Clique aqui para voltar à página inicialhttp://www.novomilenio.inf.br/santos/h0112.htm
Última modificação em (mês/dia/ano/horário): 12/26/02 18:13:44
Clique na imagem para voltar à página principal
HISTÓRIAS E LENDAS DE SANTOS
E o vilão dançou...

Mas os tropeiros preferiam o indígena cateretê...

Apesar de seu caráter cosmopolita, recebendo visitantes de todo o mundo (mas talvez por essa mesma razão), Santos não firmou um estilo próprio de música e dança que deixasse marcas claras no folclore brasileiro. São assim raras as citações dos pesquisadores, uma delas no volume II de Folclore Nacional, de Alceu Maynard Araújo (Edições Melhoramentos, São Paulo/SP, maio de 1964), onde entretanto constam inúmeros exemplos relativos a outras cidades litorâneas, como Cananéia, Eldorado, Itanhaém e Ubatuba.

Descrevendo o fandango e suas variações, conta o autor que tal dança de possível origem moura (não descartada a hipótese de origem flamenga) se propagou à Península Ibérica e poderia ter chegado ao Brasil com os espanhóis, mas mais provavelmente desembarcou em terras brasileiras com os portugueses, particularmente os colonos açorianos que chegaram ao litoral Sul paulista por volta de 1774.

Dançado até nas Cortes cariocas, a par com o minueto, entrou em decadência por força de censuras eclesiásticas e de proibições das Ordenanças Reais, sob o pretexto de ser "um baile licencioso e flamengo, e portanto herege", só voltando a ganhar força no século XX por meio dos Centros de Tradição Gaúcha (CTGs). Em São Paulo, é um conjunto de danças de salão, acompanhadas por bater de pés e palmas. Uma das formas lúdicas do fandango é o Vilão. Eis a descrição genérica e a citação de Santos:

VILÃO - Encontramos várias formas de vilão, todas elas danças lúdicas. São danças cujo principal escopo é realizar um jogo de agilidade, destreza ou habilidade, saindo um perdedor que ora é vaiado, ora fica na obrigação de fazer uma nova escolha, participar novamente do jogo: vilão-de-lenço, vilão-de-mala, vilão-de-agulha, vilão-de-faca, vilão-de-bengala.

Tal qual nas danças do Vilão-de-bengala do Sul do país, há no Amazonas uma dança lúdica chamada Arara. Ao centro dos pares que estão dançando aparece um desemparceirado, portando um bastão todo enfeitado de flores. A um sinal convencionado, a música pára de tocar, os pares se desfazem; a outro sinal, podem os cavalheiros enlaçar uma dama, ficando aquele que se desemparceirou o "Arara". E arara é sinônimo de bobo. Às vezes, o "Arara" fica muito tempo com o bastão florido, sem conseguir arranjar uma dama para dançar. (...)

Em Santa Catarina, pelo carnaval aparecem os "Vilões" que mais parecem "pauliteiros de Miranda", com avantajados bastões, batendo sob o ritmo quente das marchinhas e sambas bem brasileiros.

Em Santos, Estado de São Paulo, ali por volta de 1940, havia um folguedo popular com nome de Vilão. Graças às correntes imigratórias de espanhóis e portugueses, no carnaval exibiam-se "vilones" e dançavam o "pau de fita". No primeiro caso, eram membros da colônia espanhola, no segundo, da lusa. O carnaval absorveu estes grupos de "vilones" e passou então a ser cordão carnavalesco - vilão - congregando foliões santistas filhos desses imigrantes da Península Ibérica que se misturam na dança do bate-pau, regida a apito.

Alceu Maynard Araújo registra ainda, em sua obra, a presença de uma outra dança folclórica na Baixada Santista, o cateretê, em que o dançador procura sempre ritmar o bater dos pés com o som da viola. E explica:

O palmeado no cateretê, em ilustração da obra citada

Dança usada pelos catequistas, é muito conhecida e difundida entre os caipiras do Estado de São Paulo. Nas zonas litorâneas que temos visitado desde Angra dos Reis (Estado do Rio de Janeiro) até baía de Paranaguá (Estado do Paraná) ele é dançado com tamancos de madeira dura.

(...) Além disso, foi dança de um grupo social, dos tropeiros. Documentos abundantes mostram que, desde o Cubatão até o Interior mais distante, os tropeiros, de tropa arriada e de animais chucros, transformavam os pousos e ranchos em sedes de danças por eles preferidas, quase sempre o bate-pé. Na descrição por Hércules Florence (N.E.: o "pai" brasileiro da Fotografia, e que percorreu o Caminho do Mar no século XIX) do pouso de Cubatão, 1829, se vêem até os assistentes do sapateado batendo com as mãos nos bancos a fazer o ritmo.

Em 1777 Martim Lopes Lôbo de Saldanha, capitão-general de São Paulo, danava-se, porque os corpos de tropas que ele enviou por terra para a ilha de Santa Catarina foram parando aí adentro nos pousos, em intermináveis festanças.

Nas expedições um pouco anteriores de Afonso Botelho nos sertões do Paraná atual, aparece o violeiro. Sabe-se que nas danças africanas não havia sempre a viola, instrumento tão lusitano, mas que passou até a ser o apanágio do caboclo ou caipira. E os visitadores eclesiásticos de 1750 em diante, na região, já foram condenando os batuques e outras danças, como a de São Gonçalo, esta caipira paulista, diversa mesmo da congênere de Pernambuco.

Nos Cateretê, Xiba, Catira, Bate-pé, Batuque de viola ou Função de viola, das regiões acima citadas, somente tomam parte elementos do sexo masculino.

Pelas observações "in loco" das danças do Cateretê, quer sob o nome de Xiba ou Catira, comparando-as com as descrições colhidas nas tribos indígenas, e pela cinegrafia que temos visto, levaram-nos à conclusão de que o Cateretê é de origem ameríndia. É coreografia índia sabiamente aproveitada pelo catequista, tal qual se fizera com a dança do Cururu, Santa Cruz. O Cateretê é semi-profano e semi-religioso, ao passo que aquelas são danças religiosas.

Participantes - No Cateretê em geral tomam parte dois violeiros e cinco ou mais pares de dançantes. O traje é o comum. Em geral todas as danças são realizadas à noite, característico que no Sul do país as distingue dos bailados ou danças-dramáticas, realizados durante o dia. Não é dança de terreiro mas de salão, de galpão.

No centro do salão os dançadores formam duas colunas, tendo à testa delas um violeiro-cantador. Um dos violeiros é o "mestre" e o outro é o "contramestre". "Mestre" é a designação popular dada ao violeiro que faz a primeira voz e também é o autor da "moda" que vai ser cantada. "Contramestre" é o que faz a segunda voz.

Entre dançantes e violeiros na coluna em que está o "mestre", fica o "tirador de palmas" ou "palmeiro" e na outra, o "tirador de sapateado" ou "orela". Não raro um só exerce as duas funções de determinar o momento das batidas de palmas e do bater de pés, execução do pateio, porque batem com o pé em cheio no solo. Não é o sapateado batidas da ponta, meia planta e planta do pé; em nossas danças caipiras o que realmente há é o pateio. Ausência do taconeio, batidas do calcanhar, que denunciam origem espanhola.

Os violeiros cantam e batem os pés, não batem palmas. Os dançantes não cantam, mas batem palmas e pés.

Dança - Quando todos estão formados, os violeiros dão uns arpejos. Iniciam o canto em dueto, pedindo licença para cantar. Cessado o canto da primeira estrofe, os violeiros saem de seus lugares, por fora das colunas, em passo normal, andando naturalmente, vão até a extremidade da fila, sendo acompanhados pelos seus respectivos companheiros de coluna. Voltam aos seus lugares primitivos entrando pelo centro das colunas. Param.

Depois de uma pausa muito pequena, todos os dançantes, e os violeiros também, trocam de lugar com os pares fronteiros, ritmadamente, cruzando pelo centro das colunas. Chamam a esta figura "vorteá e cruzá" (dar volta e cruzar). A volta é feita para cumprimentar os assistentes. Esse cumprimento não se manifesta por movimentos da cabeça ou outro gesto, mas apenas através do significado da figura da volta que é por todos conhecida, é "fazer vênia". Esta volta é dada com os violeiros arpejando molemente as violas e é executada somente na fase inicial, não há repetição. Finalizando o "vorteamento" e "cruzamento", os violeiros dão início à moda, que é cantada a duas vozes.

Os dançadores ficam em seus lugares, parados, e geralmente com as duas mãos metidas nas algibeiras das calças. Quando os violeiros finalizam a estrofe, dão uns acordes, e o "tirador de palmas" dá início às batidas de palmas. Todos os demais dançantes olham atentos para ele, assim batem ritmadamente sem errar.

As violas fazem uma pequena pausa, e em outro ritmo dão início ao bater de pés, que é dirigido pelo "tirador de sapateado". Quando os violeiros percebem que todos dançantes estão firmes no bater de pés, também "repicam os pés", pateando com vontade. Param todos. Os violeiros-cantadores iniciam a arpejar as violas, e como que "tomando um fôlego", isto é, respirando até normalizar a respiração, reiniciam a moda, cantando outra estância. Vão alternando canto, bater de palmas e de pés.

Para finalizar a moda, os violeiros fazem a "suspendida". A "suspendida" consiste na inclusão de dois ou três versos (número incerto) a mais que as estrofes anteriores. Cantam estes versos uma oitava acima, geralmente em falsete. Ao finalizar a estrofe, param de planger as violas, está terminado o Cateretê, os dançadores deixam seus lugares, enxugando o suor do rosto. (...)

QR Code - Clique na imagem para ampliá-la.

QR Code. Use.

Saiba mais