Clique aqui para voltar à página inicialhttp://www.novomilenio.inf.br/santos/h0151b3.htm
Última modificação em (mês/dia/ano/horário): 05/12/03 12:49:10
Clique na imagem para voltar à página principal

HISTÓRIAS E LENDAS DE SANTOS - Clubes/navegação
Clube do Leme (4)


Muitas histórias - além de causos verdadeiros ou não - foram contadas nas reuniões do clube. Alguns desses relatos foram registrados pelo caderno Marinha Mercante em Todo o Mundo (publicado semanalmente no jornal O Estado de São Paulo), em matéria do dia 1º de junho de 1982:

Clube do Leme homenageou Paschoal Manzioni (E), James Conway, José Campinho, Edmundo Valente, Berenguer, Aquiles Greca, Alberto Rebouças, Charles Edwards, Antonio Juliano e Naimo Aun (D)
Foto publicada com a matéria

No Clube do Leme, uma homenagem aos antigos membros da comunidade marítima de Santos

Mais de quatro séculos de experiência em navegação foram lembrados terça-feira passada no Clube do Leme, em Santos, durante o Jantar das Recordações, que homenageou antigos membros da comunidade marítima local e teve até o flautista Carlos Poyares e seu conjunto, lançando o LP "Seresta à moda antiga".

Dez pessoas de destacada atuação no setor e hoje aposentadas ou atuando em setores correlatos foram homenageadas com troféus e - por iniciativa de Irênio Jácomo de Araújo - convidadas a se tornarem sócios vitalícios do clube, participando automaticamente de todas as promoções que forem realizadas pela entidade.

Os quatro séculos (na verdade, 422 anos) compreendem a soma dos períodos de atividade dos homenageados na área marítima: Naimo Aun, da Fepasa, 31 anos; Edmundo Valente, da Mormack e Netumar, 47 anos; Alberto Rebouças, da Delta Line, 55 anos; José Campinho, da Serrana, 37 anos; Charles Edwards, da Dickinson, 49 anos; Achiles Greca, da Delta Line, 62 anos; José de Menezes Berenguer, da Cia. Docas de Santos, 53 anos; Antonio Juliano, da Delta Line, 42 anos; Paschoal Manzioni, da Expresso Federal, 43 anos; e James Patrick Conway, da Grieg e Conway & Ashby, 41 anos.

CDS e Fepasa - Convidados a falar sobre as atividades, os homenageados em alguns casos preferiram omitir-se, enquanto outros contaram casos curiosos e pitorescos, animando assim o jantar.

Dois dos homenageados não pertenceram diretamente à classe dos agentes marítimos, mas em atividades coligadas contribuíram para o seu desenvolvimento, como é o caso de Naimo Aun, da Fepasa, e de José de Menezes Berenguer, da Cia. Docas de Santos.

Naimo contou ter começado como estudante em 1948 na então Estrada de Ferro Sorocabana, atuando como engenheiro ferroviário durante 31 anos, 18 dos quais em Santos como superintendente regional da hoje denominada Ferrovias Paulistas S.A. (Fepasa), e terminou sua carreira como diretor comercial e de operações da empresa em 1979, quando houve a transição de governo. Hoje trabalha como consultor técnico da DNS Consultores S.A. "Prefiro falar das amizades que consegui no passar dos anos", lembrou todavia.

José de Menezes Berenguer contou rapidamente sua história, omitindo as inúmeras condecorações recebidas, entre outros detalhes: "Sou baiano, e não esperava vir a este porto, mas um belo dia recebi um convite de um antigo colega, que aqui trabalhava, na seção de eletricidade da CDS, e que me chamava para ser seu auxiliar direto".

"Aqui chegando - continuou -, bebi água da Biquinha de Itororó (que dizem que quem bebia não deixa a cidade jamais) e deu que enquanto vivi 17 anos na Bahia, já estou aqui em Santos há 53 anos. Fui subindo de cargo, e durante 26 anos assumi o comando do porto. Tenho agora tanto saudade do trabalho que fiz como do convívio com todos. Agora que estou aposentado, em casa, é que vejo quantos amigos criei. Foi uma satisfação muito grande participar desta reunião".

James Conway divertiu os participantes do jantar,
contando como antigamente era mais fácil ganhar dinheiro
Foto publicada com a matéria

Oito histórias - Charles Edwards contou diversos casos de sua vida, que representa em parte a própria evolução da representatividade dos agentes de navegação santistas através de entidades especializadas: "Comecei em 27 de julho de 1927 e me aposentei após 49 anos de função, na Dickinson. Tivemos muita luta, principalmente na época antes da revolução (de 1964). As greves eram constantes, inclusive havia aquela organização que abrangia todos os sindicatos (o Fórum Sindical), parava-se o porto de Santos por completo".

"Numa dessas greves, tinha um vapor no porto, e nele uma senhora doente precisava de remédio, e nas farmácias não era encontrado, foi difícil consegui-lo".

"O Centro de Navegação Transatlântica de Santos foi o primeiro que conseguiu sua sede própria, levamos dois anos para comprá-la, com muita luta e sacrifício. Era um centro muito ativo e agressivo, lutou muitos anos e, com a ajuda do dr. Neiva e do dr. Boulhosa (assessores jurídicos), conseguiu alguns resultados favoráveis que nem o Rio de Janeiro conseguiu".

"O projeto 850 foi o mais batalhado - dava o direito de entidade estivadora para os sindicatos. Fomos contra o projeto, tivemos reunião com o então governador de São Paulo, Carvalho Pinto, com o presidente do Supremo Tribunal Federal, com Tancredo Neves, e vendo a possibilidade das agências perderem esse direito, fundamos com grande sacrifício a Associação Profissional das Entidades Estivadoras de Santos (Apees)".

Charles Edwards recordou também o trabalho de Jorge Figueiredo, primeiro presidente da Apees, e acrescentou: "Fundamos o nosso sindicato, e conseguimos também da Apees a questão dos limites de contribuição, sendo o resto devolvido às agências. Após a revolução, passou-se um período de paz e sossego, não houve mais tumultos, paralisações. Tenho notado entretanto que algumas das reivindicações dos sindicatos estão voltando neste ano. Nossas exportações aumentaram, com navios sofisticados, requerendo mais técnica por parte da nova geração, à qual rendo meus parabéns".

James Patrick Conway, com muito bom humor, começou: "Fugi do colégio aos 14 anos, porque meu pai havia falecido, e achei que devia ajudar minha mãe. Fui procurar um emprego, comecei atendendo telefone. O número do telefone era 174 (palpite para amanhã). Tinha uma coleção de selos e moedas que meu pai me deu. Trabalhando com um inglês, ele me deu uma máquina de escrever, aprendi a escrever à máquina. Fui convidado a ir para o LLoyd's Register, fazer certificados de vistoria. O inglês me dava 10, eu fazia 20. Aos 21 anos, fiquei chefe do Lloyd's, e fui encarregado de navegação.

"Um belo dia, um grande amigo nosso, pai do Alex Grieg, pôs anúncio no jornal. Eu me candidatei, pedi para falar com ele. Era em 1937, e havia uma reunião no Centro de Navegação Transatlântica, em Santos, em cima do Café Carioca. Lá conheci o Grieg. Conclusão: fiquei secretário particular de Alex Grieg, o pai. Hoje estou felicíssimo, por rever velhos e novos amigos.

"No porto, antes era tudo tão fácil, hoje é tudo tão difícil. Hoje se ganha um dinheiro suado, antigamente era mais fácil. Tenho pena de vocês: são uns sofredores".

James Conway deixou a Grieg no início da década de 1960, formando a empresa Conway & Ashby, com Vernon Sharp Ashby, também saído da Grieg e hoje em agência marítima própria, além de Pedro Porto de Oliveira. Em 1978 se desligou, formando as empresas Miller Conway & Cia. Ltda., comissária de despachos, e Tradutec Traduções Técnicas e Comerciais S/C Ltda.

Achiles Greca, nascido em São Paulo, e atualmente freqüentador do Clube de Pesca de Santos, conta ter começado na Delta Line em 1926. "Parei com os estudos à noite no Ginásio Santista. Permaneci na Delta Line até 1978, foram 52 anos só nessa empresa. Quando comecei, o nome da agência era America Steamship Line, passou para Delta Line mais ou menos em 1942/1943. A America Steamship Lines atendia como agência duas linhas: a America Republic Line, ou Linha do Atlântico, absorvida pela Monson Line, hoje Moore McCormack; e a Gulf Brazil River Plate Line, que se transformou em America Delta Line, cujo armador era America Steamship Line. A vida na navegação comercial nos proporciona as coisas mais extraordinárias, todos os dias. Me sinto muito honrado de estar presente nesta reunião, com vocês, jovens".

Alberto Dias Rebouças começou na navegação em 1922, na cabotagem, na Modesto & Cia., passando em 1924 para a Delta Line, onde permaneceu, aposentando nessa empresa em 1977. O troféu do Clube do Leme foi o segundo que recebeu em sua vida: o primeiro foi no tamboréu, como conta.

Convidado a falar na reunião, disse apenas: "Neste ambiente marítimo, não vejo ondas, dúvidas, nada. Apenas queria dizer que encontrei aqui velhos amigos, velhos companheiros de lutas, estou satisfeito, e espero continuar participando dessas festas. Aos novos, peço licença para contar que um gerente meu, quando encontrava alguma coisa errada, dizia: "A primeira coisa a fazer é consertar, para depois saber quem errou".

Antonio Juliano fez de público apenas um agradecimento, mas depois contou ter começado em 1936, aposentando-se em abril de 1977, após mais de 40 anos de navegação. Começou, entretanto, na área de frutas da Fischer & Cia. Como falava inglês, foi em 1936 para a Delta Line, onde permaneceu até aposentar-se. Seu serviço era praticamente de cais, de tráfego, e como procurador - "o homem que trabalhava na sombra".

"Estive nos EUA em 1966, no vapor Del Sud, numa viagem de 45 dias, visitando todos aqueles portos, e sendo sempre bem recebido, graças às amizades que havia feito. Nasci em 1911 na Itália, embora meus pais tenham casado no Brasil. Vim de lá com oito meses de idade. Durante a II Guerra, porém - e apesar de por coincidência ser italiano - nunca tive problemas, devido à confiança que tinham em mim. Toda minha família é brasileira. Hoje sou violinista, é meu hobby".

Edmundo Valente também contou sua história: "Comecei em navegação exatamente em 20 de março de 1929, e tenho agora o grande prazer de ter presente neste jantar o meu primeiro chefe, Paschoal Manzioni. Fiquei na Expresso Federal 10 anos, no tempo dos navios de guincho a vapor (era aquele barulho); quando os caminhões não entravam no costado dos navios, e o café era o principal produto exportado (daí a expressão café de rua). Tive o prazer de conhecer Alex Grieg, que ajudou a abrir a Moore McCormack, onde fiquei vários anos, em vários setores. Depois trabalhei na Agência Luma, dois anos, e na Agência Netumar (dois anos), e após 47 anos e cinco meses larguei de vez.

"Fui do tempo em que não havia férias, sábado inglês, e várias vezes varava dia e noite copiando manifestos na gelatina. Hoje existem processos modernos, fotocopiadora. Muita coisa consegui aprender, muito ainda tenho para aprender. Ainda hoje leio colunas marítimas em jornal. Apenas não vou ao porto, só vejo navio de longe, da praia. Uma das paixões que tive foi a navegação, realmente. Mas era hora de parar, dar lugar aos mais novos. Uma mensagem a eles: o negócio é trabalhar. Em navegação todo dia tem um problema, algo mais para aprender, sempre uma novidade".

Paschoal Manzioni conta ter iniciado na navegação em 1924, na Expresso Federal, sendo gerente da empresa durante 43 anos, além de presidente do Centro de Navegação Transatlântica de Santos, diretor da Apees e de outras associações do setor, e o único dos presentes naquele jantar que esteve presente na Parada do Centenário, realizada a 7 de setembro de 1922 no Rio de Janeiro, quando Epitácio Pessoa era o presidente. Aposentou-se há 15 anos, em 1967, mas atualmente trabalha na Navegação Marvinave S.A.

José Campinho trabalhou durante 37 anos: "Comecei em 1945, na agência Serrana, onde permaneci até novembro de 1981, quando me aposentei. Nessa época, o nome da firma foi mudado, criando-se uma sucessora, a Fertimport. Trabalhei com adubo a granel desde o início. Então, os controles de afretamento eram muito fáceis. Dava uma média de 800 a 1.000 toneladas por dia, e os maiores navios eram os de 15.000 toneladas. Hoje, navios de 30 a 40 mil toneladas são pequenos, há os com capacidade para 60, 70 mil toneladas de granéis, que nem vêm cheios porque não teriam calado no porto.

"A demurrage (sobreestadia) era antes de 500 a mil dólares/dia. Quando saí, o afretamento já era de 3.000 dólares/dia e a demurrage de seis a oito mil dólares/dia. No início se perdia tempo fazendo uma descarga de 1.500 toneladas de granéis; hoje não se faz mais isso, pois até uma descarga de 40 mil toneladas já é considerada pequena. Naquela época, o fosfato vinha do Marrocos, e o resto dos fertilizantes era proveniente dos EUA. Hoje, o fosfato não é mais importado, e o Brasil é suficiente na produção. A tendência é de só o enxofre e o cloreto continuarem sendo importados no futuro".

A reunião-jantar do Clube do Leme foi organizada na sede do Sindicato dos Contabilistas de Santos pela recém-eleita comissão administrativa, coordenada por Felício Agostinho da Purificação Souza e integrada também por Ricardo Smith, Benedito Florentino Guerra, Waldir Pierri, Basílio de Carvalho e Panayote Haridimos Pappadakis. A intenção do grupo é promover nos próximos meses encontros semelhantes, homenageando os que ingressaram na navegação em cada década passada. A próxima reunião será dia 29 de junho.


Capitão dos Portos do Estado de São Paulo, Sérgio Werneck (E),
é homenageado pela nova diretoria do Clube do Leme, presidida por Jaime Gonçalves Jr. (C),
em reunião realizada em 10/1987 nos salões do Santos Atlético Club (Clube dos Ingleses)
Foto publicada em Marinha Mercante/OESP em 20/10/1987

O caderno Marinha Mercante em Todo o Mundo também registrou, do dia 5 de abril de 1988:

O Rafa foi homenageado pelo Clube do Leme
e também pelo presidente honorário do clube, o capitão dos Portos do Estado de São Paulo,
na maior reunião já promovida por aquele clube desde sua fundação
Foto publicada com a matéria

"Rafa" homenageado no Clube do Leme

"Comecei em 1947, mas fui efetivado a 1º de dezembro de 1948. Meu primeiro trabalho foi pegar um barco a remo e ir até a proa do Itanagé, logo na proa onde tinha medo da hélice do navio, e pegar o cabo. Lembro que tinha de pegar o cabo e dar a mão, e foi o que fiz, só que a mão era a do cabo, não a minha, de forma que toda a operação teve de ser refeita. Naquele tempo, inclusive, nem existiam os cabeços de amarração, era usado o arganel, tínhamos que fazer uma laçada no cabo e passar um pedaço de madeira para travar o nó.

Assim comecei na praticagem, e ali só não fui prático, pois amarrei navio, fiz limpeza, atuei na fonia etc. Várias vezes, durante ataques de piratas aos navios na barra, socorri pela fonia, chamando a Polícia Marítima ao receber o pedido pelo radiocomunicador dos navios.

"Lembro que, naquela época, a Praticagem de Santos estava situada ainda na Praça da República, 4, onde o pai do Ney Garcia Sotello tinha o bar Paratodos, onde a gente tomava café".

São algumas das histórias reunidas em 42 anos de trabalho na Praticagem de Santos por Raphael Gonzales Atencio, que se aposentou recentemente como funcionário burocrático da Cooperativa dos Práticos santista e foi homenageado pela comunidade santista, através do Clube do Leme, por sua dedicação ao trabalho, que lhe granjeou grande estima no setor.

Melhor prova disso foi o total de 220 participantes, recorde na história do Clube do Leme, mesmo em jantares onde os profissionais do setor foram acompanhados de esposas. O encontro foi promovido em dependências do Clube Sírio-Libanês e, além do Rafa, participaram também - sendo igualmente homenageados - seus familiares.

"Não acredito que ninguém da comunidade marítima tenha algum ressentimento com o Rafa, creio que por vezes ele até colocou seu emprego e sua família em risco para atender às necessidades da navegação", citou o presidente do Clube do Leme, Jaime Gonçalves Jr., ao lhe entregar uma placa de homenagem, juntamente com o presidente de honra da entidade, o capitão dos portos do Estado de São Paulo, Sérgio Werneck. Um presente muito apreciado pelo homenageado, conseguido como surpresa pelo clube, foi uma camisa nº 10 do São Paulo Futebol Clube. Também a esposa dele recebeu um buquê de flores da esposa do capitão dos portos. E Rafa passou a ser considerado convidado vitalício das reuniões do clube.

Agradecendo, o homenageado lembrou ser com orgulho que se desligava da Praticagem após 40 anos de atividades, recordou passagens de seu trabalho, iniciado no quadro de amarradores de navios do porto santista, e agradeceu a homenagem. Ao final da reunião, houve ainda uma demonstração de canto por Afonso da Costa Figo.


Liderada por Wilson Capela (C), a diretoria do Clube do Leme eleita em 27/6/1991
na reunião-jantar promovida no salão nobre da Igreja Luterana de Santos
Foto publicada em Marinha Mercante/OESP em 9/7/1991


Diretores do clube entregaram ao capitão dos Portos do Estado de São Paulo, Sérgio Ribeiro de Vasconcellos, placa de homenagem pelo término de sua comissão em Santos, em 20/3/1986
Foto publicada em Marinha Mercante/OESP em 25/3/1986


Grande número de associados participou da reunião-jantar realizada em 20/3/1986 nas antigas dependências do Clube XV no final da Avenida Washington Luiz
Foto publicada em Marinha Mercante/OESP em 25/3/1986

Veja mais:
Clube do Leme (1)
Clube do Leme (2)
Clube do Leme (3)