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HISTÓRIAS E LENDAS DE CUBATÃO
Cubatão, por Afonso Schmidt (3)

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O passado, desde os enigmáticos tempos de João Ramalho; o presente-recente, na descrição de sua vida como o Menino Felipe; e o futuro, imaginado na utópica Zanzalá - três momentos de Cubatão transparecem na obra do principal escritor cubatense, Afonso Schmidt. Em 1974, no ano do jubileu de prata de Cubatão como cidade autônoma, a prefeitura local editou o livrete Cubatão na Obra de Afonso Schmidt, em que transcreve esta palestra proferida pelo professor Jorge Ferreira da Silva na Câmara Municipal cubatense, em 29 de junho de 1972, por ocasião do encerramento da III Semana Afonso Schmidt:


O Menino Felipe, como se autodenominou Afonso Schmidt em sua obra, aparece aqui idealizado por Jean Luciano como o menino sonhador, cheio de talento, que se transformou no grande escritor e se colocou entre os primeiros estudiosos das terras de Cubatão
Reprodução incluída no livrete de 1974 da P.M.C.

Cubatão do presente

Deslumbramento - Uma vez, Afonso Schmidt dedicou ao seu Cubatão, o Cubatão de sua infância, um poema hoje famoso em todo o Brasil. Permitam-me repeti-lo:

Cubatão

Minha terra não passa de uma estrada,
um bambual que rumoreja ao vento;
Sol de fogo em areia prateada,
Deslumbramento e mais deslumbramento.

Ao fundo, a Serra. Pinceladas frouxas
De ouro e tristeza em fundo azul. Aquelas
Manchas que são jacatirões - as roxas,
E aleluias - as manchas amarelas.

A minha terra, quando a vejo escampa
Cheia de sol e de visões amigas,
Lembra-me o cromo que enfeitava a tampa
De uma caixa de goma, das antigas...

(N.A.: Poesia, Afonso Schmidt, pág. 106 e transcrito no Suplemento de A Tribuna de 9/6/1957 por Nair Lacerda).

Transformação da vila silenciosa - Não imaginaria Afonso Schmidt que tal poesia, ditada e - quem sabe - imposta pelo coração, despertaria percuciente e incisiva a crítica.

Nair Lacerda levantou-se contra a ternura do poema, anotando que fazia referência a um Cubatão que não mais existia. Nas suas próprias palavras, em carta aberta dirigida ao escritor, disse ela:

"Acontece, porém, meu caro Schmidt... que mão decidida e gigantesca sacudiu, de repente, a vila silenciosa. A máquina invadiu o lugarejo triste, o progresso deitou sua marca, a fogo, no chão de romance. Lá onde se moviam personagens nebulosos, nascidos das sugestões de uns versos, trepidam agora tratores, rolam caminhões, deslizam coletivos.

E por isso, meu caro Schmidt,... que eu venho lhe pedir outro poema para a sua terra. Outro poema que sepulte definitivamente aquele de há trinta anos atrás, versos que ajudem a gente a aceitar o Cubatão de hoje, trepidante, mal cheiroso, com sua promessa, porém, de mais trabalho e mais pão" (N.A.: Nair Lacerda, em o Suplemento de A Tribuna de 9/6/1957 sob o título "Carta a Afonso Schmidt").

Se Afonso Schmidt aceitara o desafio, não havia conseguido encontrar notícia até esta noite, mas, por uma comunicação telefônica com a própria Nair Lacerda, soubemos que lhe respondeu. E como veremos adiante, não carecia, no entanto, de fazê-lo, pois já antes da observação, muito antes, em 1928 ou 1936, em Zanzalá, sonhara um Cubatão até mais evoluído que o que transparece na crítica da escritora.

O rico centro industrial de Afonso Schmidt - Aquele poema fora, segundo a resposta dada por Schmidt, composto com muitos anos de antecedência; hoje ele o reescreveria com maior verdade, com maior emoção, cantando as fabulosas mudanças que aqui se deram, como a escritora, estimada e amiga, lho sugeria.

No entanto, não estando ele mais em Cubatão, não tinha um conhecimento particularmente vívido desses aspectos mais recentes. Ouçamos, porém, o inteiro teor da carta que ele enviou a Nair Lacerda:

Carta a Nair Lacerda. O texto original está na Seção Afonso Schmidt da Biblioteca Municipal de Cubatão, entre documentos recebidos da escritora e outros doadores
Reprodução incluída no livrete de 1974 da P.M.C.

Nair Lacerda

Recebi há dias o suplemento de A Tribuna em que você teve a bondade de escrever uma linda crônica a meu respeito. Foi um belo dia para mim.

Não respondi antes, à espera da edição aumentada e definitiva de Bom Tempo, para retribuir-lhe a lembrança, mas os dias vão passando... Lamento não poder atender a sua amável sugestão de escrever, pela segunda vez, sobre Cubatão, pois eu mal conheço as fabulosas mudanças que ali se deram.

Quando lá estive, há uns dois anos, fui carinhosamente recebido pelos amigos, mas entre o Menino Felipe e o rico centro industrial só havia de permeio a lembrança dos que, à beira do rio, nasceram, sofreram e morreram...

Portanto, para mim, mais do que nunca, Cubatão não passa de uma estrada, com seus bambuais e seu velho chafariz. Aquele poema que você teve a bondade de transcrever foi composto com muitos anos de antecedência; hoje, não fora isso, eu o escreveria com maior verdade, com maior emoção.

Aceite um fraterno abraço e os meus instantes votos pela sua felicidade.

Afonso Schmidt
São Paulo, 2/9/1957
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