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HISTÓRIAS E LENDAS DE S. VICENTE - BIBLIOTECA - Na Capitania de S.V.
Washington Luís e a capitania vicentina (3)

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Além de governador paulista e presidente do Brasil, Washington Luiz Pereira de Souza foi escritor e historiador, sendo responsável pela construção dos monumentos históricos do Caminho do Mar, na subida da serra entre Santos e São Paulo, em 1922, para comemorar o centenário da Independência do Brasil.

Uma das suas mais importantes obras foi esta, Na Capitania de São Vicente, publicada em 1956 (um ano antes da morte do autor) pela Livraria Martins Editora, da capital paulista. Com 341 páginas mais 7 introdutórias, a obra foi impressa pela Empresa Gráfica Revista dos Tribunais, também de São Paulo.

O exemplar de número 956 foi cedido a Novo Milênio para digitalização, pela Biblioteca Pública Alberto Sousa, de Santos, através da bibliotecária Bettina Maura Nogueira de Sá, em maio de 2010. Páginas 15 a 30, com ortografia atualizada:

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Na Capitania de São Vicente

Washington Luís

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Capítulo II - A expedição de Martim Afonso de Souza

Diversas expedições haviam sido feitas ao longo da cota do Brasil, ou nela haviam tocado, algumas esporádicas ou fortuitas, após o descobrimento de Cabral, em 1500.

Alonso de Santa Cruz, cosmógrafo-mor do imperador Carlos V, fez parte de uma, em 1526, sob o comando de Sebastião Caboto (partido de Espanha e entrado no Rio da Prata), navegou ao longo dessa costa, notando e nomeando ilhas junto ao continente ou dele distantes até 65 léguas. No seu Islário, deixou entrever como foram essas expedições constantes e informou que essas ilhas haviam sido descobertas por portugueses

"veniendo a passar el Cabo de Buena Esperança para ir a Calecut e Maluco los quales procuram de venir meter-se em altura de 35 e 40 grados para despues con los ayres frescos del polo antartico poder a su plazer doblar el Cabo de Buena Esperança, Y desta maniera van mas ciertos e ahorram mucho camino mas, que com el que antes levavam..." [1].

De algumas dessas expedições há referências ou suspeitas em estudos brasileiros e portugueses. Outras são bem conhecidas, como a de Cristóvão Jacques.

Incontestável, porém, é que em 1530, d. João III, a expensas da fazenda real, organizou e enviou expressamente um esquadra à costa do Brasil, composta de cinco navios [2], com cerca de 400 homens, inclusive capitães, alguns fidalgos, equipagem, pilotos, mestres, guarnição militar, pessoal de intendência, intérpretes, alguns degradados, e cujo comando foi confiado a Martim Afonso de Souza. Um dos capitães de navio nessa esquadra foi Pero Lopes de Souza, irmão mais moço do comandante supremo, e autor de um Roteiro dessa navegação, Roteiro descoberto por Varnhagen nos Arquivos de Lisboa e publicado pelo Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro (Vol. 24, págs. 9 e seguintes), já bem divulgado e ainda ultimamente analisado na parte técnica, em dois volumes, pelo comandante Eugênio de Castro.

Por ele tornou-se conhecida de maneira certa a navegação de Martim Afonso de Souza desde Lisboa, de onde partiu a 3 de dezembro de 1530, até defrontar-se com o Cabo de Santo Agostinho, em Pernambuco, navegando depois ao longo da costa Sul do Brasil.

Possivelmente d. João III deu instruções escritas sobre os fins principais dessa expedição armada [3]. Foram sempre minuciosos, abundantes, longuíssimos os regimentos organizados pelo governo português para todas as suas empresas. É possível que também tenham sido dadas instruções, provavelmente secretas, a Martim Afonso, mas que até hoje não foram divulgadas ou encontradas.

Para a navegação de Martim Afonso de Souza só foram registradas três breves cartas régias. São conhecidas e podem ser lidas na íntegra na Revista do Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro, vol. 24, págs. 74 a 78, ou na História da Colonização Portuguesa no Brasil, vol. 3º, págs. 159-160.

Vão adiante, quase que na íntegra, transcritas e analisadas as suas disposições, para melhor compreensão e mais fácil exame por parte dos que se interessam pelo assunto, inda que o seu estilo pesado seja enfadonho.

Não vou fazer a biografia de Martim Afonso de Souza, nem julgar o seu governo na Índia; e, por mais interessantes que sejam essa vida e esse governo, não têm aqui cabimento. Pretendo apenas examinar os seus feitos em S. Vicente nessa única vez que em S. Vicente esteve.

Alguns escritores, aliás de subido valor, entendem que os poderes outorgados a Martim Afonso de Souza, nessas três cartas régias, foram imensos e até discricionários em relação ao Brasil. Ouso discordar dessa opinião.

Em nenhuma dessas três cartas régias, datadas de Castro Verde a 20 de novembro de 1530 e assinadas por d. João III, é Martim Afonso nomeado, ou mesmo indicado, governador do Brasil.

Na primeira carta régia (para facilidade das citações assim designo aquela em que foi nomeado capitão-mor da esquadra), e que é chamada a dos grandes poderes, d. João III logo no princípio diz:

"Fasso saber que eu envio ora a Martim Afonso de Souza do meu conselho por capitão-mór da armada que envio a terra do brasil e assim de todas as terras que ele dito Martim Afonso na dita terra achar e descobrir"...

Como aí se lê, Martim Afonso é "enviado" por capitão-mor de uma armada que é "enviada" à "terra do Brasil e assim de todas as terras que ele achar e descobrir nas ditas terras".

O seu capitaneato-mor é concedido sobre a esquadra, assim o diz  carta régia de nomeação; as palavras seguintes "terra do brasil e assim de outras terras que ele achar e descobrir" indicam sem dúvida alguma, e apenas, o destino da frota e o intuito de novos descobrimentos, nessa época de descobrimentos.

É o que também afirma o próprio Martim Afonso quando, na Relação de sua vida e obra, apresentou à rainha d. Catarina, regente de Portugal [4]: disse inequivocamente que... "D. João III por ter novas que no Brasil havia muitos franceses me mandou lá com uma armada para os combater", "assim nisto como no descobrimento de alguns rios"... Desejava o rei, talvez, que fosse explorado e descoberto pelos portugueses o Rio da Prata. Terras do Brasil designavam uma parte do mundo como terras da África designavam outra.

Mesmo para as terras novamente achadas na dita terra do Brasil, mesmo para os rios a descobrir, não é ele nomeado governador.

O rei continua, em seguida, na sua primeira carta régia:

"mando os capitães da dita armada e fidalgos cavaleiros escudeiros gentes darmas pilotos mestres mareantes e todas outras pessoas que na dita armada forem e assim a todas as outras pessoas e a quaisquer outras de qualquer qualidade que sejam que nas ditas terras que ele descobrir, ficarem e nelas estiverem ou  ela forem ter, por qualquer maneira que seja, que haja ao dito Martim Afonso de Souza por capitão-mór da dita armada e terras e lhe obedeçam em todo e por todo o que lhes mandar e cumpram e guardem seus mandados assim e tão inteiramente como se por mim em pessoa fosse mandado sob as penas que puzer as quais com efeito dará a devida execução nos corpos e fazendas daqueles que o não quizer cumprir".

Aí repete ainda, e determina também, que não só todos que iam na armada, como também todas as pessoas, de qualquer qualidade, que nas ditas terras que ele descobrisse, nela estivessem, nelas ficassem ou a elas fossem ter por qualquer maneira, obedecessem  Martim Afonso por capitão-mor da dita armada e das terras que descobrisse e cumprissem as suas ordens, como se fossem dadas por ele próprio rei, sob penas que ele pusesse nos corpos e nas fazendas.

Sobre as pessoas da armada e sobre os seus vassalos compreendem-se esses poderes; e extraordinário seria que, com a nomeação do capitão-mor da armada, não pusesse o rei sob sua obediência todos os que tomassem parte na expedição. Mas sobre as outras pessoas, que nas ditas terras descobrisse, nelas estivessem, a elas fossem ter ou nelas ficassem, tais poderes seriam vãos, porque tais pessoas poderiam ser súditos do próprio rei de Espanha, com quem tinha sido feito o Tratado de Tordesilhas, ou súditos de outros reis que nenhum interesse tinham em respeitar o Tratado de Tordesilhas, ou melhor, que não o queriam reconhecer, numa época em que as terras novamente descobertas pertenciam aos mais ousados, que delas tomassem posse e as defendessem. Além desses, lá poderiam estar nativos em certo grau de civilização - como os incas no atual Peru, nada se sabia ao certo -, sobre os quais nenhuma autoridade poderia exercer o capitão-mor da armada por delegação do rei de Portugal, a não ser pela violência e pela conquista, se para isso tivesse forças.

A carta régia fala sempre que tais poderes eram dados sobre as pessoas que estivessem ou ficassem "nessas terras que ele novamente descobrisse e achasse", poderes sem valor, sob condição casula, sobre terras indeterminadas, que poderiam, portanto, não ser achadas ou descobertas.

Note-se que a delegação de poderes a Martim Afonso de Souza é feita sobre o pessoal da esquadra e sobre os que estivessem "nas terras que ele descobrisse". A carta régia repetiu sempre as duas frases - "capitão-mor da esquadra" e "terras que ele descobrisse".

Para execução dessas ordens, acrescenta a carta régia:

"além disso lhe dou todo o poder e alçada e mero e misto império assim, no crime como no civel sobre todas as pessoas assim da dita armada como em todas las outras que nas ditas terras que ele descobrir, viverem e nelas estiverem ou a ela foram ter por qualquer maneira que seja, e ele determinará seus casos feitos assim crimes como civeis e dará neles aquelas sentenças que lhe parecer justiça conforme direito e minhas ordenações até morte natural inclusive, sem de suas sentenças dar apelação nem agravo que para todo o que dito é e tocar a dita jurisdição lhe dou todo o poder e alçada na maneira sobredita"...

O mero e misto império, que pelo obsoleto das palavras pode impressionar, não era um poder extraordinário. Muitos vassalos de Portugal continental, além das mercês de juros, de tenças, de saboarias etc., com as terras concedidas, já o possuíam e de longa data. O próprio d. João III já o havia concedido a Fernão de Miranda, como já o tivera seu pai Antônio de Miranda, ao conde de Tentugal, assim como o tiveram Rui Vaz Coitinho e João Rodrigues Coutinho, que não foram comandantes de esquadra (Anais de frei Luís de Souza, vol. 1º, págs. 81 e 169). Era um mercê usual no reino, que nada tinha de discricionária, pois que deveria ser exercida de acordo com as ordenações, como poder judiciário (vide Elucidário de Viterbo - Verbo Cutelo)

Esses poderes deram a Martim Afonso a faculdade de determinar os feitos cíveis e de devassar delitos, de impor penas pecuniárias e de morte natural, sem apelação nem agravo. Foram grandes os poderes, porém limitados, pois que só seriam exercidos de acordo com o direito e comas Ordenações, o que lhes retirava o caráter de discricionários.

Além do limite da submissão ao direito e às Ordenações do Reino, quer dizer, aos princípios jurídicos, ao processo e às penas marcadas, estabelecia outros como se vai ver, e estes importantes.

A primeira Carta Régia continua, sem seguida:

"... porém se alguns fidalgos que n dita armada forem, e n dita terra estiverem ou viverem, e a ela forem, cometerem alguns casos crimes por onde mereçam ser presos ou emprazados ele dito Martim Afonso os poderá mandar prender ou emprazar, segundo a qualidade de suas culpas o merecer, e m'os enviará com os autos das ditas culpas para cá se verem e determinarem como for de justiça porque nos ditos fidalgos no que tocar nos casos crimes hei por bem que ele não tenha a dita alçada".

Está aí expressamente declarado, o que importa restrição, que quanto aos fidalgos, que na armada fossem ou por qualquer razão estivessem na terra, as atribuições de Martim Afonso, nos casos crimes, eram preventivas, preparatórias, só podendo prender e emprazar [5] mandando-os com os autos para lá, em Lisboa, se ver e determinar. Mesmo esse "emprazamento" dos fidalgos lhe era retirado, no fim da carta régia, numa espécie de adendo, em que expressamente se declarava

"no que toca a emprazamento dos fidalgos que em cima hei declarado, por alguns justos respeitos, hei por bem que o dito Martim Afonso os não empraze e quando fizerem tais casos por onde mereçam pena alguma crime, ele os prenderá e m'os enviará presos com os autos de suas culpas para se nisso fazer o que for de justiça".

Ordenava ao capitão-mor da armada "que meta nas terras padrões e em seu nome tome delas (posse)", que não é um poder, mas uma ordem.

Autorizava mais se o

"dito Martim Afonso 'em pessoa' for a algumas partes ele deixará nas ditas terras, que assim descobrir, por capitão-mor e governador em seu nome a pessoa que lhe parecer que o melhor fará ao qual deixará por seu assinado os poderes de que há de usar, que serão todos aqueles ou aquela parte destes nesta minha carta declarados".

Aí não é Martim Afonso nomeado governador, apenas autorizado a deixar por capitão-mor e governador uma pessoa competente, nas terras que ele Martim Afonso descobrisse, os quais teriam todos ou parte dos poderes declarados na Carta Régia, e que já foram aqui analisados. Por onde se vê que ele não poderia dar mais do que o que tinha recebido.

Nessa primeira carta régia, e que é a dos grandes poderes outorgados a Martim Afonso de Souza por d. João III, encontram-se expressos os poderes concedidos ao comandante da esquadra exploradora e ao capitão-mor "das terras que descobrisse nas terras do brasil", sendo de notar que alguns desses poderes foram restringidos e outros até suprimidos no fim do documento que se analisa.

Todas as mais palavras aí escritas:

"porque para isso lhe dou especial e todo o cumprido poder como para todo ser firme e valioso requererem e se para mais firmeza de cada uma das cousas sobreditas (SIC) e serem mais firme e se cumprirem com efeito e necessário de feito ou de direito nesta minha carta de poder irem declaradas alguma clausula ou clausulas mais especial e exuberantes eu as hei assi por expressas e declaradas como si especialmente o fossem, posto que seram tais e de tal qualidade que de cada um delas por direito fosse necessário se fazer expressa menção e porque assim me de todo praz mandei disso passar esta minha carta ao dito Martim Afonso",

são frases tabelioas, que nada acrescentam de expresso ou de especial; ao contrário, há nelas o cuidado de se declarar sempre, que esse fraseado fastidioso se refere a cada uma das cousas sobreditas, o que vale apenas por uma repetição dos poderes já concedidos, e que, por essa razão, nenhum poder novo delegam.

Para se verificar que não eram amplos os poderes concedidos, nessa primeira carta régia, a dos grandes poderes, basta notar que, na mesma data, foram expedidas mais duas outras cartas régias, em uma das quais autorizava o capitão-mor da armada a nomear tabeliães e escrivães e na outra a conceder sesmarias das terras que descobrisse.

Inútil seria, e vão, fazer mais duas cartas régias para outorgar poderes para nomeação de tabeliães e para conceder sesmarias a quem já os possuísse imensos, discricionários, a quem já tinha todos os poderes. Nada se dá ou se acrescenta a quem já tudo possui. Se, então, foi julgado necessário acrescentar mais esses dois poderes, descritos nas duas outras cartas régias - nomeação de tabeliães e concessões de sesmarias - foi sem dúvida alguma, por não estarem eles incluídos na primeira.

Por essa transcrição da carta régia se vê que não foram imensos e muito menos discricionários os poderes concedidos.

Esses poderes foram, em suma, a meu ver, os grandes poderes que se delegavam (ou a que se arrogavam em alto mar) aos comandantes de esquadras descobridoras de terras em mares ignotos.

Na segunda carta, o rei o autoriza a criar para governança da terra dois tabeliães, os quais deveriam seguir logo na frota, pós deixar os seus sinais públicos na chancelaria real; e autoriza mais, depois da chegada na dita terra, se lhe parecesse necessário para governança dela,  criar maior número de tabeliães e oficiais de justiça. A expressão "para governança" da terra não nomeia governador, nem dá poderes para governá-la.

A autorização, como se vê, ficou restrita para criar dois ou mais tabeliães e oficiais de justiça, que fossem necessários.

A criação desses tabelionatos se relacionava com os interesses dos que estavam ou quisessem ficar na terra do Brasil. Aliás, a permanência de Martim Afonso na terra do Brasil deveria ser muito passageira, pois que d. João III já o autorizava também a nomear substituto, deixando a seu critério voltar logo ou não, como ainda se lê n carta que a ele escreveu por João de Souza [6].

É verdade que, nas cartas de concessão de sesmarias, o escrivão, que as lavrou, chama a Martim Afonso de governador das terras do Brasil, e Pero Lopes de Souza, no princípio de seu Roteiro, também assim o denomina. Mas não tendo nenhum deles autoridade para nomear governador, o uso dessa expressão mostra apenas lisonja ou deferência para com o comandante da armada exploradora e tolerância por parte deste.

Mas há também a acrescentar, que foram ainda restringidos os supostos imensos poderes de Martim Afonso de Souza sobre as terras do Brasil e sobre aquelas que descobrisse, se se prestar atenção ao que na carta que d. João III escreveu em resposta a esse seu capitão-mor, por João de Souza, a 28 de setembro de 1532 (História da Colonização Portuguesa no Brasil, vol. 3º, pág. 161). Aí diz textualmente:

"Depois de vossa partida se praticou, se seria meu serviço povoar-se toda esta costa do Brasil, e algumas pessoas me requereram Capitanias em terras dela. Eu quisera antes de nisso fazer cousa alguma, esperar por vossa vinda para com vossa informação fazer o que bem me parecer, e que na repartição, que disso se houver de fazer escolhais a melhor parte; e, porém, porque depois fui informado, que de algumas partes faziam fundamento de povoar a terra do dito Brasil, considerando eu com quanto trabalho se lançaria fora a gente que a povoasse depois de estar assentada na terra e ter nelas feito algumas forças, como em Pernambuco já começaram a fazer, determinei de mandar demarcar de Pernambuco até o Rio da Prata cinqüenta léguas de costa a cada capitania e antes de se dar a nenhuma pessoa mandar apartar para vós 100 léguas e para Pero Lopes, vosso irmão, 50" ... "como vereis pelas doações que logo mandei fazer".

Já aí se vê que foi, pois, após a partida da esquadra de Martim Afonso, que se praticou se seria serviço do rei povoar a terra e se pensou na repartição da costa do Brasil em capitanias.

Apesar de declarar que nada queria fazer sem informação de Martim Afonso, com o desejo de lhe marcar o melhor quinhão, o rei pretendeu desde logo, antes mesmo da volta do capitão-mor, fazer doações dessas capitanias a outras pessoas, o que, sem sombra de dúvidas, ainda diminuía os limitados poderes, diminuindo a área sobre a qual seriam eles exercidos.

Martim Afonso já não teria a seu dispor toda a costa do Brasil, mas nela apenas uma donataria, com mais companheiros, que seriam os outros capitães-donatários nela aquinhoados. E, note-se desde já, com mais extensos e mais expressos poderes que os que havia recebido o capitão-mor da armada de 1530, como se pode verificar pelo confronto das doações de capitanias e dos forais dos donatários com as cartas régias de nomeação do comandante da frota de 1530.

Na falta de conhecimento de outras instruções, escritas ou verbais, dadas a Martim Afonso de Souza, somente pelo que ele executou ou tentou executar na América, se poderão deduzir quis os objetivos da esquadra de 1530.

É o que vou procurar fazer lendo o Roteiro de Pero Lopes de Souza, que em companhia de seu irmão, o comandante, fez toda essa navegação.

Partida de Lisboa a 3 de dezembro de 1530, esteve a esquadra nas alturas do Cabo de Santo Agostinho a 31 de janeiro de 1531. Chegado às águas brasílicas, Martim Afonso de Souza percorreu a costa d América do Sul diretamente, e indiretamente por seus capitães, desde o Norte, até onde chegou Diogo Leite, e ao Sul até certa altura do RIo da Prata pela exploração feita por seu irmão Pero Lopes de Souza.

Combateu e apresou naus e marinheiros franceses, que carregavam brasil, incorporou-os à sua esquadra, desmantelou feitorias que os franceses por aí já tinham conseguido estabelecer.

A 30 de abril de 1531 a esquadra estava "com a boca do Rio de Janeiro, em cuja baía entrou". Aí, onde mandou fazer casa forte, se deteve três meses. Estando aí, Martim Afonso de Souza mandou

"quatro homens pela terra a dentro, foram e vieram e andaram pela terra 115 léguas, delas 65 foram por montanhas muito grandes e 50 por campo mui grande e foram dar com um rei senhor de todos aqueles campos e lhes fez muita honra e veio com eles, e trouxeram muito cristal e deu novas como no Rio Paraguai havia muito ouro e prata".

Procurava minas. De posse dessas vagas informações, da baía do Rio de Janeiro a esquadra partiu a 1 de agosto de 1531, diretamente à Cananéia, onde chegou a 12 desse mesmo mês. Em aí chegando, fez explorar a região por Pedro Annes, piloto da sua armada e língua da terra. Ao cabo de 5 dias voltou Pedro Annes trazendo em sua companhia Francisco de Chaves, mais o bacharel e cinco ou seis espanhóis. Esse bacharel já aí se achava, segundo dizia, havia trinta anos [7].

Pelas informações obtidas, principalmente de Francisco Chaves, que se comprometera a voltar em 10 meses com 400 escravos carregados de ouro e prata, Martim Afonso de Souza, a 18 de setembro de 1531, fez partir de Cananéia pela terra adentro, em direção ao Rio Paraguai, uma força composta de 40 besteiros e 40 espingardeiros sob o comando de Pero Lobo, ao todo 81 homens,  procurar as afamadas minas.

Em Cananéia, esteve 44 dias, continuando em seguida a derrota para o Sul. Essa viagem para o Sul até as alturas do Cabo de Santa Maria, em que se gastaram meses, foi realizada com imensas dificuldades, sofrendo muitas tempestades e tormentosos ventos, que dispersaram os navios da esquadra, já nas águas do atual Rio da Prata.

Nessas alturas, a 2 de novembro, Pero Lopes de Souza, segundo escreveu no seu Roteiro, donde tiro todas estas informações, teve notícia certa de que a nau capitânia havia naufragado, tendo se salvado o seu comandante, mas "perecendo seis pessoas afogadas e uma de pasmo".

Conseguindo, entretanto, reunir todos os sobreviventes nos navios salvos, Martim Afonso de Souza "tomou conselho com os pilotos e mestres e com todas as pessoas que para isso eram" e "todos acordaram e assentaram que ele, Martim Afonso, não deveria ir pelo Rio Santa Maria (Rio da Prata) arriba por muitas razões", sem dúvida por haver sido reconhecido que o Rio da Prata já havia sido descoberto pelos espanhóis e estava na demarcação destes pelo Tratado de Tordesilhas, ficando assentado que só Pero Lopes de Souza subisse o rio.

À vista desse concerto e determinação, Pero Lopes de Souza, a 23 de novembro de 1531, partiu Rio da Prata acima levando, em um bergantim, 30 homens, tudo em boa ordem de guerra; e, como pôde, explorou esse rio até os Carandis, onde meteu padrões portugueses, e como a ordem era de voltar em 20 dias, daí regressou a se reunir à esquadra.

Naturalmente fez observações astronômicas, naturalmente teve, ou já tinha tido, notícias das explorações nesse rio realizadas por Solis, por Caboto, por Diogo Garcia. Ele a respeito nada diz.

É fora de dúvida, segundo o Roteiro, que toda a esquadra retornou a Cananéia, de onde haviam partido para o interior do continente, em direção ao Paraguai, os 80 homens com Pero Lobo.

Em Cananéia demorou-se a esquadra 7 dias, sem ter tido notícias de Pero Lôbo e de sua expedição. Daí partiu para o porto de S. Vicente, onde surgiu, pela primeira vez, sob o comando de Martim Afonso de Souza, a 22 de janeiro de 1532, e onde foi deliberado que permanecesse "até ver recado da gente que tinha mandado descobrir pela terra  dentro" (R.I.H.G.B. vol. 24 pág. 67 - linha 10) [8].

Pela análise dos acontecimentos, em que tomou parte a expedição de Martim Afonso de Souza desde o cabo de Santo Agostinho, para o Norte e pra o Sul, pelo que ela fez, deduzo, e como deduzem outros cronistas, que a sua missão foi:

1º - Expulsar do Brasil os franceses que aí já começavam a se estabelecer, comerciando com os índios.

2º - Descobrir minas de ouro e prata e mais metais preciosos que se esperava existir, muito abundantes, mis a Leste das que os espanhóis se haviam apoderado, e que então desvairavam o mundo, excitando a cobiça geral.

3º - Reconhecer toda a costa e saber o que pertencia a Portugal, nos termos do Tratado de Tordesilhas. Esperava talvez d. João III que o seu domínio incluísse o Rio da Prata.

4º - Fortalecer civilmente e fortificar militarmente os diversos pontos na costa do Brasil, dentro da demarcação portuguesa, para assegurar os senhorios do rei de Portugal, e nelas estabelecer postos de ocupação, cravando padrões portugueses de posse.

Os trabalhos de Martim Afonso de Souza foram grandes e neles "passou muitas fomes e muitas tormentas e por derradeiro lhe dar um tão grande que se perdeu a nau, em que ia, e escapou em uma taboa" [9]. Os seus resultados, porém, foram nulos, ou quase. Martim Afonso, não há dúvida, fez o que pôde, e tudo por ordem e conta de d. João III; mas o que fez foi incerto, precário e pouco duradouro.

Os franceses, negociantes de pau-brasil, foram expulsos então, mas continuaram esse tráfico com os indígenas, e pouco depois chegaram a fundar a França Antártica no RIo de Janeiro e a se estabelecer no Maranhão.

No reconhecimento da costa da América portuguesa, pouco adiantou ao que já se sabia ou suspeitava, continuando tudo mais ou menos atrapalhado. É verdade que mandou pôr padrões portugueses no Rio da Prata, os quais, porém, não permaneceram. Mas é verdade, também, que o rei, que escrevera pretender conceder capitanias desde Pernambuco até o Rio da Prata, quando fez a distribuição, em 1534, já não incluiu o Rio da Prata nos seus domínios, dando apenas, ao Sul, indeterminada fronteira à de Pero Lopes de Souza.

Na própria distribuição das capitanias de "S. Vicente" e de "Santo Amaro" ao comandante da esquadra e ao autor do Roteiro da expedição, as informações geográficas obtidas foram tão incertas e confusas, que originaram intermináveis demandas judiciais, entre os herdeiros desses dois navegadores, causando-lhes dificuldades e prejudicando enormemente o desenvolvimento da colônia.

As minas de ouro não foram descobertas, nem descoberto caminho para elas, não recebeu recado da gente que mandara a descobrir pelo sertão adentro. Apesar disso, no sertão, e naquele tempo, mesmo as más notícias andavam lentamente, mas sempre andavam. De índio a índio, de tribo a tribo, de aventureiro a aventureiro, Martim Afonso veio a saber que a expedição de Pero Lôbo - comandante dos 80 homens - havia sido completamente trucidada pelos carijós próximo à foz do Rio Iguaçu no Rio Paraná.

Esse mau sucesso é narrado nos Comentários de Cabeça de Vaca à viagem que fez, por terra, de Santa Catarina a Assunção em 1541 (R. I. H. G. B., vol. 56, pág. 218, parte 1ª) e é ele confirmado num requerimento dirigido ao capitão-mor Jerônimo Leitão, a 10 de abril de 1585, pela Câmara de S. Paulo, em que se refere à matança dos 80 homens de Martim Afonso (Livro de Atas, vol. 1º, pág. 276). Câmara que, sem a menor sombra de dúvida, não leu os Comentários de Cabeça de Vaca, e nem deles jamais teve conhecimento.

Nesse mesmo requerimento, a Câmara informou também que Martim Afonso de Souza, quando se foi desta terra, deixou determinado a Pero de Goes e a Ruy Pinto que levassem a guerra a esse gentio carijó, que vagava ao Sul, guerra que eles, entretanto, não fizeram, conforme se vê na ata citada. Nessa expedição temerária e infeliz, perdeu Martim Afonso de Souza um quinto do seu pessoal, 81 homens em 400.

Não fortificou militarmente as feitorias portuguesas estabelecidas por iniciativa particular na costa do Brasil, nem dispunha de meios para o fazer. Não fundou vilas, nem tinha poderes para as fundar, como adiante veremos, apesar das referências de Pero Lopes de Souza, tendo apenas nomeado tabeliães e concedido sesmarias de terras, que, evidentemente, nessas feitorias, criaram laços civis com a metrópole.

Durante a sua permanência em S. Vicente, desde 22 de janeiro de 1532 até meados de maio de 1533, onde esteve a esperar recado da expedição de Pero Lobo, conforme o dizer de Pero Lopes de Souza, daí fez, provavelmente, partir outras expedições pelo sertão à procura de minas de ouro, conforme narram cronistas espanhóis, com grandes erros cronológicos. O seu intuito foi, a meu ver, descobrir e apossar-se a Leste, do ouro que Cortez e Pizarro tinham encontrado a Oeste.

Desiludido quanto ao descobrimento das minas, resolveu voltar para Lisboa.

A sua presença e a de sua esquadra deram algum movimento a S. Vicente. Quando partiu de S. Vicente para Lisboa, onde chegou em meados de agosto de 1533, deixou, segundo dizem, Gonçalo Monteiro como capitão e substituto [10] e aí ficaram, sem dúvida, algumas pessoas da esquadra, conforme estavam autorizadas pela carta régia. Mas não foram muitas.

Não teria ele muita gente para deixar, e esta não era povoadora. Da sua esquadra, composta de 5 navios ao partir de Lisboa, segundo o Roteiro, mandou ele as duas caravelas - Rosa e Princesa - sob o comando de Diogo Leite a percorrer a costa Norte do Brasil, donde voltaram diretamente para Portugal.

A nau capitânia naufragou ao Sul, perto das águas do Rio da Prata. A 22 de maio de 1532 (R. I. H. G. B., vol. 24, pág. 67), fez partir para Lisboa Pero Lopes de Souza com as naus (no plural, o que quer dizer duas pelo menos), pois "gastadas como estavam pelo buzano e a gente do mar vencendo todo o soldo sem fazer nenhum serviço a el-rei, comendo os mantimentos da terra", não seria acertado permanecer nas costas do Brasil.

Há referências ao desgarro da nau S. Miguel, sob o comando de Heitor de Souza. É verdade que ele apresou três naus francesas e as incorporou à sua esquadra. Desses três naus, uma foi queimada, e outra foi destinada a João de Souza para levar a Lisboa ao rei de Portugal notícias da expedição. Incorporou à sua esquadra uma nau que ia para Sofala. É verdade também que João de Souza voltou em duas caravelas com a resposta de d. João III.

Restariam, pois, em S. Vicente, com Martim Afonso de Souza, dois ou três navios.

Calculando-se em 400 homens (pois que para 400 homens tomou ele mantimentos no Rio de Janeiro) o pessoal de sua armada, e dele se descontando os 7 mortos no naufrágio da capitânia e os 81 perdidos na expedição de Pero Lôbo, partida de Cananéia, restariam 312 homens.

Desses sobreviventes, a maior parte deveria ter guarnecido os navios que partiram para a Europa, como guarneceria com equipagem e com militares os dois outros navios, em que Martim Afonso regressou, que um chefe de expedição não poderia dispensar, nessas travessias perigosas, em mares infestados de inimigos, corsários e piratas.

A esquadra de Martim Afonso foi uma esquadra combatente que ao Norte pelejou bravamente com os franceses, "que estavam tomando pé nos senhorios do rei de Portugal", e que ao Sul foi explorar rios desconhecidos e descobrir terras inteiramente ignotas, em procura de minas, respeitando sempre os direitos de Castela, conforme recomendação instante. Não foi, portanto, e não poderia ter sido, uma esquadra povoadora.

O próprio d. João III, na carta que escreveu ao comandante da esquadra, a 28 de setembro de 1532, expressamente declara "depois de vossa partida se praticou si seria meu serviço povoar-se toda essa costa do Brasil" (Lugar citado). Só depois da partida de Martim Afonso é que se praticou sobre povoamento, com a distribuição de capitanias. E essa distribuição só foi feita em 1534, quando Martim Afonso já se achava na Índia.

Não trouxe essa esquadra mulheres, elemento indispensável para a estabilidade da família, condição para colonização e povoamento. Não se conheciam ainda bem as terras encontradas e não se sabiam quais as que se iam encontrar, não se sabia mesmo o que elas poderiam representar. Não há nenhum notícia de que trouxesse instrumentos agrários para cultivo. Não havia, pois, meios de semear nem esperanças de colheitas para consumo interno ou exportação e comércio, num tempo de raras e difíceis comunicações com a metrópole.

Convenceu-se ele que essas terras eram brutas, nas quais só havia a indústria extrativa do pau-brasil, com esperanças falsas de minas lendárias, terras habitadas por indígenas selvagens, nômades, cruéis e antropófagos, no mais baixo degrau da humanidade.

Naturalmente, e isso d. João III havia autorizado em sua carta régia, alguns desses homens, que vieram na armada, ficaram em S. Vicente, obrigados, ou atraídos pela possibilidade de descobrimento de minas, que num golpe os enriquecesse.

Martim Afonso de Souza, segundo as três cartas régias analisadas, foi, pois, nomeado capitão-mor de uma esquadra exploradora do achamento de Cabral e das terras que achasse e descobrisse. Não foi nomeado governador do Brasil, não trouxe meios para povoamento, não teve poderes para criar vilas, como se vai ver.

Como adiante mostrarei, ele nada fez pela sua Capitania de S. Vicente.


[1] Islário de Alonso de Santa Cruz, Cosmógrafo mayor del Imperador Carlos V, publicado por Franz R. Von Wiesser pág. 54 - Inspruck, 1908.

[2] Frei Luís de Souza fala em 7 navios; mas parece que relatando a expedição, muitos anos depois, inclui nela navios franceses apresados. Eugênio de Castro (vol. 1º, págs. 31 e 32) informa que foram 5: a nau Capitanea de 150 toneladas, nau S. Miguel de 125 toneladas, galeão São Vicente de 125 toneladas e duas caravelas, Rosa e Princeza.

[3] Jordão de Freitas, no seu trabalho na História da Colonização Portuguesa no Brasil, alude, em referências a um Regimento dado a Martim Afonso de Souza. Ainda não foi publicado tal regimento.

[4] Essa relação existe na Biblioteca de Coimbra e foi publicada pelo comandante Eugênio de Castro na sua obra Diário da Navegação de Pero Lopes de Souza, volume 2º, pág. 54 e seguintes, 2ª edição da Comissão Brasileira dos Centenários Portugueses de 1904. Foi tirada em 600 exemplares e é raríssima. Já a citei diversas vezes.

O Gabinete Português de Leitura do Rio de Janeiro tem um exemplar, do qual foi tirada uma cópia fotográfica, que possuo e agradeço. O diretor da Biblioteca da Universidade de Coimbra, sr. prof. Lopes de Almeida, prestou valiosas informações sobre essa Relação.

[5] Emprazar, quanto à jurisdição, significava citar alguém para que em dia e lugar comparecesse perante juiz de maior alçada a dar a razão das queixas, crimes ou capítulos de que fosse acusado. (Viterbo. Elucidário, verbo Emprazar).

[6] Carta que se acha transcrita na História Genealógica da Casa Real, por d. Antônio Caetano de Souza.

[7] A contagem do tempo e das distâncias, em todas as narrações dessa época, não devem ser levadas rigorosamente à risca, pelas informações dos náufragos ou degredados. Homens de pouca ou nenhum instrução encontrados em terras desconhecidas, vivendo entre selvagens durante muitos anos, sem pontos de referências, não poderiam marcar exatamente a demora de sua estada nas paragens visitadas. Computariam o tempo pelas estações do frio, de calor ou chuvas, que se sucedem ora se adiantando ora se atrasando.

Eles mesmos, pelo abandono, pelos sofrimentos, e mesmo de boa fé, tinham tendência a exagerar, de modo que o número de anos, que referem, deve ser sempre o aproximado, e, portanto, com erros para mais. Do mesmo modo, as distâncias por eles indicadas são "mais ou menos", pois que elas dependiam das estradas trilhadas, da rapidez com que se punham em marcha, das dificuldades nesta encontradas, das léguas percorridas, cuja extensão variava de povo a povo, e mesmo no próprio povo português.

[8] O episódio da ida de Tibiriçá desde o planalto até S. Vicente com 500 sagitários, tendo à frente João Ramalho, não encontra fundamento nos documentos que consultei; antes é contrariado por já haver nessa época moradores em S. Vicente. Já Ayres do Casal havia feito essa observação, na sua Corografia Brasileira.

[9] Vide Sumária descrição dos serviços de Martim Afonso, que se conserva na Biblioteca de Coimbra, publicada por Eugênio de Castro.

[10] Em 1560 havia em S. Vicente um vigário que se chamava Gonçalo Monteiro. Mas esse era "vigário e ouvidor eclesiástico em todas as capitanias de Santos e de Santo Amaro, pelo muito reverendo senhor dom Pero Leitão, bispo da cidade de Salvador da Bahia de Todos os Santos e comissário geral em toda a costa do Brasil, por el-rei, nosso senhor".

Foi perante ele que o requerimento do p. Luís da Grã se iniciou, a 22 de abril de 1560, n vila e porto de Santos, o processo por heresia contra João Cointa, senhor de Boulés. Nele depuseram muitas testemunhas, entre as quais Manoel da Nóbrega e José de Anchieta. O vigário absolveu o réu, tendo havido apelação para o bispo na Bahia, conforme se vê no processo publicado nos Anais da Biblioteca Nacional, v. 25, págs. 225 a 260.