viúvos

  328

  237

  565

 25

 13

    38

  363
  240

  603

Soma

4.108

3.477

7.585

915

691

1.606

5.033
4.158

9.191

Neste mapa, o total da população é superior ao algarismo do quadro geral que é de 9.122 (N.E.: novamente excetuados os 239 caboclos).

Sabiam ler e escrever 3.785 pessoas, ou 44% da população, percentagem mais elevada que a que demonstra o recenseamento de 1913.

A população escolar que freqüentava escolas era de 448 meninos de 6 a 15 anos, ou seja 5% da população geral, isto é, menos 3% que em 1913.

Convém notar que do total de habitantes excluímos, exatamente como fizemos no recenseamento de 1913, os menores de 6 anos que, por se não acharem ainda em condições de aprender, não podem ser considerados como analfabetos. O número de menores de 6 anos era, em 1872, de 570.

A população infantil em idade escolar montava a 2.198 meninos. A percentagem de meninos freqüentando escolas, sobre o total da população infantil em idade escolar, era, pois, de 20%, ou menos 17% do que a população encontrada no censo do ano passado.

Quanto à naturalidade dos brasileiros, somente 8 províncias tinham filhos residindo em Santos, a saber: Alagoas, Sergipe, Bahia, Rio de Janeiro, Paraná, Minas Gerais, Goiás e Mato Grosso. As províncias que tinham maior colônia em Santos eram, em ordem decrescente:

Minas Gerais com .. 1.811 indivíduos
Paraná com .........    513    "
Bahia com ...........    211    "
Goiás com ...........    178    "

O número de estrangeiros que, em 1854, era de 710, desceu, em 1872, o que evidencia a insuficiência do serviço. O aparelho técnico foi mais luxuoso que o dos recenseamentos dos tempos coloniais e dos primeiros anos da Independência; mas os resultados práticos revelaram-se muito inferiores aos alcançados por aqueles censos.

O quadro das profissões é também de molde a demonstrar o quanto o censo de 1872 foi deficiente. Dele consta que nesse ano não havia, em nosso foro, um só advogado - o que é contrário à verdade dos fatos conhecidos. Também não havia oficiais de justiça. Os médicos eram 3, os farmacêuticos, 5, as parteiras, 3, os professores e homens de letras, 10, e os empregados públicos, 10. Havia 31 capitalistas e proprietários, 32 manufatureiros e fabricantes e 151 comerciantes, guarda-livros e caixeiros.

Quanto às profissões que o censo denominou manuais ou mecânicas, havia uma coluna especial para costureiras que subiam ao elevado número de 471. É de supor que se trate exclusivamente de costureiras de sacos de aniagem. As profissões operárias foram discriminadas detalhadamente, avultando os que trabalhavam em tecidos, e que eram em número de 152. Relativamente à indústria agrícola e zootécnica, havia 4.373 lavradores e 148 criadores.

O censo consigna 1.125 empregados em serviço doméstico: eram naturalmente as donas-de-casa e suas filhas, porquanto o pessoal assalariado - criados e jornaleiros - constituía uma classe à parte com 533 indivíduos dos dois sexos.

As pessoas desocupadas é que avultariam singularmente, com a elevada cifra de 1.780, numa população tão escassa, se não nos ocorresse que nesse algarismo devem ter sido incluídos os menores.

Todos os dados que citamos, muitos deles incompletos, contraditórios e disparatados, são transcritos em resumo, mas fielmente, da publicação oficial, em grandes e grossos volumes, que o Governo Imperial mandou fazer, dando conta dos resultados definitivos do censo.

Mas, no Arquivo da nossa Municipalidade, encontramos um precioso documento dessa época, que não podemos deixar de citar nestas páginas. É o Recenseamento Geral do Município de Santos, no ano de 1872, um quadro sintético assinado pela Comissão Censitária, nomeada pelo Governo para levar a cabo aquela operação.

Este quadro, que é manuscrito e datado de 26 de setembro de 1872, é autenticado com as assinaturas autógrafas dos membros da referida Comissão, e que eram os srs. Antº. Ferrª. da Silva, Thiodoro de Meneses Forjás, Vigº. Scipião Ferreira Goulart Junqª., Ignacio Wallace da Gama Cochrane e José Antonio de Magalhães Castro Sobrinho. Tentamos reproduzir em fotogravura esse documento, que já está com os caracteres muito apagados e com o papel tracejado em vários pontos; mas o seu estado precário já não permitiu que se fizesse uma reprodução satisfatória.

A Comissão dividira o Município nas 10 seguintes seções:

  1ª - Cubatao, Areaes, Raiz da Serra.
  2ª - Estrada do Cubatao, Caminho de S. Vicente.
  3ª - Rio de Mogy, Dianna e Pellaes.
  4ª - Bertioga, até Boracéa.
  5ª - Juquehy, Sahy, Couves e Trigo.
  6ª - Guayuba até Enseada de (roído pelas traças)
  7ª - Pernambuco até Cambury.
  8ª - Rua de Braz Cubas até a barra.
  9ª - Dº. d. até rua 11 de Junho.
10ª - Rua 11 de Junho até o morro da Penha.

Conservamos a ortografia original, tanto da assinatura dos membros da Comissão Censitária, todos falecidos, como da denominação das ruas e mais lugares compreendidos na divisão seccional do Município. O quadro dá um resultado inteiramente diverso do que o Governo Imperial mandou publicar. Parece que os altos poderes da nação acharam exageradas as cifras apresentadas pela prestante Comissão santista e podaram-lhe os presumidos excessos. Segundo o mapa autêntico da Comissão, o total de habitantes elevava-se a 10.120 pessoas, ou seja 999 mais do que o que figura na publicação oficial do censo = 9.191.

Entendemos que o Governo não tinha grandes razões em proceder assim com tal desconfiança imerecida e injusta, porquanto a Comissão foi de tal forma imparcial e escrupulosa que, podendo com o só acréscimo de um indivíduo, arredondar a cifra para 1.000, limitou-se honestamente a consignar apenas os 999 que encontrou a mais no conjunto da população.

O mapa, que ora examinamos, retifica, até, erros essenciais que são evidentes nos quadros gerais publicados pelo Governo Imperial. É assim que o número de estrangeiros, que na publicação oficial é demasiado pequeno, aparece, no mapa, com a sua cifra presumivelmente verdadeira - 1.577 indivíduos, assim discriminados:

Portugueses ..........
931
Africanos ..............
255
Alemães ...............
137
Franceses ............
75
Espanhóis .............
55
Norte-americanos ..
35
Ingleses ...............
31
Suíços .................
18
Italianos ..............
18
Suecos ................
4
Holandeses ...........
3
Austríacos ............
3
Chineses ..............
3
Dinamarqueses ......
2
Argentinos ............
2
Orientais ..............
2
Húngaro ...............
1
Belga ...................
1
Russo ..................
1

O número de casas habitadas (1.168) também não combina com o do mapa oficial (1.382). No cômputo da população, segundo os dados da Comissão Censitária Municipal, entravam 115 marinheiros mercantes e 134 hóspedes, sendo, pois, o total da população efetiva de 9.871 pessoas, ou sejam mais 750 pessoas. Convém notar que o mapa em questão contém um erro de soma na coluna dos hóspedes: deve ser 249 e não 149 a soma de indivíduos em trânsito.

O referido mapa traz ainda, apesar de seu tamanho, relativamente pequeno, o número e denominação dos asilos e capelas existentes; dos próprios nacionais; dos próprios provinciais; dos próprios municipais e das escolas.

Quanto à instrução, diz ele que o Município, além de 6 escolas primárias para o sexo masculino e 4 para o sexo feminino, contava, ainda, três escolas de instrução superior, sendo duas para homens e uma para mulheres. Por mais pesquisas e indagações que fizéssemos, junto aos anciãos mais autorizados da cidade, não conseguimos saber que institutos eram esses, de instrução superior, dos quais nunca tínhamos ouvido falar, e que ninguém nos soube dizer em que local funcionavam e quem eram seus diretores.

Tratar-se-ia de simples escolas de ensino secundário, que a Comissão reputava como escolas superiores? Não é possível admitir essa suposição, porque da Comissão faziam parte dois varões cultos e que tinham cursado estabelecimentos oficiais de ensino superior em nosso país: o dr. Ignacio Cochrane e o dr. Magalhães Castro. É um mistério que não conseguimos, por enquanto, esclarecer.

Voltando às contradições existentes entre o referido mapa e os quadros gerais mandados publicar pelo Governo Imperial, não achamos outra explicação plausível para esse fato a não ser no extravio dos papéis e documentos enviados daqui para a Corte. A Repartição, encarregada da apuração definitiva do censo e da organização dos quadros, deixou que se perdesse grande parte dos mapas enviados e só apresentou alguns deles, em relação aos detalhes de que nos ocupamos. Doutra forma, não se explicaria que a Comissão enviasse à Câmara um mapa em desacordo com os dados por ela coligidos e remetidos ao Governo Central.

Depois do censo geral de 1872, só tivemos o censo provincial de 1886, mandado fazer por ordem do presidente de então, sr. conselheiro João Alfredo Corrêa de Oliveira. Apesar de entregue a pessoas competentes e de ter sido organizado dentro de um plano modesto, muito deixou a desejar. No que se refere a Santos, o fracasso foi completo. A única coisa que se conseguiu apurar em relação ao nosso Município, é que a sua população era de 15.605 almas. Quanto a sexos, raças, estado civil, idades, instrução, nacionalidade, nada se fez aqui, ao passo que a maioria dos Municípios concorreram com os seus dados e informações mais ou menos exatos e criteriosos.

O movimento da população nesse ano foi o seguinte:

Nascimentos........................... 560
Óbitos................................... 496
Saldo a favor do crescimento
natural da população...............   64

Realizaram-se 79 casamentos. O coeficiente da natalidade foi de 35, mais ou menos o que é ainda hoje.

O penúltimo recenseamento que se fez em Santos foi o de 1890, mandado proceder pelo Governo da República em todo o território nacional. Esse trabalho foi dos mais incompletos que se têm feito até hoje no Brasil. Basta dizer que na Capital de S. Paulo, o presidente do Estado e sua família, que residiam no Palácio Governamental, não foram recenseados. A população do nosso Município figura, no volume do censo desse ano, publicado pela Diretoria Geral de Estatística, apenas com 13.012 habitantes.

Após a tentativa de 1890, e ainda em obediência ao preceito constitucional, o Governo da República mandou proceder a um novo recenseamento em 1900. Publicado o resultado obtido no Distrito Federal, verificou-se que ele estava absolutamente aquém da exatidão estatística; e o presidente da República, sr. dr. Campos Salles, baixou um decreto, cancelando-o.

Verificando-se, mais tarde, que os resultados dos Estados estavam em piores condições do que os do Distrito Federal, onde o serviço correra sob as vistas e a responsabilidade direta da Repartição Federal de Estatística, o ministro da Agricultura mandou patrioticamente que se arquivasse toda aquela papelada inútil. O resultado acusava uma população de 50.389 almas, sendo 27.688 homens e 22.701 mulheres.

O dr. Nilo Peçanha, presidente da República, determinou que se fizesse, em 1910, o recenseamento geral, exigido pela Constituição. Procedeu-se aos trabalhos preliminares para a grande operação. Mas, ao subir ao poder o marechal Hermes da Fonseca, verificou o novo ministro da Agricultura que a verba orçamental concedida para o serviço, e mais vários créditos suplementares, estavam literalmente esgotados, sem que o recenseamento tivesse sido encetado. Em vista da falta de verba, a nova tentativa fracassou estrondosamente.

Das nossas considerações resulta que só os governos coloniais e os dos primeiros anos da Independência é que cuidaram seriamente do recenseamento da população, no território de S. Paulo. À medida que S. Paulo se desenvolvia, os administradores exclamavam que não podiam governar sem estatística; mas, em vez de imitarem praticamente o exemplo de seus antecessores, limitavam-se a meras exclamações, puramente platônicas.

Ao passo que, no período colonial, conhecemos nada menos de 4 recenseamentos, no espaço de 44 anos; e, na época da Independência, nada menos de 6, dentro de 7 anos - todos eles relativamente bem executados; os governos provinciais só nos deram, em 32 anos, 2 recenseamentos falhos, incompletos e mal feitos!

Em todo o caso, mostraram boa vontade, esforçaram-se por bem cumprir os seus deveres. Que dizer, porém, dos governos paulistas, surgidos após a República, os quais, num período de 5 lustros, quando o Estado se desenvolvia prodigiosamente, sob todos os aspectos, não cogitaram nunca de levantar o censo geral da nossa população? Entretanto, os nossos diretores políticos costumam afirmar altivamente "que governar o Estado de S. Paulo é governar uma nação!".


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