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HISTÓRIAS E LENDAS DE SANTOS - IMPRENSA
A imprensa santista (24-B)

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Um dos primeiros jornais santistas, O Mercantil surgiu em junho de 1850, apenas um ano depois do pioneiro jornal Revista Commercial. A consulta à coleção no acervo da Biblioteca Nacional Digital permite de imediato verificar que ele começou a circular três meses antes do que supunham até então os pesquisadores. Surgiu em 8 de junho de 1850, inicialmente publicado aos sábados, sendo impresso na Typographia Imparcial (e não Imperial).

No início de 1851 já surgia duas vezes por semana, quarta-feira e sábado. No final deste segundo ano, porém, as dificuldades financeiras levaram o proprietário a vender a tipografia e transferir a impressão para a capital paulista. Sempre com quatro páginas, a exceção ocorreu na edição 5, de sábado, 6 de julho de 1850, que teve um suplemento de uma página publicado no dia seguinte, domingo, 7 de julho de 1850. O último exemplar no acervo é o de número 164, de 10 de julho de 1852, que aliás termina com um relato das perseguições enfrentadas, tanto políticas como comerciais.

 

Jornal O Mercantil, edição nº 36, de sábado, 4 de janeiro de 1851, página 1
Imagem: acervo da Biblioteca Nacional Digital

 

Jornal O Mercantil, edição nº 37, de quarta-feira, 8 de janeiro de 1851, página 1
Imagem: acervo da Biblioteca Nacional Digital

 

Jornal O Mercantil, edição nº 128, de 17 de janeiro de 1852, página 1
Imagem: acervo da Biblioteca Nacional Digital

 

Jornal O Mercantil, edição nº 164, de 10 de julho de 1852, página 1
Imagem: acervo da Biblioteca Nacional Digital

Jornal O Mercantil, edição nº 164, de 10 de julho de 1852, página 4
Imagem: acervo da Biblioteca Nacional Digital

 

CORRESPONDENCIA.

Ao publico

A brutal violencia, que entre mim acaba de praticar-se,obriga-me a recorrer a imprensa, não só para repelir o desaire que d'ahi me possa provir, e atenuar a impressão, que possa ter causado no animo das pessoas que de mim não tem cabal conhecimento, como por ser o jornalismo o unico refugio, que resta às victimas d'esta infrene actualidade, que entre nós veio inplantar o mais torpe e o mais deshonesto tranquebernista politico.

É sabido, senhores, que o Sr. Nabuco d'Araujo, com o fim de dar garrote na imprensa opposicionista de Sanctos, usou de taes artimanhas das mais perfidas promessas a ponto de deliberar-me a mudar o meu estabelecimento. É tambem sabido, que não me havendo eu prestado a ser do vil instrumento da senhor Nabuco contra o meu illustre amigo o Sr. Dr. Pacheco, encarregára a um misseravel caloteio, cujo nome faz ascro pronunciar, para escrever na sua infame Aurora uma diatribe contra mim. Tinha por fim este expediente a probabelidade de eu responder com assomo, e das minhas phrases tirar-se um pretexto qualquer para se cohonestar uma deportação, pois o reconhecimento que o Sr. Nabuco tinha feito do meu caracter incommodavo-o seriamente.

Córrem impressas, bem lidas e muito vulgarisadas as explicações que a este respeito dei no jornalismo. Desaffiei o Sr. Nabuco d'Araujo para que se explicasse, emprazei-o para que me desmentisse, mas a evidencia dos factos era tão flagrante e tão manifesta, que sua cobardia optou pelo silencio. Tambem eu optei pelo silencio e pelo desprezo, bem vingado da unanime reprovação com que o publico olhou para essa indignidade, tanto mais aggravante, quanto era elevada a posição que occupava o Sr. Nabuco d'Araujo.

Nunca mais, é verdade, fui aggredido pro esse infame pasquin chamado Aurora, que é sustentado pelos cofres da policia para deffender a criminosa administração do Sr. Nabuco d'Araujo, e esta vergonhosa situação que elle deixou; porem a Typographia Imparcial, estabelecimento de minha propriedade, continuou a ser o alvo da mais depravada e da mais deshonesta persignição. Tudo quanto a maldade pôde imaginar foi posto em pratica por essa ignobil gentalha, a quem o Sr. Nabuco assulava com dinheiros esbanjados dos cofres nacionaes.

Tudo fui soffrendo, e tudo desprezava porque não queria rebaixar-me a travar polemica com uma pandilha entre a qual ha dois homens, cuja qualidade......

Confiava eu em que esta brutal actualidade, que não se apoia em influencia de partido algum, teria de ser corrida e precipitada no charco d'onde sahira; e então o meu estabelicimento, que é o primeiro da provincia, continuaria a bem servir a publico como costumava, antes do Sr. Nabuco o ter scrcado do bem serias difficuldades.

Com o fim de vizitar este lado da Provincia, e escrever, longe do bulicio de uma capital, os primeiros volumes dos Mysterios do Rio de Janeiro, obra de alguma circunstancia, e que ha muito tempo premedito, realisei a minha sahida d'essa cidade, em pleno dia, havendome despedido com bastante antecedencia dos meus amigos e pessoas de minhas relações; e até fiz constar esta minha viagem nas duas folhas mais lidas na provincia.

Em Lorena recebi eu uma carta de pessoa de minha amizade, em que me participava, que um comedor das migalhas que esbanjara o Sr. Nabuco d'Araujo, se prestára a este e ás suas creaturas para dar uma denuncia contra mim ao Dr. Furtado, cuja má vontade contra mim é notoria.

Tambem se me communicava que o ditto Sr. Nabuco e herdeiros de sua perniciosa politica se haviam empenhado com o novo chefe de policia, para que me deportasse, mas este senhor não se prestou a uma tal vilania. desprezei estes avisos, porque repousava na minha consciencia, e porque julgava impossivel que a alucinação do Dr. Furtado chegasse a ponto de pronunciar-me, a mim, que desafio a quem quer que seja em todo o decurso da minha vida me apresente, com verdade, um unico facto que me seja desairoso, um unico facto que compromettesse o meu caracter de homem de bem, que não sabe cometter uma infamia, e que tem por timbre - quebrar, mas não torcer.

No dia 15 do corrente achava-me eu em Guaratinguita, quando inesperadamente a caza do meu illustre e prezada amigo o Sr. Dr. Lessa foi cercada por uma força militar commandada pelo digno commissionado do Sr. Nabuco, o celebre tentente Pimenta, homem universalmente odiado pelas suas escandalosas violencias, e que se tem distinguido em ser forte e insolente para com as fracos, timido e cobarde para os que repelem as suas desaforadas bravatas.

Felizmente não me achava em caza, e por um presentimento que não sei explicar, pude evitar ser ignominiosamente agarrado, e lançado na enxouvia, como esse barbaro tyranete havia ordenado.

Não contarei as crueis tribulações porque passei, os riscos de vida em que me vi, os frios, a fome e os trabalhos que supportei, errante, e quasi descalço por entre matos, que me erão desconhecidos, tendo por leito um chão humido, e por cobertura uma athemosphera fria e nublosa, bastarà dizer que, não obstante o premio de 500$000 rs. offerecidos heolo tal Pimenta, e a sua recommendação aos soldados de que - embora me deixassem o corpo, mas levassem para a cidade a minha cabeça espetada na ponta de uma bayoneta, eu pude atravessar essas sentinellas, e pôr-me fora do alcance de tanta preversidade.

Graças à generosa hospitalidade, que é proverbial entre os bons brasileiros, o meu actual homisio é bemaventurado, quanto póde ser um homisio. As tribulações e encommodos porque passei,- o jejum, as longas viagens por caminhos tortuosos e quasi não trilhados, uma grave erupção de pelle, todos estes encommodos me privam de ir quanto antes apresentar-me perante a justiça, a fim de arrancar a mascara aos meus persiguidores, buscar, até perante o throno de S. M. o Imperador, se tanto for precizo, uma reparação à criminosa violencia que contra mim se pratica. E tanto mais urgente é este reparação, quanto é attnedivel a minha qualidade de estrangeiro, estabelecido honestamente, venerando a augusta pessoa do Imperante, respeitando a lei, e por minhas taes quaes habilitações litterarias, e pela minha conducta irreprehensivel, gosando a estima de muitissimos dos mais imminentes carateres distinctos do paiz, o honrado com assento em mais de uma corporação litteraria, nunca dando em fim motivo a que se procedesse contra mim, como acabam de fazer esses desnaturados brasileiros, que se inculcam os amigos e protectores unicos dos portuguezes no Brazil, mas que os sacrificam e os perseguem, quando não se curvam submissos a seus deshonestos manejos.

Concluo pedindo ao publico e ás pessoas de minhas relações que se capacitem de que não ha nem o mais leve vislumbre de um motivo qualquer para se me formar um processo, e que acreditam que essa pronuncia, promovida por um creançola, e dada por um homem que nutre contra mim um rancor implacavel, como eu nutro por por elle o mais soberanno desprezo, é o parto monstruoso de uma vingança ainda mais monstruosa.

O que se pertende com toda esta vergonhosa patacuada é acabar com o Mercantil, folha em que exerço alguma influencia, e arruinar a typographia de minha propriedade. Para isso tem-se recorrido a todos os manejos ignobeis, e só proprios das creaturas do Sr. Nabuco d'Araujo. Esta violencia era o ultimo dado, jogado por esses trapaceiros, mas espero que perderão o jogo, porque a verdade é soberana, e eu escudado pela verdade heide triumphar do abysmo que me tem cavado esses torpes invejosos.

Aproveito esta opportunidade para desde já agradecer a todas as pessoas que setem interessado pela minha sorte. Agradeço em especial ás muitas pessoas que me tem prestado sua valiosa protecção nas crises porque acabo de pasar, e cujos nomes me comprazerei de publicar em tempo; e finalmente agradeço aos senhores redactores do Ypiranga a justiça que fizeram ao meu caracter; e o brado de indignação que ergueram contra a violencia de que sou victima.

F. M. Rapozo d'Almeida.


Expediente

São tantas e tão graves as defficuldades que temos esperimentado no restabelecimento do pessoal d'esta typographia, que nos vimos forçados a commeter tão extraordinarias faltas para com os nossos assignantes, e a tornar a folha hebdomadaria em quanto durar este estado excepcional, certos de que lhes será compensada esta falta; pois os nossos assignantes sabem apromptidão e actividade que este estabelecimento empregou até então no desempenho de seus deveres, e poderão avaliar se a culpa é por elle, ou pelas nojentas occorrencias da actualidade.


S. Paulo 1852 Typ. Imparcial.