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Caruara (2)

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Matéria publicada no jornal santista A Tribuna em 17 de outubro de 2011, páginas A-1 e A-6:

Foto: Walter Mello, publicada na página A-8

O prazer de sentir o vento…

… e olhar o verde, admirar o azul, limpar a mente. É o Caruara, na Área Continental santista

Alcione Herzog

Da Redação

s vezes, ouço passar o vento; e só de ouvir o vento passar, vale a pena ter nascido".

Quem diria que em Santos, onde mesmo na primavera se tem a sensação de que vivemos numa estufa, a frase do poeta Fernando Pessoa (1888-1935) ganharia significado real?

Pois em Caruara, maior bairro da Área Continental de Santos, localizado entre a Rodovia Rio-Santos (BR-101) e o Canal de Bertioga, é assim. O vento despenteia os cabelos, balança as saias das moças e agita as folhas das árvores todo o tempo.

Segundo o Novo Dicionário Aurélio da Língua Portuguesa, um dos significados para a palavra caruara é "vento que traz chuvas e trovoadas e que sopra principalmente em janeiro pelo litoral brasileiro".

No Caruara santista, localizado a 60 quilômetros da parte insular do Município, os bons ventos sopram o ano todo. "Em qualquer estação é sempre fresquinho assim aqui", diz Sara Siqueira, proprietária de um quiosque no Portinho, um dos principais cartões postais do lugarejo.

A brisa no rosto não é privilégio das crianças, que correm para todo o lado descalças, a pé ou de bicicleta. Ele, o vento, está em todo o lugar. É democrático. Serve aos pescadores que tiram o sustento do Canal de Bertioga, aos moradores, que dispensam aparelhos de ar condicionado nas casas, e aos visitantes, que buscam um recanto onde se possa respirar com qualidade.

Mas nem só de ar puro vivem os 3 mil habitantes do lugarejo. Encravado na Mata Atlântica, entre o Parque Estadual da Serra do Mar e os manguezais, o povoado tem verde para onde quer que se olhe.

Se sossego tivesse cor, também poderia ser notado a dezenas de metros de distância, até mesmo de dentro dos veículos que passam pela Rio-Santos a 80 quilômetros por hora.

O casal de médicos de São Paulo, Emílio Teramoto e Elisa Wagwu, enxergou, de longe, o que muitos santistas sequer desconfiam que existe. "Estávamos passando do outro lado do Canal, na Rodovia Guarujá-Bertioga, e avistamos o local. Vimos um lugarejo pitoresco e imaginamos que valia a pena conhecer".

O faro para redutos relaxantes funcionou. "Descobrimos um ótimo ponto para pescar e fugir dos problemas. Agora, sempre que podemos, passamos o dia aqui", diz o médico, com a vara de pescar em uma mão e a cerveja em outra.

Curiosos como Emílio e Elisa, que resolverem explorar Caruara, podem entrar à direita no KM 233 da Rio-Santos e pegar um estreito caminho de lama asfáltica. Cerca de 50 metros depois, surgirá um cenário típico de cidadezinha de Interior: uma pequena capela, um coreto e os olhares de interrogação dos moradores.

Há quem diga que os ventos do progresso estão chegando em Caruara. A única praça do bairro – a das Palmeiras – está remodelada. Ganhou, recentemente, uma biblioteca e uma base compartilhada da Guarda Municipal e da Polícia Militar. Ali, a população recebe atendimento médico, e as crianças brincam num parquinho.

Todas as ruas são de terra, com exceção da Rua Andrade Soares, a principal, que agora está sendo asfaltada.

Já faz alguns meses que o bairro convive com caminhões, tratores e trabalhadores, que aos poucos mudam também a ara do Portinho. O local, que conta com um píer e um atracadouro, passa por revitalização. Os investimentos chegam a R$ 1 milhão, incluindo a drenagem da rua principal.

O presidente da Sociedade de Melhoramentos do bairro, Ricardo Lucas, acredita que as obras ajudam a população a desenvolver um sentimento maior de pertencer ao local. "Muitos moradores trabalham e votam em Bertioga ou em Guarujá e acabam tendo um vínculo mais forte com essas cidades. Com esforço, aos poucos se amplia a noção de que Caruara pertence a Santos e não a Bertioga".

A confusão é natural. Geograficamente, para se chegar à parte insular santista, é preciso passar por Guarujá (caso o trajeto seja por balsa ou barca) ou, ainda, por Cubatão (no caso de acesso rodoviário).

Se por um lado o isolamento traz tranqüilidade, por outro significa falta de perspectiva aos mais jovens. Dono de um mercadinho, Fábio Pinto pede mais oportunidades de qualificação profissional. "Muitos adolescentes caminham para as drogas por falta de perspectivas aqui dentro".

OUVINDO O VENTO PASSAR… - No Caruara, maior bairro da Área Continental de Santos, localizado entre a Rodovia Rio-Santos e o Canal de Bertioga, a vida é tranqüila. Todas as ruas são de terra e as crianças têm liberdade de correr descalças, a pé ou de bicicleta. E a maioria dos adultos tira seu sustento da própria terra.

Foto: Walter Mello, publicada na página A-1

Investimento social – Um exemplo de que investir em gente garante retorno social imediato é a Padaria Solidária Sonho Meu.

A Prefeitura e a Sociedade de Melhoramentos somaram esforços durante um ano para montar o equipamento no Centro Comunitário. O resultado é a geração de renda para dez mulheres da comunidade, que agora fabricam e vendem pães e bolos.

Lúcia Helena Silva conta que o projeto funciona desde o último dia 23. "Os pães sempre foram fabricados fora. Já recebemos muitas encomendas e temos certeza de que o negócio vai dar certo. Porém, precisamos de ajuda para a compra de matéria-prima".

Crianças não passam sufoco em dias de sol e calor: a piscina é natural

Foto: Walter Melo, publicada com a matéria

A alegria do contato com a água

Um enorme quintal. Assim é Caruara para as crianças do bairro.

Nos dias de calor, o Canal de Bertioga vira uma piscina, mas há quem prefira um banho nas cachoeiras das imediações.

Na tarde da última segunda-feira, o sol e a temperatura de 33 graus fizeram boa parte dos adolescentes deixar as brincadeiras de rua para se esbaldar nas águas geladas da Cachoeira do Castelinho, em Caiubura, bairro vizinho de Bertioga.

Quem nos guiou até o local foi Maicon Perez, de 16 anos. Encontramos o adolescente voltando de uma pescaria que lhe rendeu alguns paratis e bagres. No caminho, ele conta que ocupa as tardes livres nas aulas de canoagem do bairro. "Faço parte dos Brucutus. Nossa equipe compete em vários locais do Brasil e já ganhou várias medalhas".

Quando não está remando ou pescando, o garoto nada nas cachoeiras com os amigos. Esse também é o lazer preferido dos filhos da dona de casa Milene Martins, de 35 anos. "Tenho seis filhos entre 3 e 14 anos. Sempre que faz calor, a gente vem para cá".

A quantidade de bares chama a atenção no Caruara, indicando que, para os adultos, o lazer é jogar baralho ou dominó, sempre tomando cerveja.

O segmento parece ser um dos poucos tipos de comércio que dão lucro no bairro. Não à toa, Gilvan Francisco da Silva, de 38 anos, investiu. "De dia, sou caseiro de um sítio de plantas ornamentais e, à noite, viro dono de bar. Mesmo assim, não dá para enricar aqui, não".

O sustento que se tira ali mesmo

Da pesca, ainda vive uma minoria

Foto: Irandy Ribas, publicada com a matéria

Antes de ser bairro, Caruara era uma grande fazenda de bananas. O povoado surgiu a partir de um loteamento da propriedade, por volta de 1951.

Atualmente, a maioria da população sobrevive de pequenos comércios ou atua em postos de trabalho em Bertioga ou Guarujá.

Uma minoria insiste em tirar o sustento da pesca. Encontramos três remanescentes desta tradição caiçara: Edilson de Souza, Rubens dos Santos e José Ferreira.

Edilson tem 45 anos e há mais de 35 pesca corvinas, pescadas, tainhas e carapevas no local. Para ele, não tem coisa melhor do que trabalhar no silêncio do Canal de Bertioga. "Fico no mar até às 10 horas, que é quando a maré está boa para a rede de espera. Volto com uns 20 quilos (de peixes) e vendo no mesmo dia para a comunidade".

Com Rubens, de 66 anos, é diferente. O aposentado vai para o mar só quando é preciso colocar peixe na mesa. Quando não falta mistura, seu ofício é fabricar redes de pesca.

Por causa da proximidade do mangue, o quintal de Rubens fica repleto de pequenos caranguejos. "Mas esses não são de comer, não", avisa.

Há 34 anos no Caruara, garante que, de lá, não sai. "Quem é do litoral não fica longe do mar. Beiradeiro que é beiradeiro vive e morre perto do mangue. Aqui não se passa fome. Quando não há dinheiro, há o mar para nos alimentar".

De "folga" – José tem 59 anos e é catador de caranguejos. Por causa da época de defeso da espécie, Bio, como é conhecido no bairro, tem descansado bastante, ultimamente. "Nessa época, vou para o mar só para buscar meu alimento. Pego parati, robalo e, de vez em quando, trago mariscos e ostras".

O motor do barquinho de alumínio está de folga, assim como Bio. "Ele quebrou. Por enquanto uso o remo. É mais devagar, mas dá para o gasto".

Ser criança, no Caruara, é correr para todo lado, sem limitação de espaço.

Foto: Irandy Ribas, publicada com a matéria

 

Ser adulto é mais difícil, mas moradores, como Gilvan, aproveitam…

Foto: Walter Mello, publicada com a matéria

 

…chances, como as  mulheres que atuam nesta padaria comunitária

Foto: Irandy Ribas, publicada com a matéria

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