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HISTÓRIAS E LENDAS DE SANTOS - VISITANTES
Príncipe Aimone de Savoia (Itália), 1920 (F)

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Logo após a Primeira Guerra Mundial, e apenas um mês antes da visita dos reis da Bélgica ao Brasil, quem esteve em Santos foi o príncipe Aimone, da casa de Savoia, que permaneceu cerca de uma semana nesta cidade, como registrou o jornal santista A Tribuna, que na edição de 17 de setembro de 1920, uma sexta-feira, prosseguia na sua página 4 com o relato da estadia da comitiva real italiana (ortografia atualizada nesta transcrição):

 


Imagem: reprodução parcial da matéria original

A FRATERNIZAÇÃO DE DOIS POVOS

Homenagem a s. a. o príncipe Aimone e ao comandante Capon

O chá dançante no Grand Hotel de La Plage, no Guarujá - O chá dançante na sede do Palestra Italia - Espetáculo de gala no Guarany - Outras notas

Cada dia que passa é um novo acontecimento que se registra nos anais da sociedade santense, com a estadia, em nosso porto, do couraçado Roma, da marinha de guerra italiana.

 

Esta semana tem sido repleta de sucessos. Recepções solenes, banquetes, bailes, etc., tudo correndo às mil maravilhas, sob uma atmosfera de indizível alegria, e na mais admirável cordialidade.

 

Quer s. a., quer o comandante Capon, oficialidade e maruja, todos têm sido alvo da mais profunda manifestação de carinho,não só por parte dos nossos patrícios, como da honrada e distinta colônia italiana aqui domiciliada.

 

Os dois povos irmãos congregaram-se e na mais perfeita comunhão de vistas promovem em honra aos nossos prezados hóspedes toda a sorte de homenagens, que têm significação eloqüente.

 

Para completar a série de festejos organizados, registramos hoje a notícia do chá-dançante ontem levado a efeito nos luxuosos salões do Grande Hotel de La Plage, no Guarujá.

 

Foi uma tarde adorável. E tão encantadora a festa, que se prolongou até o último minuto da noite, sempre com o mesmo entusiasmo, com a mesma expansão. Nada faltava ali. Tudo havia e em abundância. por toda a parte flores, iluminação farta e polícroma, toilettes belíssimas, jóias raras e preciosas, em todos os lábios se esboçava um leve sorriso, grupos de gentis senhoritas palestravam animadamente, um sutil perfume pairava no ambiente dos salões, a música completava, com a sua suave melodia, a felicidade que todos experimentavam naquele recanto.

 

Digna, por todos os títulos, de honrosa menção a velada dançante, que logo se transformou em soirée.

 

Às 16,10, uma lancha da Companhia Guarujá partia do cais da Guardamoria, levando a seu bordo, além dos oficiais do estado-maior do Roma, inúmeros convivas, entre eles elegantes e graciosas senhoritas.

 

Noutra lancha da mesma companhia seguiam o corpo consular e pessoas gradas.

 

A apreciada banda de música do Corpo de Bombeiros, que nestas festas tem uma parte dos sucessos obtidos, alegrava os viajantes com a execução de modernas peças.

 

Desembarcados no Itapema, seguiram os convivas, em trem especial, para o Hotel de La Plage, onde se realizou o chá-dançante.

 

Às 17 horas, o príncipe Aimone chegava ao local da festa em automóvel do Parque Balneário Hotel, onde se acha hospedado, em companhia dos srs. comandante capon, cav. Augusto Marinangeli e comendador João Manoel Alfaya Rodrigues.

 

Levados para o salão de danças, sua alteza e o comandante Capon foram recebidos sob uma prolongada salva de palmas.

 

Daí a momentos teve início a vesperal, dançando s. a. com a gentil senhorinha Baby Ford.

 

Daí por diante o entusiasmo chegou ao auge. Era um contínuo e desenfreado movimento de danças, volteando pelos salões elegantes pares, ao som da magnífica orquestra especialmente contratada pela empresa do Hotel.

 

No alpendre ficou situada a magnífica banda do Corpo de Bombeiros, que sucedia à orquestra, não dando tréguas aos convidados.

 

A simpática e distinta oficialidade do Roma espalhou-se por todo o salão, dando-lhe, a par das ricas toilettes ali apresentadas, um belíssimo aspecto.

 

No salão contíguo ao das danças, foi localizado o buffet. Originais mesas de vime, bem colocadas, ficaram repletas.

 

O serviço foi excelente e muito recomenda a empresa do Hotel de La Plage.

 

Do cardápio constava o seguinte:

 

Thé Caffé, Cioccolato, Sandwichs assortiti, tatines al burro, biscoitti, petits fours, pasticeria, plum-kake, bombons finissimi, Limonate, aranciate, gamberi imbottiti, Gelati di cioccolata, crema e limone, acque minerali, liquori, sciroppi.

 

Deixamos de publicar os nomes dos presentes, porque essa tarefa se nos apresenta árdua e difícil numa festa como a de ontem, em que predominava o melhor elemento do escol santense e paulistano.

 

Autoridades civis e militares, estaduais, federais e municipais, parlamentares, representantes do comércio e da indústria, pessoas gradas, exmas. famílias e imprensa formavam a seleta e avultada assistência.

 

Cerca das 20 horas, o príncipe Aimone retirou-se para o Parque Balneário, sendo acompanhado no automóvel pelo cav. sr. Augusto Marinangeli.

 

O comandante Capon, demais oficialidades e convidados prosseguiram na festa.

 

Às 21 horas, foi servido um lauto jantar ao comandante, oficiais, autoridades e pessoas gradas, no salão de refeições do hotel.

 

Oito mesas, artisticamente adornadas com flores naturais pela Flora Santista, foram ocupadas imediatamente.

 

Na mesa central o comandante Capon ocupou o lugar de honra, tendo aos seus lados, respectivamente, as senhoras Anna Marinangeli e Anna Bastos Montenegro.

 

Durante o ágape, estabeleceu-se cordial causerie.

 

A orquestra, sob a direção do maestro Andolfi, executou o seguinte programa:

 

1 - Marcia della Marina italiana - Cerato.

2 - Cavalleria Rusticana - Intermezzo - Mascagni.

3 - La Tosca - Phantasia - Puccini.

4 - Serenata - Toselli.

5 - I Pagliacci - Phantasia - Leoncavallo.

6 - Mamma mia, che vó sapé - Canzone napolitana - Natile.

7 - Gioconda - Danza delle ore - Ponchielli.

 

Foi servido o seguinte menu:

 

Crostini "Delizia"

Crema alla Solferino

Dentice alla "Plage Hotel"

"Fundua" alla Piemontese

Filetto de manzo alla R. M. Roma

Asparagi Salsa Ausonia

Tacchino arrosto com prosciutto

Cuori di lattuga

Bomba "Tutti frutti"

Meringhe alla panna

Frutta - Café

Vini

Martini Secco

Chianti Bianco

Rufino

Neblolo "Mirafiore"

Grande Spumante

"Gancia"

Liquori - Sigari

 

Ao champanha foram levantados brindes em todas as mesas, reciprocamente, todos em honra aos nossos visitantes.

 

Esse banquete terminou pouco antes das 23 horas, dançando-se novamente até a hora 0, quando a banda do Corpo de Bombeiros, em galope final, anunciou a terminação daquela estupenda festa, que ficará registrada nos anais dos nossos acontecimentos.

 

Os convivas regressaram a Santos em trem e barca especiais, sempre sob o mesmo entusiasmo e cordialidade.

 

A sauterie do Parque Balneário Hotel - Bastante animada decorreu a sauterie de ontem, no Parque Balneário Hotel, em homenagem à oficialidade do couraçado Roma.

 

A empresa Fraccaroli proporcionará ainda hoje à distinta oficialidade mais uma velada dançante.

 

Palestra Italia de Santos - A sua festa de ontem em homenagem aos sub-oficiais do Roma - Apesar da chuvinha importuna que caiu durante quase toda a noite de ontem, a festa que esta conceituada sociedade esportiva ofereceu aos sub-oficiais do couraçado Roma não podia ter sido mais significativa e mais atraente.

 

Já às 20 horas, começavam a chegar os convidados, compostos não somente dos valentes marujos italianos, como também de sócios e exmas. famílias, que deram à festividade uma feição muito simpática.

 

Estavam presentes quase todos os sub-oficiais a quem era dedicada a homenagem.

 

Os presentes foram todos gentilmente recebidos à porta por uma comissão assim constituída:

 

Luís La Scala, Bruno Bezzi, Augusto Marcilio, Guilherme Barbaresi, Ernesto Bruno, Teseo Maranti, Antonio Pasquarelli, João Moalli, Vecio Romitti, Miguel Cyrillo e Paulo Bocudo.

 

Às 21 horas, foram servidas diversas mesas onde se agrupavam os hóspedes marujos, a diretoria do Palestra Italia, representantes de clubes de futebol desta cidade, da Associação Santista e da imprensa.

 

Ao champanha, os representantes da imprensa e o sr. Vicente Garcia, em nome da A. S. S. A. (N.E.: sigla de Associação Santista de Sports Athleticos), saudaram a diretoria do Palestra, salientando a significação daquela prova de fraternidade e congratulando-se com esse clube esportivo por tão auspiciosa e oportuna iniciativa.

 

Respondeu, agradecendo, o secretário do Palestra, sr. Luiz La Scala, que proferiu bem feito improviso.

 

Em meio de entusiasmo geral, travou-se animada palestra entre os presentes, fazendo-se ouvir alguns marinheiros graduados que contavam suas façanhas praticadas durante a guerra. Houve também referências, aliás, muito lisonjeiras, sobre o acolhimento recebido durante a longa estadia do Roma no Rio de Janeiro.

 

Logo após passaram todos ao grande salão de baile, onde os distintos homenageados tiveram ocasião de bailar com inúmeras senhoritas presentes.

 

Durante o baile tivemos ocasião de falar com o valente marujo Armando Gori, cabo timoneiro de 1ª classe, o herói de Plimonda de que tanto se ocuparam os jornais de todo o mundo, devido à sua grande façanha.

 

Como é sabido, este cabo-marinheiro, comandando em 10 de junho de 1918, em plena guerra, a lancha blindada M.A. S. 15, rumou às 3,25 horas para as águas da  Dalmácia, onde estavam ancorados 12 dos mais poderosos couraçados austríacos. Com uma audácia inaudita, Armando Gori aproximou-se sorrateiramente do inimigo, conseguindo, num arrojo supremo, torpedear o dreadnought austríaco Santo Estevão e metê-lo ao fundo.

 

Mau grado estar apenas a 250 metros do navio torpedeado, o herói de Plimuda conseguiu fugir ileso, servindo-se para isso de bombas submarinas.

 

Este feito valeu a ele e a seus companheiros de aventuras a medalha de valor militar, promoção por ato de bravura e o prêmio de uma avultada cifra de liras. Tem também a cruz de guerra francesa.

 

Em um dos primeiros intervalos do baile, tomou a palavra o sr. Ligli Giuseppe, 1º sub-oficial da nave real italiana, que proferiu com grande eloqüência o seguinte discurso:

 

"Goventú d'Italia - Dall'unione del nome di Roma con la Regia Marina d'Italia sorge la promessa di non permettere la menomessione di quei destini che la vittoria á tracciato per la gloria imperitura della nostra madre Patria. La fortuna e l'insistenza benevola dei miei colleghi ánno voluto che io ripetessi in questo locale favorito ai nemici dei fiaccidi ozii, l'orazione che suona in tutti i cuori direta dal ritmo di una povera parola che á la sola virtu' di essere sincera.

 

"Allor che salpammo da Genova alla volta del Brasile, sembrava nella bazze dello spazio che innumerevoli famiglie richiamassero al loro seno i volentierosi partenti; sola nell'alto s'ergeva in tutta sua maestá la figura d'Italia che indicava risoluta la missione da compiere. Oh! non vi dispiaccia l'allegoria se io vi presento in quell'ora il sua petto sanguinante di ferite quali non seppe inferirle il nemico disfatto! Purtroppo si verificó il ripetersi delle gesta di Caino nell'alba maledetta quando l'orribile legge della blandizie vigliacca consenti che si vituperasse e si percuotesse un mutilato di guerra senza temo di punizione. Erano questi figli prediletti avvinti al suo corpo cosi forte che lo strappo violento causó quelle ferite che non rizaneranno, che il giorno in cui i beffatori degli eroi verranno fuori dalla sezzura a liberare colle unghie la pelle ricoperta dal manto di Taide.

 

"Chi doveva, adunque, mandare la madre vituperata nei figli devoti, per ridonare ai figli lontani la scossa speranza fatta gigante dalla strrepitosa vittoria? Doveva mandare dei ciarlatani che durante la lotta adoprarono la lingua per deporre la spada? Ella mandó i figli che combatterono in silenzio, quelli che videro nello spazio silente la morte vicina e non paventarono in tanta giovinezza il riposo eterno sul letto dei flutti.

 

"Ed ecco in una sera di questo memore settembre riunirsi la gioventu' marinara reduce della inescrivibile lotta colla gioventu' italiana residente in Santos; corpi cestretti all'inazione delle membro purché nella nava vibri normalmente ogni fibra, corpi elastici, liberamente lanciati alle risorse dell'azione. Gesta diverse e unisono di cuori. Com me, adunque, e che l'eco dell'orazione rimanga ricordo granitico per le volte di questa palestra:

 

"- Roma come nacque disse: io sono il cuore d'Italia e siccome l'Italia si scioglie dal groviglio dei terreni confini per lanciarzi libera nel mare del mondo, io sono il cuore dzi mundo. Da me nacque la sinceritá, da me nacque la forza in mansctudine, da me nacque l'amore.

 

"E noi senza superbia indichiamo, con eguale dottrina, la via al superbi del ravvedimento. E noi senza odio lasciamo ao Caini il tempo per il rimorso; e noi loviamo al sole la fronte serena e: 'per ridonarti, o Patria, il sorriso radioso, sogno e idolatria dell'esotiche genti', gridiamo: siam pronti a ripetere, per te con te ora e sempre".

 

Logo a seguir falou o 1º secretário do Palestra, sr. Luiz La Scala, saudando os marinheiros da Itália, sendo seguido nesse gesto pelo sr. Saturno Otello, 3º oficial do vapor mercante Monte Bianco, também surto neste porto.

 

Falou também o sr. Raphael Noschese, presidente das assembléias gerais do Palestra Italia, que, saudando os distintos homenageados, referiu-se com muito calor ao Brasil e à sua imprensa ali representada, sendo ao terminar muito aplaudido.

 

A convite de alguns colegas de nossa imprensa orou o representante desta folha, sr. Ulysses Freire, que se refere primeiramente ao gesto do Palestra promovendo a aproximação ítalo-brasileira de uma maneira tão simpática e oportuna, citando o que nesse sentido já tem sido feito entre os dois povos. Cita os serviços da imprensa por uma causa tão oportuna e necessária e termina a sua oração fazendo a apologia do povo italiano, que pode ser igualado mas nunca superado no trabalho.

 

O representante desta folha é vivamente aplaudido por todos os presentes, que levantaram constantes vivas e hurrahs ao Brasil, à Itália e à imprensa santista e brasileira.

 

Em seguida recomeçou o baile, apresentando o salão um aspecto grandioso até a madrugada de hoje.

 

Récita de homenagem a s. o príncipe Aimone - A Companhia Dramática Francesa do Teatro Nacional do Odeon, de Paris, que ontem fez a sua estréia no Teatro Guarany, organizou para amanhã um grandioso espetáculo em homenagem a s. a. o príncipe Aimone, comandante Capon e distinta oficialidade do couraçado Roma.

 

Será esse o último espetáculo da companhia, subindo à cena a linda peça de Henri Murger - La Vie de Boheme.

 

Este espetáculo de gala revestir-se-á de raro brilhantismo, e terá a assistência de s. alteza e demais oficialidades italianas.

 

Os bilhetes serão postos à venda hoje durante o espetáculo, no Guarani, e as encomendas podem ser dirigidas, durante o dia, para a Confeitaria Santista.

 

A ida de s. a., o príncipe Aimone, a S. Paulo - Segundo conseguimos saber, o duque de Spoleto e o comandante Capon, em companhia do estado-maio do Roma, deverão embarcar no próximo domingo para S. Paulo, em visita à capital paulista e à colônia italiana ali domiciliada.

 

Os distintos viajantes terão ali uma recepção imponentíssima, que alcançará as raias do maior entusiasmo.

 

Almoço íntimo no Parque Balneário - O sr. conde Ottavio Gloria, vice-cônsul da Itália, nesta cidade, oferece amanhã, às 12,30 horas, no Parque Balneário Hotel, um almoço a s. a. o príncipe Aimone e ao comandante Capon.

 

Esse almoço terá um caráter de absoluta intimidade.

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