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Última modificação em (mês/dia/ano/horário): 10/09/01 03:42:58
Edição 100 - SET/2001

Habitação

Governo muda, mas não satisfaz

Renata Viana

O impacto das recentes medidas do Governo, como a suspensão do crédito para a classe média através da Caixa Econômica Federal, agravou ainda mais a situação dos setores que participam da indústria imobiliária. Em vez de atender aos anseios do setor, que nos últimos anos espera a definição de uma ampla política habitacional, o governo apontou para um novo modelo habitacional que só traz dúvidas e incertezas. 

Apesar de sofrer os efeitos da conjuntura internacional, o mercado da construção civil vinha reagindo de forma positiva, até que uma série de acontecimentos modificou esse rumo. Os escândalos ocorridos no Congresso, a crise energética e a recessão econômica na Argentina assombraram e fizeram despencar a credibilidade do governo, espantando de vez os investidores. Depois, o fantasma da crise econômica mundial, ocasionada pelo terrorismo nos EUA, veio ampliar ainda mais o clima de indefinição que permeia a indústria imobiliária.

A medida mais preocupante é a suspensão dos financiamentos imobiliários para a classe média (leia box). Como um dos primeiros reflexos, houve o esfriamento do mercado secundário em função das Cartas de Crédito que estavam sendo concedidas a este público. Responsável pela alavancagem do mercado de novos, a retração do mercado de imóveis de segunda mão vai resultar na queda do mercado como um todo.

Foto: Sandra Neto
Popularização - Muito embora o governo tenha anunciado que se trata de uma medida temporária, a suspensão torna evidente a tendência de direcionar os financiamentos oficiais para a aquisição da casa própria em função das classes mais populares. A justificativa dada pela instituição, contudo, sem que fossem anunciadas outras medidas de incentivo a este tipo de habitação, não satisfez nem respondeu  às necessidades do mercado.

“A classe média não ficará desamparada porque vem sendo atendida pela CEF há mais tempo”, acredita Waldir Monti, gerente de mercado da CEF na Baixada Santista. Ele afirma que a instituição tem intenção de antecipar o projeto de consórcio de imóveis para o início de 2002, assim como a Carta de Crédito, que deve ser relançada com outras características.

Um dos motivos que levaram a Caixa a afastar-se da classe média é que o banco encontra-se “superaplicado” em financiamentos habitacionais e o montante emprestado supera as operações de caderneta de poupança. Para aplicar no mercado imobiliário, a CEF cobrava dos mutuários 12% de juros ao ano enquanto captava recursos no mercado à taxa Selic, equivalente a 19%.

Alternativas - Domingos Augusto de Oliveira, proprietário da Construtora Conpral, também atribui a falta de investimentos externos às deficiências do Poder Judiciário. “Talvez os bancos estrangeiros não se sintam seguros porque a Justiça é lenta e não funciona como deveria”, analisa. Para ele, o panorama tende a se modificar devido aos efeitos das Medidas Provisórias 2.221 e 2.223. “Antes, torcíamos para que a inadimplência não existisse porque não existiam mecanismos de retomada”, conta ele. O construtor afirma que as empresas terão que entender como funcionam os novos mecanismos de oferta de crédito disponibilizados com as medidas. “Teremos que nos adaptar o mais rápido possível”, diz.

Neste contexto, o financiamento direto com as construtoras foi uma das alternativas encontradas pelos empresários para não perder mercado. Para José Marcelo Ferreira Marques, presidente da Associação dos Empresários da Construção Civil da Baixada Santista, a Assecob, e proprietário da ConstruHab, trata-se de uma opção menos burocrática que serve principalmente à classe média. 

“Os santistas têm medo de se comprometer com instituições financeiras porque as taxas de juros são muito altas”, esclarece, lembrando que as construtoras financiam os valores em prazos razoáveis com taxas de juros semelhantes às dos bancos. Ele ressalta a importância dos financiamentos concedidos por bancos privados, mas revela que esta não é uma característica do mercado da Baixada Santista. “Grande parte das construtoras já passaram a trabalhar apenas com o financiamento direto”, diz o dirigente. 
 

Medidas não definem
Lançada no final de 8/2001, a suspensão temporária dos financiamentos habitacionais para a classe média foi uma determinação do governo em conseqüência da reestruturação patrimonial sofrida pela CEF dentro do programa de ajustes dos bancos federais.

O corte é válido para as modalidades Carta de Crédito Individual Caixa (recursos da caderneta de poupança), Poupança de Crédito Imobiliário (poupanção, que se destinava à compra de imóveis usados), Imóvel na Planta (cuja renda mínima exigida sobe para R$ 3.250,00) e Convênio Caixa do Trabalhador. A determinação prevê andamento normal apenas às linhas de crédito que utilizam recursos do FGTS voltadas às famílias com renda inferior a R$ 2.000,00.

Em resposta às reações negativas do mercado à suspensão, o governo lançou no início de 9/2001 a Medida Provisória 2.223 que criou mecanismos como a Cédula de Crédito Imobiliário (CCI), que facilita a cessão e a securitização de créditos imobiliários, e a Letra de Crédito Imobiliário, que pode ser emitida pelas instituições financeiras para a captação de recursos. 

Além disso, foi editada também a MP 2.221, relativa à adoção facultativa do Patrimônio de Afetação, que isola um determinado empreendimento do patrimônio da construtora. A partir daí, o setor continua aguardando novos ajustes do governo, como a redução da taxa de juros, visando definir uma política habitacional eficiente.