Clique aqui para voltar à página inicialhttp://www.novomilenio.inf.br/cubatao/ch060e.htm
Última modificação em (mês/dia/ano/horário): 05/21/14 05:46:38
Clique aqui para voltar à página inicial de Cubatão
HISTÓRIAS E LENDAS DE CUBATÃO - S. LÁZARO
A capela para os lázaros no sopé da serra (5)

Desvendando mistérios
Leva para a página anterior
Mesmo acontecimentos relativamente recentes começam a cair no esquecimento das pessoas. Um exemplo é o ano em que ocorreu a demolição da capela de São Lázaro. Já foram citadas as datas de 1957 (em livro,  pág. 93), início da década de 1950 ou década de 1960 (em jornal) e também em 1971, que é a data mais coerente com as evidências encontradas. O ano de 1954, também citado quanto à demolição, se refere à última Festa de São Lázaro realizada em Cubatão no século XX, sendo também o ano em que o terreno onde existia o cemitério da capela foi repassado à Refinaria Presidente Bernardes Cubatão - esta a origem do declínio da festa, pois os organizadores, face às crescentes dificuldades de acesso ao local, pelas restrições de segurança das instalações da refinaria, começaram a desistir de realizá-la.

Também não foram encontrados registros quanto à construção da capela por Francisco Miguel Couto. Apesar de uma referência à década de 1850/60 pelo memorialista Ayres Coutinho, os relatos coincidem geralmente em que ele construiu a capela pouco antes de morrer, no início do século XX. Conta-se inclusive que foi como cumprimento de uma promessa feita a São Lázaro.

É possível que o casal de leprosos que originou a história tenha realmente vivido em meados do século XIX e só mais tarde, com a devoção tornada tradicional, tenha ocorrido a Francisco Miguel Couto erigir a capela. A imagem original de São Lázaro foi trazida de Portugal por sua filha Brasília Couto, chegando ao Porto Geral de Cubatão em meio a uma festa. Note-se que o nome da capela, de "Santa Cruz dos Lázaros", incorpora uma tradição religiosa: templos erigidos em locais marcados pela morte de pessoas recebiam o nome de "Santa Cruz".

Relata a professora Celma de Souza Pinto em seu livro Cubatão - História de uma Cidade Industrial (edição do autor, 2005, Cubatão/SP), páginas 61 e 62 (a entrevista com o memorialista José Gouveia dos Santos ocorreu em 13 de maio de 1998):

[...] o maior destaque era para a festa de São Lázaro, que acontecia todos os anos no dia 17 de maio e reunia toda a comunidade cubatense, sendo uma festa de confraternização que envolvia a todos. Era uma grande celebração de fé e de amizade. José Gouveia assim descreve a festa:

"Em comemoração a São Lázaro fazia-se todos os anos aquela festinha em sua homenagem, essa festa ficou tão grande, tão importante que vinham pessoas de fora assistir. Vinham pessoas de Santos, de São Vicente, da redondeza toda. Era uma festa muito bem organizada pela igreja com uma participação maior dos portugueses que moravam na Raiz da Serra e depois com o apoio de todos os moradores de Cubatão. Muito bonita.

Sobre a lenda da devoção a São Lázaro, de acordo com a versão do sr. Simões, dizem que um casal de leprosos vinha descendo a serra e, cansados, eles pararam ali no pé da Raiz, perto daquele pontilhão que ainda existe até hoje, e ali passaram a viver, aproveitando um ranchinho velho. A mulher estava mais doente do que o marido, então ficava em casa enquanto o marido vinha para o centro da cidade buscar alimento para a manutenção dos dois. O povo muito bom de Cubatão dava carne, farinha, feijão.

Depois de certo tempo, ele não voltou mais; aí descobriram que a mulher tinha morrido e o marido sozinho estava ruim também. Ele enterrou a mulher, botou uma cruz de madeira de mato, feita rusticamente. Um belo dia, foram lá e ele tinha morrido também, já estava até meio podre, aí enterraram no mesmo lugar que a mulher. Foi quando deram o nome de Os Lázaros, pois simplesmente ninguém sabia o nome dos coitados.

Com o decorrer do tempo aquela campa passou a ser bem tratada. No começo falavam que aconteciam milagres, que as velas apagavam sozinhas. O povo acendia muitas velas porque acreditava nos dois que tinham morrido ali. Então, o sr. Joaquim Miguel Couto, antes de morrer, fez uma promessa para São Lázaro que ia construir uma capelinha no lugar da sepultura, e de fato construíram.

Foi o sr. Francisco Couto quem mandou construir a Capela da Cruz dos Lázaros, mais tarde chamada de Capelinha de São Lázaro, que ficou até os dias de hoje com esse nome. Logo que fizeram a capelinha começaram a fazer festa e as festas de antigamente eram ainda mais belas do que as mais modernas.

Os portugueses, que ganhavam bastante dinheiro com a venda de bananas, ajudavam muito nas festas. Saía banda de música para colher as esmolas nos sítios dos portugueses e ali eram bem recebidos e as esmolas eram sempre gordas, tornando a festa ainda mais linda por causa das prendas.

Nós colávamos bandeirinhas de Cubatão até a Raiz da Serra.

No início a festa ia de Cubatão até a Raiz da Serra, depois ficou resumida à Raiz da Serra. O pessoal que morava lá tinha muita dificuldade em conseguir dinheiro porque todo mundo dava prenda mas dinheiro não tinha, e sem dinheiro não se podia comprar bandeirinhas, balões coloridos, fio elétrico, cola, lâmpadas. Então, as moças montavam um pedágio lá no posto da guarda civil na Raiz da Serra, eles inclusive ajudavam a gente a fazer a festa, pois era preciso que tivesse colaboração da guarda. Eles paravam os carros para anotar o número da chapa e pedir documentos e nesse momento muitas pessoas faziam doação de dinheiro e nós ganhávamos muito dinheiro. Com isso dava para fazer uma festa muito bonita."

O jornal O Estado de São Paulo registra, na edição de terça-feira, 5 de setembro de 1950, página 6, que até mesmo um presidente da República esteve na capela (ortografia atualizada nesta transcrição, grifo por Novo Milênio):

Imagem: reprodução parcial da página de O Estado de São Paulo com a notícia

NOTÍCIAS DO INTERIOR

O presidente da República presidiu o lançamento da pedra fundamental da refinaria de petróleo do Cubatão

Oleoduto Santos-São Paulo - Almoço no Parque Balneário - Visitas - Regresso ao Rio de Janeiro - Outras notícias de Santos

SANTOS, 4 - A fim de presidir ao lançamento da pedra fundamental do primeiro conjunto da refinaria de petróleo de 43 mil barris e inspecionar as obras do oleoduto, ambas no vizinho município de Cubatão, chegou hoje a esta cidade, às 8 horas e meia, descendo na base aérea, o general Eurico Gaspar Dutra, presidente da República. [...]

Em Cubatão - Para o novo município de Cubatão o dia de hoje foi de festas, recebendo sua população com aplausos o presidente da República.

Dísticos saudando o chefe da Nação foram colocados em vários pontos da vizinha cidade.

Em frente ao edifício da Prefeitura, alunos das escolas locais, uniformizados e empunhando bandeirinhas com as cores nacionais, saudaram alegremente o general Dutra e sua comitiva, enquanto a banda de música executava o Hino Nacional.

Na porta da Prefeitura, o sr. Armando Cunha, prefeito municipal, vereadores, funcionários e pessoas gradas aguardavam a chegada do sr. presidente da República, recebendo-o com palmas.

A visita às dependências da Prefeitura foi curta.

Obras da refinaria de petróleo - Deixando a sede do governo municipal de Cubatão, o general Dutra rumou para os escritórios da Comissão Construtora da Refinaria, situada no sopé da Serra do Mar.

No trajeto, o povo postado ao longo da avenida Bandeirante assistiu a passagem da comitiva presidencial.

Antes de visitar os escritórios a Comissão, o general Dutra esteve na capela de São Lázaro, que acaba de ser reconstruída.

Nos escritórios da Comissão da Refinaria, além dos engenheiros, chefes de serviço e demais funcionários, receberam o sr. presidente da República o general Estenio Albuquerque Lima, presidente da Comissão, dr. Rui Zubaram, engenheiro-chefe, e drs. Plinio Castanhede e Adalberto A. Albuquerque.

O general Eurico Gaspar Dutra visitou o acampamento do pessoal e demorou-se apreciando a descrição do andamento dos trabalhos, sendo-lhe exibidas plantas e pormenores da grande obra.

Momentos depois, o chefe do governo presidiu a solenidade do lançamento da pedra fundamental do primeiro grupo da Refinaria de Petróleo de 45 mil barris.

A parte religiosa esteve a cargo do padre Primo Vieira, que inicialmente dirigiu uma saudação ao sr. presidente da República, na qual fazia menção ao regozijo do povo pelo grande melhoramento.

Lida a ata, assinada por todos os presentes, foi tudo colocado na pedra angular, cimentando-a o general Gaspar Dutra.

Terminada a cerimônia, ao general Gaspar Dura e sua comitiva foi oferecido um coquetel na sede da Comissão.

Oleoduto Santos-São Paulo - Outra importante realização é a construção do oleoduto ligando os depósitos da Ilha Barnabé, em Santos, ao planalto, num percurso de 48 quilômetros.

A estação de Cubatão recebe os produtos claros da Ilha Barnabé, bombeando-os até Utinga. O óleo pesado da estação de bombas de Alemoa é retransmitido igualmente, porém recalcado pela estação do alto da Serra. Tanto em Cubatão como no Alto da Serra serão construídas caldeiras de aquecimento, para reduzir a viscosidade do óleo.

No local da usina de Cubatão, onde as obras acusam progressos, o sr. presidente da República recebeu minuciosas informações prestadas pelo dr. Renato Azevedo Feio, diretor da Estrada de Ferro Santos-Jundiaí, a quem está adjudicada a construção do oleoduto e sua futura exploração.

O chefe da Nação visitou ainda os tanques construídos e outros em andamento, mostrando-se satisfeito pelo que pode observar.

Em Santos - Cumprida a parte do programa elaborado para Cubatão, o general Gaspar Dutra e sua comitiva rumaram para Santos, encaminhando-se para o grupo de casas populares construídas no Macuco. [...]

O construtor da capela, Francisco Miguel do Couto, teve ativa participação nas atividades do município. Já em documento arquivado na Cúria Metropolitana de Santos, datado de 22 de junho de 1883 era citado numa solicitação ao presidente da província para que a povoação, elevada em 6 de maio de 1854 à condição de Capela Curada, passasse a contar com "um sacerdote que no mister de capelão, se preste igualmente a ensinar as primeiras letras e religião aos meninos deste bairro, embora os suplicantes concorram na altura de seus parcos meios em auxílio do capelão que for nomeado".

Também, por portaria de 19 de julho de 1899, Francisco Miguel do Couto foi nomeado zelador da capela de Nossa Senhora da Lapa (que daria origem à Igreja Matriz de Cubatão).

O jornal O Estado de São Paulo registra, na edição 23 de setembro de 1910, primeira página, a concessão para que ele explorasse em Cubatão uma linha de bondes:

Imagem: reprodução parcial da página de O Estado de São Paulo com a notícia

Bondes no Cubatão - SANTOS, 22 - Ontem, em sessão ordinária da municipalidade, foi aprovado o parecer das comissões de obras e viação, finanças e justiça e poderes, dando concessão, por quinze anos, para o sr. Francisco Miguel do Couto explorar no bairro do Cubatão uma linha de bondes de tração animada.

O mesmo jornal O Estado de São Paulo registra, em 8 de maio de 1913, página 4, que Francisco Miguel do Couto estava licenciado por doença do cargo de administrador do cemitério de Cubatão, conforme decidido em sessão ordinária da Câmara de Santos no dia anterior:

Imagem: reprodução parcial da página de O Estado de São Paulo com a notícia

O fim da capela teria ocorrido em 1971. Ainda em 8 de novembro de 1968, o caderno de Turismo do mesmo jornal O Estado de São Paulo registrava, na página 3, em matéria especial de Benedito Lima de Toledo, o fim das festividades de São Lázaro e a presença da capelinha no local (ortografia atualizada nesta transcrição):

Imagem: reprodução parcial da página de O Estado de São Paulo com a notícia

 

Caminho do mar tem também sua capelinha

Na base da serra um pontilhão contém duas placas. Uma refere-se ao pioneirismo no uso do concreto na pavimentação da estrada, concluída em 1926 no governo Carlos de Campos.

Esse pontilhão, relativamente estreito e colocado bem ao fim da descida, é vítima frequente de caminhões que avaliam mal suas dimensões. Daí seu relativo mau estado.

A estrada, infelizmente, é usada como pista de teste para caminhões. Mas a placa é muito significativa, pois, não obstante os 40 anos de uso intensivo e os rigores de um clima que submete a pista a elevadas temperaturas alternadas com precipitação pluviométrica que atinge índice dos mais elevados do País, o seu estado é muito satisfatório.

Próximo ao pontilhão aparece a singela Capela de São Lázaro, à volta da qual eram realizadas danças populares em determinadas épocas do ano. Havia, nas proximidades, um cemitério. Foi removido com a construção da usina. Desgostosos com as modificações, os festeiros afastaram-se pouco a pouco. A capela é como tantas que encontramos à beira das estradas pelo Brasil. Poder-se-ia dizer que é a capela do Caminho do Mar.

Capela de S. Lázaro

Foto publicada com a matéria

Na edição de 18 de junho de 1972, o jornal paulistano Folha de São Paulo publicou na página 14 do 1º caderno a matéria Os capítulos da História do Brasil nos monumentos do Caminho do Mar, por Isabel Dias de Aguiar, registrando:

O progresso conspirou contra o Cemitério dos Jesuítas ao Pé da Serra, cedendo lugar à refinaria de Cubatão. A Capela de São Lázaro que havia no local foi, inexplicavelmente, inteiramente destruída pelo homem

Imagem: reprodução parcial da página da Folha de São Paulo com a notícia

[...] Outro monumento é a base da serra de um pontilhão contendo duas placas referentes à pavimentação de concreto concluída em 1926. Próximo a ela existia uma capela de São Lázaro, onde eram realizadas festas populares. Esta capela, inexplicavelmente foi destruída, sem que qualquer explicação fosse dada. Trata-se de um monumento com certa importância histórica, uma vez que fazia parte de um velho cemitério construído pelos jesuítas há séculos. Com a construção da refinaria Presidente Bernardes o cemitério foi removido e permaneceu a capela que há pouco tempo também foi removida.

Leva para a página seguinte da série