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HISTÓRIAS E LENDAS DE SANTOS - URBANISMO (D)
Favelas urbanas e desfavelamento (3)

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Metropolização, conurbação, verticalização. Os santistas passaram a segunda metade do século XX se acostumando com essas três palavras, que sintetizam um período de grandes transformações no modo de vida dos habitantes da Ilha de São Vicente e regiões próximas. Da má condução desse processo, surgem distorções, como a favelização, citada nesta matéria publicada nas edições eletrônica e impressa de 28 de abril de 2006 do jornal santista A Tribuna:
 


Foto: Alberto Marques, publicada no jornal em 21 de fevereiro de 2005
e republicada com esta matéria na versão eletrônica

Sexta-feira, 28 de Abril de 2006, 08:09
URBANISMO
Favelas em expansão

O programa que deveria controlar o surgimento de novos barracos e palafitas é considerado ineficaz até mesmo por órgãos encarregados de impedir esse crescimento

Nilson Regalado
Da Reportagem

As favelas continuam crescendo em Santos. E o pior é que os próprios órgãos da Prefeitura encarregados de impedir a construção de novos barracos em áreas de risco geológico e de preservação ambiental admitem que o programa de congelamento de favelas é ineficaz. Os principais focos de expansão dos barracos e palafitas continuam sendo o entorno do Dique da Vila Gilda e o Morro da Caneleira.

Só nos três primeiros meses deste ano, a Coordenadoria Regional da Zona Noroeste contabiliza 55 ações para demolição de barracos e palafitas, contra 96 operações do gênero em todo o ano passado.

Isso significa dizer que a quantidade de novas construções ou de ampliações de barracos detectadas pela Regional da Zona Noroeste no primeiro trimestre de 2006 já representava 57,29% de todas as irregularidades do gênero detectadas pelo órgão da Prefeitura nos 12 meses de 2005.

"Sinceramente, não considero eficiente (o programa de congelamento de favelas)", admite o administrador regional da Zona Noroeste, Geonísio Pereira Aguiar, o ex-vereador Boquinha. "Se eu dissesse que não tem nenhum barraco novo estaria mentindo, porque eles ainda são construídos", revela Boquinha.

Na área do Dique, as palafitas avançam principalmente no fundo dos becos que compõem os caminhos São Sebastião e São José, escondendo cada vez mais o leito do Rio dos Bugres.

Agonizando, o Rio dos Bugres, de onde os primeiros moradores do Dique tiravam peixes como a tainha, virou um depósito de esgoto e lixo doméstico, dejetos que acabam, inevitavelmente, chegando ao Estuário e, conseqüentemente, às praias de Santos.

Realidade

"Se eu dissesse que não tem nenhum barraco novo
estaria mentindo, porque eles ainda são construídos"

Geonísio Pereira Aguiar
Administrador regional da ZN

União de favelas - Outro ponto crítico da Zona Noroeste é o Caminho da União, onde os barracos avançam sobre o leito do Rio Lenheiros, praticamente unindo as favelas do Caminho da União e da Vila Telma.

Os dois núcleos ficam em margens opostas do curso d'água que corta a Zona Noroeste. O pior é que já existe até uma decisão judicial determinando a desocupação da área onde estão os barracos do Caminho da União. Porém, a ocupação não só continua existindo como vem crescendo nos últimos anos.

"Nossas equipes monitoram diariamente os becos, mas é muita área não-urbanizada para um número reduzido de fiscais", reconhece, constrangido, o administrador regional da Zona Noroeste.

A equipe que atua no congelamento de favelas conta com apenas dez pessoas para fiscalizar novas construções em toda a região, que concentra 13 favelas.
Nas margens do Rio Lenheiros, não existe sequer uma mancha de mata ciliar, nem mesmo resquícios do que foi o manguezal podem ser vistos, já que toda a margem do curso d'água e seu próprio leito foram tomados, há décadas, por palafitas.


Nas margens do Rio Lenheiros, a mata já foi quase totalmente destruída
em função das palafitas que avançam a cada dia
Foto: Paulo Freitas, publicada com a matéria

Sexta-feira, 28 de Abril de 2006, 08:13
Pedidos de ligação de água e luz aumentam

Por incrível que possa parecer, a entrega de 80 casas populares para moradores dos caminhos São José e São Sebastião, no início do ano, acabou incentivando a chegada de novos moradores ao Dique da Vila Gilda.

Isso acabou acontecendo porque a transferência das famílias para casas de alvenaria acabou abrindo espaço no mangue para a construção de novas habitações improvisadas.

"É nos locais onde moravam essas famílias transferidas que observamos a maior incidência de pessoas querendo invadir", revela o administrador regional da Zona Noroeste, Geonísio Pereira Aguiar, o ex-vereador Boquinha.

"Estou procurando conscientizar os moradores cadastrados no sentido de que, se eles permitirem novas invasões, vai ficar ainda mais difícil construir casas para eles", salienta Boquinha.

"Não é que a gente não queira que a pessoa tenha um barraco, não é nada pessoal, mas se não houver seriedade no congelamento nunca teremos uma política habitacional no Município", completa o administrador da Zona Noroeste. Outro dado que reforça a falha do programa de congelamento de favelas implementado pela Administração Municipal é o número de pedidos de ligação de água que chegam à Administração Regional.

Em 2005, foram protocolados 61 pedidos para novas ligações de água e outros oito para ligações de luz em barracos. Porém, só uma religação foi autorizada. No primeiro trimestre deste ano, foram contabilizados 19 solicitações para novas ligações de água e outros cinco de luz.

Favelas da Zona Noroeste

Caminho São José Caminho São Sebastião
Mangue Seco Vila Telma
Caminho da Divisa Caminho da Capela
Caminho da União Butantã
Alemoa Industrial Caminho São Manoel
Vila dos Criadores Tetéu
Pantanal (*) (*) Moradores parcialmente transferidos para o Conjunto Habitacional Mário Covas
Fonte: Coordenadoria Regional da Zona Noroeste

Palafita - Só para se ter uma idéia, a quantidade de palafitas é tamanha que cada vez mais são necessárias "fundações profundas" para manter as habitações de pé, sobre o leito dos rios.

Isso exige uma maior quantidade de madeiras, que vão funcionar como pilares. Com isso, a estimativa é que cada nova palafita erguida sobre o mangue não estaria sendo construída com custo inferior R$ 6 mil na compra dos materiais.

Segundo o administrador regional da Zona Noroeste, a maior parte dos invasores é composta por filhos de antigos moradores das favelas, adolescentes grávidas, mães solteiras e desempregados que perderam a condição de pagar aluguel.

"Pode construir dez mil casas, mas, se o congelamento de favelas não for sério, as favelas nunca vão acabar porque outras pessoas vão ocupando os barracos", conclui Boquinha.


Transferência de famílias para casas de alvenaria abriu espaço para novas ocupações irregulares
Foto: Paulo Freitas, publicada com a matéria

Sexta-feira, 28 de Abril de 2006, 08:10
Morros também registram invasões

Nos morros, a situação também é crítica. Dados extra-oficiais da Defesa Civil estimam em cerca de 2.500 famílias vivendo em áreas de risco geológico, nas encostas. Há cerca de uma década, esse número beirava 2.200 famílias. Porém, assim como na Zona Noroeste, nos morros não há qualquer estatística oficial atualizada com o número de moradores em favelas. Este ano, a Defesa Civil deve concluir um levantamento das famílias que residem atualmente em áreas de risco.

Um dos locais de maior pressão é o Morro da Caneleira, onde pelo menos 200 novas famílias teriam se instalado nos últimos quatro anos, segundo cálculos de moradores da área.

Essas invasões teriam se intensificado num terreno com 46.770 metros quadrados, contiguo à área onde já existia um núcleo de barracos conhecido como Ocupação do Doutor Chiquinho, criada há cerca de 12 anos.

Mesmo na Ocupação do Doutor Chiquinho, líderes comunitários admitem que o contingente de 62 famílias originalmente instaladas subiu para cerca de 90.

Silenciosamente, as invasões estariam ganhando corpo na Caneleira. Segundo moradores, a mais recente ganhou o nome de Ribeirão da Bosta devido ao córrego poluído que corta o núcleo, que teria cerca de 36 famílias.

Consciência

"As crianças daqui são muito inteligentes.
O que falta é ocupação sadia, oportunidade"

Marinete José da Silva Lopes
Moradora do Caminho da Capela

Sexta-feira, 28 de Abril de 2006, 08:16
Ex-policial civil se transforma em líder comunitário

A impressão de que só pessoas com pouca instrução moram nas favelas cai por terra diante de personagens como Paulo Furquim. Ex-policial civil, Furquim freqüentou uma das melhores escolas particulares de Santos e já passou por quatro faculdades, incluindo Direito. Oriundo de uma família de classe média, Furquim é filho de um ex-delegado regional da Polícia Civil e neto de professor decano da USP. Depois de tomar "um tombo" da vida, Furquim foi morar na Ocupação do Doutor Chiquinho, no Morro da Caneleira.

Consciente do risco social a que estão submetidas crianças que residem nas favelas, Furquim decidiu implantar na sua comunidade uma biblioteca para tentar mostrar aos menores o "caminho certo".

Trajetória oposta fez a faxineira Marinete José da Silva Lopes, moradora do Caminho da Capela, na Zona Noroeste. Nascida em Recife, Marinete seguiu o roteiro de muitos migrantes nordestinos. Sem estudo, Marinete foi morar no dique há 36 anos, assim que chegou a Santos.

Ali, construiu sua família, criou quatro filhos e transformou o barraco em um sobrado de alvenaria. Com a experiência de quem viu gerações de jovens formados na favela, Marinete pede providências às autoridades: "As crianças daqui são muito inteligentes. O que falta é ocupação sadia, oportunidade".


Furquim criou biblioteca
Foto: Davi Ribeiro, publicada com a matéria

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