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HISTÓRIAS E LENDAS DE SANTOS - AMARGO AÇÚCAR
Engenhos iniciaram a agroindústria no Brasil

Ao mesmo tempo que iniciou o ciclo do açúcar no País, Martim Afonso também começou a indústria nacional baseada na agricultura, como relata esta matéria, publicada no jornal santista A Tribuna em 29 de outubro de 1995:

Entrada Proibida. Em 1953, a Universidade de São Paulo ganhou a área de 3.500 m²,
onde estão as ruínas do Engenho de São Jorge dos Erasmos
Foto: Sílvio Luiz - reprodução de A Tribuna, 29/10/1995

Martim Afonso começou
agroindústria em 1532

Áureo de Carvalho
Da Redação

O ciclo da cana-de-açúcar, na história econômica do Brasil, está marcado por São Vicente, onde foi instalado um engenho pioneiro em 1532. Por iniciativa de Martim Afonso de Souza, donatário da capitania de São Vicente, vieram da Ilha da Madeira as primeiras mudas da cana crioula, que encontraram no litoral o clima e o solo adequados à rápida produção.

Além disso, muitas famílias, vindas da Madeira e dos Açores, conhecedoras da cozedura e purga da cana, fixaram-se na Vila de São Vicente que, ainda no século XVI, passou a ser importante centro de produção açucareira, exportada em caixas de madeira para a Europa. Em 1535 foram instalados em Pernambuco os primeiros engenhos de moagem da cana, disseminados depois no litoral da Bahia e na região de Campos (Rio de Janeiro), que até hoje são fortes produtores.

No final do século XVI, o Brasil já era o maior produtor e fornecedor mundial de açúcar, exportando para Portugal 90% da sua produção, apesar das taxas alfandegárias cobradas pela metrópole, que dava preferência à produção açucareira da Ilha da Madeira. O açúcar brasileiro, por outro lado, era repassado a outros países da Europa, "com altos ganhos para a Coroa", conforme narrou Frei Gaspar da Madre de Deus.

Segundo alguns historiadores, em 1560 o açúcar produzido na Capitania de São Vicente era a base da economia local e usado como moeda corrente: não havia dinheiro em circulação.

Monumento - Para a instalação de um engenho de açúcar em suas terras, Martim Afonso de Souza contratou sociedade com Jan Van Hielst, Francisco Lobo e Vicente Gonçalves. Esse engenho, considerado o 1º do Brasil, era chamado de São Roque ou Do Senhor Governador, por causa da propriedade, e começou a funcionar em 1533.

Seguindo o modelo açoriano, de onde viera, era movido a água e, de acordo com Frei Gaspar, "fora instalado no sopé de um morro, para aproveitar pequena cachoeira ali existente. Não passava de um instrumento tosco, com uma roda d'água que acionava o martelo de triturar a cana. Havia também a fornalha alimentada com achas (pedaços) de lenha, e a caldeira, que exalava um cheiro acre de garapa, tudo sob o mesmo teto".

Na primeira colheita da cana-de-açúcar produzida nos arredores da Vila de São Vicente, Martim Afonso de Souza e seu irmão, Pero Lopes de Souza, donatário da Capitania de Santo Amaro, se associaram com comerciantes flamengos, compondo a chamada Sociedade dos Armadores do Trato, certamente uma das primeiras empresas do Brasil voltadas à produção do açúcar, a agroindústria.

A firma comercial Erasmo, Schetz & filhos, de Antuérpia (Bélgica), adquiriu o Engenho São Jorge, mantendo-o entre 1557 e 1603. No início do século XVII, as instalações do engenho foram destruídas por um incêndio, "dele restando, se muito, as quatro paredes com tijolos recozidos pelo calor, e o teto com o madeirame chamuscado pelas labaredas. O equipamento do engenho propriamente dito, esse estava perdido na destruição, dela não escapando nem a roda d'água".

Não são conhecidos os proprietários posteriormente à firma belga, mas desde aquela época o engenho ficou conhecido como dos Erasmos, denominação que permanece até hoje.

Aqui funcionou o engenho movido a água que Martim Afonso mandou vir dos Açores
Foto: Édison Baraçal - reprodução de A Tribuna, 29/10/1995

São Jorge à frente, entre os primeiros

Os primeiros engenhos de cana-de-açúcar da Baixada, segundo o pesquisador Olao Rodrigues, conforme publicação no Almanaque de Santos:

1532 - Engenho Madre de Deus, fundado por Pero de Góis, no Morro das Neves (parte continental de Santos);

1533 - Engenho de São João, fundado por José Adorno, no local onde hoje é a Praça Rui Barbosa, em Santos;

1534 - Engenho do Governador, ou do Trato, mais tarde São Jorge dos Erasmos, fundado por iniciativa de Martim Afonso na parte noroeste da Ilha de São Vicente;

1560 - Engenho de Nossa Senhora, ou Nossa Senhora do Engenho, fundado por Bartolomeu Antunes, em Cambraiaquara;

1565 - Engenho de Santo Amaro, fundado por Estevão Raposo, na Ilha de Guaibê;

1570 - Engenho de Santo Antônio, fundado por Antônio Fernandes, junto à Igreja de Santo Antônio do Guaibê (Ilha de Santo Amaro, Guarujá);

1590 - Engenho Nossa Senhora do Pilar, fundado pela Companhia de Jesus à margem direita do Rio Itapanhaú (Bertioga).

Desses, o único que resistiu ao tempo foi o de São Jorge dos Erasmos, no sopé do Morro São Jorge, no Bairro da Caneleira, em Santos, tombado pela Sphan em 2 de julho de 1963, ex-ofício em 11 de dezembro de 1974, processo nº 362/73, Histórico nº 1, página 10, inscrição 89.

À relação de Olao Rodrigues deve-se acrescentar o Engenho dos Aires, que foi construído por Aires da Cunha no Morro do Saboó, entre 1534 e 1544.

1º do Brasil - Frei Gaspar da Madre de Deus, todavia, advoga a primazia para o Engenho de São Jorge dos Erasmos, destacando: "Por conhecer que sem negócio de agricultura, nenhuma colônia se aumenta, promoveu quanto lhe foi possível estes dois ramos, introduzindo todas as espécies de animais domésticos, depois que foi a Piratininga, e viu a bondade de seus campos para criarem gado vacum, cavalar e ovelhum; e mandando vir da Ilha da Madeira a planta de canna doce.

"Para que os lavradores a pudessem moer, fabricou quasi no meio da sobredita Ilha um engenho de água e uma capela, dedicada a São Jorge, o qual foi o primeiro que houve no Brasil; dele saíram cannas para outras capitanias brasileiras e disso eu dou fé".

Convênios e acordos não conseguem remover o matagal que rodeia o 1º engenho do Brasil
Foto: Paulo Freitas - reprodução de A Tribuna, 29/10/1995

Abandono, saldo dos convênios e acordos

Em 1943, os terrenos com as ruínas do Engenho dos Erasmos pertenciam parte a Edgard de Toledo, parte à firma N.R. Santos e Cia. Toda a área, naquele ano, foi adquirida por Octávio Ribeiro de Araújo, que a urbanizou, loteando-a com o nome de Vila São Jorge, parte em Santos, parte em São Vicente.

Lúcido e com a melhor das intenções, Octávio Ribeiro ouviu inicialmente o Instituto Histórico e Geográfico de Santos, antes de solidificar uma idéia inicial de preservação, e só então doou o chão e as ruínas do engenho à Universidade de São Paulo que, em 1970, ali pretendia restaurar o imóvel para a instalação do Museu Colonial de Açúcar.

Em abril de 1971 o local estava isolado por uma cerca de arame farpado, tendo como único acesso um caminho quase tomado pelo mato, onde se via uma placa "Propriedade da Universidade de São Paulo - Obras de restauração do Engenho dos Erasmos - Convênio com o 4º Distrito da Diretoria do Patrimônio Artístico e Histórico Nacional - Proibida a entrada".

Muitos projetos - A doação da área do Engenho dos Erasmos à Universidade de São Paulo só foi concretizada em 1953. O 1º projeto feito para o local previa a adaptação dos 3.500 metros quadrados do terreno, para a formação de um campo de pesquisas. A USP queria, também, construir dentro da área um bloco de apartamentos para abrigar professores e estudiosos interessados.

Desde a doação, no entanto, o engenho esteve abandonado, e algumas terras ao redor acabaram sendo vendidas a imobiliárias. Em 1982, o Ciesp (Centro das Indústrias do Estado de São Paulo) mostrou interesse em assumir a restauração do prédio, junto com outros órgãos.

Um ano depois, o Ciesp, a Prefeitura de Santos e a Prodesan se propuseram a assinar um convênio para recuperar o engenho. Esses três órgãos queriam um levantamento histórico e a montagem de painéis fotográficos para os visitantes.

Em 1988 foi feita nova tentativa de fazer a restauração do local, desta feita por iniciativa da própria Universidade de São Paulo, que nomeou uma comissão de estudos. No ano seguinte, foi realizado um seminário sobre o engenho e, em 1990, foi contratado um arquiteto holandês para analisar a recuperação do patrimônio. A idéia básica era a de transformar o local em ponto turístico e de pesquisas arqueológicas.

No dia 15 de abril de 1992, a Prefeitura de Santos e a Universidade de São Paulo assinaram um termo de cooperação técnico-administrativa, visando à recuperação do Engenho dos Erasmos. O acordo era válido por quatro anos, e prorrogável. À Prefeitura, através da Secretaria de Desenvolvimento Urbano (Sedam), caberia autorizar sondagens, prospecções e escavações arqueológicas do solo; providenciar a doação à USP das áreas necessárias (cerca de 40 mil metros quadrados), para a construção dos edifícios destinados a atividades culturais, educacionais e de apoio, além de outras responsabilidades.

À USP, por intermédio da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas, caberia o desenvolvimento de pesquisas históricas, arqueológicas e arquitetônicas, assegurando a manutenção da cobertura vegetal da área em 50%, além de outras atribuições.