HISTÓRIAS E LENDAS DE SANTOS -
CIDADE FESTIVA
A vida noturna de Santos (1)
Bandeira Jr. (*)
Colaborador
Embora promoções de algumas sociedades carnavalescas
do século passado [N.E.: século XIX] fossem dedicadas ao demi-mondo (ou sociedade equívoca, como bem traduziu nosso
grande Vicente de Carvalho), e isso se deduz da propaganda em linguagem libertina, inserta na imprensa e nos panfletos da época, a verdade é que Santos
só conheceu vida noturna nos primeiros dias, ou melhor, noites, do ano de 1900, quando o célebre Teatro Variedades
(esquina das ruas XV de Novembro e São Leopoldo) passou a filial do Moullin Rouge, da Capital.
Ali, nossa mocidade, a mesma que fundaria o primeiro time de futebol do litoral paulista - Club Athletic
International (7/11/1902) - ia cervejar (o whisky ainda não estava na moda) e cortejar as habituês, principalmente, francesas...
O Cassino Coliseu, inaugurado em 1924, apresentava nú artístico
Fechado o Variedades em 1904, seu pessoal - bailarinas, chanteuses e
coccotes - sob a liderança do artista Darly, mudou-se para o Parque Miramonte (esquina das ruas Riachuelo e João Pessoa), que funcionou até 1908.
Ainda em 1903 havia o Amigalhaço (Centro Santista), na Rua Santo Antônio (Comércio), 55, que apresentava todas
as noites "grande terceto sob a direção de Mma. Beatriz, professora de piano. Chopp, lunch, sorvetes e bebidas finas. Além de charutaria
de primeira ordem".
Em 1905 foi anunciada a abertura do Cabaret Artístico, num prédio da Praça Visconde de Mauá, porém a coisa só
ficou na promessa... O Cinema-bar Recreio Santista e o Cassino Santista, ambos de 1914, tiveram curta duração.
The Royal Concert, no sobrado do Cine-Teatro Politeama Rio Branco (atual Edifício Leôncio Peres), esteve ativo
durante o período da 1ª Guerra Mundial (1914-1918).
Na praia da Barra (Boqueirão), o Recreio Miramar fazia
fucionar, ao lado do cassino, grill room com música ao vivo e números de cabaret. Ali se apresentaram o divo do belcanto Caruso, em 1917,
e as feras do Circo Sarrasani, em 1928.
Nos anos de 1924 e 1927 foram inaugurados o Cabaret do Coliseu e o
Cassino do Monte Serrat, construídos para esse fim específico.
No Coliseu, mudado para Cassino Night Club, apresentou-se, em 1943, a Orquestra
Carlito de Paris, trazendo da Europa a novidade do swing - um furor! O novo ritmo teve início com In the Mood, de J. Garlana, criação do
bandleader Tommy Dorsey (1905/1956), que, em 1952, com sua orquestra, apresentou-se no Clube XV. Pelo panfleto de propaganda, ficamos sabendo
que, no Coliseu, a champagne custava 160$000 e a cerveja 6$000 ou seja, cento e sessenta mil réis e seis mil réis - o dinheiro tupiniquim era o
único no mundo com divisão milésima, isto é, a unidade era mil! Felizmente, aprendemos com o dólar americano a simplificar nossa moeda...
Voltando ao Cassino do Coliseu, que ocupava a parte superior do saguão de
entrada desse cine-teatro, resta-nos dizer que todas as noites apresentava "nus artísticos" e, aos sábados, era obrigatório o traje de rigor: long
dress para damas e tuxedo para cavalheiros. Com vários arrendatários, ele sobreviveu até 1944.
Ainda na década de 30, concorrendo modestamente com o tradicional Coliseu,
tivemos as casas noturnas: Bar Netuno (Praça Antônio Telles, 8), de Willy Femm; Gambrinus (Rua General Câmara, 203), inaugurada em 14 de maio de 1929
pelos proprietários Metzack & Burnhof, dancing notável pela freqüência de balzaquianas e a música de quarteto cordiofone, cujo spalla foi
o violinista Paiva, irmão do maestro e compositor Vicente Paiva. Reformado em 1940, pelo boêmio Eduardo de Nicolla, o velho dancing funcionou,
algum tempo, com o nome de Martini.
Inaugurado em 1921, o Chave de Ouro, ao lado do A.B.C. e do Night and Day, seria o núcleo
da Boca
No Paquetá (futura Boca) surgiram, por essa época, o American Star Bar, o El
Morocco (luxuosíssimo), o Casablanca (de Toto e Dona Elisa), o Bar A.B.C. e o Night and Day que, com o Chave de Ouro -
Golden Key, restaurante em estilo art noveau, da firma Castañera & Peres, inaugurado em 12/2/1921 - gerariam a Boca,
zona boêmia da Baixada Santista.
Fora da Boca, registramos: Bar Volga (Praça da República, 82), que, em 1944, mudou para Balalaika, nome extraído
de filme norte-americano; Bar Imperial, que começou, em 1936, na Rua João Pessoa, 203, mudando a seguir para loja maior na Rua General Câmara, 151, onde
desfrutou, por seis anos, de grande popularidade, graças à Orquestra do Maestro Ligeireza e à atuação do cabaretier Mário Gibbon, exímio
professor de dança, principalmente tanto argentino. Até as vesperais do Dancing Imperial, aos domingos e feriados, eram concorridas. O Hollywood Dancing
(Rua João Pessoa, 216) foi inaugurado por Santino Ferraro em 15/5/1941. Nele pontificou o cabaretier Totonho, o último bom maxixeiro que
conhecemos.
Outros night-spots: Marabá, Capitólio, Bola Preta, Urca Santista (no prédio hoje ocupado pela Polícia
Federal, na Praça da República) [N.E.: o autor se refere ao endereço da Praça da República, 73,
defronte à Alfândega, do qual esta entidade se mudou, algum tempo depois, para o prédio do antigo Instituto Brasileiro do Café, na
Praça Barão do Rio Branco].
(*) Bandeira Jr. é historiador e escritor em Santos. Este artigo foi
publicado em cinco partes, nas edições de 12, 19, 26 de outubro, 2 e 9 de novembro de 1992, no jornal santista
A Tribuna. As imagens são reproduções do arquivo do autor.
Veja as partes [2], [3], [4]
e [5] desta série
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