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HISTÓRIAS E LENDAS DE CUBATÃO
Esperança, na pauta desta associação (3)


Clique na imagem para voltar ao índice do livroCriada em Santos por Samuel Augusto Leão de Moura, com apoio do Rotary Club de Santos, a Casa da Esperança teve em Cubatão uma outra unidade, que foi enfocada em trabalho de estudantes de Jornalismo da Universidade Monte Serrat (Unimonte), o qual deu origem ao livro de 62 páginas, coordenado pela professora Helena Gomes (inédito até fins de 2008, quando ocorre esta publicação eletrônica), Tempo de Esperança. Este, por sua vez, foi reunido a outros trabalhos de alunos da mesma universidade, no livro-brochura Vidas em Pauta, lançado em 2007 por aquela universidade santista, também com a coordenação de Helena Gomes. Este é o texto integral de Tempo de Esperança:

Leva para a página anterior[...]           Tempo de Esperança

Ana Lúcia Borges, Ana Paula Mackevicius, Antonio Marcos Santos Silva,

 Júlio César Chaves, Maria Helena Sousa

Maria Aparecida Pieruzzi dos Santos, presidente da Casa da Esperança de Cubatão

Foto: Ana Lúcia Borges, enviada a Novo Milênio pelos autores do livro


Capítulo 1

por Ana Lúcia Borges

"Dar de si, antes de pensar em si".

Nega Pieruzzi

Mulher coragem

Vinte e um de março de 1980 foi o começo da realização de um sonho: transformar a vida e a realidade de pessoas especiais que antes não tinham onde recorrer. Crianças e adolescentes portadores de necessidades especiais que necessitavam de pessoas especiais, "anjos" que lhes dessem esperança e um lugar que pudessem chamar de "Casa da Esperança".

Maria Aparecida Pieruzzi dos Santos, carinhosamente chamada de Nega Pieruzzi, 63 anos, nascida em Tambaú, no Estado de São Paulo, filha de João Baptista Pieruzzi e Dolores Martins Pieruzzi. Era uma criança como tantas outras da sua idade, brincava, andava, corria. Mas, aos dois anos de idade, teve poliomielite e, na cidade onde morava, a dificuldade de se obter tratamento era grande. Seus pais foram obrigados a se deslocar até Ribeirão Preto.

A poliomielite deixou seqüela em sua perna direita, que lhe causa uma pequena dificuldade para andar, mas nada que a impeça de realizar suas funções.

Não sofreu preconceito, nunca se sentiu uma pessoa diferente e sempre teve o apoio da família e o incentivo dos pais para estudar. "Vim de uma família numerosa, de oito irmãos", conta. "Meu pai, apesar de ter pouca instrução, sempre teve a preocupação que seus filhos estudassem, todos têm formação superior".

Aos 17 anos, Nega começou sua vida trabalhando como professora na rede municipal de ensino. Foi lutando pela educação que resolveu entrar para a política. Candidatou-se ao cargo de vereadora em Cubatão, foi eleita e exerceu essa função por mais três mandatos não consecutivos. Foi eleita presidente da Câmara Municipal, a primeira mulher a assumir esse cargo e também a primeira na Baixada Santista a assumir a presidência do Rotary Clube. Nega trabalha desde 1980 na Casa da Esperança. E em 1992 assumiu como presidente, cargo que ocupa até hoje.

É difícil colocar no papel todas as coisas que ela já fez. É uma mulher que quebrou tabus e que precisou de muita coragem para assumir tamanha responsabilidade, coisa que a ela não falta. Luta em defesa daquilo que acredita ser importante para a sociedade e para os portadores de necessidades especiais.

A vida não é fácil para essa mulher de pouco mais de um metro e 55 de altura, cabelos curtos, pele clara, olhar sempre atento e um rosto que revela preocupação, ansiedade e também satisfação por sonhos realizados. Nega revela em sua rotina uma enorme força de vontade de mudar a realidade e proporcionar as crianças e adolescente melhor qualidade de vida e perspectivas de futuro.

Sentada diante de uma mesa repleta de papéis e com inúmeras decisões a tomar, ainda assim, consegue dar atenção a todos que a procuram.

Seu trabalho à frente da Casa da Esperança requer dedicação exclusiva. São poucas as pessoas que assumem compromissos deste tipo. "Não é porque a gente é boa. Poucas pessoas querem trabalhar sem ganhar", revela Nega.

A Casa da Esperança presta atendimento não só a crianças e adolescentes, mas também a seus familiares. Foi proporcionando boas condições de trabalho a seus funcionários e prestando um serviço de qualidade à comunidade que a Casa da Esperança cresceu em qualidade e quantidade. No começo, eram 80 crianças. Hoje são mais de 400, entre crianças e adolescentes, e cerca de 40 funcionários.

"Para que esse e outros trabalhos sociais dêem certos, é fundamental a ajuda da sociedade, do poder público e da iniciativa privada", afirma Nega.

Divulgar e mostrar o trabalho desenvolvido por essa associação só trará conseqüências benéficas, pois o desconhecimento leva a não ajuda. "Você só ama aquilo que conhece", conclui Nega.

Essa pequena grande mulher nos dá o exemplo de que, com perseverança, força de vontade, doação e sonhos pode-se fazer a diferença na vida de centenas de pessoas.

Diego, menino esperança

Entre tantos personagens que fazem da Casa da Esperança um lugar especial, Diego Godinho Alves é, sem dúvida, um exemplo de perseverança.

Aos 21 anos de idade, tem uma história de vida que merece ser contada. Rapaz tímido e de poucas palavras, mas que em seu depoimento revela superação, amor e principalmente o sentimento de gratidão pelas pessoas que fizeram diferença em sua vida.

Profissionais competentes, cuidado e respeito no atendimento, amor que recebe da família e dos amigos, tudo contribuiu para que Diego hoje pudesse testemunhar a luta e principalmente a vitória sobre a doença.

A dona-de-casa Lúcia e o encanador Geraldo sonhavam com esse filho, o único do casal. "A gravidez foi de alto risco", conta Lúcia. "Eu me sentia muito mal, tinha crises de tosse e falta de ar e, por muitas vezes, precisei ser levada ao hospital".

Diego nasceu de parto cesariana, mas precisou ser reanimado, pois nasceu desacordado. Foi um susto para a família, que pensou que o menino não iria sobreviver. Com 8 dias de nascido, começou a ter crises, se contorcia e chorava muito. Os pais o levaram ao pediatra, que pensou se tratar de cólicas. O bebê era medicado e mandado de volta para casa. Quando completou 15 dias, teve uma convulsão. Constatou-se que Diego estava com meningite. Foi internado e permaneceu 17 dias em coma.

Depois do susto, Diego começou a ser tratado por um neurologista, que detectou uma paralisia cerebral leve do lado esquerdo, seqüela da meningite. Apesar de todos os problemas, Lúcia e Geraldo se mantiveram unidos. "Enchi-me de esperança e me apeguei a Deus. Nunca perdi a esperança de ver meu filho curado", desabafa Lúcia, emocionada.

Diego tinha dificuldades de ficar em pé. Suas perninhas não tinham força para sustentá-lo. Foi aí que, com 8 meses de idade, descobriu-se que a meningite tinha deixado seqüelas também nas pernas. Foi preciso engessá-las e, depois de algum tempo, trocar o gesso por um aparelho ortopédico.

Na época, a família morava no bairro Cota 95, em Cubatão, onde as condições de transporte e o acesso eram precárias. Levar o filho até o hospital no centro da cidade para fazer o tratamento era dispendioso e muito difícil.

Os pais se revezavam nos cuidados com o menino. Enquanto Geraldo ia trabalhar, Lúcia pegava o pequeno Diego no colo, descia e subia o morro, esperava o ônibus por horas a fio para chegar até o hospital com a certeza que todo sacrifício valia a pena. "Quando Deus nos dá de presente um filho especial é porque os pais são especiais", declara Lúcia.

Foi quando a Casa da Esperança entrou em suas vidas, indicada pelo hospital onde Diego fazia o tratamento. Lúcia procurou a associação e ali Diego passou a ser tratado. Através do ótimo atendimento médico e das incansáveis e dolorosas sessões de fisioterapia, conseguiu reaver o movimento de suas pernas. Além da fisioterapia, participava das aulas de natação e das oficinas de dança e pintura que complementavam o tratamento e traziam muita alegria ao menino.

Quando Diego completou 4 anos, Lúcia descobriu que aquela tosse e falta de ar que ela sentia e que se agravou na gravidez, na verdade, era um problema cardíaco. Triste e angustiada, viu-se com um novo desafio a enfrentar, mas não esmoreceu. "Tenho muita fé em Deus. É Ele que me dá força".

Submeteu-se a uma cirurgia que durou 7 horas para implantação de uma válvula mitral, passou um dia na UTI até o seu restabelecimento, contou com a ajuda do marido que, mesmo trabalhando de turno, cuidava do pequeno Diego, e dos vizinhos que ajudavam no serviço da casa. Em várias ocasiões, Geraldo perdeu oportunidades de emprego fora da cidade. Tudo para ficar ao lado da esposa e cuidando do filho.

Aos 5 anos, Diego foi para a pré-escola e lá permaneceu por um ano. Para Lúcia, era difícil subir e descer a ladeira com o filho nas costas, pois ele pesava muito. E o menino sentia-se triste e traumatizado por não poder correr e jogar bola. Na época, tomava medicação para controlar convulsões. Era uma criança agitada e chegava a ter 5convulsões por dia.

Para Lúcia e Geraldo, era difícil olhar para o filho e explicar a uma criança que via seus amiguinhos andando e correndo que ele não podia brincar com eles.

Aos 7 anos, Diego pôde começar a estudar. Cursou o ensino fundamental nas escolas municipais Lorena, Princesa Isabel e Martim Afonso. Por ter dificuldade de aprendizado e se sentir discriminado pelos colegas, parou de estudar. O pai, querendo incentivá-lo, entrou com ele no supletivo.

Atualmente, Diego cursa o terceiro ano do ensino médio na Escola Marechal Humberto de Alencar Castelo Branco, mais conhecida como Castelão.

Lúcia procura incentivar o filho a ser independente, conquistar o seu espaço na sociedade e realizar os seus sonhos. "Ele precisa aprender a se virar sozinho. Nós, pais, não somos eternos".

Diego é um jovem batalhador e independente. Hoje, não usa mais aparelho ortopédico e tem a liberdade de se locomover sozinho. Trabalhou como estoquista numa loja de calçados e atualmente, por convite da presidente da associação Nega Pieruzzi, é funcionário da Casa fazendo o serviço de office-boy em horário comercial e desempenhando suas funções com eficiência. "Gosto do meu trabalho e de me sentir útil", conta Diego.

Apesar da timidez, revela seus sonhos e planos para o futuro. "Penso em fazer um curso de informática na Escola Técnica Federal e continuar trabalhando na Casa da Esperança, ajudando as pessoas da mesma forma como sou ajudado".

Quando o assunto é a Casa da Esperança, ele diz que o trabalho desenvolvido é maravilhoso. "Somos tratados com respeito. Os profissionais que trabalham aqui são competentes e tudo é realizado com muito amor".

Por muitas vezes, durante seu depoimento, percebi pelo tom de sua voz uma dose de emoção e gratidão por ter encontrado na Casa da Esperança, além da reabilitação, o amadurecimento como cidadão.

"Hoje me sinto forte e preparado para enfrentar qualquer dificuldade", afirma. "Tenho amigos, meu trabalho e minha família como apoio".

Diego Godinho Alves: um exemplo de perseverança e vitória

Foto: Ana Lúcia Borges, enviada a Novo Milênio pelos autores do livro

Uma adorável surpresa

Enquanto fazia uma das entrevistas na sala da administração da Casa da Esperança, notei que era observada por alguém. Diante de uma porta de vidro, havia um rapaz com olhar curioso, esperto e ávido por saber o acontecia.

Parecia estar atento a todos os meus movimentos. Aquela fisionomia não era estranha para mim. Lembrei que, desde o primeiro dia na Casa, ele vinha me observando como querendo perguntar algo.

Diante da insistente observação, parei por alguns segundos a entrevista e acenei com a mão para ele entrar. Ele foi logo abrindo a porta e dizendo:

- O que você está fazendo?

- Uma entrevista, pois estamos escrevendo um livro sobre a Casa da Esperança – respondi.

Ele ficou feliz com a notícia e foi dizendo que queria ser entrevistado também. Sentou-se ao meu lado e foi falando sem parar. Pedi que esperasse um pouquinho que logo conversaria com ele, mas não pude evitar sua impaciência.

Peguei meu bloco de anotações e comecei a escrever tudo o que ele me falava. Às vezes não conseguia compreender e pedia que repetisse a frase, mas ele me bombardeava com tantas informações que eu ficava um pouco zonza. No final, anotei tudo e agradeci o depoimento.

Marco Aurélio Lopes, 19 anos de idade, portador de deficiência mental, é atendido desde os 7 anos pela Casa, onde participa da oficina de pintura, faz natação e fisioterapia. "Os médicos, psicólogos e todos os funcionários da Casa me tratam com muito amor", explicou.

Gosta de assistir à TV, ler gibis, ficar na Internet, cursa a 6ª série do ensino fundamental e têm muitos amigos. "Acho a dona Nega Pieruzzi muito legal".

Este foi o depoimento espontâneo de um jovem que expressou os seus sentimentos e que tornou essa entrevista uma adorável surpresa.

Obrigada, Marco.

Um exemplo a ser seguido

"Um presente divino". Com esta frase a presidente da Casa da Esperança, Nega Pieruzzi resumiu toda a sua alegria ao falar sobre a nova sede da associação.

Trata-se de um prédio de três andares onde funcionarão salas de dança, informática, pintura, ateliê de costura e atendimento, com o objetivo de proporcionar melhores condições de reabilitação para as crianças e adolescentes.

Para a maioria das pessoas, é mais um prédio que foi construído, mas para os funcionários, crianças e adolescentes da Casa é a realização de mais um sonho.

O "presente" veio através de Arthur César Whitaker de Carvalho, presidente da Carbocloro, juntamente com a empreiteira Nobre e o Banco Nacional de desenvolvimento Econômico e Social (BNDES).

A Carbocloro é uma empresa que procura desenvolver parcerias com a sociedade. Neste sentido, participa de programas sociais, ambientais e culturais. Dentro da própria empresa, há diversos programas que visam à interação da comunidade com a indústria.

Há também a preocupação com o meio ambiente e os reflexos que os desequilíbrios ambientais podem causar na vida da população. A empresa e seus colaboradores procuram realizar de forma pioneira a implantação de programas de combate à poluição.

"Na Carbocloro, responsabilidade social começa em casa", afirma Carvalho em entrevista publicada no jornal A Tribuna, em 2de novembro, sobre a inauguração do novo prédio, ocorrida três dias antes. Assim deveriam pensar e agir todos os empresários que enxergam de forma responsável a questão social.

Diego e sua mãe Lúcia Godinho Alves

Foto: Ana Lúcia Borges, enviada a Novo Milênio pelos autores do livro

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