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HISTÓRIAS E LENDAS DE SANTOS - SEU BAIRRO/mapa
Problema é o que não falta no Rádio Clube (4)

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Publicado em 20/1/1983 no jornal A Tribuna de Santos

 Leda Mondin (texto) e equipe de A Tribuna (fotos)


Criança é o que mais se vê na favela de Vila Gilda, a maior de Santos

Moradores estão assustados: apareceu o dono do dique

Só faltava essa: depois que os moradores de Vila Gilda aterraram o mangue, transformaram o lodo em terra fértil, dedicaram anos e mais anos de suas vidas para melhorar as áreas sobre as quais viviam, aparece uma família se dizendo dona delas. O pessoal anda assustado e desorientado: dois moradores concordaram em fazer negócio e comprar os terrenos para se livrarem de problemas, mas outros estão dispostos a lutar até o fim, alegando que nos 10, 20 ou mais anos em que se encontram lá, nunca souberam que aquilo tivesse um proprietário.

Tudo começou no final do ano passado, quando um homem chamado Amorim se apresentou para moradores do Caminho da Capela como procurador da família Alberto de Luca, que segundo ele seria dona dos terrenos. Só que os vizinhos são testemunhas entre si de que as águas do Rio do Bugre avançavam muitos metros adiante, e se hoje os tais terrenos estão habitáveis, tudo se deve ao esforço daquela gente simples que cansou de jogar aterros para afastar a maré para longe.

Oneida Salvador do Ouro mudou-se para o Caminho da Capela quando aquilo tudo não passava de um manguezal. O mesmo aconteceu com a paraibana Rosilda Medeiros dos Santos Silva, 23 anos, de Vila Gilda. Ambas foram procuradas pelo Amorim (ninguém sabe dizer o seu sobrenome) e não se conforma com o que ouviram dele.

"Aqui está toda a minha vida. Aqui está tudo o que fiz", diz dona Rosilda, mostrando o quintal aterrado, cercado por muros, e o sobradinho em construção. debruça-se sobre os blocos para mostrar até onde a maré atingia e conta: "Eu, meu marido e meus três filhos carregamos aterro em bacia, na cabeça, porque não tínhamos nem carrinho. inutilizada da espinha por causa disso. Já pus nesse terreno muito dinheiro. Principalmente, deixei nele minha saúde".


Como a garotada não tem onde brincar,
transforma as águas podres do canal do Rio do Bugre num lugar de muita diversão

Trabalho em vão? - Dona Rosilda se mostra inconformada. Quando chegou ao dique, com os braços esticados não conseguia alcançar o fundo do seu barraco. Ele ficava a uns dois metros de altura do chão para não ser atingido pelas águas. O mangue era tão bravo, dava tanto mosquito-pólvora e botuca que a sogra lhe disse: "Olha que os bichos vão comer meu filho".

Aos poucos, ela e o marido foram ajeitando a área. À medida que os filhos cresciam, se punham também a trabalhar para acabar com a lama podre. "Teve dia em que o almoço e o jantar da gente foi uma lata de sardinha e uma cabeça de repolho. Acabei-me no tanque. Tudo para guardar dinheiro e comprar aterro. Agora que está tudo direitinho aparece o dono do terreno?", pergunta dona Rosilda, revoltada.

Às vezes, a família jogava o aterro, mas o chatão de areia que sempre passa pelo Rio do Bugre deixava a água revolta e a terra era arrastada. Se perdiam dinheiro e horas de trabalho. Para acabar com esse problema, dona Rosilda e o marido decidiram construir o muro: e lá se foram para dentro do mangue preparar o alicerce e assentar os blocos.

Áreas de marinha - Essa paraibana esforçada e valente não pretende ser passada para trás de uma hora para outra. Ainda mais que tem certeza que seu terreno nunca teve dono nenhum.

"O que eu sempre soube é que se trata de área de marinha", acrescenta dona Rosilda, lembrando-se que, numa ocasião em que os jornais anunciavam o fim de Vila Gilda, há uns 18 anos, correu ao Serviço de Patrimônio da União. O delegado regional tranqüilizou-a: "More lá 100 anos ou um dia, se a senhora quiser. Só se a União precisar, ela toma a área. Ninguém mais pode despejar alguém de lá". Ela guardou tudo direitinho e nunca esquece que o delegado ainda lhe deu o dinheiro da condução para voltar.

Não é à toa que ela e os moradores das imediações andam muito desconfiados do tal procurador Amorim. Um homem que, segundo eles, sempre chega à noite e nunca se encontra no telefone que ofereceu.


Em meio às brincadeiras, eles esquecem a barriga que ronca de fome
e a falta dos pais, que saem para trabalhar

Veja as partes [1], [2] e [3] desta matéria
Veja Bairros/Jardim Rádio Clube

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