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HISTÓRIAS E LENDAS DE SANTOS - ESTRADAS
Tentativa de melhorar o Caminho do Mar (2)

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Texto de Francisco Martins dos Santos, extraído do livro História de Santos, de autoria desse pesquisador, republicado em 1996 junto com a Poliantéia Santista de Fernando Martins Lichti, pela Editora Caudex Ltda., de São Vicente-SP, primeiro volume:

Francisco Martins dos Santos

Interessante para o estudioso de hoje é conhecer a expansão verificada no século XIX e a opinião dos diversos viajantes estrangeiros sobre a velha estrada e seu movimento. É o que proporcionaremos ao leitor nas linhas a seguir, desenvolvendo mais do que pretendíamos o presente capítulo:

Pontilhão da Raiz da Serra marca a presença em Cubatão do Caminho do Mar, primeira estrada brasileira pavimentada em concreto

Conhecem-se depoimentos interessantes desde as primeiras décadas do século XIX. De início temos o do inglês John Mawe e do sueco Gustave Beyer. Mawe, em 1807, fez a viagem de Santos para S. Paulo, e, quando estava ainda em Cubatão, observou que havia ali um terreno amplo, circundado pela alfândega (Barreira Fiscal) e por outros edifícios, para onde eram conduzidas cerca de cem mulas carregadas. Surpreendeu-se com a docilidade dos animais e com a habilidade dos tropeiros negros.

Começando a subir a serra, notou que a estrada era boa e bem pavimentada, mas estreita, e, devido às subidas íngremes, fora talhada em ziguezague, com voltas freqüentes e abruptas. As mulas que viajavam por esses declives escarpados, embora mais resistentes que os cavalos, caíam freqüentemente, vitimadas pela fadiga. Encontrou algumas delas mortas à beira da estrada. Dizia ele:

As tropas de mulas carregadas, que encontrávamos em caminho para Santos, dificultavam-nos a passagem, tornando-a desagradável, muitas vezes perigosa. Em alguns lugares a estrada atravessa vários pés de rocha. Em outros sobe perpendicularmente, conduzindo com freqüência a umas montanhas cônicas, ladeando precipícios, onde o viajante está sujeito a ser lançado numa floresta inacessível, trinta jardas abaixo. Esses lugares perigosos estão protegidos por parapeitos.

As florestas eram tão espessas, exceto na trilha das mulas, que não se enxergava o solo. Os galhos das árvores, em certos trechos, se entrelaçavam formando um caramanchão sobre o caminho e protegendo o viajante da chuva ou dos ardores do sol.

Rancho de Tropeiros, 1827: óleo de Charles Landseer

Imagem: Iconografia Paulistana do Séc. XIX, 1998, Metalivros/BMeF, SP/SP

A despeito das deficiências e dos perigos, reconheceu Mawe o que representava a Estrada do Mar:

Poucas obras públicas, mesmo na Europa, lhe são superiores, e se considerarmos que a região por onde passa é quase desabitada, encarecendo portanto muito mais o trabalho, não encontraremos nenhuma, em país algum, tão perfeita [1].

Do alto da serra em diante, no trecho do planalto, observou que o caminho era marginado por belas árvores e enormes espinheiros, mas que estava em vários pontos danificado em conseqüência das chuvas torrenciais da estação.

No decorrer da viagem, passamos por vários grupos de negros e alguns índios, trabalhando na reparação da estrada ou em abrir novos desvios.

Nessa parte, o caminho comportava - como anotaria o viajante Bayer em 1813 - trânsito de veículos de rodas. O trecho da Serra, esse cronista sueco o descreveu assim:

O caminho em ziguezague de ângulos curtos é protegido por um parapeito ladrilhado e continua até a altitude de setecentos metros, levando a subida cerca de duas horas. Quatro ou cinco caminhos em ziguezagues pareciam, em muitos lugares, correr acima de nossas cabeças e davam ensejos novos de admiração por uma obra para cuja conclusão foi necessário vencer tantos obstáculos naturais e aplicar milhões de cruzados, que foram gastos para derrubar a mata, e finalmente calçado com lajes, contribuindo para dar uma idéia da energia do brasileiro e sua inclinação para grandes empresas.

Na segunda e terceira décadas do século XIX, outros viajantes estrangeiros deixaram seus depoimentos sobre o Caminho do Mar. Luiz D'Alincourt, capitão e engenheiro militar português, elogiado por Sant'Hilaire, visitando a região em 1818, punha em relevo ainda a realização de Lorena, dizendo:

A subida da serra é assaz íngreme e em ziguezague; o terreno é todo coberto de alto e espesso arvoredo; em alguns lugares passa a estrada junto a medonhos precipícios que se abrem entre montes e montes, e horrorizam a vista; tem este caminho a grande vantagem de ser todo calçado, obra utilíssima e que saneou a dificuldade do trânsito, principalmente em tempo chuvoso.

Quatro anos depois, verificava-se um grande acontecimento no Caminho do Mar. Corria o ano de 1822, quando, na madrugada de 5 de setembro, descia uma cavalgada ilustre, em direção a Santos; era o Príncipe D. Pedro, regente do Império, com a sua notável comitiva.

Desceram pela mesma estrada descrita por D'Alincourt, a Calçada do Lorena; chegaram ao porto de Cubatão, onde eram aguardados pelas altas autoridades e pessoas da sociedade e do comércio de Santos. Tomaram as lanchas especiais que aguardavam junto à Barreira Fiscal e às 4 horas da tarde (16 horas) desembarcavam todos junto ao Consulado, no chamado Largo da Alfândega Velha, onde a massa popular aclamou o Príncipe D. Pedro, dando vivas ao Imperador do Brasil.

No dia 7 pela manhã, voltava o Príncipe com os seus acompanhantes, já agora em maior número, e tomando os animais guardados e reservados em Cubatão, encetaram todos a subida do secular Caminho, notando-se que uma grande preocupação e um mal qualquer agitavam o imperial cavaleiro.

E foi nessa subida, quase ao término da estrada do planalto, já saindo do Ipiranga e tendo São Paulo à vista, ao longe, que se deu a cena extraordinária, do encontro da comitiva que seguia de Santos, com o oficial do Correio Paulo Bregaro, que vinha do Rio de Janeiro passando por São Paulo - cena que culminaria com a revolta do Príncipe, sua conhecida exaltação e seu grito redentor: "Independência ou Morte", significando a separação política de Portugal e do Brasil e a criação de uma Pátria livre e soberana, a fundação do Império, realizadas em pleno Caminho do Mar.

Independência ou Morte, óleo pintado por Pedro Américo em 1888

Imagem: Iconografia Paulistana do Séc. XIX, 1998, Metalivros/BMeF, SP/SP

Três anos depois, a viagem foi feita e descrita por um francês que se radicaria em São Paulo e ali se notabilizaria por vários inventos e descobertas e que participou da trágica bandeira científica do conde russo Langsdorf, como desenhista (bandeira essa que o levaria ao casamento com a filha do brigadeiro Álvares Machado, e à constituição de uma grande família paulista) - era esse homem o extraordinário Hércules Florence.

Verificou ele que Cubatão era muito freqüentado devido ao seu caráter de entreposto, apesar de não passar de povoação de suas vinte ou trinta casas. Durante os oito dias que permaneceu ali, viu chegar, todos os dias, três a quatro tropas de animais, e partirem outras tantas - cada uma delas compondo-se em geral de quarenta a oitenta bestas de carga, guiadas por um tropeiro e divididas em lotes de oito mulas dirigidas por um camarada. Desciam de São Paulo carregadas de açúcar bruto, de aguardente, de toicinho, e retornavam com sal, com vinhos portugueses, com vidros e ferragens.

Em relação às comodidades do caminho, mostrou-se Florence menos otimista que Mawe e D'Alincourt. Na subida da serra achou que a estrada era péssima, pavimentada com grandes lajes em sua maior parte deslocadas - o que tornara a ascensão bastante cansativa: "Galgamos a metade do caminho a pé, a fim de poupar os nossos animais. A cada passo, as bestas paravam ofegantes de cansaço".

Do alto da serra em diante, em direção a S. Paulo, o caminho lhe pareceu sofrível, se bem que muito estreito em certos trechos. Sabe-se, aliás, que, embora fosse mais curto o trajeto por terra, era possível ainda ir por água, pelos cursos dos rios Pequeno, Grande e Jeribatiba ou Pinheiros, utilizando-se às vezes essa navegação para o transporte de objetos de grande peso, como sinos ou canhões [2].

Aires do Casal, em sua Corografia Brasílica, que tem a data de 1817, escrevia:

Projeta-se comunicar a ilha (de S. Vicente) com a terra firme, por meio de uma calçada através do canal de S. Vicente, a qual só depois de completa será uma obra magnífica, evitadora de muitos naufrágios.

Pizarro, na mesma época, observava:

Projetando-se fazer um caminho por terra, que da Vila de Santos vá a Cubatão, tem sido esse trabalho grandemente dificultoso pela necessidade de um aterro sólido na extensão mais ou menos de duas léguas. Esta obra, que conta já alguns anos e gastará ainda outros até se completar, não cessa, nem esfriará por falta de meios...

...Esses trabalhos - que incluíram o transporte de terra em cestos, na cabeça de escravos negros - estiveram em sua última fase sob a direção de Daniel Pedro Muller, vencendo-se a vasta região de mangues, gamboas e lamarões - segundo relata um cronista da história santista - por uma espécie de cais, dando passagem a pé enxuto e por uma ponte de madeira sobre o rio São Jorge ou Casqueiro, antigo Iriripiranga. As obras se completaram em 1827.

Em 1837, no governo de Gavião Peixoto (conselheiro Gavião Peixoto), terminava um grande rancho para tropeiros em Santos (o Rancho Grande, levantado na Rua São Francisco, junto ao Largo de S. Francisco de Paula). "Ali encontravam enfim o abrigo de que tanto necessitavam os pobres tropeiros", como rezava o Relatório oficial.

Rancho Grande dos Tropeiros, em Santos

Imagem: quadro de Benedito Calixto

Desta época é o depoimento do viajante norte-americano Daniel P. Kidder, e ele pôde constatar que o caminho, mesmo no trajeto do planalto, era impróprio para qualquer tipo de veículo.

Compreendia a subida da serra - notou o reverendo - cerca de quatro milhas de sólida pavimentação e mais de cento e oitenta voltas em seu percurso em ziguezague.

A nossa subida se tornou divertida pelo encontro de sucessivas tropas de mulas. A princípio se ouvia a áspera voz dos tropeiros tocando os animais e soando tão por cima de nós, que parecia vir das próprias nuvens; depois, distinguia-se o bater dos cascos, e à distância, os animais. Foi preciso procurar lugar resguardado para deixar passar as várias seções da tropa; passado algum tempo, seu tropel ressoava ao longe, com os ecos afastados de sua voz, perdendo-se nos precipícios embaixo.

A despeito de ser uma das maiores e mais caras estradas construídas no Brasil, não podia ser transitada por veículos, devido à sua declividade enorme.

Parou o viajante nos pousos do caminho: Rio Grande, Ponto Alto, São Bernardo.

Encontramos na parte do planalto tropas de cem a trezentas mulas cada uma, e cada animal levando uma cangalha com dois jacás perfeitamente balanceados, contendo sacos de açúcar ou de outra qualquer mercadoria.

Voltemos um pouco, na palavra de Manoel Rodrigues Ferreira, para chegarmos de novo ao americano Kidder.

Já em 1831, o presidente da Província mandara fazer, na serra, explorações a fim de melhorá-las. Mas foi o governo seguinte, o de Rafael Tobias de Aguiar, que se preocupou a fundo com o problema, interessando-se pessoalmente em resolvê-lo. Os governos seguintes tiveram mais a preocupação de melhorar o aterro de Cubatão a Santos.

Em 1837, Gavião Peixoto interessou-se pelo problema de uma estrada de carros de eixo móvel, na Serra, e, por isso, mandando fazer explorações, informava: "Determinei que se queimasse e limpasse a roçada que se fez na antiga trilha da Serra de Cubatão, por onde subiu a artilharia que foi para Iguatemi".

Gavião Peixoto, pois, aviventava o primitivo Caminho do Padre José, a fim de verificar a possibilidade de ser restaurado para o uso de carros de eixo móvel. Por outro lado, informava o mesmo presidente:

O terreno oferece capacidade para uma boa estrada e mesmo para trânsito de carros, dando-se-lhe, porém, uma outra direção, em alguns lugares, que oferecem dificuldades, mas não invencíveis.

Cruzeiro Quinhentista marca o encontro dos caminhos do Padre José e do Mar, em Cubatão

Em 1839, o norte-americano Kidder fez uma viagem de Santos a São Paulo. No alto da Serra ele encontrou já em ruínas, e quase completamente coberto de lama, o padrão que ali mandara colocar o capitão-general Lorena, quando fizera o nosso Caminho do Mar. O viajante Kidder encontrou, na serra, com freqüência, tropas carregadas de café, em direção a Santos.

A essa época, operários alemães, trabalhando em Cubatão, absorviam toda a renda da barreira que nesse ponto existia e que fora criada pela lei de 1835. O senador Vergueiro, devido ao caminho de Santos, chegou a pedir a destituição do presidente da Província, e, na carta que escreveu a Bernardo de Vasconcelos, dizia que os alemães (imigrantes), "a quem se havia prometido quartel decente, só acharam a sombra do mato para se abrigar". Por isso e outras coisas, o senador Vergueiro pedia a destituição do presidente. Finalmente, os operários de Cubatão se amotinaram, puseram em risco a vida dos chefes e em sobressalto a todos os moradores.

Em 1841, novamente presidente, Tobias de Aguiar volta a preocupar-se com uma estrada de carros para Santos; e por isso informa em Relatório à Assembléia:

Mandei fazer novas explorações para ver se se descobre uma vereda própria, e que não se afaste muito das obras de grande valor que estão sendo feitas abaixo da serra, a fim de se não perder o que ali se tem despendido em pontes, aterrados, calçadas. As notícias que tenho da exploração são lisonjeiras, asseverando o explorador que a vereda que indiquei, pelas margens do "rio das Pedras", na parte que corta a serra, como lugar mais baixo, oferece assento para uma estrada de carro.

Seguindo essa diretriz ou outra, o certo que Rafael Tobias Aguiar iniciou os estudos de nova estrada na serra. A Estrada do Lorena seria, pois, abandonada, logo que esta estivesse concluída. E a este novo caminho, o brigadeiro Tobias de Aguiar deu o nome de "Estrada da Maioridade".

São Paulo (Várzea do Carmo), do Caminho de Santos, 1839, aquarela de Noël-Aimé Pissis

Imagem: Iconografia Paulistana do Séc. XIX, 1998, Metalivros/BMeF, SP/SP

A Tobias de Aguiar sucedeu, na presidência da Província, Miguel de Sousa Mello e Alvim, que tomou posse a 15 de julho de 1841. Sua grande preocupação foi continuar a estrada iniciada por Tobias de Aguiar. Por isso, em seu Relatório à Assembléia, de 13 de janeiro de 1842, escrevia:

Qualquer indústria que dependesse do emprego de máquinas importadas do estrangeiro parava ante a impossibilidade de conduzi-las para cima da serra, visto que elas são de ordinário volumosas, e dum peso tal, que não podem ser conduzidas em bestas. (...)

Era pois um desideratum para a Província inteira a achada de uma vereda nessa Serra que, com uma ligeira inclinação sobre o horizonte, facilitasse a passagem de toda a espécie de transportes; e cabe-me hoje a fortuna de anunciar-vos que esta dificuldade, longo tempo julgada insuperável, acha-se afinal vencida, com a abertura de uma trilha descoberta o ano passado, mediante os incessantes e bem dirigidos esforços de meu antecessor, que o denominou Estrada da Maioridade (...)

A inspeção da planta e nivelamento, tirados com toda a exatidão possível, vos mostrará, senhores, que já não pode entrar em dúvida que a Província há de, em breve, colher os benefícios de uma estrada de carro por esta Serra.

Talvez, pela primeira vez na história dos Caminhos do Mar, hajam sido empregados instrumentos de engenharia e confecção de plantas, conforme anunciava o presidente.

Com a revolução de 1842 (chefiada pelo brigadeiro Tobias), a construção desse novo caminho foi paralisada, para ser reiniciada posteriormente. Em janeiro de 1844, o presidente Manoel de Souza e Mello informava à Assembléia que, embora se estivesse construindo a Estrada da Maioridade, o Caminho Velho (do Lorena) continuava a ser conservado também, e dizia:

A Estrada da Maioridade, cujas vantagens transcendentes e óbvias só poderão ser cabalmente apreciadas por quem nela transita com suavidade, depois de haver com custo e trabalho atravessado a serra antiga, dará considerável impulso à produção de nossa Província, se apenas conseguir-se a descida e subida de carros carregados; e ela vai em progressivo andamento, obtendo cada dia novos melhoramentos, de modo que já oferece trânsito desde a base até a extremidade superior, não só a cavaleiro e animais de carga, mas também a liteiras, informando-me o respectivo inspetor ter há pouco por ela subido uma traquitanda.

Finalmente, informava que metade da serra já estava aberta, tendo a estrada a largura de 20 a 30 palmos na parte superior, e 15 a 20 na inferior.

NOTAS DO AUTOR:

[1] Este John Mawe, que tão bem impressionado se mostrou com a Estrada do mar e tão generoso, deixou-nos em seu livro Viagem ao Interior do Brasil, principalmente aos distritos do ouro e dos diamantes, ao lado de elogios e boas referências a S. Paulo e seu povo, até mesmo a Cubatão e Bertioga, uma péssima referência a Santos e à hospitalidade de seu povo. Ele trazia duas cartas de apresentação, uma para o juiz e outra para um negociante. Eis o relato:

O juiz recebeu-nos friamente e quando lhe perguntamos onde morava a pessoa a quem era endereçada a outra carta, pareceu muito satisfeito pela oportunidade de se ver livre de nós. O negociante mostrou-se tão frio quanto o juiz, e deu-nos desculpa banal.

Recorremos então ao boticário, de quem recebemos algumas atenções, e que atendeu a um de nossos amigos que, tendo deixado S. Paulo doente, esperou três semanas por uma passagem para o Rio de Janeiro. Expusemos-lhe a nossa situação, explicando-lhe que o tempo chuvoso nos impedia de passar a noite na embarcação. Bondosamente, ofereceu-nos a sua loja para abrigo, por ser o único espaço que possuía disponível.

Solicitamos-lhe oferecesse quatro dólares a um dos vizinhos para que nos desse pousada por uma noite, porém ele alegou nada adiantar, pois o povo de Santos era notoriamente conhecido por sua falta de hospitalidade. A grande afluência de estrangeiros e renegados de outras nações, nesta e em outras cidades do litoral, enrijecera o coração do povo contra esses apelos à sua boa vontade, que os habitantes do interior, menos assediados, estão sempre prontos a ouvir e entender.

Assim desenganados, resolvemos não aguardar navio em Santos, mas seguir para o Rio de Janeiro numa canoa, margeando a costa. Alugada uma, embarcamos, depois de remarmos toda a noite, num estreito que separa o continente da ilha de Santo Amaro (que constitui uma das passagens para Santos por mar), chegando ao nascer do sol a Bertioga, situada no extremo daquela ilha.

Tão desenganado da terra santista se mostrara o mineralogista e comprador de pedras preciosas, que resolvera fugir dela, de canoa mesmo e remando a noite inteira... como se fugisse à peste.

Cremos que isto só acontecia com ingleses... dada sua má fama ao tempo... Santos não seria ainda a terra da Liberdade, da Caridade e da Fraternidade.

[2] Dr. Manuel Rodrigues Ferreira - Os Caminhos do Mar na História de São Paulo - in Os municípios de São Paulo - edição especial, 1956, pp. 25 a 31.

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