Domingo, 27 de Agosto de 2006, 07:27
MERCADO
Crise ameaça lojas especializadas em CDs

Crescimento da pirataria e músicas em formato digital prejudicam o setor

Um dos segmentos mais tradicionais do comércio santista está desaparecendo de forma gradativa. Nos últimos anos, os proprietários de lojas especializadas em venda de CDs e DVDs musicais vêm encontrando dificuldades para se manter em atividade, em função do avanço da pirataria e do acesso às novidades tecnológicas, proporcionado pela Internet.

No Centro, é possível perceber o que se passa neste setor do comércio. A área, que chegou a contar com mais de 20 lojas especializadas no ramo, possui hoje três pontos: Marimba (na Rua Martim Afonso), Prodisc (na Rua General Câmara) e Musical (na Praça Mauá).

As Lojas Americanas também comercializam CDs e DVDs, mas sem oferecer o mesmo tipo de atendimento dos estabelecimentos especializados.

O Gonzaga se transformou em uma espécie de ponto de resistência, mantendo lojas em atividade nos dois shopping centers (Miramar e Parque Balneário) e nas galerias comerciais Ipiranga (esta segmentada no estilo rock e blues) e 5ª Avenida. Há ainda a Loja Tremendão, que funciona no térreo de um condomínio da Avenida Ana Costa, mais próximo do cruzamento da Avenida Francisco Glicério.

Já no Boqueirão, no Super Centro Comercial local, o único estabelecimento do ramo fechou no início de maio, dando lugar a uma loja de reciclagem de cartuchos de impressora para computador.

O mesmo aconteceu no Praiamar Shopping, na Aparecida, que não conta com lojas especializadas. Os discos novos são encontrados no Hipermercado Carrefour.
Proprietário da Marimba Discos, Delmiro Antello Iglezias trabalha no setor há mais de 40 anos. Ele disse que nunca presenciou um período tão ruim como o atual. "Só estou no ramo porque gosto muito do que faço. Financeiramente, as coisas vão de mal a pior".

O seu estoque, que chegou a ser de 12 mil títulos, conta hoje com cerca de 3 mil, entre CDs e DVDs. "O que continua mantendo as vendas, por incrível que pareça, são os discos de seresta e música instrumental antiga, além dos ritmos como bolero".

Como causa principal da queda do movimento, Iglezias aponta a pirataria e o acesso cada vez maior do público aos arquivos sonoros em formato digital, disponibilizados pela Internet. "Se continuar dessa forma, dentro de cinco anos, a nossa atividade estará extinta".

Renovação - Sócio há quatro anos da Loja Acústica, no Gonzaga, Tito Pucciarello se viu obrigado a fazer promoções para tentar cobrir os gastos. No preço à vista, por exemplo, ele vem dando 40% de desconto. "No período de Copa do Mundo, tivemos um desempenho muito fraco nas vendas. Se eu não fizer isso, não terei condições de honrar os compromissos assumidos".

Durante 18 anos, ele trabalhou como funcionário da antiga loja Opus, que funcionou na Avenida Floriano Peixoto e era uma referência para o setor. "Hoje em dia temos a Ferrs, no Parque Balneário, que ocupou esta lacuna por causa do seu acervo bem diversificado. Mas ainda é pouco".

Conforme salientou, não houve uma renovação no público consumidor. "Muitos jovens não têm qualquer tipo de referência dos produtos fonográficos. Alguns chegam a baixar as músicas pela internet e só. Nem se preocupam em saber como é o encarte e a capa, por exemplo".

Ele também aponta o crescimento das grandes lojas e dos serviços pela Internet como fatores que contribuíram para o fenômeno. "Os hipermercados, por exemplo, trabalham pelo sistema de consignação, ou seja, se não venderem, podem devolver os discos. No nosso caso, somos obrigados a arcar com as despesas, vendendo ou não".

Domingo, 27 de Agosto de 2006, 07:28
Comerciante trocou de ramo

"Desisti do ramo porque percebi que não havia mais condição de mantê-lo. Se por um lado as empresas fornecedoras não oferecem uma contrapartida, por outro, o público consumidor continua se afastando". A opinião é do empresário Luiz Fernando Alves Lima, que desde 1999 trabalhava na Loja Freedom, no Super Centro Boqueirão.

Ao assumir o ponto, ele tomou a decisão de segmentar os produtos oferecidos. "A pirataria acontecia de forma desenfreada na Cidade. Não havia como competir com os camelôs. Então, me voltei para o público de rock e jazz, que era mais seleto e não era visado pelos piratas".

Em abril deste ano, ele participou da promoção que trouxe a banda alemã de heavy metal Helloween para Santos. "Naquela ocasião, só consegui vender dois discos. Apesar de o público ter sido bem grande no show, a maioria tinha baixado as músicas pela Internet".

Na sequência, Lima tomou a difícil decisão de fechar o loja. "Eu sempre gostei de trabalhar com discos. Mas não dava mais para pagar as despesas. O comerciante não consegue sobreviver com um ideal".

Desde maio, o ponto da extinta Freedom conta com outro tipo de atividade, voltada para a área da informática. Depois de pesquisar por conta própria, Lima percebeu que o local não contava com uma loja de remanufaturamento de cartuchos. "Pelo menos estou conseguindo obter algum resultado positivo".

Após 30 anos, Prodisc encerra as atividades
Foto: Nirley Sena, publicada com a matéria

SILÊNCIO

Prodisc perde para piratas e fecha depois de 30 anos

Ano-novo começa mais pobre no ramo fonográfico com fechamento da loja

Luiz Gomes Otero

Da Redação

O gigante saiu de cena. Empresário do ramo fonográfico há 30 anos, Alcides Palácio decidiu encerrar as atividades da loja Prodisc, no Centro de Santos. A decisão foi em função das dificuldades financeiras provocadas pela pirataria.

Na matriz da empresa, na Rua General Câmara, próximo da Praça Mauá, várias pessoas passaram em busca dos lançamentos de seus artistas preferidos. Mas ontem, às 13 horas, o estabelecimento fechou as portas. O ano-novo, no caso, começou mais forte na oferta de lojas especializadas em CDs e DVDs musicais.

Vale lembrar que a rede Prodisc chegou a ter 15 filiais espalhadas pela Baixada Santista. Quem é que não se lembra das unidades de Cubatão, na Avenida Nove de Abril, e da de São Vicente, na Rua Frei Gaspar? Ambas situadas em movimentados centros comerciais.

Proprietário da rede, o empresário Alcides Palácio, que está no ramo há 40 anos, sendo 30 deles na Baixada Santista, lembra com saudade dos tempos áureos da atividade.

"Aqui e em todas as nossas lojas, nos preocupávamos sempre com a qualidade do atendimento. Dificilmente alguém ficava sem encontrar algo próximo do que desejava".

Porém, o empresário disse que o estabelecimento não suportou a pressão provocada pela queda do movimento e pelo comércio ilegal de produtos.

"Hoje em dia ficou muito fácil conseguir baixar um disco em formato digital (mp3). Não há controle efetivo sobre isso. E o que é pior é que isso ganhou espaço nas ruas, nas barracas dos camelôs e até nas lojas. Ficou impraticável", sentenciou o empresário.

Segundo ele, nem mesmo uma comissão formada na Câmara de Santos, que promoveu audiências públicas e reuniões com instituições responsáveis pela fiscalização da pirataria, produziu resultados práticos.

A loja contava com quatro funcionários.

Comerciante reclama da falta de fiscalização para combater a pirataria, praticada impunemente nas ruas
Foto: Nirley Sena, publicada com a matéria

Despedida

"A Prodisc, empresa do ramo de CDs e DVDs, informa que após 30 anos encerra suas atividades. Gostaríamos de ficar mais 30 anos. Mas a falta de combatividade das autoridades contra a pirataria não nos deixou outra alternativa, a não ser fechar as portas em definitivo neste final de 2009. Assim como a Prodisc, milhares de outras empresas do ramo de CDs e DVDs também já encerraram suas atividades nos últimos dez anos em todo o País, deixando de gerar empregos e impostos. Aos nossos clientes, empregados, fornecedores, entidades de classe e mídias, o nosso obrigado pelo apoio. Apoio este que não se apagará da lembrança, porque a dedicação de cada um não foi e não ficará enfraquecida pelas circunstâncias que, lamentavelmente, nos forçaram a parar".

Alcides Palácio

Centro ainda tem um resistente

Um dos remanescentes do setor de venda de discos no Centro de Santos é Delmiro Antello Iglezias, proprietário da loja Marimba. Atuando no mercado desde 1949, ele acredita que as dificuldades proporcionadas pelo avanço da pirataria acabarão com a atividade dentro de alguns anos.

Em sua loja, situada na Rua Martim Afonso, ele ainda mantém uma clientela fiel. Mas afirma que o movimento vem caindo nos últimos anos.

"Estou nesse ramo hoje por puro idealismo. Porque não me vejo fazendo outra coisa na vida. Mas infelizmente a situação está chegando a um ponto insuportável mesmo", reconheceu Iglezias.

Facilidade - Ele entende que o acesso à Internet (rede mundial de computadores), que passou a disponibilizar downloads gratuitos e sem controle por parte das gravadoras ou dos autores, prejudicou ainda mais o comércio legalmente estabelecido.

"Não vejo como controlar isso. Da forma como está, quem faz a distribuição ilegal não é punido. E o artista acaba sendo prejudicado, pois não recebe a parte que é seu direito (autoral)", assinalou o comerciante de CDs.

A principal queixa do lojista reside também na ineficácia da fiscalização no comércio clandestino. "Temos lei. Mas o fato é que ela não é cumprida. Se fosse, não teríamos ambulantes vendendo discos piratas", reclamou Iglezias.