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HISTÓRIAS E LENDAS DE S. VICENTE - BIBLIOTECA - Na Capitania de S.V.
Washington Luís e a capitania vicentina (12)

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Além de governador paulista e presidente do Brasil, Washington Luiz Pereira de Souza foi escritor e historiador, sendo responsável pela construção dos monumentos históricos do Caminho do Mar, na subida da serra entre Santos e São Paulo, em 1922, para comemorar o centenário da Independência do Brasil.

Uma das suas mais importantes obras foi esta, Na Capitania de São Vicente, publicada em 1956 (um ano antes da morte do autor) pela Livraria Martins Editora, da capital paulista. Com 341 páginas mais 7 introdutórias, a obra foi impressa pela Empresa Gráfica Revista dos Tribunais, também de São Paulo.

O exemplar de número 956 foi cedido a Novo Milênio para digitalização, pela Biblioteca Pública Alberto Sousa, de Santos, através da bibliotecária Bettina Maura Nogueira de Sá, em maio de 2010. Páginas 155 a 163, com ortografia atualizada:

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Na Capitania de São Vicente

Washington Luís

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Capítulo XI - O cruzamento e a escravidão

Como se poderá ler nos capítulos anteriores, os jesuítas, em pequeno número, só dispondo de recursos espirituais, não tinham elementos, como foi reconhecido pelos mais autorizados catequistas nas suas cartas, para, pela só persuasão, cristianizar os indígenas bravios e brutais, e sempre aludiam ao auxílio da espada, da força em suma.

Os indígenas, antropófagos, nômades, sem Deus e sem leis, não poderiam por si sós sair da selvageria em que viviam havia muitos séculos.

As costas de Vera Cruz cairiam aos pedaços nas mãos de piratas ingleses, holandeses e franceses, movidos pela cobiça e pela avidez do ouro, as quais depois passariam aos respectivos governos, mais fortes, se no século XVI houvessem sido descobertas as minas incríveis, que a fantasia então desvairada concretizara no El Dourado. Tudo assim sucederia se não tivesse havido o cruzamento, o extermínio e a escravidão dos aborígines. Esse cruzamento das raças foi uma experiência, inconsciente sem dúvida, para a civilização da zona contida entre o Equador e o Trópico e na zona temperada pela altitude.

Todos os povos têm as suas origens enevoadas e obscuras. Essa obscuridade engendra fábulas que os pósteros acreditam, cria lendas formosas que arrastam, sustentam, fazem viver e triunfar as nações. São elas inevitáveis e sempre existiram, desde que os Deuses desceram do Olimpo para coabitarem com as gregas e desde que a Loba amamentou Rômulo e Remo.

A verdade é que a vida dos povos, que conquistaram, começou sempre pelas guerras, as quais só terminavam com o extermínio ou com a escravidão dos vencidos.

Todas as civilizações, em seus inícios, e mesmo em seus períodos adiantados, estabeleceram e mantiveram a escravidão. No Cap. 2º, do Livro 1º de sua Política, Aristóteles, na fase social da Grécia de então, admitia e justificava a escravidão. Estudando os elementos da economia doméstica, considerava ele como partes primitivas e indecomponíveis – a mulher e o marido, o pai e o filho, o homem livre e o escravo – e declara que há pessoas que nasceram para mandar – o senhor – e outras que nasceram para obedecer – o escravo.

Do mesmo modo, segundo Gastão Boissier narra, Cícero justificava a escravidão (Ciceron et ses amis, pág. 113) e ninguém ignora que a escravidão sempre existiu em Roma, ainda nos seus períodos áureos.

Nos países do Mediterrâneo houve sempre escravos. Em todos os países da América, mesmo nas mais adiantadas nações, houve escravos, instituição que durou até os fins do século XIX, em muitas nações. São fases primitivas da evolução social.

Mesmo os jesuítas que defendiam a liberdade dos índios, admitiam a escravidão do africano pedindo negros de Guiné para seu serviço (Cartas jesuíticas, vol. 1º, págs. 126, 130, 138 – Manuel da Nóbrega).

D. João III, nas cartas de doação a Martim Afonso, autorizava a mandar para Lisboa, dos escravos que resgatasse, 48 peças livres de direitos.

No próprio regimento dado a Tomé de Sousa, d. João III mandou cativar e matar dos tupinambás "aquela parte deles que vos parecer que baste para o seu castigo e exemplo. E isso será, porém, com eles ficarem reconhecendo sujeição e vassalagem" (reg. do Tomé de Sousa – Memórias Históricas e Políticas da Bahia, I. Acioli e Braz Amaral – vol. 1º, pág. 264).

O que sucedeu no Brasil, sucedeu em toda a parte.

Nos começos, de viver quase paralelo, os povos da Europa não tiveram a seu lado outros mais adiantados que descrevessem, em toda a sua nudez, a barbárie dos seus costumes primitivos. O índio da América encontrou escritores, nem todos inteligentes e de boa-fé, que contaram o estado selvagem em que ele se achava.

É evidente que para uma terra bruta, habitada por selvagens, sem produção, sem as mais rudimentares comodidades da vida social, não viriam viver ricos e nobres, filósofos e literatos.

Para aí viver sem garantia de espécie alguma, só viriam os forçados pela lei, os que se destinavam ao martírio os degradados pelas justiças da terra e os aventureiros. Para estes últimos, a não ser alienados mentais ou tipo lombrosianos, podia-se esperar a consoladora regra de Paulo de Saint-Victor que declarava "que a travessia do oceano purificava". Na terra, em que não se conheciam princípios de justiça, de propriedade, e cujo fim único era morrer e matar, não poderia haver ladrões ou assassinos. O homem é o produto da terra em que vive, que ele transforma, como o é das condições sociais que o rodeiam.

***

Não há, nas nações, raças puras. É o clima que principalmente faz o homem e a sua raça. E o clima é produzido pela latitude e pela altitude sobre o nível do mar, modificadas pelos seus rios, montanhas e ventos. É preciso reparar em que latitude e em que altitude vivem os homens que criaram a civilização. Repare-se a diversidade dos climas em que ele vive. A mais de sete mil metros de altitude o homem não pode viver, debaixo do Equador o homem vive dificilmente. A luta pela vida cria necessidades e obriga o homem a trabalhar para satisfazê-las.

Sob os climas frios, o homem é obrigado a cobrir-se, a fazer sua casa, a armazenar víveres, e para isso se esforça. Depois dessa necessidade, vem o conforto e em seguida a arte que adorna o vestuário, que embeleza a casa, a gastronomia que torna saborosos os víveres armazenados. Esses homens, pela expansão natural da descendência, para poderem viver, estendem a sua civilização aos outros povos, que a aceitam a princípio pela escravidão e depois pelo hábito.

Nos trópicos, na selvageria, a natureza aquece os homens e eles andam nus, e só têm casas rudimentares para se acobertar das chuvas, as florestas dão os frutos e a caça para a sua alimentação, como também o fazem os rios dando os peixes. E se lhes faltam esses gêneros de nutrição são eles antropófagos. É a lei do menor esforço.

É vã a discussão sobre superioridade de raças. O clima faz o homem e o homem faz a raça, criando o meio, o ambiente, as condições mesológicas, enfim em que ele se reproduz.

Os Estados Unidos se estendem de Leste a Oeste sempre sob quase a mesma latitude, semelhante à da Inglaterra, e lá se exterminou, se escravizou o aborígine e se conquistaram territórios. O Brasil se estende de Norte a Sul e com zona tórrida. A sua altitude no planalto deu o clima temperado de que gozam os trópicos e permitiu desde cedo o seu maior desenvolvimento. Essa situação geográfica explica suficientemente a diferença do progresso entre os dois países. O nosso progresso tem que ser mais lento mas tem que vir, o que nos deve animar e não abater. Uns se civilizam, outros são civilizados.

Como em outros países, nas costas do Brasil houve o extermínio de tribos, a escravidão de outras; mas aqui houve também o cruzamento e pela religião, pelas leis portuguesas, houve progresso, embora lento, e foram essas as causas, e primordiais, para a formação do Brasil.

Também em outros países houve o cruzamento. Os celtas, os gauleses, os francos e mesmo os árabes, que só foram vencidos em Poitiers e que deixaram descendência, cruzaram para fazer a França. Os celtas, os anglos, os saxões, os normandos, cruzaram para fazer a Inglaterra. Os iberos, os lusitanos, os bérberes, os árabes cruzaram para fazer Espanha e Portugal. Os ligúrios, os lombardos, os gregos, os asiáticos cruzaram para fazer a Itália. Nos países do Norte os vândalos, os celtas, os germanos, os eslavos, cruzaram para formar a Alemanha. Nos Estados Unidos, país de imigração, há todas as raças.

Não posso fazer a enumeração completa das raças que, nos diversos países, cruzaram, porque me falta competência para isso e seriam necessários estudos que absorveriam uma existência.

Sem outras mulheres que as índias, com grande espaço diante de si, sem outro instrumento de trabalho que o índio vencido, essas levas de gente, vindas não se sabe como, ou mandadas pela vontade absoluta e fanática do rei de Portugal, sob o domínio das leis portuguesas e sob a proteção da catequese, tornar-se-iam talvez boas ou úteis. O extermínio, a escravidão, e o cruzamento teriam que se impor.

Não têm os descendentes dos primitivos habitantes da Capitania de S. Vicente que se orgulhar ou que se envergonhar diante de outros povos, eles que dos primitivos não chegam a ter deles uma gota de sangue, depois dos cruzamentos europeus.

Nas Causeries de Lundi (vol. VII, pág. 138) conta Sainte-Beuve que Benjamin Franklin aplicava à fidalguia um método de aritmética moral, segundo o qual um filho pertence por metade à família do seu pai e a outra metade à família de sua mãe, e chegava à conclusão, provada por algarismos e supondo uma genealogia intacta, que na nona geração esse descendente possuiria apenas "cinq cents – douziènes parties" da fidalguia inicial.

Adotando-se na aritmética racial o método de Benjamim Franklin, e admitindo-se que cada indivíduo normal, em peso e tamanho, tenha no seu organismo cinco mil gramas de sangue, chega-se à conclusão de que um paulista de quatrocentos anos, descendente dos que se enumeraram acima, após quinze gerações, que tantas são as que se contam desde os primeiros colonos até hoje, esse paulista tem em suas veias apenas cento e cinqüenta miligramas de sangue de João Ramalho ou de Antonio Rodrigues, ou das respectivas princesas, quantidade que equivale a pouco menos de uma gota. Foi esse o cálculo que, sob as bases indicadas, fez um professor da Escola Politécnica de S. Paulo, a meu pedido.

É inútil, parece-me, fazer observar que, nas linhas que aí estão, procuro reunir elementos para a futura história da formação territorial do Brasil, e, por conseqüência, não faço obra de moralista. Isto quer dizer que narro, sem os aprovar ou censurar, os fatos que se desenvolveram para a constituição geográfica do país e para a civilização de seus habitantes. E fazendo esta observação, repito conceitos expedidos por Ernest Renan, quando estuda As Origens do Cristianismo.

Hoje considera-se a escravidão como um sistema violento, desmoralizador, entorpecente do progresso econômico, e, sem dúvida alguma, injusto e abjeto; mas não foi assim nos tempos anteriores.

Também não é minha intenção diminuir as glórias dos paulistas ou amesquinhar a fidalguia e a riqueza de seus antepassados. Para sua glória, basta relatar o que eles realizaram para a constituição geográfica do Brasil, que ainda hoje é um dos principais feitos de sua História.

Mas é de justiça recordar que todo o trabalho começou pela opressão do mais forte sobre o mais fraco; e que, em seguida, a civilização se estabeleceu pela escravidão, imposta por uma raça mais forte sobre a vencida. E a fortaleza aqui não somente deve-se entender fisicamente, mas sob o aspecto moral e intelectual.

Para ser justo e imparcial para com esses homens, que foram escravizar os índios para obrigá-los a trabalhar, dando-lhes começo de civilização, é imprescindível julgá-los com os princípios e a moral do tempo em que viveram. Se escravizassem, nos nossos dias, seriam eles passíveis de censuras e de condenação: mas, nos primeiros tempos coloniais, eles agiram, como agiram os principais povos, as principais pessoas, embora louvavelmente já houvesse quem a isso se opusesse.

Com o cruzamento das duas raças, apareceram os mamelucos que herdaram dos pais uma inteligência mais apurada, a iniciativa e a tenacidade nos esforços, as possibilidades da civilização, aprenderam a língua portuguesa e foram feitos cristãos; das mães herdaram a resistência física às agruras do viver sem conforto, a sobriedade na qual o comer não tinha horas marcadas, e, às vezes, nem havia o que comer. Herdaram mais a imunidade às febres, conseguiram a adaptação ao clima áspero e selvagem do sertão falto de todo o necessário, mas abundante de feras, de mosquitos, que dão febres, que matam, em viagens que duravam meses e mesmo anos. Delas herdaram também os ódios de tribos, e, por conseqüência, o gosto indômito de guerrear.

Foram eles, foram esses mamelucos, os elementos básicos, indispensáveis para organização das bandeiras e decisivos para o bom êxito das entradas ao sertão, concorrendo poderosamente para conquista e povoação do interior do Brasil. Mas já esses mamelucos não eram selvagens, já possuíam, com força e vigor, os princípios elementares de uma civilização incipiente. Hans Staden, quando escreveu, em 1551 (?), sobre os irmãos Braga, disse que já falavam a língua paterna e a materna e que já eram cristãos, como cristãos eram os descendentes de João Ramalho, conforme, em 1553, relatou Ulrich Schmidl.

O negro africano, se algum veio nessa primeira época, foi em pequeníssimo número, e só mais tarde, muito mais tarde, entrou a colaborar, e servilmente, nessa obra. Houve então poucos escravos de Guiné, como eram chamados os africanos.

Nessa época, nos inventários processados em S. Paulo, desde 1578 a 1611, ano em que faleceu em S. Paulo, d. Francisco de Sousa, e publicados pelo Arquivo de S. Paulo, nessa época, em que nos inventários, as mais insignificantes coisas se avaliavam, como por exemplo, duas colheres de estanho, três galinhas, uma ceroula velha, meias usadas e quejandas, nessa época poucos foram os escravos de Guiné avaliados para serem partilhados pelos herdeiros, encontrando-se, porém, numerosíssimos índios da terra, indicados como escravos, administrados, ou serviços forros, o que tudo significava a mesma coisa [1].

Não pude fazer estatística rigorosa, nem mesmo aproximada, porque nesse período não consultei todos os inventários; muitos deles desapareceram e outros tornaram-se ilegíveis e não foram publicados; e, provavelmente, as descrições dos escravos, nos inventários consultados, não foram talvez completas. Mas só tive esse elemento para distinguir a origem dos escravos.

Mesmo sem casamentos, o cruzamento das raças foi grande e talvez maior. Pedro Taques só menciona os que, no seu entender, podiam ser colocados em Nobiliarquia. Os padres da Companhia de Jesus narram, nas suas cartas, que o sertão estava cheio de mestiços, que se asselvajavam, tomavam os costumes dos aborígines, e até os doutrinados fugiam para viver nas selvas. Nessas longas e demoradas, ou não, estadas no sertão longínquo, a mestiçagem proliferava.

Nesses testamentos que consultei, raro é aquele em que o testador não se refira a filhos bastardos, havidos com índias da terra, antes, durante e após casamento, e neles sempre os recomenda, para educação, aos seus inventariantes e testamenteiros, a seus pais, a seus irmãos, às próprias esposas, que, virtuosas, não se descuidavam desses enteados postiços, sendo algumas delas designadas com o apelido de Matronas, que as tornavam respeitáveis na terra em que viviam.

Num desses testamentos (vol. 20, pág. 6) o testador, possuidor de muitos bens e de mais de 500 arcos (índios), ao lado de quatro filhos de seu legítimo matrimônio, diz que não sabe quantos tem bastardos, textualmente diz "que na verdade não sei quantos; são meus quantos as mães disserem", e todos deviam ser contemplados na terça.

Um outro que vivia em um sítio, que pela quantidade de casas mais parecia vila, conforme diz Azevedo Marques nos seus Apontamentos, não casou. Mas deixou treze bastardos com as índias de sua administração, que todos tiveram geração.

Luzia Leme litigou judicialmente com seus sobrinhos, filhos de Braz Esteves, seu irmão, para excluí-los da herança por serem bastardos. Afonso Sardinha, o moço, era bastardo. Pero Sardinha, filho deste Afonso Sardinha, o moço, em seu testamento, suplica a seu avô, Afonso Sardinha, o velho, que não deixe ficar escravo o seu bisneto, também de nome Afonso, que ele havia tido com uma índia, Esperança, escrava de Pedro Álvares (vol. 3º, pág. 396). Inumeráveis foram os que não entraram na Nobiliarquia.

Essa mestiçagem começou bem cedo, logo nos primeiros dias do descobrimento, graças aos instintos de reprodução dos alienígenas, da indiferença e desprezo do índio pela mulher, e à facilidade de costumes das índias, em estado quase animal. Quando foi distribuída a costa do Brasil em capitanias, com a vinda dos séqüitos dos capitães-donatários, ela cresceu; e mais se avolumou depois do governo geral, com a chegada de Tomé de Sousa, que trouxe uma guarnição militar com empregados subalternos de cerca de 400 homens, na maior parte celibatários, e com 600 degradados solteiros, largados nas selvas do Brasil, terra que, pouco depois, seria declarada couto e homízio para os criminosos, exceto os de heresia, moeda falsa, sodomia e traição. Continuou ela crescendo com a vinda das frotas portuguesas, das quais desertava a marinhagem, a tal ponto que uma provisão real proibiu a arribagem ao Brasil de naus que se destinassem às Índias, como já disse.

Ela existiu sempre, mesmo nas povoações habitadas pelas autoridades civis e religiosas.

Um pouco mais tarde começaram a chegar casais brancos e homens brancos solteiros. Estes se casavam com as mestiças, como o capitão-mor Jorge Ferreira, que se consorciou com uma filha de João Ramalho. E muitos outros assim o fizeram.

Os filhos destes já eram um quarto de sangue, e, pelos casamentos sucessivos com europeus, um oitavo etc., embranqueceram, formaram, civilizaram uma raça, pela diluição do sangue indígena, permitindo que eles se chamassem brancos, ou que mesmo se tornassem brancos, pela pequena quantidade de sangue indígena, que ainda lhes circulava nas veias.

Foi a "equiparação cívica das raças, de cuja fusão saiu grande parte da nacionalidade brasileira" (frase de Olavo Bilac, em Críticas e Fantasias, pág. 166).

Da promiscuidade cautelosa em que os primeiros portugueses viviam com os tupiniquins procedeu essa sub-raça, em que se apoiaram os forasteiros para conquista do sertão, para aumento do Brasil. Depois vieram os casamentos.

Dessa promiscuidade nasceu essa sub-raça, elemento forte para as contínuas guerras de conquista, que sustentavam contra os aborígines – tamoios, carijós, temiminós, tupiaens etc. – dando os portugueses o auxílio de suas traças e de sua superioridade aos seus sócios e deixando parte dos vencidos inimigos para a antropofagia indígena, que não podiam evitar, e destinando a restante para venda aos navegantes que aí aportavam, ou para as necessidades de suas lavouras.

Esposando os ódios hereditários, que acendiam guerras com as tribos vizinhas, esposavam os colonos também as índias prolíferas.

Com esses mamelucos, como eram então chamados pelos que os combatiam, se formaram os bandeirantes que compuseram as expedições, que domaram os sertões, e bandeirantes ainda se dizem hoje, e com orgulho, os seus milhões de descendentes.


[1] Negros eram chamados os índios da terra, como se vê nos inventários em que são avaliados os tamoios e os outros. Negros de Guiné eram chamados os africanos. No inventário de Henrique da Cunha, vol. 1.º, págs. 223 e 224, em 1624, se descreve uma negra de Guiné, casada com um índio, com um filho de peito, e avaliados dois mulatos, seus filhos.