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BAIXADA SANTISTA - LIVROS - Chronica Geral do Brazil
Uma crônica de 1886 - 1600-1700 (11)

Clique aqui para ir ao índice do primeiro volumeEm dois tomos (1500-1700, com 581 páginas, e 1700-1800, com 542 páginas), a Chronica Geral do Brazil foi escrita por Alexandre José de Mello Moraes, sendo sistematizada e recebendo introdução por Mello Moraes Filho. Foi publicada em 1886 pelo livreiro-editor B. L. Garnier (Rua do Ouvidor, 71), no Rio de Janeiro. É apresentada como um almanaque, dividido em séculos e verbetes numerados, com fatos diversos ordenados cronologicamente, tendo ao início de cada ano o Cômputo Eclesiástico ou Calendário Católico.

O exemplar pertencente à Biblioteca Pública Alberto Sousa, de Santos/SP, foi cedido  a Novo Milênio para digitalização, em maio de 2010, através da bibliotecária Bettina Maura Nogueira de Sá, sendo em seguida transferido para o acervo da Fundação Arquivo e Memória de Santos. Assim, Novo Milênio apresenta nestas páginas a primeira edição digital integral da obra (ortografia atualizada nesta transcrição) - páginas 225 a 254 do Tomo I:

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Chronica Geral do Brazil

Alexandre José de Mello Moraes

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Imagem: reprodução parcial da página 225/tomo I da obra

1600-1700

[...]

CI – Martirológio. Páscoa 11 de abril; 1º de janeiro sexta-feira; indicação romana 4; período Juliano 6.334.

CII – No dia 28 de março de 1621, falece em Madrid el-rei Felippe III, com quarenta e oito anos de idade, e lhe sucedeu no trono de Portugal seu filho Felippe IV.

CIII – Marquês de Denia, depois duque de Lerma 1º ministro. Fernão de Mattos secretário de estado no reinado de Felipe III.

CIV – O reinado de Felipe II de Portugal e III de Espanha foi calamitoso, porque seus validos reinaram debaixo de seu nome, sendo o seu 1º ministro tão incapaz como o soberano.

Rebaixou o clero e a nobreza; e abateu inteiramente a Portugal, mandando suas tropas para Holanda, dando os principais empregos aos espanhóis. Abandonou a Índia quase de todo aos holandeses. Portugal era uma província conquistada, e tanto que fazendo paz com a Holanda, não foi Portugal contemplado no tratado. Consente que os holandeses ataquem as ilhas dos Açores e se apoderem da ilha do Príncipe. O Brasil aumentou. Grande tremor de terra nos Açores. D. Jeronymo de Almeida voltando para Lisboa, com algumas naus derrota a esquadra holandesa. Os ministros de Felippe mandam vender todos os empregos da Índia, excluindo deles os homens de merecimento nascidos em Portugal, e daqui principiou a decadência das possessões da Ásia. O desprezo a tudo o que era português, e as vexações aos primeiros homens da nação, eram a arma mais poderosa de que lançou mão a corte de Madrid para aniquilar Portugal, e sobretudo contra o duque de Bragança, que tinha direitos legítimos à coroa usurpada.

CV – D. Luiz de Souza, governador geral do Brasil, nomeia a Bento Maciel Parente para o lugar de capitão-mor do Grão-Pará; e no ano seguinte de 1622, é nomeado Antonio Muniz Barreiros capitão-mor do Maranhão.

Bento Maciel Parente era homem perverso, e para exercer os seus maus instintos faz horrível carnificina nos pobres índios do Pará.

CVI – Mathias de Albuquerque, filho de Jeronymo de Albuquerque, distinto por seus merecimentos e valor, tomou conta do governo de Pernambuco, em cuja administração fez progredir a capitania. Sabendo ter sido invadida a Bahia no dia 10 de maio de 1625, e preso pelos holandeses o governador geral d. Diogo de Mendonça Furtado e seu filho, e achar-se o bispo d. Marcos Teixeira dirigindo as operações de guerra, enviou imediatamente de Pernambuco a Francisco Nunes Martinho d'Eça para o substituir, partindo também ele para a Bahia, onde tomou conta do governo geral, dirigindo as operações de guerra, até que chegou o governador geral d. Francisco Rolim de Moura, pernambucano valente e amestrado na guerra, que veio de Lisboa a Pernambuco, e seguindo para a Bahia tomou posse do governo, no acampamento do Rio Vermelho, que imediatamente lhe foi entregue por Mathias de Albuquerque.

CVII – Cômputo eclesiástico. Áureo número 8; ciclo solar 7; epacta 18; letra dominical B.

CVIII – Martirológio. Páscoa 27 de março; 1º de janeiro sábado; indicação romana 5; período Juliano 6.335.

CIX – D. Diogo de Mendonça Furtado, décimo segundo governador geral do estado do Brasil, tomou posse da administração na Bahia no dia 12 de outubro de 1622; e como o estado permanecia em paz, cuidou o governador em promover o bem geral e a agricultura. A ermida de Nossa Senhora da Conceição da Praia, construída com assistência do governador Thomé de Souza em 1551, sendo frequentada por grande número de fiéis, moradores na Ribeira, foi elevada a Paróquia em 1623.

No seu governo foi tomada de assalto a cidade do Salvador e Bahia de Todos os Santos, porque inesperadamente aparecendo na barra,no dia 9 de maio de 1624, a armada holandesa, no dia seguinte 10 foi a cidade tomada de assalto, sendo preso a falsa fé o próprio governador d. Diogo de Mendonça Furtado e seu filho, e remetidos para Holanda, e incendiados os seus arquivos.

CX – Logo que foi vista a esquadra holandesa n alto mar da barra no dia 8 de maio, o governador Diogo de Mendonça Furtado mandou tocar a rebate, e reuniu para mais de três mil pessoas com as armas que tinham; e na tarde deste dia o bispo d. Marcos Teixeira, com uma companhia de eclesiásticos armados, não só para animar o povo como para defesa da cidade, percorreu as fortificações e o mais. Os padres jesuítas fizeram o mesmo.

No dia 9 entrou sem resistência a armada repartida em esquadra, ao som das trombetas e em tom de guerra, salvando o almirante a cidade, sem bala, e mandou à terra com bandeira de paz, que foi recebida com pelouros; o que vendo o inimigo, principiou o combate sobre a fortaleza do mar, e as outras e sobre a gente de terra; desembarca cerca de mil e quinhentos homens, ataca a fortaleza de Santo Antonio, e depois de renhido combate se apodera do forte, fugindo todos os habitantes.

Durante a noite do dia 9 de maio foi desesperada a luta entre aqueles e aqueles e a força holandesa, quando alta noite se ouviu uma voz que se espalhou pela cidade declarando terem entrado os inimigos, e se apoderando de todos o medo, abandonaram as suas casas aos invasores, deixando tudo nelas, e muitos até as armas. O bispo d. Marcos Teixeira foi ao colégio de Jesus, e dá parte e tudo aos padres, retirou-se com os jesuítas pela madrugada e indo para a Quinta do Tanque e daí para o Rio Vermelho.

No dia 10, vendo os holandeses que a cidade estava sossegada, entraram e foram tomar conta das casas reais, onde estava o governador d. Diogo de Mendonça Furtado e seu filho, e de mais três ou quatro homens desamparados de todos, os quais foram presos e mandados para a nau almirante; e saqueiam a cidade e os templos, onde estragam tudo. Indo os holandeses à quinta do Tanque, roubaram toda a prata; porém, dois ou três escravos, esperando-os de emboscada com arcos e flechas, os fizeram deixar o roubo, para não perderem a vida.

Os que saíram da cidade, em número de dez ou doze mil pessoas, andavam pelos matos mortos a fome e expostos a tudo. Os jesuítas foram se recolher à aldeia do Espírito Santo de sua jurisdição, e por ali foram a maior parte dos que deixaram a cidade para as fazendas do recôncavo, e para a aldeia de S. João.

Os índios na Vila Velha bateram os holandeses, e tomaram-lhes a fortaleza de Santo Antonio da Barra; o mesmo aconteceu perto de S. Bento, e do lado do Carmo.

O bispo, que se achava na aldeia do Espírito Santo, ajuntou alguns desembargadores e oficiais da câmara, e com eles fez conselho sobre o estado da guerra na Bahia, e como o governador se achava preso em poder dos inimigos, abriu-se a primeira via de socorros, mandada por el-rei, que indicava Mathias de Albuquerque, que se achava em Pernambuco, e como havia necessidade de nomear capitão-mor governador para juntar e armar os soldados para bater os inimigos foi eleito o dr. Antão de Mesquita de Oliveira, chanceler da redação, que muito fez, mas não pôde continuar; e depois de alguns dias o bispo, por aclamação, foi eleito capitão-mor, e tomou conta do governo e do comando da tropa, reunindo gente, nomeando capitães, repartiu companhias, com o pensamento de entrar na cidade invadida no dia 13 de junho.

Principiaram pelos arrabaldes acometendo o mosteiro do Carmo, o que levaram a efeito, onde estavam aquartelados muitos holandeses, e os prenderam, mas se retiraram porque os mesmos holandeses, ouvindo o toque do sino como sinal de rebate, vieram em grande número. Os jesuítas chegaram em auxílio do bispo com todos os índios das aldeias, até vindo mesmo com ele o velho padre reitor Fernão Cardim.

O bispo capitão-mor assentou arraial no Rio Vermelho; e ao primeiro encontro que teve a nossa força com a do inimigo, defronte do forte de S. Felippe, perto de Monserrate, foi morto o intrépido coronel holandês Wan Darte, com o que os soldados holandeses desanimaram.

CXI – O padre Bartholomeu Guerreiro, contemporâneo dos sucessos da guerra da Holanda na Bahia, conta que a nova companhia dos índios ocidentais se aprestou, no ano de 1623, com uma armada nas ilhas da Holanda e Zelândia de vinte e seis navios; treze próprios do Estado, e treze fretados de mercadores. Dos treze navios do Estado, e de toda a armada, era general Jaque Guilhelmo, holandês de sessenta anos de idade, bom soldado e marinheiro. Era almirante da armada Pero Perez, inglês de nação.

Dos treze navios de contratadores vinha por cabo João Dorth, que também vinha nomeado pelo conde Maurício, por governador do Brasil, por três anos, e juntamente vinha por mestre de campo; era natural de Izufifel, perto da Holanda. A quarta pessoa autorizada que vinha na armada era Francisco Duch, a quem Martim Corrêa de Sá tomou no Rio de Janeiro, e estando preso na cadeia da Bahia fugiu dela.

Vinha mais por capitão de um navio, um Rodrigo Pedro, morador que foi na capitania do Espírito Santo, que estando preso e condenado á morte, se sobresteve na execução por ordem de el-rei, em tempo do governador d. Luiz de Souza.

As despesas da armada foram iguais, tanto as do estado, como as dos mercadores. A força que embarcou foi de três mil homens escolhidos e de valor, com boas munições, armamento e artilharia. A fama que corria na Holanda era que a expedição se encaminhava para as possessões espanholas.

A armada saiu da Holanda no dia 21 de dezembro de 1623. No mar da Inglaterra, sobrevindo uma tormenta, se extramalhou a armada, e só no mês de janeiro se tornaram a juntar os navios em Cabo verde, demorando-se em S. Vicente, onde estiveram seis semanas; e abrindo aí o regimento e cartas que da Holanda traziam, ficaram todos certos que iam à Bahia de Todos os Santos, capitania do Brasil; e conforme as ordens da Holanda, armaram aí oito chalupas, em guerra.

Seria o regimento do general que, de improviso, atacasse a cidade do Salvador, como cabeça do Estado do Brasil; e esta rendida, salteasse Pernambuco, porque capituladas essas duas praças, o mais do Brasil ficaria ao alvedrio de suas armas.

Com efeito, chegaram à Bahia achando logo resistência pela parte do forte de Santo Antonio, desembarcando no lugar da barra mil e quinhentos homens, com suas armas e falcões, e marchando para a cidade, levando encarretadas algumas peças miúdas, e assim foi a cidade invadida, sem resistência,pela parte de Santo Antonio da Barra, onde só acharam alguns negros e homens velhos, fugindo para o interior todos os mais.

O governador Diogo de Mendonça Furtado, desamparado de todos, foi preso dentro do seu palácio e levado para a capitania com seu filho e dois ou três homens que o não abandonaram.

CXII – D. Marcos Teixeira, presbítero secular, chegou à Bahia e tomou posse do bispado em 1622. Governando em paz a sua diocese, quando mal se esperava, apareceu no dia 9 de maio de 1824, na barra da Bahia, a esquadra holandesa composta de vinte e cinco navios e três mil e quatrocentos homens de desembarque, sendo general da armada Jacob Willeckeens, e almirante Pedro Petrid, e comandante da tropa João Dorth.

Desembarcados os holandeses, entraram pelo corredor ou estrada da Victoria, e fazendo alto na larga rua de S. Pedro Velho, vieram acometer o castelo das portas de S. Bento ou de Santa Luzia, e como achassem resistência, se foram fortificar no mosteiro de S. Bento. Na noite do dia 9, os moradores, abandonando a cidade, os acompanhou o bispo d. Marcos Teixeira para os matos.

Desamparada a cidade, os holandeses entraram pelas duas ruas de Palácio e Ajuda; e se querendo apoderar do palácio, foram repelidos pelo governador d. Diogo de Mendonça Furtado, que nele estava com dezoito homens. Como o governador não podia resistir, capitulou, e à falsa fé foi preso, remetido para bordo e enviado para Holanda. Os holandeses se assenhorearam da cidade, a saquearam e cuidaram em fortificar-se.

Os moradores da cidade, que se tinham refugiado nos matos, se foram reunindo, e com os que vinham do recôncavo e os índios, formando um corpo suficiente, puseram cerco à cidade, não permitindo que os holandeses saíssem dela.

Para suceder ao governador d. Diogo de Mendonça Furtado, designava a carta régia que existia na mão do reitor dos jesuítas, a Mathias de Albuquerque, que governava Pernambuco; mas, como a província não podia estar sem governador, foi interinamente nomeado o ouvidor-geral Antão de Mesquita de Oliveira, que não aceitou o cargo por ser velho, e o renunciou nos capitães Lourenço Cavalcante e Antonio Cardoso de Barros, que foram imediatamente graduados em coronéis; porém, vendo existir entre eles uma autoridade superior, logo depois renunciaram o governo na pessoa do bispo d. Marcos Teixeira, que, aceitando-o, tratou de fazer preces e mudar o acampamento para o Rio Vermelho, pouco distante da cidade, onde se fortificou com nove peças e seis rouqueiras.

O bispo d. Marcos, pondo em ordem o seu pequeno exército, por vezes acometeu ao inimigo, sendo no ataque do dia 15 de julho morto em combate o general João Dorth.

Mathias de Albuquerque, sabendo do que se passava na Bahia, mandou Francisco Nunes Marinho d'Eça substituir ao bispo d. Marcos, que comandava em chefe o exército português por espaço de três meses.

O bispo d. Marcos Teixeira, talvez desgostoso por se ver substituído, sem ser pelo próprio Mathias de Albuquerque, sentiu agravarem-se os seus antigos achaques, e faleceu no dia 8 de outubro de 1624, com três anos de governo episcopal, sendo sepultado na capela de Nossa Senhora da Conceição de Itapagipe, hoje matriz de Nossa Senhora da Penha, que alguns anos antes tinha edificado Francisco de Medeiros, e o provedor-mor da fazenda real Antonio Cardoso de Barroso. Algumas memórias dizem que o bispo d. Marcos fora sepultado na capela do engenho da Conceição, que os lusitanos destruíram em 1822; porém, sabe-se que isto não podia ter tido lugar, porque este engenho foi levantado muito depois do ano de 1624. O certo é que não se sabe o lugar da sepultura do bispo Teixeira, porque a guerra não permitiu que se lhe pusesse inscrição.

CXIII – Em 9 de agosto de 1622 o capitão-mor Antonio de Albuquerque toma posse do governo da Paraíba do Norte e cuida com muito empenho no aumento da povoação e na agricultura.

CXIV – Cômputo eclesiástico. Áureo número 9; ciclo solar 8; epacta 29; letra dominical A.

CXV – Martirológio. Páscoa 16 de abril; 1º de janeiro, domingo; indicação romana 6; período Juliano 6.336.

CXVI – Felippe IV de Espanha, em atenção à grande distância do centro governamental, e das novas conquistas do Norte do Brasil, em 23 de junho de 1623 separou o estado do Maranhão e Grão Pará do governo geral do Brasil, fazendo-o exclusivamente dependente do de Lisboa; e nomeou governador do novo estado a Francisco Coelho de Carvalho, que efetuou a separação em setembro de 1629; sendo também nomeado Pedro de Albuquerque para governar o Pará.

Pouco tempo antes de Pedro de Albuquerque entrar na administração do Pará, Bento Maciel Parente pôs para fora os estrangeiros que se tinham estabelecido e fortificado no Rio Curupá.

Bento Maciel Parente foi o mais feroz de todos os colonos do Brasil, porque tendo devastado os índios do Pará e do Maranhão, o fazia por considerá-los animais bravios, e não homens suscetíveis de civilização.

CXVII – Rodrigo de Miranda Henrique era um cabo de guerra da cidade da Bahia, o qual sendo nomeado pelo governador geral do Estado, d. Diogo Luiz de Oliveira, para governador do Rio de Janeiro, em substituição a Martim de Sá que havia falecido, tomou posse da administração no dia 13 de junho de 1633, até que lhe veio sucessor da corte de Lisboa. Foi durante o seu governo que os monges de S. Bento obtiveram as terras que possuem no distrito de Maricá, cuja sesmaria lhes foi dada em 31 de outubro de 1635.

Rodrigo de Miranda Henrique nada fez que mereça particular atenção.

CXVIII – Em uns autos de demanda e sequestro, que encontrei na Bahia, promovido pelos herdeiros do bispo d. Pedro Leitão, a respeito de um vínculo em três casas de sobrado ao lado e por detrás da Sé, que fazem frente para a Rua do Passo do Saldanha, contra José Miralles, natural de Valença, casado com d. Josepha Ramos da Guerra no 1º de setembro de 1718, bisneta de d. Maria Guerra, casada com Pedro Gonçalves de Mattos, senhores do engenho Patatiba cujas casas ele Pedro G. de Mattos e sua mulher Maria Guerra haviam comprado a Ventura de Frias, as quais vincularam, tomando Maria Guerra na terça as casas da contenda, sendo elas usufruto, chamou sua neta Margarida filha de Maria Guerra e seu marido Gregorio de Mattos, cujo testamento foi aberto em 28 de março de 1645, observei em uma nota ter nascido na cidade do Salvador o célebre poeta satírico dr. Gregorio de Mattos Guerra.

Formado em Direito, na Universidade de Coimbra, exerceu a magistratura; mas o seu gênio mau, que a todos feria sem poupar a própria esposa, foi a causa de ser desterrado para Angola, e depois voltou para Pernambuco tão pobre que chegou a pedir esmolas para sustentar a vida, expirando em uma casa de caridade em 1696.

A respeito deste famoso poeta satírico há muitas anedotas que a tradição popular conserva na Bahia; e entre elas são as seguintes, que me referiu o padre João Quirino Gomes, bispo resignatário do Ceará, e meu mestre de Filosofia. Desesperada a mulher com o gênio de Gregorio de Mattos, retirou-se para a casa dos país; e ele no dia seguinte mandou por pelas esquinas pregões anunciando ter-lhe fugido a mulher, e o capitão do mato que a trouxesse presa seria bem gratificado. O pai da senhora, desgostoso com isto, vem trazer-lhe a mulher e ele a recusa dizendo que só a receberia entregue pelo capitão do mato, e o pobre sogro, que não desejava descasar sua filha, sujeitou-se à dura imposição do marido.

Ainda se conserva na Bahia, e eu vi porque me mostraram o frade de pau, começo da escada do sobrado, na ladeira do Tijolo, que tomou o tiro que lhe era destinado. Sabendo Gregorio de Mattos que o espreitavam para o matar, ao cair de uma noite colocou a cabeleira sobre a cabeça do frade, e sobre ela o chapéu, e por diante colocou o capote com que andava, e se pôs em observação em uma das janelas do segundo andar, quando se aproximando o assassino, à porta vê o vulto e supondo ser Gregorio de Mattos desfecha o tiro e ele de cima gritou matou o frade!!

Muitas de suas poesias satíricas correm impressas, e eu possuía dois tomos de poesias manuscritas que pertenceram ao visconde do Rio Vermelho, e que os emprestei a Francisco de Paula Brito, de saudosa memória, que m'os não restituiu, e se extraviaram com a sua morte. Estes preciosos manuscritos devem estar no poder de alguém no Rio de Janeiro.

CXIX – O convento do Carmo do Maranhão foi fundado em 1624 por fr. Christovão de Lisboa, sendo o seu primeiro prelado fr. André da Natividade em 1627, e secretário fr. Antonio de Santa Maria.

CXX – Sendo governador do Estado do Brasil d. Diogo de Menezes e d. Marcos Teixeira, quinto bispo da Bahia, foi elevada a capela de N. S. da Conceição da Praia, em 1623, à categoria de matriz, estabelecendo-se logo nela a irmandade do Santíssimo Sacramento, com toda a solenidade e pompa.

CXXI – As questões judiciais entre os herdeiros de Martim Affonso de Souza e os de se irmão Pedro Lopes de Souza, donatários das capitanias de S. Vicente e Santo Amaro, representados pelo conde de Monsanto, sexto herdeiro de Pedro Lopes de Souza e a condessa de Vimieiro, quarta herdeira de Martim Affonso de Souza, que continuava na sua doação, enquanto estes pleiteavam o seu direito, estava acéfala, e então, por ordem da condessa de Vimieiro, em 1624, foi designada a vila de Itanhaém para cabeça da capitania de S. Vicente, onde esteve a sede da administração até o ano de 1679.

CXXII – Cômputo eclesiástico. Epacta 10; letra dominical G. F.; Pásoa a 7 de abril.

CXXIII – Nas crônicas do tempo, e mesmo nos muitos documentos oficiais antigos que percorri, não achei a época da fundação da igreja do Corpo Santo da Bahia. Não existindo o compromisso e nem os livros primitivos da igreja, suponho que o templo foi edificado entre os anos de 1620 a 1624. Em um documento de 1694, consta que os mestres dos navios davam como contribuição, em proveito da fábrica da igreja de S. Pedro Gonçalves como padroeiro dos navegantes, dez mil réis, cinco mil réis e um mil réis, na razão da grandeza e lotação do navio.

Em 1714 se reuniram os mestres dos navios e fizeram um termo, em que se obrigavam a dar cada um aquelas quantias correspondentes à sua tripulação, sendo a dos navios grandes seiscentos e quarenta réis por cada marinheiro, e dos navios menores trezentos e vinte, com o fim da irmandade de S. Pedro Gonçalves fundar um hospital para curar os navegantes.

O termo foi aprovado pelo vice-rei. Em 1715 foi aprovada a deliberação, mas o hospital se não fez, e houve grande contestação entre a Santa Casa de Misericórdia e a irmandade, que não deu resultado, porque as quantias entregues foram consumidas pelos tesoureiros. O templo é rico de magníficas pinturas; e mete pena vê-lo estragado pela incúria e pelo desleixo.

CXXIV – Cômputo eclesiástico. Áureo número 10; ciclo solar 9; epacta 10; letra dominical G.F.

CXXV – Martirológio. Páscoa 7 de abril; 1º de janeiro segunda-feira; indicação romana 7; período Juliano 6.337.

CXXVI – Felippe II de Espanha e primeiro rei de Portugal oprimia as províncias de Holanda e a Zelândia, e as obrigava a uma resistência obstinada que por fim a coagiu a reconhecer a sua independência e a firmar com os Estados Gerais uma trégua de doze anos.

Este resultado teve por causa a adoção das instituições e o cansaço dos povos em obedecer ao poder arbitrário dos déspotas que comprimem e dos tiranos que devastam; e Felippe II, rompendo a trégua, os Estados Gerais da Holanda se preparam para a guerra, e acometem as possessões portuguesas da Ásia e da África; e os comerciantes de Amsterdam, desejando a posse de quatrocentas léguas de costa do Brasil para dela fazerem um grande império, ofereceram-se aos Estados Gerais, para fazer-lhes conquista, cujo projeto foi apresentado ao conde Mauricio em Haia em 3 de julho de 1623, por João André Moertecan, holandês, em vinte capítulos; e a companhia, de posse do privilégio, preparou-se de tudo, e no dia 22 de dezembro do mesmo ano de 1623 fez partir de Texel a sua formidável expedição, tendo à sua frente o almirante Jacob Villesques, para a marinha; e para o comando da infantaria o coronel João Van Dorth, em direção à Bahia de Todos os Santos, sendo vista a armada distante da barra no dia 8 (sexta-feira) de maio de 1624, composta de vinte e quatro velas, e no dia 10 dando desembarque entraram na cidade do Salvador, apesar de resistência dos fortes, e dos três mil soldados em terra, tomaram a cidade, sendo presos o governador geral Diogo de Mendonça Furtado, e seu filho, os quais foram enviados à Holanda; saquearam a cidade, e lhe queimaram os arquivos.

O bispo d. Marcos Teixeira, que a vê sem governador, toma conta do governo e dirige as operações de guerra contra os invasores, e morreu, segundo diziam, envenenado no arraial, no dia 6 de outubro de 1624, sendo sepultado na capela de N. S. da Conceição do engenho de Itapagipe [17].

CXXVII – André Dias Ferreira sucede neste ano de 1624 a Francisco de Albuquerque, no governo da capitania de Pernambuco, e a administra até 16 de janeiro de 1629, data em que regressou Mathias de Albuquerque, em razão dos holandeses quererem conquistar Pernambuco, o que efetivamente realizaram no dia 14 de fevereiro de 1630.

CXXVIII – Aberta a via de sucessão governamental, por se supor morto Diogo de Mendonça, com as formalidades legais, achou-se que o devia suceder Mathias de Albuquerque, que governava Pernambuco, em lugar de seu irmão Duarte de Albuquerque, donatário da capitania.

Avisado logo Mathias de Albuquerque por um correio expresso de que era por sua majestade determinado que fosse o sucessor no governo geral do Estado, e que viesse tomar conta do mando, e trouxesse socorros, mandou em seu lugar Francisco Nunes Marinho d'Eça, valente cabo de guerra, experimentado e muito prudente; e ao mesmo tempo Mathias de Albuquerque, mandando notícia a el-rei da tomada da Bahia, ela lhe chegou a 26 de julho, respondendo el-rei em 2 de agosto do mesmo ano.

O sentimento da tomada da Bahia pelos holandeses foi geral, vindo logo socorros mandados pelos governadores de Lisboa e el-rei.

El-rei mandou que se fizessem preces a Deus em todo o Portugal e em toda a Espanha, as quais efetivamente se fizeram. No entanto, os holandeses eram batidos, e mortos em vários pontos da cidade, sendo a principal parte do nosso exército antes de chegar a armada de Portugal, de índios flecheiros dos jesuítas, dirigidos por seus chefes às ordens dos padres da companhia, os quais atacavam os holandeses atirando-lhes nuvens de flechas que os atravessavam de lado a lado.

CXXIX – El-rei deu ordens aos governadores de Lisboa para se aprontar não só a armada como a força que devia embarcar para o Brasil. O número dos navios da armada de Portugal era de vinte e seis, quatro urcas com mantimentos, uma das quais era de Duarte de Albuquerque, senhor de Pernambuco, e os mais navios maiores e menores eram de guerra.

O galeão S. João, capitâneo da armada real, em que embarcou o general d. Manoel de Menezes; o galeão Santa Anna, almirante, capitão d. Francisco de Almeida; galeão Conceição, capitão Antonio Moniz Barreto; galeão S. José, capitão d. Rodrigo Lobo; nau Nossa Senhora do Rosario, capitão Tristão de Mendonça Furtado; nau Santa Cruz, capitão Constantino de Mello; nau Charidade, capitão Lancerote da França; nau S. João Baptista, capitão Manoel Dias de Andrade; nau Nossa Senhora do Rosario Menor, capitão Christovão Cabral; nau Nossa Senhora das Neves Maior, capitão Domingos Gil da Fonseca; nau Nossa Senhora das Neves Menor, capitão Gonçalo Lobo Barreto; nau S. Bartholomeu, capitão Domingos da Camara; nau S. João Evangelista, capitão Diogo Ferreira; nau Nossa Senhora da Ajuda, capitão Gregorio Soares; nau Nossa Senhora da Penha de França, capitão Domingos Varejão; nau Nossa Senhora da Boa Viagem, capitão Bento do Rego Barbosa; navio S. Bom Homem, capitão João Casado Jacome; caravela Conceição, capitão Sebastião Marques; caravela Rosario, capitão Manoel Palhares Lobato; caravela Remedios, capitão Roque Monte Ruy; caravela S. João, capitão Cosme do Couto. A gente que ia na armada de mar e terra compunha o número de quarenta mil homens.

Conduziam as urcas sete mil e quinhentos quintais de biscoitos; oitocentas e oitenta e quatro pipas de vinho; mil, trezentas setenta e oito pipas d'água; quatro mil, cento e vinte arrobas de carne; três mil, setecentos e trinta e nove peixes; mil setecentos e oitenta e duas arrobas de arroz; cento e vinte e dois quartos de azeite; noventa e três pipas de vinagre; e fora deste provimento levava a armada muitos queijos, passas, figos, amêndoas, ameixas passadas, legumes, doces, especiarias, sal, e vinte e duas boticas, dois médicos; e cada navio, cirurgiões; duzentas camas para os enfermos e grande provimento de meias, sapatos e camisas.

Levava a armada trezentas e dez peças de artilharia; pelouros redondos e de cadeias; dois mil, quinhentos e quatro mosquetes; e arcabuzes, dois mil, setecentos e cinquenta e cinco, fora muitas armas de fogo, sem falar as que levavam os fidalgos e aventureiros.

Morrão para as peças, duzentos e dois quintais; pólvora, quinhentos quintais; e trezentos que se compraram em Cadiz e Sevilha, que foram na armada de Castella para se entregarem à armada de Portugal, em Cabo Verde.

Levava a armada muitas palanquetas de ferro; lanternetas, pés-de-cabra, colheres, carregadores, picaretas, machados, serras e todo o preciso para a guerra; e para qualquer eventualidade levou vinte mil cruzados em reales.

CXXX – Os holandeses, de posse da cidade do Salvador, faziam fornalhas pelas praias para danificarem as forças marítimas inimigas. Nas ruas da cidade fizeram trincheiras, e sobre elas colocaram peças, como a de S. Bento; na praça fizeram outra, onde colocaram oito peças de artilharia; na praia fizeram vinte trincheiras; fizeram sete baluartes em terra, alguns com peças; fizeram estacadas corridas e bem fortificadas; e em várias partes levantaram quatro redutos, sendo um deles em forma de meia lua e todos bem aparelhados. No mar tinham vinte e seis navios, sendo seis de guerra de seiscentas a setecentas toneladas.

CXXXI – Estando com poucos recursos o erário régio, e urgindo aprontar-se logo a armada para restaurar a Bahia do poder holandês, o patriotismo nacional não se deixou esperar, oferecendo a cidade de Lisboa cem mil cruzados, tirados com igualdade da nobreza, igreja e povo, do pequeno tributo lançado nas carnes e vinhos, aplicados às obras públicas.

D. Theodoro, segundo duque de Bragança, ofereceu vinte mil cruzados; o duque de Caminha, marquês de Villa Real, e d. Miguel de Menezes, mil seiscentos e vinte cruzados; o duque de Villa Hermosa, conde de Ficalho, presidente do conselho, d. Carlos Borja, dois mil e quinhentos cruzados por conta da fazenda real; o marquês de Castello Rodrigo, d. Manuel de Moura Côrte Real, ofereceu dois mil, quinhentos e cinquenta cruzados; d. Luiz de Souza, que foi governador do Brasil, três mil e trezentos cruzados, e mais trinta moios de trigo para biscoito; o conde de Castanheira, d. João de Atayde, dois mile quinhentos cruzados; Francisco Soares ofereceu mil cruzados; d. Pedro de Alcaçova, mil e quinhentos cruzados; Antonio Gomes da Matta, correio-mor, dois mil cruzados; d. Pedro Coutinho, dois mil cruzados; Constantino de Magalhães, quinhentos cruzados; Tristão de Mendonça Furtado ofereceu um navio de quinhentas toneladas, vinte peças de artilharia, duzentos homens de mar e guerra, pagos à sua custa, e providos de mantimentos e munições de guerra, avaliado tudo em nove mil e quinhentos cruzados; o arcebispo de Lisboa d. Miguel de Castro, dois mil cruzados; d. Affonso Furtado de Mendonça, dez mil cruzados; d. José de Mello, quatro mil cruzados; d. Francisco de Castro, dois mil cruzados; d. João Manuel, quatro mil cruzados; d. Francisco de Castro, dois mil cruzados, e outros bispos e fidalgos, e mesmo particulares que fizeram donativos, cuja nomenclatura é extensa (Vide o 3º tomo da minha Corogr. Historica).

CXXXII – O donatário Coutinho passou a sua capitania a Francisco de Aguiar Coutinho, ocupada pelos holandeses em 1624, a qual foi libertada por Salvador Corrêa de Sá e Benevides, quando, por seu pai Martim de Sá, governador do Rio de Janeiro, foi socorrer a Bahia, à frente de duzentos soldados. Dos descendentes de Coutinho, passou a capitania às mãos do almotacé-mor do reino Antonio Luiz Gonçalves da Camara Coutinho, que foi governador geral do Brasil, e vice-rei da Índia, que o vendeu ao coronel Francisco Gil de Araujo por quarenta mil cruzados.

Depois acompanhou Manoel Garcia Pimentel em 5 de dezembro de 1687; e por seu falecimento, passou ela a Cosme Rolim de Moura, primo e cunhado de Manuel Garcia Pimentel, a quem a comprou el-rei d. João V por quarenta mil cruzados, para incorporá-la à coroa, por carta régia de 6 de abril de 1717.

CXXXIII – Cômputo eclesiástico. Áureo número 11; ciclo solar 10; epacta 21; letra dominical E.

CXXXIV – Martirológio. Páscoa 30 de março; 1º de janeiro quarta-feira; indicação romana 8; período Juliano 6.328.

CXXXV – Von Dorth, no governo da cidade do Salvador, em um reconhecimento que procurou fazer na segunda-feira, 17 de junho, é morto pelo capitão Francisco Padilha, em luta corpo a corpo. Willeckens volta para a Europa, e Itaynes vai atacar a capitania do Espírito Santo.

CXXXVI – Mathias de Albuquerque, logo que soube que o bispo d. Marcos Teixeira estava como governador e dirigindo as operações de guerra contra os holandeses, enviou de Pernambuco a Francisco Nunes e Miranda d'Eça, e logo depois marchou para a Bahia, e tomou conta do governo do 1º de maio de 1625, em cujo ano chegou o novo governador que o substituiu.

No governo de Mathias de Albuquerque, foi restaurada a Bahia pelo general português d. Manuel de Menezes, e pelo de Espanha d. Fradique de Toledo d'Eça, marquês de Valdoeza, que mandavam em chefe as duas armadas, e que fundearam na Bahia no dia 28 de março de 1625, com doze mil homens de desembarque. A de Manuel de Menezes se compunha de vinte e duas naus, na qual se embarcou toda a nobreza e titulares de Portugal; e a do chefe espanhol se compunha de trinta e oito naus, em que se embarcou muita fidalguia da Espanha, cuja armada, pondo a cidade em sítio, obrigou o inimigo a evacuá-la no dia 30 de abril. Passados quinze dias lhes puseram sítio os holandeses; porém, vendo que nada conseguiriam, levantaram e se retiraram com grane perda de naus e de gente. A perda mais sensível que experimentaram os holandeses foi a de seu general João Dorth, que ficou sepultado na Bahia.

A armada holandesa se compunha de vinte e cinco navios comandados pelo general Jacob Willeckens, e pelo almirante Pedro Petrid.

CXXXVII – A armada de Portugal que saiu de Lisboa e veio à Bahia compunha-se de vinte e seis galeões em que se embarcou a principal nobreza do reino em 22 de novembro, sendo general d. Manuel de Menezes, almirante d. Francisco de Almeida. Esta armada se uniu em Cabo Verde à de Castella, composta de trinta e oito navios bem armados, trazendo por general d. Fradique de Toledo, marquês de Valdoeza, almirante d. João Fajardo, e deram fundo na Bahia no dia 28 de março de 1625, e depois de forte resistência e renhido combate foi restaurada a cidade, e expulsos os holandeses, como já fica exposto.

CXXXVIII – Depois de muitos aprestos, e das repetidas ordens de el-rei para a saída da armada desde o mês de setembro, só pode ela levantar os ferros no porto de Lisboa no dia 22 de novembro de 1624, reunindo-se à armada espanhola em Cabo Verde, onde por causa do tempo sofreu algumas contrariedades, mas vencidas elas seguem caminho do Brasil, com sessenta velas, e chega à Bahia no dia 1 de abril de 1625, em modo a não deixar saírem os navios inimigos.

A força portuguesa e espanhola dentro da Bahia, e em posição de resistência, começou a desembarcar gente em terra sem violência; mas logo depois entraram em combate, morrendo na peleja o mestre de campo d. Pedro Osório. Desembarcados que foram todos, continuou a luta, morrendo nela o morgado Martim Affonso de Oliveira.

Cercados os holandeses, foram batidos no quartel do Carmo, assistindo ao ataque o general d. Fradique de Toledo; no sítio da Palma (antigo das Palmeiras) ou como o chamavam o Sítio do Correeiro, comandada a força pelos mestres de campo Antonio Muniz Barreto e d. João Orelhana. Em outro sítio se colocaram d. Francisco de Moura, Jeronymo Cavalcante de Albuquerque e Duarte de Albuquerque, governador de Pernambuco, com grande força.

O quarto sítio de ataque e o mais importante foi o quartel de S. Bento em que assistiu o mestre de campo general o marquês de Corpani, com o mestre de campo d. Francisco de Almeida, almirante da armada de Portugal, o marquês de Tonecura.

Pela praia eram eles batidos por d. Manuel de Menezes e como o almirante espanhol achasse um caminho seguido da Morinha para S. Bento, por aí foi atacar o inimigo. A luta foi decidida, e aí morreu na peleja d. Pedro Osorio, e mais três capitães. D. Francisco de Almeida ficou senhor do convento de S. Bento, que então possuía o inimigo.

CXXXIX – Depois de muita mortandade, e por toda a parte cercado o inimigo holandês, se rendeu, e um cabo levando uma carta no dia 28 de abril assinada pelos coronéis Hans, Ernesto e Riffgnamelt, pedindo pazes; e o general convocando conselho, sendo chamados d. Affonso de Noronha, o conde de S. João, Duarte de Albuquerque Lourenço Pires Carvalho, o mestre de campo general Diogo Rodrigues, e o governador João Vicente de S. Feliz, concordaram na suspensão das armas; porém não mandaram resposta.

No dia 29 de abril os holandeses escreveram nova carta ao general, dizendo estar resolvido em conselho entregarem a cidade, com a condição de lhes darem três semanas para se proverem do necessário para a jornada. Que lhes dariam quatro navios de trezentas toneladas para o transporte da sua gente; e que sairiam com tudo o que tenham em seu poder e os soldados com as suas armas, e seus navios com as peças etc. Que os seus ministros sairiam com seus livros e ornamentos, sem serem molestados; que a nenhum deles se pediriam os bens conquistados nem pilhados na conquista da cidade; que os portugueses que com eles ficaram na cidade não fossem desacatados; que consentindo nestes artigos de capitulação dariam sem resgate a d. Francisco Sarmento, a d. Agostinho, a d. João, seu genro, a mulher e filhos e mais família de d. Francisco e a d. Francisco Baraba, a fr. Vicente Palha e seu companheiro; e que os presos de ambas as partes fossem livres sem resgate; só entrando o exército português na cidade depois que eles partissem livremente.

A tudo isto respondeu d. Fradique de Toledo que se achando ele com um exército poderoso e grossa armada, e portanto senhor do mar e da terra, que estando eles cercados, entraria na cidade pela força das armas, sendo o mais que lhe podia conceder poupar-lhes as vidas, transporte para suas terras, mantimento, restituindo-lhes todos os presos, e no primeiro lugar o governador Diogo de Mendonça Furtado.

Os holandeses não aceitaram esta resposta, e responderam que não podiam entregar Diogo de Mendonça Furtado por estar na Holanda.

Apertando-se-lhes mais o cerco, no dia 30 de abril do mesmo ano de 1625 mandaram a d. Fradique de Toledo a seguinte carta:

"Nós o coronel e conselho damos poder, e havemos por bem, que os senhores Guilhelino Stop, Hugo Antonio, Francisco Ducks; pessoas do nosso conselho vão a tratar com o marquês d. Fradique d Toledo sobre a entrega da cidade do Salvador, e concertar com o dito senhor as capitulações apresentadas por nossa parte na melhor forma que puderem. E o que os ditos senhores tratarem, daremos por bem feito, e o cumpriremos pontualmente com sinceridade. Feita na cidade de S. Salvador, em 30 de abril de 1625".

CXL – Francisco de Aguiar Coutinho, no dia 13 de junho de 1620, na qualidade de donatário da capitania do Espírito Santo, tomou posse dela; e os holandeses em maio de 1625, comandados por Adrião Patrid, fez desembarque em diferentes pontos, e atacando a vila em 12 e 14 do mesmo mês foram repelidos.

Brito Freire diz que o que mais concorreu para o sucesso da expulsão holandesa do Espírito Santo foi o ato heroico de Maria Urtiz que da janela de sua casa, espreitando a passagem de Adrião Patrid, lhe despejou uma caldeira de água fervente, que o obrigou a retroceder, e com isso desanimou a sua gente.

Seguindo para o Norte, entra na barra da Bahia, sem ser esperado, e à vista de todos apreendeu dentro do porto doze navios carregados de gêneros, levando o terror pelo recôncavo porque fez nele grandes estragos.

CXLI – Na segunda-feira 24 de junho de 1624 nasce na Bahia de Todos os Santos João Rodrigues Adorno, fundador da povoação da vila de Nossa Senhora do Rosario do porto da Cachoeira, depois cidade, na província da Bahia.

CXLII – Em honra de Portugal lembrarei que foram os fidalgos portugueses os primeiros que se apresentaram a embarcar para a Bahia com o fim de a restaurar do poder holandês, sem atenção à posição social e nem ao estado de casado ou de solteiro.

CXLIII – Os casados que partiram para a Bahia foram: d. Manuel de Menezes, general da armada real; d. Francisco de Almeida, almirante e mestre de campo de um terço; d. Alfonso de Noronha, do conselho de Estado; Luiz Alves de Tavora, conde de S. João; d. Affonso de Portugal, conde de Vimioso; d. Duarte de Menezes, conde de Tarouca; Martim Affonso de Oliveira de Miranda, morgado de Oliveira; Duarte de Albuquerque, senhor de Pernambuco; d. Henrique de Menezes, senhor de Louriçal; d. Alvaro Coutinho; d. Antonio Corrêa; d. Antonio de Castello Branco; d. Lopes da Cunha; Ruy de Moura Telles, senhor de Povoa; d. João de Souza, alcaide-mor de Thomar; d. Francisco de Portugal; Pero da Silva, governador que foi da Mina; João da Silva Telles de Menezes, coronel de Lisboa; Alvaro Pires de Tavora; Ruy Lourenço de Tavora, governador que foi do reino do Algarve e vice-rei da Índia; d. Antonio de Menezes; Luiz Cesar de Menezes, filho e herdeiro de Vasco Fernandes Cesar, provedor dos armazéns de el-rei; Pero Cesar d'Eça; Francisco de Mello e Castro, filho de Antonio de Mello, presidente da câmara de Lisboa e do conselho do Paço; Tristão de Mendonça Furtado, filho de Pero de Mendonça Furtado, do conselho do Estado da Índia; Estevão de Brito Freire; d. Rodrigo Lobo; Ruy Barreto de Moura; Nuno da Cunha; Jeronymo de Mello e Castro; João de Mello.

CLXIV – Fidalgos solteiros que embarcaram para a restauração da Bahia: Antonio Muniz Barreto, mestre de campo; Antonio Luiz de Tavora, filho e herdeiro do conde de S. João; Lourenço Pires de Carvalho, filho de Gonçalo Pires de Carvalho, provedor das obras de el-rei; d. João Telles de Menezes, capitão de infantaria, filho do general da armada; d. Alvaro de Branches, capitão de infantaria, filho de d. Francisco Coutinho, e neto do conde de Villa Franca; Gonçalo de Souza, capitão de infantaria, filho de Fernão de Souza, governador de Angola; Antonio Telles da Silva, filho de Luiz da Silva, do conselho de estado e vedor da fazenda real; d. Affonso de Menezes, filho de d. Fradique de Menezes; d. Francisco de Faro, filho do conde d. Estevão de Faro, do conselho de estado e vedor da fazenda real; d. Sancho de Faro, capitão de infantaria, filho do conde de Vimieiro; d. João de Lima, filho do visconde de Villa Nova da Cerveira; d. João de Portugal, filho de d. Nuno lves de Portugal, governador que foi do reino; Antonio da Silva; o capitão Lucas; Alvaro de Souza, filho de Gaspar de Souza, do conselho de estado e governador que foi do Brasil; Antonio Carneiro de Aragão; d. João de Menezes; Rodrigo de Miranda Henriques; Pero da Silva da Cunha; Manuel de Souza Coutinho, filho de Christovão de Souza Coutinho, guarda-mor das naus da Índia; Ruy de Figueiredo; Luiz Gomes de Figueiredo e Antonio de Figueiredo; d. Diogo de Vasconcellos de Menezes, e seu irmão d. Sebastião; d. Nuno de Mascarenhas da Costa; Nuno Gonçalves de Farias, filho do alcaide-mor Nicolau de Farias; Pero Lopes Lobo; Sebastião de Sá de Menezes, filho do célebre Francisco de Sá de Menezes e irmão do conde de Mattosinhos, Simão de Mascarenhas; d. Lourenço de Almada; d. Francisco Muniz; d. Francisco de Toledo; Antonio de Abreu; Gonçalo Tavares de Souza; Simão de Miranda; d. Diogo da Silveira, neto do conde de Sortella; João Mendes de Vasconcellos, filho de Luiz Mendes de Vasconcellos, governador de Angola; d. Rodrigo da Silveira e seu irmão Fernão da Silveira; d. Diogo de Noronha; Antonio de Sampaio; Lopo de Souza; Ruy Dias da Cunha; d. Manuel Lobo; Manuel de Souza Mascarenhas; d. Diogo Lobo; Jorge de Mello; Francisco de Sá; Duarte de Mello Pereira; Martim Affonso Pereira; Martim Affonso de Mello e José de Mello, seu irmão; Estevão Affonso de Mello; Pero Cardoso Coutinho; Antonio Pinto Coelho; Fernão Coutinho; Amaro de Souza; Simão Ferreira de Andrade; Pero Corrêa da Silva; Antonio de Freitas da Silva; Antonio Taveira; Francisco de Mendonça Furtado; Christovão de Mendonça Furtado; Henrique Corrêa da Silva; Gaspar de Paiva de Magalhães; d. Antonio de Mello; Garcia Velez de Castello Branco; Jorge Mexia; d. Manuel Coutinho; José Machado de Brito; Paulo Cabral e outros.

A vila de Vianna apresentou trezentos homens de mar e terra, e ofereceu três navios para a viagem, embarcando para a Bahia a sua nobreza, sendo os principais, João Ferreira, provedor da fazenda real no Brasil; o capitão Diogo Ferreira, e seu irmão; o capitão Gonçalo Lobo Barreto; d. Antonio de Lima, e seu filho d. Francisco de Lima; João Barboza de Almeida; Manuel de Lima; Francisco Pedrosa; Bernardo Velho Boto; Manuel Caminha Corrêa; José de Gouvêa Corrêa; Antonio Pinto; Manuel do Rego; Jacome da Silva; quatro filhos de Pedro velho Travassos; Antonio Morim Serrão; João Barboza; Diogo Jacome Bezerra; Domingos Ferreira; Belchior Prestes; Thomaz Fernandes; Francisco Munhóes Corrêa; Gabriel Farjado Bezerra; Valentim de Souza; Domingos Ferreira Jacome; Domingos Burgueira; Bento Rangel; Antonio Bravo de Tavora; Simão Salgado; Manuel Dias; Manuel de Farias; Gaspar Maciel; o capitão Affonso Caminha Barros; Lourenço de Morim; Antonio Borges Pacheco; Antonio Velho Godim; Affonso do Porto; Manuel Corrêa; Jorge Pinto; Jacintho de Alpoim; Gaspar Sizio; Balthazar Sizio Cogminho; Luiz Pinto Pedroso; o capitão João Casado Jacome; o capitão Bento do Rego; Antonio de Magalhães; Diogo da Rocha Brandão; Simão Fagundes Jacome; João da Rocha Fagundes; o padre Estevão Rodrigues da Rocha a junta do Porto mandou dez navios sob o comando de Tristão de Mendonça Furtado.

CXLV – De posse d. Fradique de Toledo da credencial do conselho holandês para a capitulação e entrega da cidade a Sua Majestade, foram lavrados em escritura pública a concordata oficial dos comissários, a saber: que toda a artilharia, armas, bandeiras, munições, apetrechos, bastimentos, navios, dinheiro, ouro, prata, joias, mercancias, escravos, cavalos e tudo o mais que se achar na cidade do Salvador, com todos os presos que tiverem, e que não tomaram armas contra Sua Majestade até se verem na Holanda. Que os oficiais possam sair da cidade com sua roupa de vestir e dormir. Os coronéis e oficiais poderão sair com seus baús e caixas e nada mais; e os soldados com suas mochilas. Que o general de Sua Majestade mandará passaporte para os navios reais, e não os achando lhes dará embarcações para os levar à Holanda. Que sairão da cidade todos juntos levando consigo os que se acharem presos, e os instrumentos etc. Assinados no quartel do Carmo em 30 de abril de 1625. D. Fradique de Toledo Ozorio, Guilhelmo Stap, Itugo Antonio, Francisco Ducks.

CXLVI - Concordada e assinada a capitulação, deram os holandeses a entrada na cidade sitiada no 1º de maio de 1625, sendo os primeiros que entraram o marquês de Crapani e d. João de Orelha, a quem não tocava a entrada, e sim a Antonio Muniz Barreto, mestre de campo de um terço português; e depois toda a força que sitiava a cidade do Salvador, arvorando nas fortalezas e lugares públicos as quinas de Portugal e Castela.

No dia 5 de maio se celebraram festas na cidade em ação de graças ao Todo Poderoso, pregando nesta solenidade o reverendo fr. Gaspar, que d. Affonso de Noronha levou por seu confessor.

É preciso lembrar que, durante a invasão holandesa na Bahia, os moradores do recôncavo acudiram com empenho na defesa do país. Invadindo os flamengos a Ilha de Itaparica, deram muitos golpes em uma cruz que se venerava em frente de uma ermida, e, sendo presenciado o fato, foram todos mortos. Um cronista contemporâneo memora um prodígio que se viu por ocasião da mutilação da cruz.

Quando tudo era satisfação pelos triunfos das nossas armas contra os flamengos, no dia 26 de maio chegam trinta e quatro navios que vinham engrossar as forças da Holanda na Bahia; mas caindo sobre eles a nossa esquadra, os afugentaram para as Antilhas. Foi por esta ocasião que o célebre padre Antonio Vieira pregou o seu famoso sermão na igreja da Ajuda, que transcrevi, como modelo de eloquência sagrada, no tomo 3º da minha Corogr. Historica.

CXLVII - O senado da câmara da Bahia anualmente festejava com pompa o dia aniversário da restauração da cidade do Salvador e Bahia de Todos os Santos. Esta festa durou de 1625 até 1828, que foi o último que o senado da Bahia comemorou.

Eu possuo um quadro comemorativo desta solenidade, que o mandei copiar do grande painel original que existe no mosteiro da Graça da Bahia (Vide o meu Brazil Hist.).

CXLVIII - Em 12 de maio de 1625 foi acometida a capitania do Espírito Santo por oito naus holandesas, dando desembarque na vila; mas o capitão Francisco de Aguiar Coutinho, ajuntando a gente da terra, indo ao encontro deles, os bateu, morrendo uns a fio de espada e outros afogados.

No dia seguinte pretenderam os holandeses tirar desforra; mas Salvador Corrêa de Sá e Benevides, filho de Martim de Sá, governador do Rio de Janeiro, que vinha por ordem de seu pai socorrer a Bahia, com duas caravelas e quatro canoas grandes, os acometeu com tanto denodo que lhes matando em combate quarenta homens, pôs os demais a fugir.

No dia 15 de maio o general holandês mandou à terra pedir um sobrinho seu que o julgava prisioneiro oferecendo resgate, e também pedir aos padres da companhia lhes mandassem refrescos, como fizeram os padres da Bahia, e tiveram em resposta que o sobrinho fora morto em combate e não se achava preso; e quanto aos refrescos na terra não haviam outros que os que eles tinham tomado nos dois dias passados.

Os holandeses neste mesmo ano atacam a Paraíba do Norte e o Rio Grande, e são expulsos vigorosamente pelos habitantes auxiliados pelos índios capitaneados por quatro jesuítas.

CXLIX – D. Fradique de Toledo, depois de tomada a cidade da Bahia aos holandeses, prevenido tudo e colocado os negócios públicos em boa ordem e entregado o governo geral do Brasil a d. Francisco de Moura Rollim, natural de Pernambuco, no dia 4 de agosto do mesmo ano de 1625, desferrou a armada do porto da Bahia de Todos os Santos comboiando os holandeses que haviam capitulado; mas em consequência do mau tempo que apanharam durante a viagem para a Europa muitas embarcações naufragaram.

D. Francisco de Moura Rollim governou até o dia 30 de novembro de 1625, passando a administração geral a d. Diogo Luiz de Oliveira, conde de Miranda.

CL – No 1º de maio do ano seguinte de 1625, são os holandeses expulsos da Bahia, por d. Fradique de Toledo, almirante espanhol, que fundou em 28 de março com uma esquadra de sessenta velas portuguesas e espanholas e doze mil homens de desembarque, mandados para a restauração da Bahia, a qual posta em sítio, como já contei, foram os holandeses forçados a deixá-la no dia 30 de abril. D. Fradique de Toledo, depois de prevenir todas as ocorrências, e colocar os negócios públicos em bom estado, entregou o governo no dia 30 de novembro, domingo do mesmo ano de 1625, nas mãos de d. Francisco Rollim de Moura, décimo quarto governador geral, natural de Pernambuco, no qual esteve até 1626.

[...]


[17] Vide da pág. 34 em diante o histórico minucioso da guerra contra a invasão holandesa na Bahia, no Tomo 4º da minha Corographia Historica etc.