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HISTÓRIAS E LENDAS DE SANTOS - TRANSPORTES - LIVROS
Uma história dos transportes em Santos (4)

Clique nesta imagem para ir ao índice da obraA história centenária dos transportes coletivos em Santos foi narrada em 1987 pelo professor Ricardo Evaristo dos Santos e pelo jornalista e advogado José Paulo de Oliveira Matos, na obra Transporte coletivo em Santos - História e Regeneração. Com 160 páginas, ilustradas, o livro (registros CDD - 388.4 - S237t) foi editado pela Companhia Santista de Transportes Coletivos (CSTC), sendo composto e impresso em 1987 na Gráfica Prodesan, em Santos, com o apoio do prefeito Oswaldo Justo.

Esta primeira edição digital, por Novo Milênio, foi autorizada em 17/2/2010 por Paulo Matos, que faleceu em Santos, em 19 de julho de 2010. Não foi possível localizar o outro autor, que teria se radicado na Europa alguns anos depois. Páginas 30 a 37:

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Transporte Coletivo em Santos

História e regeneração

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 Ricardo Evaristo dos Santos e Paulo Matos

As inovações introduzidas pela Cia. City frente ao aparecimento do automóvel

O aparecimento do automóvel, o surto populacional da época e o ritmo da urbe santista com o café fazem com que o movimento de passageiros, sempre com a tendência de aumentar, acabe levando o público a se voltar para o automóvel, considerado por alguns como conforto e rapidez da sociedade moderna.

Estatisticamente, notamos na década de 10 um pequeno surto de automóveis circulando nas vias de trânsito. Tanto que em 1915 havia em Santos 68 automóveis de carga, 147 carros de praça e 124 automóveis para passageiros. Além disso, a tendência do movimento de cargas em bondes era menor e, após o término da Grande Guerra (1914 a 1918), dos 14 carros motores para carga abertos que a Cia. City possuía, 7 se achavam fora do serviço, sendo o material usado nos carros de passageiros, cujas peças eram de difícil importação.

Nessa época, a Cia. City apresentou uma novidade em seus carros - o de nº 98 não possuía o lanternim com vidros coloridos como ostentavam os outros. Esse novo tipo era fabricado pela firma inglesa Dick Kerr e daí em diante todos os bondes seriam daquele tipo. A dificuldade de importação, no entanto, leva a companhia a se aparelhar para construir seus próprios carros, o que se efetivou em 1919, ao colocar em tráfego o primeiro bonde construído em Santos, importados apenas os motores e trucks (N.E.: conjuntos rodantes, roda+eixo e seus complementos). Esse carro era o de nº 102 e logo em seguida foi construído o de nº 104. Neles foram empregadas madeiras nacionais (cabriúva e cedro) e toda a carpintaria metálica era de aço fundido nas próprias oficinas.

Segundo o pesquisador Waldemar Correa Stiel, havia na época tipos curiosos de veículos, como por exemplo o de nº 46, que era construído com a plataforma mais baixa que os demais, e atrás do motorneiro havia uma porta corrediça que se comunicava com o interior do bonde. Para essa passagem, no centro do banco ali encostado, havia uma abertura, o que motivava muitos tombos, pois o passageiro de fora via um lugar vago, entrava e ao se sentar é que notava a falha ali existente, e muitas vezes sentava no chão.

Ao iniciar o serviço de bondes elétricos, a Cia. City pintava seus carros de cor de chocolate,um pouco mais escuros que os de São Paulo, e numerava-os em ordem seguida a partir do nº 1, sendo uma série para cada tipo. Assim havia carros nºs 1, 2, 3 etc. (tanto de carga como de passageiros). Em 1915, a Cia. City renumerou seus carros de passageiros com números pares e uniformes a partir do nº 10. Os carros de serviço e reboque continuaram com a duplicidade de número.

Só para termos uma idéia, até 1909, a companhia possuía 15 carros de passageiros, 5 de socorro e carga e 3 bagageiros. No ano seguinte, só montou carros de serviço, 2 de carga e 4 bagageiros. Em 1911 somente um de carga e uma irrigadeira e 19 de passageiros. Em 1912 não houve montagem de carros e em 1913 foram montados 10 carros de passageiros e e um de carga. Em 1914 foi montada mais uma irrigadeira e 2 de carga. Em 1915, 2 carros de passageiros e 4 gôndolas, também de passageiros. Essas gôndolas eram reboques para 60 passageiros, com dois trucks. Durante a I Guerra, não houve montagem de carros até 1919, ano que, como já mencionamos, marcou o início da construção dos bondes em Vila Mathias.

O ano de 1919 marca também a construção de uma locomotiva elétrica, nas oficinas. Essa locomotiva, a primeira a ser construída no Brasil, seria usada pela Cia. City em bitola de 1,60 m para rebocar os trens de gado, entre o Saboó e o Matadouro. Para esse fim, assinala Waldemar Correa Stiel, foi construído - ao lado dos trilhos da bitola de 1,35 m da linha 1 - um ramal de 1,60 m, que até poucos anos ainda se via naquele trecho.

No dia 16 de fevereiro de 1924, a Cia. City apresentou uma novidade: foi inaugurado, às 16h30, um novo bonde, todo ele "arrumado" nas oficinas da Companhia, em Vila Mathias, tendo sido importados apenas os motores e os trucks. Esse carro, que dispunha de assentos estofados de palhinha, era considerado de luxo, ostentando um pintura verde, dando motivo a que o povo o apelidasse de "bonde-periquito".

O primeiro tráfego foi feito da Praça dos Andradas, em frente à antiga Santa Casa, pelas ruas São Francisco, Ana Costa, Gonzaga, Conselheiro Nébias, General Câmara e Praça dos Andradas. Nessa viagem, o carro conduziu, a convite do dr. Bernardo Browne, os srs. cel. Joaquim Montenegro, prefeito municipal; vereadores, comendador Alfaya Rodrigues, Arnaldo guiar, dr. Samuel Baccarat, cel. Manuel de Azevedo Sodré, capitão João Salerno, sr. Antonio Gomide Ribeiro dos Santos; e o repórter do jornal A Tribuna, Galeão Coutinho. Esses carros serviam, preferencialmente, as linhas da praia, ou as linhas Rápido que partiam da cidade para São Vicente (linha 1). E, poucos dias após a inauguração, em vista de inúmeros pedidos de usuários, essas linhas de rápidos passaram a trafegar também aos sábados.

No entanto, com o fito de ainda melhorar o serviço, a Cia. City adquiriu em Londres, em novembro de 1924, seis bondes de novo tipo, com lotação para 60 passageiros. Nessa época, porém, o governo federal, autorizado pelo Congresso Nacional, resolveu suspender os favores aduaneiros que concedia às empresas de utilidade pública, o que motivou uma brusca elevação nas taxas alfandegárias, tendo aqueles bondes só chegado ao Brasil em 1926 pelo preço alfandegário de 156:418$500 (156 contos, 418 mil e 500 réis), o que equivalia ao preço de 3 bondes importados comuns. Houve protestos da Cia. City com a fixação de cartazes pela cidade para serem fotografados, a fim de ilustrar um memorial que o dr. Brnardo Browne, gerente da Cia., iria enviar ao Congresso Nacional, o que foi feito em 11 de dezembro de 1926. Foram retirados os cartazes e tudo se normalizou.

Em novembro de 1926, a Cia. City, a exemplo do que havia feito a Light em São Paulo, que sentia a concorrência dos auto-ônibus, adquiriu vários carros desse tipo para estabelecer na cidade "um modelar serviço de transporte de passageiros, sendo as viagens feitas em horários certos".

Em princípios de 1926 já havia em tráfego algumas linhas de ônibus particulares ainda claudicantes, como uma que ligava a estação denominada "a inglesa" (Estrada de Ferro São Paulo Railway, atual Santos-Jundiaí) à Alfândega. Era o auto-ônibus de nº 1.162, onde eram cobrados 300 réis de passagem e fazia o seguinte itinerário: Estação, Largo do Rosário, praças Mauá, Rio Branco e República, ruas Senador Feijó, Rosário, escritório das Docas e Alfândega. No entanto, eram companhias efêmeras, sem possibilidade de expansão, em vista da grande procura aos bondes e, assim, não duraram muito.

Em meados de 1927, a cidade de Santos dispunha já de uma apreciável vida noturna e, como naquela época o automóvel ainda não era muito popular, o povo sentia falta do serviço de bondes nas altas horas da noite e na madrugada, já que o último carro a sair da cidade para as praias era o da linha 2, que saía da Praça Mauá às 24h50.

Para cobrir essa deficiência, em 11 de julho de 1927 foi posta em tráfego uma linha exclusivamente noturna, ostentando a letra "N" no lugar do número, e que fazia o seguinte itinerário: praças Rui Barbosa, da República, ruas Senador Feijó, Lucas Fortunato, avenidas Ana Costa, Vicente de Carvalho, Conselheiro Nébias, Rua Amador Bueno e Praça Rui Barbosa.

O trajeto era circular, começando na Praça Rui Barbosa (via Ana Costa) à 0h40, de 40 em 40 minutos até as 4 horas e os carros, via Conselheiro Nébias, começavam a circular à 1h40 até as 4h20. Isto queria dizer que a cada 20 minutos havia um carro, ora via na Costa, ora via Conselheiro Nébias, durante praticamente toda a madrugada, para as praias do Gonzaga e do Boqueirão, na época os pontos de maior atração turística.

Em 7 de dezembro de 1935, às 12 horas, era inaugurado um novo serviço de auto-ônibus, cuja empresa se instalara com o título de Viação Santista Ltda. e o seu itinerário ia da Praça Mauá até a Avenida Presidente Wilson. Não obstante isso, em 1936 houve uma grande novidade, que a Cia. City colocou em tráfego na cidade - era um novo tipo de bonde, o de número 300, chamado "Articulado", que era constituído de dois bondes pequenos com um truck entre os dois corpos, o que fazia o carro ter três jogos de trucks.

Esse carro e seu irmão, de número 302, também lançado na mesma época, apresentaram grandes novidades. A principal era a adoção de freio a ar comprimido, fornecido pela firma English Electric Co., o que tornou bem mais fácil aos motorneiros dirigir aqueles carros. Apesar dos três jogos de trucks e lotação para 90 passageiros, o carro ainda possuía dois motores Crompton Parkinson, de 58 hp cada.

Outra novidade que apresentava era o tipo de numeração da linha, bem menor que a usual sobre o tejadilho da plataforma, embutida ao lado da tabuleta de destino, também embutida na plataforma, que era fechada por vidros, com um sistema basculante. Esse foi o primeiro bonde de Santos a ter plataforma envidraçada, já que os anteriores só possuíam um sistema de janelas móveis, presas no alto da plataforma, e que resguardavam muito pouco o motorneiro das intempéries. Outra novidade era a pintura amarela-creme.

Com essas inovações, a Cia. City chegou em 1937 a 67 km de extensão das linhas de bondes.

As preocupações e os cuidados da Cia. City com a população santista

A Cia. City sempre foi cautelosa com a questão de segurança de seus passageiros, tanto nos bondes como no experimental serviço de ônibus. Tanto é assim que os inúmeros passageiros que não podiam pegar os ônibus, quando estes já estavam lotados, não se conformavam em ter que aguardar outro e entravam nos carros, ficando em pé, o que motivou um aviso da Cia. City nos jornais nestes termos: "Não é permitido aos auto-ônibus conduzirem passageiros em pé, por disposição expressa da lei municipal nº 796. Esta companhia sendo incursa já foi multada por este conceito. Pede-se ao público a fineza de não insistir em embarcar num auto-ônibus de lotação completa, para não prejudicar o respectivo motorista".

Em 1914, os carros da Cia. City transportavam 15.252.000 passageiros durante o início da ampliação das linhas. Em 1934, a empresa já tinha uma frota de 98 carros e 64 reboques, transportando 34.809.892 passageiros.

Em 18 de setembro de 1937, em meio à extensão das linhas de bondes - havia em circulação 124 carros motores e cerca de 100 reboques - um fato curioso aconteceu: a Cia. City, atendendo às reclamações e pedidos dos moradores da Ponta da Praia, havia resolvido estender a linha de nº 19, Avenida Pedro Lessa, de moto a favorecer os que residiam nas imediações do Jóquei Clube, pela Rua Alexandre Martins. Colocou os seus trilhos, mas ficou aguardando época própria para a inauguração.

Os moradores se impacientaram e nesse dia, reunidos em grande massa, se dirigiram ao ponto final da linha 19, na Avenida Pedro Lessa, e aguardaram a chegada do bonde. Antes que o motorneiro virasse a alavanca, o povo, composto de homens, mulheres e crianças, invadiu o bonde, ordenando os funcionários da city que fizessem o veículo prosseguir viagem pela nova linha, inaugurando assim popularmente a linha que teria posteriormente o nº 29, com o ponto final na esquina da Alexandre Martins com a Avenida Bartolomeu de Gusmão.

Idêntico fato registrou-se na mesma época, com o prolongamento da linha nº 6 - Vila Matias até a Rua Carvalho de Mendonça, tendo a empresa, depois da imposição dos moradores, cedido e homologado a decisão do povo.

As preocupações da Cia. City com a população da cidade referiam-se também com o preço das passagens. Através de um aviso, publicado no jornal A Tribuna de 1º de junho de 1945, informava que entraria em vigor o aumento de 10 centavos no preço das passagens de bonde. A direção vinha a público informar que tomara essa atitude tendo em vista o reajuste dos salários de seus servidores. O destaque da notícia é que há mais de 30 anos os santistas pagavam 20 centavos para viajar nos bondes e, embora o custo de vida tivesse crescido, os preços não foram majorados, pois eram suficientes até então. Lamentava a gerência da Cia. City quebrar a tradição de três décadas.

A fabricação de bondes da Cia. City na Vila Mathias: um pioneirismo industrial no transporte coletivo da cidade

A fabricação de bondes se iniciou por volta de 1919 com carros pequenos e, a partir de 1931, a Cia. City iniciou a construção, em suas oficinas de Vila Matias, de carros grandes de 12 bancos e 60 lugares, iguais aos importados. Os primeiros a serem postos em tráfego, construídos nesse ano, foram os de nºs. 218, 220, 222. Os últimos carros pequenos, construídos e postos em tráfego, foram os nºs 176,178, 180 e 182, durante o ano de 1929.

Em 1932, foram construídos mais 4 carros grandes de nºs 224, 226, 228 e 230. Esses carros possuíam a curiosidade de ter somente dois motores, um em cada jogo de trucks, ou seja, com a mesma potência de um carro pequeno de 45 lugares, ofereciam 60. Além disso, aqueles carros possuíam também um sistema de freio elétrico, ou seja, uma sapata entre as duas rodas de cada truck, que, ao ser acionada pelo motorneiro, por meio de reversão do controler, fazia indução nos trilhos, brecando o carro quase instantaneamente. Ou seja, estes carros não possuíam freio a ar, trabalhando motorneiro com freio mecânico manual.

Em 1933, a Cia. City lançou um novidade: um tipo diferente de alavanca de contato, pois as que usavam seus carros, desde o início dos serviços, eram semelhantes às de São Paulo, isto é, de haste com rodilhas. O novo tipo de alavanca introduzido pela Cia. City, denominada "lira" devido ao seu formato, era fabricado no Canadá pela firma Sivewright Bacon Fischer Box. Foi iniciado o seu uso, em caráter experimental, em dezembro de 1933 e os primeiros carros a possuírem esse melhoramento foram os de nºs 212 e 214, nos quais as antigas alavancas permaneciam abaixadas até ser aprovado o uso daquele novo tipo. Posteriormente, aquelas foram retiradas. Em 1934 foram construídos mais 6 novos carros e em 1935 mais quatro, até o de nº 262.

Já em 1936, após o lançamento dos carros articulados (300 e 302), a Cia. City continuou com a construção dos bondes de 60 lugares, os carros de nºs 264, 268, 270 e 272, já com freio a ar comprimido, enquanto que o melhoramento era adaptado nos que estavam em tráfego. No ano seguinte foram construídos mais 7 carros. Em 1938, 4 carros e em 1939, 4 carros, sendo dois com os números 296 e 298 e dois com os números 310 e 312. Em 1940 a Cia. construiu 4 carros, em 1941 mais 4 e em 1942,último ano em que houve construção de bondes pela Cia. City, em Vila Mathias, 2 carros, os de nºs 330 e 332. Era o apogeu da guerra e o material de difícil importação.

O serviço de bondes da Cia. City durante a 2ª Guerra Mundial (1939-1945)

Com a chegada da 2ª Guerra Mundial (1939-1945), os serviços de bondes continuaram servindo razoavelmente os moradores da cidade, apesar da paralisação na ampliação da frota. Com a dificuldade de importação, a Cia. City teve que recolher alguns carros que estavam precisando de reforma para aproveitar suas peças naqueles que tinham mais urgência.

A 13 de julho de 1943, em vista das normas de defesa passiva, em virtude da guerra, o sr. prefeito municipal, dr. Antônio Gomide Ribeiro dos Santos, entre vários itens, obrigou a que bondes e outros veículos que se aproximassem das praias à noite apagassem suas luzes e usassem faixas brancas em seus pára-choques.

Em 1º de setembro de 1944, a firma Expresso Brasileiro Viação Ltda., mediante contrato assinado com a Prefeitura, se propõe a manter serviço de ônibus na cidade e inicia suas atividades com grande satisfação do público, chegando até a doar a renda global do primeiro dia de tráfego ao Centro Municipal da Legião Brasileira de Assistência. Isso tornou-se um golpe muito sério para Cia. City, porque o EBVL tenta absorver, com o novo meio de locomoção rápido (ônibus), as linhas traçadas pela Cia. City. Esta, alegando diminuição no movimento de passageiros, se desinteressa dos serviços de bondes, começando a encostar os carros e diminuindo a conservação dos que estavam em tráfego, em sinal de protesto.

O término da concessão dos serviços da Cia. City e a criação do Serviço Municipal de Transportes Coletivos de Santos (1951)

Ao final da década de 40, a cidade de Santos passa a viver num caos, em matéria de transporte coletivo. A imprensa local criticava veementemente o descaso da Cia. City com relação ao serviço de bondes.

O jornal A Tribuna de 20 de maio de 1947 estampou a seguinte manchete: "Verdadeiro flagelo, o serviço de bondes em Santos - Injustificável desinteresse da City - A população aumenta e o número de bondes diminui - Motorneiros apressados - A Prefeitura precisa intervir na questão". A cidade contava com menos de 100 carros em movimento, 50% da frota se encontrava nas oficinas da Vila Mathias para reparos. Isto também se deve, mais uma vez, à ocupação do tráfego das linhas de bondes, pelo Expresso Brasileiro, com o sistema de ônibus que, além de diminuir a receita da City, desmotivava a empresa a renovar o contrato com a Municipalidade.

Em 1950, à vista da proximidade do término do seu contrato, o que se daria em 14 de janeiro de 1951, a Cia. City não demonstrou interesse em renová-lo, o que motivou a Câmara Municipal de Santos a procurar um modo de não interromper os serviços. O motivo do rompimento residia também na asfixia tarifária, sem perspectivas de reconsideração, e levou a Cia. City a entregar toda sua organização viária à Municipalidade de Santos em 20 de dezembro de 1951, quando foi constituído o Serviço Municipal de Transportes Coletivos (SMTC), pela lei 1.297.

Em 11 de janeiro de 1951 foi assinada a portaria nº 10, que nomeava a comissão que estudaria a transferência dos transportes coletivos. Integravam a referida comissão os srs. dr. Mario Lopes Leão, dr. Ciro de Ataíde Carneiro, dr. José Aflalo Filho, dr. José Garcia da Silveira e dr. Édison de Oliveira Santos. A 20 de dezembro de 1951 era criado, então, o Serviço Municipal de Transportes Coletivos (autarquia, nos moldes da CMTC de São Paulo). Era prefeito de Santos o dr. Joaquim Alcaide Valls e, respectivamente, superintendente e vogais do conselho diretor do SMTC, os srs. dr. Mário Lopes Leão, Álvaro Rodrigues dos Santos e Sócrates Aranha de Menezes. No dia 21 de dezembro do mesmo ano, às 13h30, em seu gabinete, o sr. prefeito assinou a escritura de compra do acervo do serviço de bondes da Cia. City, tendo sido entregue ao sr. Henry Thomas William Pilbean um cheque no valor de Cr$ 4.124.285,00, referente ao pagamento da 1ª prestação da importância de Cr$ 17.624.285,00, pela qual foi acertada a aquisição do material rodante, linhas e móveis da seção de bondes.

Foram entregues ao SMTC 75 bondes pequenos com 9 bancos; 62 bondes grandes com dois trucks e 12 bancos; 2 bondes articulados, com três trucks e 18 bancos cada um; 47 reboques pequenos, sendo 26 com 8 bancos e 21 com 7 bancos; 33 gôndolas com 12 bancos; 1 vagão de socorro; 12 vagões para carga; 1 esmerilhador de trilhos; 2 bagageiros; 2 carros-torre e 2 reboques de carga; 10 gôndolas de carga; 2 vagões-tanque; 8 trolleys de carga, totalizando 259 unidades. A nova companhia iniciou suas atividades oficialmente em 1ºde janeiro de 1952.

A contribuição do serviço da Cia. City para a expansão sócio-urbana da cidade

Os bondes elétricos serviam para tudo na cidade, como por exemplo: carros fúnebres; para transportar os noivos à igreja; levar excursionistas aos pontos pitorescos da cidade; e, até, para realização de mudanças. Eram usados também para transporte de móveis adquiridos nas casas do Centro e a razão dessa preferência se deve ao preço das tarifas, que eram muito inferiores às cobradas pelos caminhões de aluguel. O serviço de carga era feito por duas estações, localizadas um na Rua Itororó, esquina da Rua Amador Bueno, e outra na Av. Nossa Senhora de Fátima.

Com o correr do tempo, o serviço de bondes elétricos foi se expandindo com a criação de novas linhas e o acréscimo de novos veículos, proporcionando os santistas a oportunidade de conhecer melhor a sua cidade, além de provocar o deslocamento do núcleo habitacional do Centro velho da cidade, para os bairros que foram surgindo ao longo das linhas, estendendo-se até à praia (Campo Grande, Marapé, Embaré, Aparecida e Ponta da Praia).

Até 1950, a Cia. City conseguiu fazer funcionar nada menos de 27 linhas, dentre estas três para São Vicente via Matadouro e via Praia. Havia ainda duas linhas semi-expressas que paravam apenas em determinados pontos, e outra que interligava o Centro à Ponta da Praia, com paradas apenas no ponto inicial e final. Durante o trajeto, o motorneiro diminuía a velocidade em alguns pontos para que os mais afoitos saltassem, sem que os bondes parassem.

Para facilitar o transporte de operários, a City estabeleceu preços diferentes para as passagens no carro motor e reboque, concessão essa que, mais tarde, vigorou para determinados horários pela manhã e à tarde. Os bondes elétricos, pela higiene, conforto e rapidez do serviço, passaram a ser um marco no progresso da cidade e ainda um impulsionador do turismo doméstico e externo. Isto tudo se deve à pujança e ao pioneirismo da Cia. City.

Reprodução parcial da página 5 da edição de 20 de maio de 1947, do jornal santista A Tribuna, também publicada com o texto