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CULTURA/ESPORTE NA BAIXADA SANTISTA - Ribeiro Couto - BIBLIOTECA NM
Rui Ribeiro Couto (16-[16])

Clique na imagem para ir ao índice desta obraUma das principais obras de Rui Ribeiro Couto é o romance Cabocla, aqui transcrito em primeira edição digital, a partir do livro publicado em 1945 (terceira edição) pela Livraria Sá da costa Editora, de Lisboa, Portugal, com prefácio de João de Barros, sendo todos os exemplares autenticados com as rubricas do autor e editores. A obra faz parte do acervo de Rafael Moraes transferido à Secretaria Municipal de Cultura de Santos e cedida a Novo Milênio pelo secretário Raul Christiano para digitação/digitalização (ortografia atualizada nesta transcrição - páginas 103 a 106):

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Cabocla

Ribeiro Couto

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XV - Moça da roça

Dias depois prima Emerenciana aproveitou um momento em que estávamos sós, na cozinha, para me dizer:

- Que é isso, primo, você, Deus me perdoe, parece que anda gostando da minha afilhada... (Eu creio que corei, fiquei confuso, olhei-a com reprovação. Ela continuou): Veja lá, heim? Ela é moça boa.. Não vá perder a cabeça com ela.. Não se esqueça que Zuca está noiva, que vai casar direitinho...

Ergui os braços ao céu, teatralmente, mas Emerenciana impediu-me de pronunciar a frase de protesto que ia irromper da minha boca:

- Eu sei quem você é, Jerónimo, tenho confiança... Em todo caso, estou lhe avisando...

Da sala de jantar veio a voz de Zuca:

- Você me pega aquele novelo que caiu, Mariazinha?

O Robertinho gritou:

- Eu pego! eu pego!

Os dois deviam ter se precipitado, porque houve um choque, uma queda, e o riso triunfante de Mariazinha zombou de RObertinho que se pôs a chorar.

- Ooooora! para que é que vocês hão de brigar por uma coisa à toa? - ralhou Zuca.

Prima Emerenciana passou o café no coador e continuou baixinho, em confidência:

- Você ficou triste, primo? Não se aborreça, não... Se eu falei isso, é porque notei que você anda meio caído por ela... Afilhada é como filha, meu dever é chamar sua atenção...

Pôs na xícara uma colherada de açúcar, serviu-me de café:

- Depois, eu também notei que ela não desgosta... Mas porém, Zuca é pobre e da roça, você é moço da cidade, arranjado, de bonito futuro... Não vai agora se engraçar por uma mocinha do mato...

Segurei prima Emerenciana pelo braço, nervosamente:

- Você fez alguma observação a ela, prima?

- Não fiz, mas meu dever é fazer...

- Então não faça, peço-lhe.

- Por que não?

- Prima, se você falar alguma coisa a Zuca, eu vou-me embora.

Soltou um riso bondoso, como que querendo desmanchar a minha má impressão:

- Não falo nada, fique sossegado... Mas prometa que não vira a cabeça da minha afilhada... Moça da roça... Deixe ela seguir o destino dela...

Sacudi-me num riso forçado:

- Ora, ora! Que fantasia a sua!

De repente, tomado de um ímpeto, levantei-me, cruzei os braços e perguntei:

- Que é que você diz de eu pedir a Zuca em casamento?

Prima Emerenciana pareceu cair das nuvens. Esqueceu-se de que estava com o coador de café na mão, deixou tombar a borra no vestido, quis dizer não sei quê, mas a cozinheira vinha entrando de lá de baixo com um braçado de lenha; então mudou de assunto:

- Está bom o café?

E pôs-se a resmungar, dando de ombros, como se dissesse: este primo Jerónimo perdeu o juízo.