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HISTÓRIAS E LENDAS DE S. VICENTE - BIBLIOTECA NM
1532+460 anos de S. Vicente (P)

Um álbum comemorativo mostra aspectos da cidade que muitos vicentinos desconhecem. Outros, já mudaram bastante desde então, ou viraram história

Ao longo dos séculos, as povoações se transformam, vão se adaptando às novas condições e necessidades de vida, perdem e ganham características, crescem ou ficam estagnadas conforme as mudanças econômicas, políticas, culturais, sociais. Artistas, fotógrafos e pesquisadores captam instantes da vida, que ajudam a entender como ela era então.

Em 1992, comemorando os 460 anos da chegada de Martim Afonso, que oficializou o nome São Vicente, foi publicado o livro São Vicente - 1532-1992, com pesquisa e texto da jornalista Noemi Francesca de Macedo, editora do jornal Espaço Aberto), tendo projeto gráfico e editorial da EF Editora Ltda., fotos e reproduções de José Dias, arquivo do jornal Espaço Aberto, edição da Poliantéia Vicentina e arquivo pessoal de Santo Bordinhon. A capa, criada por Maurício Menezes, teve ilustração de Eduardo Jardim. A revisão foi feita por Exceção Assessoria de Texto S/C Ltda., enquanto Impressão, Fotolito e Acabamento foram providenciados por Maynard & Poladian Associados Gráfica e Editora Ltda., de S. Paulo. A obra de 103 páginas teve apoio cultural de Carrefour Comércio e Indústria S/A e chega agora pela primeira vez ao meio digital, em Novo Milênio (páginas 72 a 77):

 

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Noemi Francesca de Macedo

Boa Vista, tradição de bairro boêmio

Durante o dia, a tranquilidade de um bairro comum, com exceção do período de temporada de verão, quando o movimento é maior. Olhando aquelas ruas por onde pessoas passam sem muita pressa, não se pode imaginar a transformação daquele bairro à noite, quando o Boa Vista se torna o centro das atrações, o ponto de convergência da vida noturna da região.

Bares, restaurantes, calçadas e ruas tomadas por gente de todas as idades e lugares. O bairro noturno de São Vicente é uma mistura de raças, onde a convivência pacífica é caracterizada pelas opções de seus frequentadores. Uns preferem os restaurantes e bares mais badalados; outros, aguardar na fila uma mesa na pizzaria ou num banquinho no jardim, montado no final de uma das ruas pela proprietária de uma barraquinha de petiscos. Isso sem contar os que preferem, em meio a toda aquela agitação, tentar junto à banca de jornal, mesmo que tardiamente, saber se ainda restou algum jornal.

Há também aqueles que preferem ficar encostados ou sentados nas muretas, observando o movimento,principalmente o das garotas, e aproveitar para ouvir o som da boa música vinda das casas noturnas, ou mesmo dos próprios automóveis estacionados ao longo das ruas que formam o bairro. O Boa Vista, situado entre as praias de Itararé e São Vicente, sempre apresentou controvérsias com relação a seus limites.

Boa Vista mantém a tradição da vida noturna em São Vicente,...

Imagem: reprodução da página 72 da publicação (cor acrescentada por Novo Milênio)

Surpresas e histórias da noite

No Boa Vista a noite é uma criança, e para que ela se apresente cheia de luzes, cores e sons, os preparativos começam muito cedo.

Os bares e restaurantes quase não fecham, pois, para preparar os atrativos da noite, comerciantes e funcionários estão prontos logo cedo, ou seja, nem bem a casa fechou, outra equipe já está trabalhando.

Eugênio Francisco Cação, proprietário de um dos mais badalados restaurantes, o Boa Vista, comerciante no bairro há 26 anos, diz que a tradição noturna de uma casa começa nos preparativos da manhã. Ali, na esquina das ruas 11 de Junho com Pero Correa, onde funciona seu estabelecimento, sempre foi ponto de encontro dos amantes da noite, mesmo quando o bairro ainda era pacato, mas com a distinção de local preferido pelos boêmios.

Na década de 40, naquele lugar funcionava o empório de Eleutério Teixeira, onde, à noite, os rapazes, vestidos de ternos, brilhantina nos cabelos e sapatos bico fino, paravam para namorar. Aquele ponto de encontro funcionou como Padaria continental, antes de chegar a ser o Restaurante Boa Vista.

A especialidade da casa, naturalmente, são frutos do mar o ano inteiro. Como o restaurante funciona durante o dia e tem clientela que passa de pai para filho, nos fins de semana, durante o horário de almoço, a espera por uma mesa é recompensada pela delícia dos pratos servidos.

À noite, o grande movimento começa a partir das oito horas, sem horário para acabar, e é nesse período que acontecem histórias pitorescas, como a de Maria Isabel Antunes e Hector Antunes, que se conheceram no Boa Vista em 1977. Voltaram a se encontrar no mesmo local dois anos depois. No terceiro encontro (1980), sempre em festas de fim de ano, começaram um namoro de três meses e logo em seguida se casaram. Garantem que o Boa Vista os uniu.

"Uma pérola", exclamou o pesquisador Narciso Vital, quando na madrugada de 5 de abril de 1989, em companhia de seus colegas de trabalho da Câmara Municipal de São Vicente, Walter e Eliezer, este último jogou o que julgava ter sido uma pedra dentro de um marisco. Eles haviam se reunido para comemorar o final da exaustiva sessão de promulgação da nova Constituinte do município e, como sempre, escolheram o Boa Vista.

...com muita gente, badalação e música ao vivo

Imagem: reprodução da página 72 da publicação (cor acrescentada por Novo Milênio)

De repente, Eliezer mordeu algo estranho. Tirou da boca aquela bolinha branca e jogou fora. Mas Narciso, ao ver a bolinha rolando, notou um brilho diferente. O fato foi notícia explorada pela imprensa e a pérola, hoje, é o símbolo de união entre os três amigos e obrigatoriedade de retorno "sempre" ao Boa Vista, onde o garçom Catarina, há 22 anos trabalhando com o proprietário da casa, é figura folclórica e das mais queridas pelos frequentadores do local. Com 67 anos, Catarina venceu várias vezes a tradicional "Corrida dos Garçons" (extinta) e sua rapidez e segurança no transporte de travessas, copos, garrafas etc. o tornaram famoso.

Lá também está o garçom Edvaldo, há 21 anos. Muito parecido com o cantor Caubi Peixoto, é carinhosamente chamado pelos fregueses de Caubi, até pelas crianças.

Em frente ao Boa Vista está o Panela de Barro, tradicional restaurante dançante. Sob a direção de José Luiz Severo (proprietário), a casa parece não saber o que é crise. Há dez anos Servo resolveu incrementar o restaurante, abrindo espaço para música ao vivo, e o sucesso foi geral. Em 1986, desmembrou o restaurante e, no andar superior, criou o Aconchego, local mais que perfeito para bufê e eventos, com ampla pista de dança, iluminação moderna, ar-condicionado e música. Muitas são as pessoas que às vezes não sabem se ficam na parte de baixo (Panela de Barro) ou se preferem o Aconchego. Em ambos os locais o serviço é excelente, com freguesia garantida, que costuma ficar na dúvida na hora de escolher um entre os quarenta tipos de pizzas oferecidos, pratos tradicionais de frutos do mar, churrasco e outros.

Em frente ao Boa Vista e ao Panela de Barro está o Mares do Sul. Ainda na Rua 11 de Junho, a Morada do Sol, onde a pizza é muito disputada. Pouco antes dessa rua, o Restaurante e Pizzaria Lá em Casa, também com música ao vivo. O Restaurante Itapura, de larga tradição na cidade, funcionou durante muitos anos próximo à Ponte Pênsil. Agora está no bairro, com instalações recentemente inauguradas na Avenida Presidente Wilson.

As opções para quem gosta de um chope, petiscos e bate-papo à noite não param por aí. Na Rua Messia Assu, assim como na 11 de Junho, inúmeros são os barzinhos, alguns funcionando durante 24 horas. Nessa mesma rua, bem no final, juntinho da pequena praia, uma barraca especial: a de Zulmira Abadia Prate que, para incrementar o local, montou um pequeno jardim, aproveitando algumas mesas e bancos que já existiam. Assim, sua barraca de petiscos, onde o peixinho frito na hora é uma tradição, é ponto obrigatório na noite do Boa Vista.

Bares e restaurantes lotados, o bairro Boa Vista atrai turistas de todas as regiões

Imagem: reprodução da página 76 da publicação (cor acrescentada por Novo Milênio)

Lazer, história, informação

O Boa Vista não é só vida noturna. Tem suas prainhas: a Boa Vista é formada por molhes no final da Rua Messia Assu; a Praia dos Milionários e uma menor ainda, conhecida como Recanto das Crianças, em frente ao restaurante Lá em Casa.

E também ruas arborizadas, a pracinha da Amizade, onde sempre há alguém para bate-papo, passeios de barco, comerciantes antigos que sabem tudo sobre o local e o Museu Histórico Naval, na Rua Messia Assu, 78, mantido por Carlos Alfredo Hablitzel. Durante 50 anos, Hablitzel formou seu acervo para a implantação desse museu particular, onde podem ser apreciadas maquetes e quadros de navios, naufrágios, destroços de navios e balas de canhão da era colonial.

A história do bairro Boa Vista é cheia de tradições que os mais antigos do local fazem questão de passar para as novas gerações. Uma das tradições do bairro é a banca de jornal da espanhola Maria Josefa Limian Vânio de Fidalgo, localizada na confluência das ruas Messia Assu e 11 de junho.

A banca, que pertenceu a um português de nome Joaquim, foi adquirida pelo marido de dona Maria, seo Luiz Fidalgo Ambrózio, falecido há 25 anos. Durante a temporada, a banca funciona até mais tarde. Anos a fio, Maria Josefa, que reside na Zona Noroeste, em Santos viu passar pelo local, para conversar e trocar ideias sobre os últimos acontecimentos estampados nos jornais e revistas, pelo menos três gerações de famílias.

Trabalhando hoje em companhia de seu filho Pepe, 40 anos, ela fala da transformação verificada nos meios de comunicação: "Quando compramos a banca, havia em média trinta tipos de revistas e os jornais eram os tradicionais. Claro que depois surgiram outros, que tiveram suas atividades interrompidas após anos. As grandes revistas noticiosas eram Manchete e O Cruzeiro, enquanto a grande revista feminina era Cláudia, além de muitas outras sobre artistas, fotonovelas e histórias infantis. Hoje, há uma infinidade de revistas que não dá para guardar o nome de todas e seus assuntos, a não ser as mais procuradas, naturalmente".

"Antes, nosso trabalho era muito mais árduo, porque a banca abria muito cedo, madrugada mesmo, e fechava muito tarde. Hoje, já não podemos continuar nesse ritmo, mas a freguesia continua fiel, até mesmo com relação às figurinhas, que só mudaram de cor e personagens, mas o efeito produzido nas crianças é o mesmo".

Dona Maria lembra que, quando comprou a banca, bem pertinho dela, na mesma calçada, já funcionava o açougue Boa Vista, a quitanda do seo Caetano e a casa de artigos de esportes Maresportes. Diz dona Maria: "Ainda existiam os casarões, como o que hoje é sede da Liga do Apostolado Católico".

Há 24 anos na banca de jornal, Maria Josefa vem acompanhando as gerações do bairro Boa Vista

Imagem: reprodução da página 76 da publicação (cor acrescentada por Novo Milênio)