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HISTÓRIAS E LENDAS DE SANTOS - CARNAVAL
Tempo de Carnaval (11)

Dos bailes no Largo da Coroação aos patuscos da Dorotéia. E depois?...
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Em sua História do Carnaval Santista (edição do autor, junho de 1974, Santos/SP), conta o pesquisador Bandeira Júnior:
 
Afinal, "após uma noite terrível de chuva, vento e profundas trevas, raiou o tão almejado domingo gordo (14 de fevereiro de 1858), a princípio um tanto brusco, tornando-se, porém, depois belo e claro"; ia ter início o

Primeiro Carnaval de Santos

Dirigiu a primeira gestão da Sociedade Carnavalesca o sr. Antônio Marques Saes, que, como presidente da Câmara Municipal, era o governador da Cidade. Assim, o carnaval santista começava com timbre oficial, um século antes da sua efetiva oficialização pelo prefeito dr. Antonio Ezequiel Feliciano da Silva.

Mas, deixemos que o cronista de O Comercial nos descreva, no estilo da época, o que foi esse inaudito congresso dos sócios e convidados da Sociedade Carnavalesca Santista:

"Ao meio-dia em ponto, atroaram os ares numerosos foguetes queimados à porta do Teatro. Já o prazer fazia pular todos os corações, e a ansiedade se pintava nas feições do povo: estava prestes uma interessantíssima festa. Às 3 horas, novos e sucessivos foguetes fizeram-se ouvir partindo do mesmo ponto: era o aviso, a chamada dos máscaras. Com efeito, às 4 horas, no Largo do Campo (agora Praça Visconde de Mauá), era digno de apreciar-se a chusma de carros enfeitados que se achavam reunidos, os muitos cavaleiros que campeavam em seus vistosos ginetes, os sons elétricos da banda de música, o povo que se apinhava à roda dos grupos de elegantes máscaras, a alegria, a curiosidade, o entusiasmo que transluziam em todos os semblantes!

"Começou o passeio: descrever a animação que houve, no jogo de ramalhetes e confeitos a boa ordem que presidiu todo divertimento, a galhardia dos máscaras e desembaraço das senhoras, fora impossível; por isso damos mão a tal empresa. Diremos somente, quanto aos máscaras, que se apresentaram em geral vestidos (fantasiados) com riqueza, e, o que é ainda mais apreciável, o que é ouro sobre azul, com o mais apurado bom gosto. Todos trajavam por figurinos, quer representativos de costumes históricos e de atualidade, quer fantásticos. E respectivamente às senhoras, que se portaram como verdadeiras brasileiras que são, amigas do progresso e das inovações próprias da civilização moderna.

"Na noite desse dia teve lugar o primeiro baile público. Foi pouco concorrido, isto em conseqüência de pensar o povo que era esse o baile da Sociedade Carnavalesca. No dia seguinte, em conformidade com o programa, nada houve durante o dia. À noite, eram apenas 8 horas, já as galerias do Teatro, resplandecentes de luzes, ostentavam uma brilhante exposição do belo sexo. A princípio frio e desanimado, do meio para o fim o baile de máscaras particular da Sociedade assumiu outra fisionomia, esteve magnífico; compareceram máscaras interessantes, sérios e burlescos, e muito se dançou.

"Amanheceu o terceiro dia, tão lindo e risonho como os dois dias passados. Ao meio-dia, da porta do Teatro, soltaram-se numerosos foguetes e ali tocou algumas bonitas peças a música do batalhão da guarda nacional. No mesmo momento, um carrinho, carregando dois máscaras grotescos, percorria as ruas da Cidade anunciando que, naquele dia, havia o enterro do Carnaval.

"À tarde, repetiu-se o divertimento do primeiro dia com mais animação, mais entusiasmo, mais alegria, mais loucura, recolhendo-se o congresso ao teatro às Ave-Marias.

"Não nos esqueceremos de mencionar que, no primeiro dia de passeio, o congresso foi obsequiado com magnífico copo de água, pelo ilmo. sr. tenente-coronel Bernardino Ferreira da Silva, e no terceiro com uma lauta e delicada mesa de viandas, doces e bebidas, pelo seu digníssimo diretor, o ilmo. sr. vereador Antônio Marques Saes.

"Na noite do último dia, teve lugar o segundo baile público. Foi uma verdadeira enchente - houve uma concorrência espantosa. Era a despedida do carnaval - cumpria que todos a solenizassem. Às 11 horas da noite, procedeu-se ao enterro do carnaval. Uma charola carregada de um presunto e garrafas de vinho, no meio de archotes e lastimosos cantos de adeus, percorreu as ruas da Cidade iluminadas pelos habitantes prevenidos com antecipação. À meia-noite dançava-se no teatro o galope infernal, última peripécia da soberba comédia - o carnaval.

"Tais foram nesta cidade os folguedos dos dias 14, 15 e 16 do corrente mês. Correram rápidos para nos deixarem saudades de tantas loucuras e prazeres".

E o cronista encerra seu histórico trabalho - verdadeira certidão de nascimento da nossa folia - com este fecho profético: "Praza aos céus que, nos anos vindouros, o carnaval se festeje com tanto entusiasmo, tanto gosto, tão grande harmonia!".

Bem que o autor dessa deliciosa crônica merece o título póstumo de Primeiro Cronista Carnavalesco de Santos.

Lembrando: congresso carnavalesco é a forma como eram então chamados os desfiles de Carnaval...

O mesmo P. Bandeira Jr. havia publicado artigo sobre o tema no Almanaque de Santos - 1969, editado por sua empresa Roteiros Turísticos de Santos e tendo como redator responsável Olao Rodrigues (exemplar no acervo do historiador Waldir Rueda) - página 72 a 75:

Carnaval santista

(sinopse histórica)

Bandeira Jr.

O Carnaval santista é talvez o único na face da terra que nasceu em data certa: 14 de fevereiro de 1858. Antes disso, os dias "gordos" eram assinalados com arremedo de folia no qual a violência e a tragédia andavam de mãos dadas... Era o condenado (pela imprensa) Entrudo (de entra tudo?) que exercia estranho fascínio sobre todas as camadas da sociedade brasileira de então. Herança dos nossos colonizadores lusitanos...

Foi para eliminar do burgo - de 7.400 almas - esse hábito bárbaro que os seus homens de prol se reuniram durante o ano de 1857 e fundaram a Sociedade Carnavalesca Santista, chefiada honorariamente pelo sr. Antônio Marques de Saes, presidente da Câmara Municipal e ipso-facto governador da comuna.

No domingo de Carnaval de 1858 a SCS realizou o seu primeiro congresso (hoje diríamos desfile) que, saindo do Teatro do Largo do Campo (depois do Chafariz e atual Praça Visconde de Mauá), percorreu as primeiras vias de Santos. Mas, deixemos que o cronista do semanário tipográfico O Comercial nos conte, no seu estilo pitoresco, como foi o primeiro Carnaval da Orla praiana (N.E.: esta transcrição difere em pequenos trechos da que o mesmo autor apresenta em outro trabalho, acima):

"Ao meio-dia em ponto, atroaram os ares numerosos foguetes queimados à porta do Teatro. Já o prazer fazia pular todos os corações, e a ansiedade se pintava nas feições do povo: estava prestes uma interessantíssima festa. Às 3 horas, novos e sucessivos foguetes fizeram-se ouvir partindo do mesmo ponto: era o aviso, a chamada dos máscaras. Com efeito, às 4 horas, no Largo do Campo, era digno de apreciar-se a chusma de carros enfeitados que se achavam reunidos, os muitos cavaleiros que campeavam em seus vistosos ginetes, os sons elétricos da banda de música, o povo que se apinhava à roda dos grupos de elegantes máscaras, a alegria, a curiosidade, o entusiasmo que transluziam em todos os semblantes!

"Começou o passeio: descrever a animação que houve, no jogo de ramalhetes e confeitos a boa ordem que presidiu todo divertimento, a galhardia dos máscaras e desembaraço das senhoras, fora impossível; por isso damos mão a tal empresa. Diremos somente, quanto aos máscaras, que se apresentaram em geral vestidos (fantasiados) com riqueza, e, o que é ainda mais apreciável, o que é ouro sobre azul, com o mais apurado bom gosto. Todos trajavam por figurinos, quer representativos de costumes históricos e de atualidade, quer fantásticos. E respectivamente às senhoras, que se portaram como verdadeiras brasileiras que são, amigas do progresso e das inovações próprias da civilização moderna.

"Segunda-feira gorda nada houve durante o dia, mas à noite realizou-se o prometido baile da Sociedade Carnavalesca Santista no Teatro Lírico. Eram apenas 8 horas da noite, já as galerias do Teatro, resplandecentes de luzes, ostentavam uma brilhante exposição do belo sexo. A princípio frio e desanimado, do meio para o fim o baile assumiu outra fisionomia, esteve magnífico; compareceram máscaras interessantes, sérios e burlescos, e muito se dançou.

"Amanheceu o terceiro dia, tão lindo e risonho como os dois dias passados. Ao meio-dia, da porta do Teatro, soltaram-se numerosos foguetes e ali tocou algumas bonitas peças a música do batalhão da Guarda Nacional. No mesmo momento, um carrinho, carregando dois máscaras grotescos, percorria as ruas da Cidade anunciando que, naquele dia, havia o enterro do Carnaval.

"À tarde, repetiu-se o divertimento do primeiro dia com mais animação, mais entusiasmo, mais alegria, mais loucura, recolhendo-se o congresso ao Teatro às Ave-Marias (N.E.: portanto, às 18 horas, o horário canônico da reza da Ave Maria)...

"Não nos esqueçamos de mencionar que, no primeiro dia de passeio, o congresso foi obsequiado com magnífico copo de água, pelo ilmo. sr. tenente-coronel Bernardino Ferreira da Silva, e no terceiro com uma lauta e delicada mesa de viandas, doces e bebidas, pelo seu digníssimo diretor (e prefeito da cidade), o ilmo. sr. vereador Antônio Marques de Saes.

"Às 11 horas de terça-feira procedeu-se ao enterro do Carnaval. Uma charola carregada de presuntos e garrafas de vinho, no meio de archotes e lastimosos cantos de adeus, percorreu as ruas da Cidade iluminadas pelos habitantes, prevenidos com antecipação. À meia-noite dançava-se no Teatro o galope infernal, última peripécia da soberba comédia, o Carnaval.

"Tais foram nesta cidade os folguedos dos dias consagrados ao deus da Folia. Correram rápidos para nos deixarem saudades de tantas loucuras e prazeres".

E termina o cronista de O Comercial com as palavras proféticas: "Praza aos céus que, nos anos vindouros, o Carnaval se festeje com tanto entusiasmo, tanto gosto, tão grande harmonia!".

No Carnaval de 1860 as famigeradas chuvas de verão, que inesperada e copiosamente desabam sobre o Litoral, cancelaram o luzido congresso da Carnavalesca Santista, malogro que se repetiu no ano seguinte.

O desânimo tomou conta dos foliões e a Sociedade carnavalesca Santista feneceu, para ressurgir, tal como Fênix, das próprias cinzas, em 1868, com o mesmo ímpeto dos velhos tempos. No Carnaval seguinte repete-se o sucesso. No meio do ano, um cisma na atuante sociedade resultou na retirada de 15 sócios, que sem perda de tempo fundaram outra agremiação, a Sociedade Carnavalesca Clube XV (12 de junho de 1869), transformada aos poucos no nosso atual Clube XV, que no próximo 12 de junho completa 100 anos!

Não demorou e surgiram outras entidades carnavalinas em sucessão às antigas que iam saindo da cena momesca: Les Bavards (9/3/1870), Parasitas de Luneta (1876), Tenentes do Diabo (1877), Democratas de 1860 (1861), Grupo dos Meteoros (1881), Tipos de Arribação (1881), Galopins Carnavalescos (1881), Benquistos Zé-pereiras (1883), Periquitos Carnavalescos (1883), Influenza Carnavalesca (1891), Influentes Carnavalescos (1893), Grupo dos Cartolas (falange do Clube XV, 1895), Clube dos Fenianos (1895), Clube dos Democráticos (1896), S.C. Vila Matias (1901), Tenentes do Diabo (1903), Filhos do Inferno (1903), Clube dos Argonautas (1904), Dragões do Averno (1905), Congresso dos Fenianos (1907), Grupo dos Carvoeiros (1908), Clube dos Girondinos (1910), Clube Roial (1912) e Clube dos Políticos (1914), que encerrou o ciclo dos congressos carnavalescos.

O uso do automóvel e a introdução dos confetes (1894), das serpentinas (1896) e dos lança-perfumes (1903), criaram outro tipo de Carnaval popular, estruturado no corso automobilístico, quando duplas filas de carros deslizavam pelas principais ruas da praia (à tarde) e da cidade (à noite). Os foliões encarapitados em cima dos carros (de capota arriada e escapamento aberto) se "guerreavam" com confetes, serpentinas e lança-perfumes.

Os barulhentos zé-pereiras que, no século anterior, cruzavam com os organizados congressos, sofreram também radical transformação; tornaram-se conjuntos coreográfico-musicais conhecidos por vilões, choros e cordões (na base do vai quem quer...)

Dos vilões (cujos componentes dançavam terçando bastões de madeira e trilando apitos), os mais famosos foram: Sociedade Carnavalesca Foliões Santistas (1901/1925), Vilão Braz Cubas (1908), Vilão Santos Dumont (1909/1921), Vilão Flor da Mocidade (1910/1914), Vilão da Meia Lua (1911/1914), Vilão do Rio Branco (1913/1923) e o inesquecível Fecha a Rosca que brilhou de 1920 a 1927.

Dos choros, o primeiro e talvez o mais característico foi o inolvidável Grupo Musical Sapeca Choro, fundado a 5 de outubro de 1919. Até 1936, com algumas falhas, o Sapeca irisou de música nacionalíssima o ambiente carnavalesco de Santos. A partir da folia de 1921, o Sapeca teve muitos êmulos (aos quais quase sempre venceu), como o Gato Preto, Lá Vai Choro, Cerejas, Fila-Bóia, Afirma Choro, Triângulo de Ouro, Sustenta a Nota!, Tudo Branco, Braço é Braço, Em Cima da Hora, Espia S'estou na Esquina..., Arrepiados, Risonhos, Carinho & Nota, Trinca, Lá Vai Sapeca!, Lírio, Aborrecidos, Turunas Santistas, Aqui é Que Tem!, Marujos Santistas, Morcegos, Rumba Calunga, Centenário, Chorões Santistas e Primas e Bordões. Deve-se destacar a constância do Choro Rumba Calunga, que desde 1938 brilhou nos carnavais santistas e vicentinos! Tem 30 anos de atividade o conjunto cordiofônico e vocalista do veterano carnavalesco Carlos Borstnez (Lorde Açúcar).

O Clube de Regatas Saldanha da Gama, nos pródromos carnavalescos de 1922, promoveu patuscada aquático-momesca ("H.K.I.") que, com a repetição, se transformou no célebre desfile "Dona Dorotéia, Vamos Furar Aquela Onda?". No domingo anterior ao gordo a passeata reunia muitos blocos de patuscada, uns de luxo, e chegou a ser durante muito tempo a única manifestação de Carnaval externo na Orla. Depois tornou-se demasiadamente luxuoso a ponto de sobreviver um só conjunto, o famoso e espetacular Bloco da Cruz de Malta, do Clube de Regatas Vasco da Gama, campeão absoluto de Santos nestes últimos anos.

Como Cronos, Dorotéia engoliu os próprios filhos...

Falando em bloco, não podemos deixar de mencionar o pré-carnavalesco "Agora Vai..." (fundado no antigo Café d'Oeste, em fevereiro de 1947), um aglomerado de patuscos que no sábado anterior à semana de Carnaval percorre as ruas centrais da Cidade, com as mais bizarras fantasias e os mais improvisados, porém artísticos, carros alegóricos e humorísticos.

A primeira escola de samba da Baixada Santista foi a X-9, fundada a 1º de maio de 1945, na Bacia do Macuco, e que ainda detém o galardão de melhor organizada, competindo com a Brasil (remanescente da Vitória, fundada em 1947) e a Império do Samba, bicampeã do Estado (1966-67). Outras tiveram passagem apenas meteórica pelo céu do Carnaval praiano.

Os bailes carnavalescos começaram no já citado Teatro do Largo da Coroação (ou Teatro de Santos), que funcionou de 1850 a 1879, num pardieiro datado do século XVIII, na esquina da atual Praça Visconde de Mauá com a Rua Riachuelo (antigo Beco do Teatro). Outros famosos bal masques realizaram-se nos palacetes de Manoel Alfaya Rodrigues, Mauá, comendador Ferreira Neto e nos teatros Rink (1870 a 1890), Guarani (1893 a 1936), Coliseu (1896), Variedades (1902), Parque Miramonte (1903/1908), Politeama Rio Branco (1913) etc.

Carnavais famosos tiveram por teatro o antigo Centro Recreativo Miramar (1896/1937), na praia da Barra e depois do Boqueirão, e o Parque Balneário Hotel, no Gonzaga (de 1909 até nossos dias).

Clubes que deixaram nome no carnet de Momo: Clube XV, Eden Clube (1895/1936), Clube dos Elegantes (1901), Jockey Clube (onde é hoje - N.E.: em 1969: Av. Presidente Wilson, 13 - a sede do Clube XV, 1925), City A. C. (1932), Tênis Clube (1936), Centro dos Estudantes (1945), Caiçara Clube (1963).

Quase todas as agremiações esportivas promoveram bailes momescos, sendo de destacar o Brasil F. C., Clube Atlético Santista, Espanha F.C. (depois Jabaquara), SPR F. C. (depois Bandeirante e atualmente Nacional), Santos F.C. e os clubes náuticos da Cidade (Santista, Internacional, Saldanha, Vasco etc.).

Em 1958, por decreto-lei do então prefeito Antônio Ezequiel Feliciano da Silva, o Carnaval de Santos foi oficializado (projeto do vereador Roux Paulino).

Hoje, com apenas 5 clubes no Carnaval de rua, há, contudo, mais de 30 e tantas agremiações realizando animados bailes de Carnaval; o corso de automóveis nas avenidas beira-mar é a coisa mais característica da folia praiana e única do Carnaval brasileiro.

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