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BAIXADA SANTISTA - LIVROS - Docas de Santos
Capítulo 1

Clique aqui para ir ao índicePublicada em 1936 pela Typographia do Jornal do Commercio - Rodrigues & C., do Rio de Janeiro - mesma cidade onde tinha sede a então poderosa Companhia Docas de Santos (CDS), que construiu o porto de Santos e empresta seu nome ao título, esta obra de Helio Lobo, em 700 páginas, tem como título Docas de Santos - Suas Origens, Lutas e Realizações.

O exemplar pertencente à Biblioteca Pública Alberto Sousa, de Santos/SP, pertenceu ao jornalista Francisco Azevedo (criador da coluna Porto & Mar do jornal santista A Tribuna), e foi cedido a Novo Milênio para digitalização, em maio de 2010, através da bibliotecária Bettina Maura Nogueira de Sá, sendo em seguida transferido para o acervo da Fundação Arquivo e Memória de Santos. Assim, Novo Milênio apresenta nestas páginas a primeira edição digital integral da obra (ortografia atualizada nesta transcrição) - páginas 3 a 11:

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Docas de Santos

Suas origens, lutas e realizações

Helio Lobo

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PRIMEIRA PARTE (1886-1895)

Capítulo I

Antecedentes

Desde cedo preocupou-se o Brasil com a navegação de seus portos, costas e rios, bem como com a construção de cais e armazéns para as necessidades do seu comércio.

Sobre aquela dispôs, nos primeiros anos da independência, a lei de 29 de agosto de 1828, cujo artigo 1º assim se redigia: "As obras, que tiverem por objeto promover a navegação dos rios, abrir canais, ou construir estradas, pontes, calçadas ou aquedutos, poderão ser desempenhadas por empresários nacionais ou estrangeiros associados em companhias ou sobre si".

Sobre a segunda, a lei n. 1.746, de 13 de outubro de 1869, autorizou ao Governo Imperial "a contratar a construção, nos diferentes portos do país, de docas e armazéns para carga, descarga e conservação das mercadorias de importação e exportação".

Votada pela Assembleia Geral e sancionada e mandada executar pelo imperador, suas disposições continham o que de melhor havia ao tempo e depois: aprovação dos planos pelo Governo; determinação do capital; prazo máximo de 90 anos, findo o qual as obras e o material ficariam pertencendo ao Estado; formação de um fundo de amortização, a contar de dez anos da conclusão dos trabalhos; percepção de taxas para retribuição dos serviços prestados, devendo reduzir-se quando os lucros líquidos excedessem de 12%; faculdade de emissão de warrants sobre mercadorias, e de resgate pelo Estado, depois do primeiro decênio da conclusão das obras; faculdade de execução do serviço de capatazias e armazenagem, caso o Governo encarregasse disso a empresa construtora; minuciosa fiscalização e arrecadação dos direitos do Estado; desapropriação das propriedades e benfeitorias particulares, necessárias às obras; vantagens e favores de que gozavam os armazéns e entrepostos alfandegados etc.

Pondo em relevo, mais tarde, o porto de Santos, construindo-se, então, à sombra dessa lei, diria, em momento crítico para a companhia arrematante, Ramiro Barcellos (Senado, 4 de dezembro de 1895):

Temos uma lei que me faz admirar e venerar mesmo a memória de um dos homens do tempo do Império que via bem a importância da fiscalização das rendas e do nosso desenvolvimento comercial; e não só isso, ideou e converteu em lei a resolução que se devia dar a questão tão importante. Refiro-me ao venerado patriota sr. Visconde de Itaboraí.

A lei n. 1.746, de 13 de outubro de 1869, foi uma sábia concepção que, se fosse realizada em todo o país, o teria elevado a uma grande riqueza e ao mesmo tempo teria feito o porto do Rio de Janeiro o mais importante entreposto da América do Sul. Esta lei, tão simples nos seus dizeres quanto admirável nos seus efeitos, está provando na prática, na única aplicação que teve, o quanto lucraria o país se convertesse em atos o que ela tem em vista.

A sábia disposição, com que esta lei dá remuneração aos grandes capitais necessários às obras desta natureza, fazendo depender principalmente do valor das mercadorias, as taxas de armazenagem, cria uma fiscalização paralela à da Alfândega, interessando ao mesmo tempo os concessionários e o Tesouro.

Sobre a elaboração dessa lei, escreveria depois, também a propósito do cais do Rio de Janeiro e suas taxas, o Jornal do Commercio (22 de novembro de 1909):

Por muitos anos o nosso Governo e o comércio anelavam por portos modernos nos principais dos nossos empórios no Atlântico. Os portos de Pernambuco e do Rio Grande de muito tempo desafiavam a atenção de peritos e sobre eles se fizeram estudos.

Até 1869, porém, ou porque o movimento marítimo era ainda diminuto, ou porque o Tesouro sentia a falta de recursos para empreender grandes obras, não havia o Governo tomado sérias providências no sentido de facilitar estes melhoramentos.

É verdade que o Governo não se descuidara do assunto, como se vê dos estudos e relatórios, entre outros, de Milnor Roberts, sir John Hawkshaw, Honorio Bicalho e Caland, e das centenas de contos de réis gastos anualmente na dragagem das barras do Rio Grande do Sul, Pernambuco e outras. Mas até então nenhuma medida havia tomado de caráter geral e que aproveitasse a um sistemático melhoramento de nossos portos.

E com relação à lei a votar-se:

Nesse ano de 1869, porém, foram apresentadas muitas emendas ao orçamento autorizando o Governo a gastar várias somas com melhoramentos de determinados portos. Na sessão de 10 de julho, o presidente do Conselho, visconde de Itaboraí, falando especialmente da autorização para gastar 3.000 contos no porto de Pernambuco, declarou que, reconhecendo a importância deste melhoramento, e dos de outros portos, sentia dizer que ao Governo faltavam recursos suficientes para dar-lhes o impulso conveniente.

Foi então que o comerciante Stephen Buck e o engenheiro André Rebouças solicitaram autorização para organizarem uma companhia estrangeira para a construção e gozo de docas no Rio de Janeiro. Em luminoso parecer assinado pelos deputados Dionysio Gonçalves Martins e F. L. Mello Rego, a Comissão de Obras Públicas aprovou a autorização pedida e preconizou o sistema de associação aplicado a melhoramentos desta natureza, tanto mais quanto, acrescentou, "garante a melhor fiscalização das rendas…"

Quando esse projeto da Comissão entrou em discussão, a 5 de agosto, o ministro da Agricultura, Comércio e Obras Públicas, Antão, entendeu conveniente generalizar a medida e não limitá-la a um só porto "por isso que há reclamações de diversas províncias exigindo este melhoramento de docas". E ofereceu um substitutivo nesse sentido, que foi impugnado pelos deputados Barros Barreto e A. De Oliveira, de Pernambuco, por entenderem que sua província não precisava de docas, mas sim de melhoramento do seu porto. Responderam e sustentaram valentemente o substitutivo os srs. Teixeira da Silva e Dionysio Martins. O projeto foi aprovado pela Câmara e sancionado como lei n. 1.746, de 13 de outubro de 1869.

Disse, então, o primeiro, depois de descrever as vantagens das docas:

Deixando às companhias particulares a construção de docas, isto é, bacias e cais para receber os navios, e de armazéns para guardar os gêneros que formam a sua carga, poupa-se o empate e imobilização dos capitães do Tesouro aplicados a tais edificações. E o que lucram as alfândegas? Despendem mais nesses serviços de carga e descarga e de armazenagem de mercadorias do que recebem em seu pagamento.

Argumentou o segundo com as alfândegas miseravelmente instaladas por todo o Brasil, sem armazéns, sem docas, carecendo de reparações, para as quais "são necessárias grandes quantias, impossível de despender-se presentemente, quando o Tesouro em críticas circunstâncias clama por todos os lados pela redução das despesas, quando faltam ao Estado capitais e falta-lhe sobretudo o pessoal habilitado" [01].

Eram pontos essenciais para qualquer concessão o máximo lícito ao capital como rendimento e taxas compensadoras do mesmo capital. Sobre estas decidiria o Governo em cada caso. Quis, porém, na discussão o deputado Barros Barreto que, desde então, ficassem fixadas as mesmas taxas, ao que respondeu o autor do projeto que não podendo os lucros exceder uma cota sem redução de tarifa, ficava, assim, marcado o quantum indiretamente. "Elas estão fixadas pela natureza das coisas e não é ato exagerado o que está estabelecido no projeto: elas não poderão exceder de 12% sem revisão da tarifa".

Quanto ao rendimento do capital, o máximo previsto, a princípio, foi de 10%, mas tal a necessidade das obras portuárias e tão difícil era obter para elas os necessários recursos que se elevou a 12%. No projeto substitutivo Antão Fernandes Leão, calcado sobre o ato do parlamento inglês de 20 de junho de 1800, que havia criado a doca de Londres, preceituava-se que "Os primeiros fornecedores de capital deveriam ter 5%, que o dividendo nunca excederia do duplo dessa soma". Disse, então, o deputado Araujo Goes:

Noto que no caso do resgate da empresa, o Governo pagar-lhe-á somente o capital correspondente àquele que render 8%. Se o lucro de 8% é o máximo que a empresa deve utilizar, julgo que não deve esperar que se eleve a 12% para a previsão das tarifas; o lucro de 12% é excessivo para tais empresas. Parece-me, portanto, que se não deve recusar aos contribuintes a diminuição quando os lucros atingirem a mais de 8%.

Pois nem assim, com favores julgados altos, foi possível iniciar nenhuma obra portuária. Em Santos, que é o que nos importa, o Governo Imperial concedeu, no ano seguinte ao da lei n. 1.746, pelo decreto n. 4.584, de 31 de agosto de 1870, à companhia que o conde de Estrela e o dr. Francisco Praxedes de Andrade Pertence organizassem, autorização para construir em Santos, província de São Paulo, docas e outros melhoramentos no mesmo porto. Essa concessão não se fez por concorrência pública; tinha a duração de 90 anos, e, em virtude dela, a companhia perceberia pelo serviço de embarque, desembarque e armazenagem das mercadorias e bagagem as mesmas taxas estabelecidas nas docas do Rio de Janeiro; o que tudo convém ter em vista para julgamento de reservas que se farão depois à companhia arrematante e executora até hoje dos serviços.

Não puderam os concessionários conde Estrela e dr. Andrade Pertence organizar a empresa, malgrado a prorrogação, por duas vezes obtida, do prazo para o começo dos trabalhos. Foram alterados pelo decreto n. 4.900, de 13 de março de 1872, o plano do cais e outras obras, sobre cuja execução expediu ainda o Governo Imperial o decreto n. 5.229, de 1º de março de 1873. Haviam solicitado os mesmos concessionários a elevação do capital para 6.000:000$000, o prazo de 5 anos para construção dos primeiros 200 metros de cais e 29 em vez de 10 anos para a conclusão dos excedentes, garantia de juro para o capital, aumento de taxas.

Escreveria sobre isto, mais tarde, o Diario de Santos:

Sem indagarmos demoradamente os motivos que trouxeram o fracasso da concessão, diremos somente que quem acompanhou os fatos daquela época devia ter-se convencido de que a principal causa do insucesso da empresa foi a incerteza do resultado do capital que tinha de ser empregado nas obras [02].

A Associação Comercial de Santos, que desde então não cessava de solicitar a construção do cais, representou ao Governo Imperial:

Este porto precisa somente e com a máxima urgência de um cais corrido ou paredão, que vindo em continuação da ponte da estrada de ferro, se estenda até diante da Alfândega [03].

Caduca a concessão, resolveu o Governo Imperial nomear uma comissão, chefiada pelo engenheiro William Milnor Roberts, para o fim de "ocupar-se, desde já, do exame do porto de Santos, levantamento de sua planta e do projeto das obras" que ali fossem mais convenientes, o que fez com o aviso n.5, de 14 de fevereiro de 1879.

Compunham essa comissão os engenheiros Antonio Placido Peixoto de Amarante, 1º engenheiro; Rodolpho Wieser, chefe de seção; Domingos Sergio de Saboia e Alfredo Lisbôa, engenheiros de 1ª classe; e Miguel Antonio Lopes Pecegueiro e Theodoro Sampaio, engenheiros de 2ª classe.

Em aviso n. 17, de 2 de abril de 1879, recomendou João Lins Vieira Cansansão de Sinimbú, signatário também do anterior, que no projeto do respectivo cais devia ter-se em muita atenção a profundidade suficiente para a atracação, aterro bastante para satisfação das condições sanitárias e organização geral de modo a facilitar a execução das obras por empresas particulares.

Resolveu, depois disso, o Governo Imperial, abrir concorrência pelo Ministério da Agricultura, Comércio e Obras Públicas, com os editais de 22 de dezembro de 18798. Enquanto se procedia ao estudo das três propostas apresentadas, dirigiu-se a Assembleia Provincial de São Paulo ao Governo da mesma – tal a urgência das obras de Santos, já importante via de entrada para a Província e sua saída comercial -, pedindo que ao mesmo Governo fosse confiada a construção. Acedendo a tais desejos, despachou o ministro da Agricultura, Manuel Buarque de Macedo:

Não podendo o Governo construir a expensas do Tesouro o cais da cidade de Santos e parecendo-lhe atendíveis os fundamentos aduzidos pela Assembleia Provincial, defiro a pretensão no sentido de ficar a construção a cargo da província de São Paulo, a quem se conferirá o direito de perceber as taxas a que se refere a lei n. 1.746, de 13 de outubro de 1869, em valor e número oportunamente calculados, para cobrirem os jutos e amortização do capital, que em semelhante obra ou melhoramento for empregado.

Neste sentido lavre-se o competente decreto com as cláusulas que se acordarem.

Pelo presente, declaro também que fica sem efeito a concorrência a que se refere o edital deste Ministério, de 22 de dezembro de 1879, restituindo-se aos proponentes as cauções que prestaram ao Tesouro Nacional.

Lavrado, em consequência, o respectivo decreto n. 8.800, de 16 de dezembro de 1882, foi o Governo Provincial de São Paulo autorizado "a levar a efeito por si diretamente ou pelos meios que forem mais convenientes à Província, a realização das obras de melhoramento do litoral da cidade de Santos, tendo por base o projeto organizado pela comissão hidráulica sob a direção do engenheiro William Milnor Roberts, observando as cláusulas que com este baixam".

Este foi o preâmbulo do decreto:

Sendo de urgente necessidade proceder à construção das obras de melhoramento de que carece o litoral da cidade de Santos, a fim de facilitar o crescente movimento de seu importante comércio marítimo de importação e exportação e considerando que, pela natureza e especiais condições do plano organizado pela comissão hidráulica, sob a direção do engenheiro William Milnor Roberts, mais convém aos interesses comerciais daquela cidade que seja a execução das referidas obras confiada à própria província, conforme assim também o entendeu a Assembleia Provincial, votando a lei n. 13, de 13 de fevereiro de 1881: Hei por bem… etc.

Para tal, gozaria a Província do privilégio exclusivo de 40 anos e direito de cobrar as taxas da lei de 1869. Mas São Paulo não pôde executar por si as obras, do que resultou a lei n. 55, de 2 de abril de 1884, autorizando sua realização por particulares. Aberta a concorrência provincial, preceituou o edital que deviam as obras realizar-se de acordo com duas plantas do engenheiro Milnor Roberts e modificações dos engenheiros Estevaux, A. C. Rodrigues e Ricardo Medina. Seja por motivos de ordem técnica, seja pela falta de confiança pessoal na realização, o certo é que não esconderam suas inquietações a Câmara Municipal da cidade e sua Associação Comercial. Num dos relatórios do presidente da Província à Assembleia Provincial (1883) escreveu-se mesmo que "a renda esperada dos favores feitos pelo Governo era mais imaginária que real". Fazendo-se eco daquelas inquietações, exarou, ao tempo, a maior folha de publicidade local:

Por que razão a Província de São Paulo não leva avante as obras do porto de Santos? A concessão lhe havia sido feita com favores excepcionais, ela não fez as obras à custa de seus cofres e nem encontrou quem, com vantagem para o comércio e para o Governo, as executasse.

É que nem o Governo Provincial nem particulares queriam comprometer, na realização daquele serviço, grandes capitais que, aos olhos deles, não encontrariam justa compensação. A falta de confiança no resultado da empresa foi, sem dúvida alguma, o que arredou o Governo da Província da execução desta obra [04].

A própria Associação Comercial de Santos, em extensa representação, chegou mesmo a pleitear junto ao Governo Central a transferência para ela das prerrogativas e ônus da concessão do decreto n. 8.800, de 16 de dezembro de 1882. Tinham sido estas, no 1º de agosto de 1885, suas palavras justificativas:

Ninguém pode melhor que o comércio conhecer de suas próprias necessidades, e melhor providenciar sobre a sua prosperidade, e sendo em definitiva o mesmo comércio que tem de pagar o melhoramento projetado, ninguém melhor do que ele pode encarregar-se de sua realização, assim como da distribuição das taxas, de modo a não serem atrofiadas as suas forças produtoras [05].

Por isso, num memorial dirigido à Assembleia Provincial (23 de fevereiro de 1884), quando procurava aquela revogar a lei n. 13, de 13 de fevereiro de 1881, que autorizou o presidente da Província a contratar com o Governo Geral a construção, grande era o desengano da Associação Comercial de Santos:

Sobre o cais de Santos nada podemos informar, a projetada obra tão reclamada pelo comércio, e mais ainda pela higiene de nossa cidade, continua procrastinada. Diz-se muita coisa, têm-se feito muitos exames, plantas e riscos, mas o que é verdade é que passa o tempo e nada se resolveu ainda.

Ultimamente apareceu novo edital, chamando concorrentes para essa obra, mas irá avante?

O comércio, a higiene, exigiam solução pronta, e Santos, com apenas 20.000 almas – a capital não tinha mais de 150.000 -, mal dava a imagem do que seria depois, sem esgotos, sem condições sanitárias, devastada pela febre amarela e outros flagelos. Numa memória escrita em 1896, dez anos depois de feita a concessão, em virtude da qual a cidade granjearia saúde, poria em fuga o contrabando, faria prosperar o comércio, avultaria em significação regional e nacional, assim se escreveu:

É bem conhecida a história do porto de Santos, que desde 1856 até 1888 procurou o Governo melhorar, tudo envidando para isso, já por meio de diversas concorrências e estudos a que mandou proceder, já fazendo concessões a particulares e à então província de São Paulo por decretos em que foram consignadas vantagens que bem remunerassem os capitais empregados em tão útil quanto inadiável melhoramento.

Infelizmente todas estas concessões caducaram, e o porto de Santos foi piorando até tornar-se o espantalho da navegação de longo curso pelas suas péssimas condições higiênicas e falta absoluta de meios regulares de carga e descarga, ao ponto de pagar-se quase o dobro do frete exigido para o Rio de Janeiro aos navios destinados àquele porto [06].

O próprio Mauá, que nos daria a indústria do ferro, diques em Niterói, tanta coisa de monta, teve também, entre suas concessões, a de um cais em Santos:

No ano de 1861 a Companhia de Estrada de Ferro de Santos a Jundiaí, representada pelo visconde de Mauá, requereu ao Governo permissão para fazer um cais junto à estação de Santos para seu uso privado. Na conformidade do parecer da seção de negócios do Império do Conselho de Estado, proferido em consulta de 16 de agosto de 1861, com o qual o imperador se conformou pela resolução de 2 de novembro do mesmo ano, foi dada aquela permissão, devendo a respectiva despesa correr por conta dos concessionários da estrada. (Aviso de 8 de novembro de 1861 ao Conselho de Estado, marquês de Olinda). Fez-se então uma ponte de madeira e uma pequena rampa de pedra solta [07].

Imagem: reprodução parcial da página 3


[01] Lê-se num folheto do depois Ministério da Viação e Obras Públicas: "Tendo Stephen Buck e o engenheiro Rebouças solicitado autorização para organizar uma companhia que construísse no litoral das enseadas da Gamboa e Saúde docas de importação e exportação, apresentou a Comissão de Obras Públicas da Câmara dos Deputados, a qual foi encarregada de dar parecer sobre o respectivo requerimento, um projeto autorizando o Governo a contratar com eles ou com quem melhores vantagens oferecesse, a construção das docas.

Por ocasião da primeira discussão, a 5 de agosto de 1869, ofereceu o ministro da Agricultura um substitutivo, calcado sobre os mesmos princípios, mas dando autorização ao Governo, não para contratar com uma empresa individualmente designada, nem a construção de docas de um determinado porto, como fazia o projeto, mas como uma medida geral compreensiva dos diferentes portos do país.

Esse substitutivo do sr. Joaquim A. Fernandes Leão tornou-se afinal a lei n. 1.746, de 13 de outubro d 1869, a qual, apesar da renhida discussão que se travou na Câmara, é a reprodução quase literal dele, pois o substitutivo foi aceito, tanto nela como no Senado, com pequenas modificações". A tomada de contas das companhias concessionárias de obras de melhoramentos de portos e a Companhia Docas de Santos, Rio de Janeiro, Imprensa Nacional, 1907.

[02] A Companhia Docas de Santos e a Alfandega de Sâo Paulo, 1ª série, São Paulo, Pap. Guarany, de Maciel & Companhia, 1896, pág. 19.

[03] Já em 1879, a referida Associação se dirigira ao Governo Imperial nestes termos: "A construção de um cais simples é hoje uma questão vital, tanto para a salubridade de nossa cidade como para os interesses de nosso comércio; e, segundo o que podemos coligir dos dados ao nosso alcance, a sua realização, sendo bem administrada, e atendida a indispensável economia, seria de um magnífico resultado para uma empresa que nela empenhasse o capital preciso". Id. p. 27.

[04] Id. pág. 23.

[05] Id. pág. 25.

[06] Na Gazeta de Noticias de 30 de maio de 1896. Há outros antecedentes históricos a citar. "Quando se dava o fracasso de qualquer das concessões feitas pelo Governo Geral, surgiam pretendentes singulares com projetos especiais para as obras do porto de Santos. Em 1874 o engenheiro Augusto Teixeira Coimbra propôs-se construir um cais corrido e armazéns alfandegados sob plano novo; o Governo Geral ouviu a nossa Associação comercial, a qual assim classificara esse projeto: - "coisa tão cheia de extravagâncias que bem podia ter sido repelida in limine". "Logo que caducou a concessão que o decreto n. 8.800 fizera à Província de São Paulo, a São Paulo Railway Company ofereceu-se para executar a obra do cais de Santos, incorporando ao seu capital o que nela fosse empregado bona fide, com todas as vantagens e direitos que aquele decreto dera à Província". Diario de Santos, na A Companhia Docas de Santos e a Alfandega de São Paulo, 1ª série, citada, pág. 24.

Ainda: "Do outro lado, e ao mesmo tempo (1869), deputados da bancada paulista, entre eles os srs. Rodrigo Silva, Rodrigues Alves e Duarte de Azevedo, desejando facilitar a construção do porto de Santos, segundo os planos já aprovados do engenheiro Sergio de Saboia, autorizavam o Governo a levantar a precisa soma de 5.300 contos…" Jornal do Commercio, 22 de novembro de 1909.

[07] As Companhias de Estradas de Ferro e as Docas de Santos, São Paulo, 1897, Typ. A Vapor Carlos Gerke & Companhia, pág. 30.