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Artigo publicado no jornal A Tribuna de Santos em 23/11/1997
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ROTA DE OURO E PRATA
Histórias: porto de Santos em junho/1940 (2)

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Um dos produtos de destaque era o café, que mantinha a liderança das exportações através do complexo portuário

Café! Sempre o primeiro produto de exportação do Brasil e do Porto de Santos. Durante o transcorrer do ano de 1939, haviam sido embarcadas para o exterior do porto santista 11 milhões 200 mil sacas do produto.

Nos nove primeiros meses do escoamento da safra 1939-1940 (julho a março) passaram para embarque em Santos quase 8 milhões de sacas, de um total de 12 milhões exportadas pelo País. Deste total, mais da metade tinha como destino portos dos Estados Unidos da América (com 6 milhões 700 mil sacas). Outras 6 milhões de sacas foram exportadas para a Europa e o restante dividia-se em importações por parte do Canadá (600 mil), países da África (600 mil) e Ásia (100 mil).

A eclosão das hostilidades na Europa havia provocado sensível diminuição do volume exportado para aquele continente, porém, por outro lado, os norte-americanos praticavam uma política de estocagem e compravam mais do que no passado.

No mês precedente (maio de 1940), só em navios de bandeira norte-americana foram embarcadas em Santos mais de 500 mil sacas de 60 quilos, o maior carregamento em absoluto desse mês sendo feito pelo vapor Donald McKay, que levou embora 90 mil sacos. O transatlântico de passageiros Brasil levou outras 46 mil sacas.

Nos navios do Lloyd Brasileiro embarcaram-se, nesse mesmo mês, outras 200 mil sacas, a maioria também destinada ao continente norte-americano. Só o Lages carregou 65 mil sacas para Nova Iorque.

Na ponta exportadora, além do café, saíam por Santos algodão e seus subprodutos e banana.

O restante do movimento total de mercadorias (4 milhões 200 mil toneladas descarregadas ou carregadas) ficava por conta dos produtos tradicionais de importação: trigo, óleo combustível, carvão, gasolina e bens de consumo.

Nesse ano de 1939 haviam entrado em Santos 3.530 navios a vapor ou a motor. O movimento total de entradas e saídas era portanto de 7 mil embarcações, o que representava a média de 20 movimentos por dia.

O porto nessa época podia acomodar cerca de 30 navios em seus 4.400 metros de cais linear, que iam do Valongo até a altura do Armazém 27 e do dique do estaleiro da Companhia Docas de Santos, na Mortona.


O transatlântico japonês Argentina Maru, da companhia de navegação OSaka, em 1940,
com sinais de neutralidade no casco, em cargão-postal da coleção do autor
Imagem publicada com a matéria

Na manhã de 7 de junho de 1940, atracava no cais do Armazém 16 o transatlântico Conte Grande, proveniente de portos italianos. Em Santos, desembarcaram cerca de 300 passageiros e, no cair da tarde desse mesmo dia, o navio largou amarras com destino ao Rio da Prata, tendo a bordo outros 380 passageiros destinados a Montevidéu ou Buenos Aires, portos que não alcançariam nessa viagem.

Na noite do dia 9 para o dia 10, o transatlântico italiano inesperadamente retornou ao Porto de Santos, tendo recebido, nesse tempo, notificação, via rádio-telégrafo, da iminente entrada da Itália no conflito. A partir desse momento, o Conte Grande permaneceu retido (por própria decisão das autoridades navais italianas) no Porto de Santos.

No dia 13, o navio era transferido para o cais do Armazém 25 e, no dia 27, para o cais dos armazéns 22 e 23, posicionando-se ao lado de outro ilustre nome, o Windhuk.

A armadora estatal Italia di Navigazione empregava nessa época, além do Conte Grande, dois outros navios de passageiros entre Gênova e Buenos Aires, via Rio de Janeiro e Santos. Estes eram Saturnia e o Principessa Maria. Viajavam também nessa rota os cargueiros Valdarno e Atlanta.

No dia 4 de junho, o Principessa Maria atracava no cais do Armazém 19, proveniente da Europa. Este antigo vapor, construído em 1922 (tal como seu par-gêmeo, o Principessa Giovana), zarpou no dia seguinte para Buenos Aires, onde se encontrava por ocasião da entrada da Itália na guerra. Em agosto de 1941, sempre retido em Buenos Aires, foi negociada sua venda para o governo argentino, que lhe deu o novo nome de Rio de La Plata. Também o Valdarno ficara retido na cidade portenha e fora vendido à Flota Mercante del Estado, recebendo o nome de Rio Neuquen na mesma data.

Sempre no dia 4 de junho, encontravam-se atracados vários navios interessantes: no Armazém 1, o noruguês Norma; no Armazém 12, o britânico St. Rosario; no cais do 17, o Damaique; no 23, o Lipori, ambos da Chargeurs Reunis; no 25, o Almeda Star.

O primeiro dos navios acima mencionados, o Norma, pertencia à linha norueguesa Sul-Americana, cujo agente em Santos era Alex S. Grieg & Cia. e cujos vapores ligavam a Escandinávia ao Brasil e aos países do Prata.

Este vapor de 4.487 toneladas de arqueação bruta (tab) era um cargueiro dispondo de acomodações para 12 passageiros, no máximo. Sua passagem por Santos foi a primeira realizada após a capitulação da Noruega (28 de maio) e a tripulação norueguesa que o servia estava então consciente de que muito tempo se passaria antes que pudessem retornar à sua pátria e famílias.


O cargueiro Norma pertencia a uma armadora norueguesa, tinha 4.487 toneladas de capacidade 
e contava com instalações para acomodar 12 passageiros a bordo
Imagem publicada com a matéria

O segundo mencionado, o St. Rosario, era propriedade da armadora britânica do País de Gales, a South American Saint Line, tendo sido construído em 1937, em Sunderland, como cargueiro de 4.312 tab. Este navio sofreria, em fevereiro de 1941, dois ataques aéreos por parte de aviões alemães, que em dias diferentes lhe despejaram algumas bombas e rajadas de metralhadora. Apesar dos danos, o St. Rosario conseguiu permanecer flutuando e prosseguir viagem para o Reino Unido. Teve posteriormente longa carreira, sendo desmontado somente em 1969.

O Damaique e o Lipori eram transatlânticos mistos, pertencentes à armadora francesa Chargeurs Reunis. Haviam sido lançados ao mar contemporaneamente, em setembro de 1921, por dois estaleiros construtores diferentes.

O primeiro mencionado sobreviveria intacto ao conflito, permanecendo em serviço até 1954. O Lipori, porém, terminaria sua carreira por ocasião do desembarque das tropas aliadas em Casablanca. Em 7 de novembro de 1942, recebeu uma salva de projéteis de 406 milímetros, disparados pelo couraçado norte-americano Massachusetts, que lhe provocou violento e fatal incêndio. Seu fim foi idêntico (inclusive na causa e na data) ao do transatlântico Savoie, cuja história, como sendo o ex-Araguaya, da Royal Mail, foi narrada nesta coluna em 27/5/1993.

Quanto ao Almeda Star, da Blue Star Line, referimos o leitor à narrativa de sua carreira já abordada longamente nos artigos publicados em 22 e 29 de julho de 1993. Lembraremos somente que este transatlântico foi torpedeado pelo submarino alemão U-96, em janeiro de 1941, no Atlântico Norte, tendo afundado com a perda de todas as 360 pessoas que se encontravam a bordo.

No dia 5, entrava em Santos, procedente de Lisboa, o paquete português Angola, chegando ao Brasil com mais de 700 passageiros, que fugiam do espectro da guerra que se alastrava pela Europa. Em seus bordos laterais haviam sido pintadas, em grandes letras brancas, as indicações de identificação, cruciais para evitar ataques de aviões ou submarinos: Angola, Lisboa, Portugal.

Este antigo vapor havia sido construído em 1912 para a Cie. Maritime du Congo, armadora belga, com o nome de Albertville. Após 20 anos de serviço na linha Bélgica-Congo Belga, fora adquirido em 1923 pela Companhia Nacional de Navegação (CNN), de Lisboa, recebendo seu novo nome de Angola e sendo destacado para a carreira da África Oriental dessa companhia.

Em 1932 já havia realizado uma única viagem redonda para o Brasil e desde outubro de 1939 ligava Lisboa a Santos, via Rio de Janeiro. Sua saída do porto santista estava prevista para o dia 22 de junho, com destino a Lisboa e Leixões, via Rio de Janeiro e Recife, e isto significaria uma permanência de quase três semanas em Santos.

No dia 6 do mês em título passava por Santos, em viagem regular da linha Buenos Aires-Tóquio-Yokohama, o transatlântico japonês Buenos Aires Maru, pertencente à Osaka Sosen K.K., construído em 1929 em Nagasaki, pelos estaleiros da Mitsubishi.

Era um navio a motor de 9.626 tab, dupla hélice e três conveses de superestrutura, que assegurava, junto a seu par-gêmeo Rio de Janeiro Maru, a linha Japão-América do Sul, via Los Angeles e Califórnia.

Nesta ligação, a Osaka Sosen havia recentemente colocado outro par de novíssimos navios a motor, o Brazil Maru e o Argentina Maru, ambos de características técnicas semelhantes, 12.750 tab, duas turbinas Sulzer de 16.500 cavalos-vapor, permitindo altas velocidades, próximas a 22 nós (41 quilômetros horários). Este par de embarcações tinha excepcional desenho externo, eram navios belos e harmoniosos, velozes e funcionais, com capacidade para 900 passageiros, dos quais 100 em primeira classe.

O Brazil Maru, após servir dois anos como transatlântico de passageiros, foi transformado, depois de Pearl Harbour, em navio-transporte de tropas e nessa condição foi posto a pique em agosto de 1942 no Pacífico, nas coordenadas 9º51' Norte de latitude e 150º46' Leste de longitude, atingido por dois torpedos, disparados em superfície, e em ataque visual, pelo submarino U.S. Navy Greenling, comandado por Henry Brutton, realizando ambos sua segunda patrulha de guerra.

Em junho de 1940, o Brazil Maru passava por Santos no dia 23, proveniente do Japão e direto a Montevidéu e Buenos Aires. Havia realizado sua viagem inaugural em janeiro desse mesmo ano.

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