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HISTÓRIAS E LENDAS DE SANTOS - RADIOFONIA
Rádio Atlântica de Santos (3)

PRG-5, depois ZYK-534

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Na edição de 15/9/2002 do Jornal da Orla, de Santos, o colunista esportivo Sérgio Luiz Corrêa recorda um episódio folclórico ligado à emissora:
 

Folclore

Radialista experiente, Walter Dias já estava com toda sua aparelhagem montada pelo técnico da emissora para mais uma transmissão do jogo do Santos, no Pacaembu (N.E.: na capital paulista). O time da Vila (N.E.: referência ao Santos Futebol Clube, sediado no bairro de Vila Belmiro) iria jogar contra o América de Rio Preto. Dias começou a chamar o pessoal da Embratel para checar a linha, enquanto aguardava o término do Projeto Minerva (N.E.: programa educativo em cadeia nacional de rádio). Naquele tempo, a Rádio Atlântica pertencia ao Grupo A Tribuna, portanto, funcionava no prédio da Rua João Pessoa.

- Alô Embratel, alô Embratel, responda por favor!

A resposta não vinha. Dias insistia. Começou a ficar nervoso.

- Alô Embratel, alô Embratel, alô alô Embratel...

Nada.

- Alô Embratel, cara...!

Nenhuma voz. Dias não aguentou.

- Esse pessoal da Embratel é f... Sabe de uma coisa, já que ninguém está respondendo, então vão pra p... q... p.., seus filhos da p...

Uma falha do técnico que havia montado a aparelhagem na cabine do Pacaembu, porém, fez o experiente radialista perder a cor. É que, por um descuido, o rapaz havia deixado a linha de transmissão do jogo interligada com a do Projeto Minerva. Todos aqueles palavrões tinham ido para o ar.

Foi um furor na Cidade.

Walter Dias teve que se explicar com a direção da rádio.

Semanas depois, o técnico que cometeu a falha foi demitido.


Detalhe de anúncio publicado no jornal A Tribuna de 18 de julho de 1985

Em sua História do Carnaval Santista (Gráfica A Tribuna, Santos/SP, 1974), o cronista Bandeira Jr. incluiu este tópico:


Grupo de Piratas no baile da Rádio Atlântica (Cassino Miramar, 1937)
Foto publicada com a matéria

Radiotelefonia

Atualmente há queixas, mormente dos compositores, de que as emissoras de rádio se negam a transmitir músicas de carnaval. Entretanto, há alguns anos o rádio representava papel importante na folia nacional; era ele quem preparava o ambiente da grande festa.

Recorda-se que, já em 1926, a Rádio Clube de Santos (fundada em 4 de abril de 1925) punha o microfone à disposição dos conjuntos carnavalescos, que lá se quisessem exibir, e isto constituía uma inovação, pois ainda não havia programas "ao vivo".

A partir do carnaval de 1935, a Sociedade Rádio Atlântica, recém-fundada, tomou conta da folia, dando-lhe, com sua operosidade, nova feição. À "Voz do Mar" devem-se grandes iniciativas: criação do Rei Momo em carne e osso, concursos pré-carnavalescos; a presença de consagrados artistas (Carmem Miranda, Aurora Miranda, Francisco Alves, Sílvio Caldas, Vassourinha, João Petra de Barros, Almirante, Trio de Ouro, Bando da Lua, Custódio Mesquita etc.) em nossa cidade).

Ainda em 1937, a G-5 fez realizar, no antigo Miramar (transformado em Iate dos Piratas), grandes bailes de carnaval, animados pelo seu cast artístico, do qual destacamos os cantores Gomes Costa e Corina, então a Rainha do Rádio (N.E.:coroada em junho de 1934, foi a primeira a ocupar esse posto no Brasil, segundo cita Olao Rodrigues, no seu Almanaque de Santos 1972, pág. 96).

Com a visualização da TV, a radiotelefonia perdeu muito como veículo de comunicação; mesmo assim, para a parcela menos favorecida da população, ainda mantém vínculo positivo.


Profissionais da emissora, em fotomontagem 
com peças publicitárias publicadas em A Tribuna de julho a outubro de 1985


Artistas da Rádio Atlântica
Reprodução: Revista Flama, de 1945, no acervo do historiador santista Waldir Rueda


Artistas da Rádio Atlântica
Reprodução: Revista Flama, de 1945, no acervo do historiador santista Waldir Rueda


Cantores sertanejos Alvarenga e Ranchinho, em foto Kauffmann de 1935, autografada, ao microfone da PRG5, quando a emissora funcionava no prédio da Sociedade Humanitária

Imagem: acervo do professor e pesquisador santista Francisco Carballa

Publicado na antiga revista mensal santista Flama, edição de março de 1944 (grafia atualizada nesta transcrição):


Foto publicada com a matéria

O que o rádio é e o que o rádio precisa ser - Dois dedos de prosa com Aldo Madureira

No afã bem informar o público rádio-ouvinte local, fomos à PRG-5 procurar Aldo Madureira. Encontramo-lo atarefadíssimo com os seus programas de Rádio-Teatro. À nossa primeira pergunta sobre quando e em que condições havia ingressado no broadcasting nacional, obtivemos a seguinte resposta:

- Há muito tempo vinha Paulo Leblon insistindo comigo para que eu entrasse para o Rádio, pois, segundo dizia, era eu talhado para isso. Nunca, entretanto, lhe dei ouvidos. Certa vez, porém, pensei mais acuradamente no assunto. Senti-me atraído e resolvi experimentar. Que diabo! O Rádio, afinal de contas, não é um bicho de sete cabeças! Assim, um dia apareci aqui na Atlântica. Depois da minha chegada, todos vocês sabem o que aconteceu, e o que fiz.

Inquirido sobre o que tenciona fazer no Rádio, disse-nos:

- Por enquanto, nada. Digo isto porquanto toda a atividade radiofônica acha-se limitada a normas antigas, invariáveis, que nos tolhem toda a ação, proibindo-nos inovações. Porém, tenho esperanças de que, vagarosamente, essa ordem de coisas se modifique. Julgo que o Rádio deve passar por modificações radicais. Precisa progredir. Ao contrário de Otávio Gabus Mendes, que declarou "ser necessário pôr inteligências no Rádio", eu acho que já existe muita inteligência dentro do nosso broadcasting. O que é preciso é saber aproveitá-la, dando chance aos que são portadores dela, e, principalmente, pelo rompimento corajoso da rotina e adoção de métodos novos que tirem a programação de Rádio do ramerrão que a vem caracterizando.

Quais as medidas que você sugere para que tal estado de coisas desapareça dos meios radiofônicos?

- Dar ao rádio a sua verdadeira função recreativa e cultural - métodos, por assim dizer, cinematográficos - sutileza nas comédias; intensidade emotiva nos dramas, porém dentro das linhas fixadas pela sobriedade, e, sobretudo, maior atenção para a parte referente à sincronização e contrarregra, no que residirá o necessário cunho de realismo dos programas apresentados. É preciso que o ouvinte "veja" o que está sucedendo. Direi mais, que os programadores de rádio devem compreender que têm nas mãos um instrumento de imenso poder persuasivo sobre a mentalidade das massas e, portanto, não devem limitar-se a provocar lágrimas e risos do público ouvinte, mas imprimir aos seus trabalhos uma orientação social, voltada sempre para os altos interesses da nacionalidade. Para isso, é preciso estudar, é preciso ter cultura. Ser programador de rádio a cada dia que passa, deixa de ser uma aventura de pessoas de boa vontade ou audaciosas, mas ignorantes, para revestir-se do caráter de alta responsabilidade, como a têm a imprensa, a escola e o próprio púlpito.

E como o tempo já se tornava escasso - porque Aldo Madureira se aprestava para dirigir o ensaio da Rádio-Novela - disse-nos, para terminar:

- Mas pode estar certo de que a direção da Atlântica já entrou em entendimentos com os programadores para o surto de uma nova fase de progresso e inovações.

O.C.

"Antonio Guenaga, nosso prezado colega, diretor do Departamento Esportivo da A Tribuna, organizador da VII Travessia do Canal a Nado"
Foto-legenda: revista Flama, março de 1944 ((ano XXIII, nº 3)

Crônica publicada no suplemento AT Revista, do jornal santista A Tribuna, em 28 de outubro de 2007, página 66:


Imagem: reprodução parcial da página com a matéria, com ilustração de Max

Os tombos e a vida

por Vicente Cascione (*)

Nunca me dediquei a escrever graças. É uma arte que não alcanço. Mas, ao contrário do que afirmam meus incansáveis críticos, não sou, no avesso, tão carregado de pesados humores que me impeçam o milagre do riso.

Não me envergonho de revelar, neste texto confidencial, que, até por ter uma tendência para rir à toa, acho aplicável, no meu caso, o inquietante provérbio: muito riso, pouco siso.

Na ânsia de atender aos que me pedem para escrever alguma comédia entre os dramas habituais, revolvo entulhos da memória. Nos fatos cômicos relembrados, o personagem histriônico e involuntário quase sempre sou eu. No fundo, sou o palhaço preferido de mim mesmo.

Houve um tempo de minha adolescência em que vivi tragicomédias sucessivas, como quando decidi ser radialista esportivo, certamente pela herança do sangue de meu pai.

Com 16 anos, cara e coragem, ingressei na velha Rádio Atlântica, do notável - e temível - Hernani Franco.

Como no verso de Antônio Maria, minha carreira começou de fracasso em fracasso. Mas, arrastada por minha teimosia, durou 10 anos.

No dia da estreia, como repórter de campo, fui anunciado com estridência. Após rasgados elogios ao meu velho pai, que já tinha abandonado os microfones, Hernani apresentou o filho de peixe, mas eu, num canto do vestiário da Vila Belmiro, tropecei em minhas palavras, sob o testemunho de Pelé, Pepe, Zito, ídolos que eu reverenciava das arquibancadas, e estavam ali, uniformizados, prontos para entrar em campo. Inicialmente, eu deveria divulgar apenas a escalação dos times. Mas resolvi decorar um discurso gongórico de abertura, que detonou na cabeça dos ouvintes como um atentado.

Depois, copiando a voz exaltada dos radialistas esportivos que parecem proclamar a hecatombe universal, parti para a escalação do Botafogo: "Alôôô, alôôô, amigos ouvintes. Eis o time do Botapogo de Ribeirão Freto".

Troquei o fogo pelo pogo, e o Preto pelo Freto. Com uma dicção impostada e impecável.

Entalei. Engasguei. Emudeci. E o Hernani, diante do eloquente silêncio do filho de peixe (que não saiu aos seus e, portanto, degenerou) disse para minha imorredoura vergonha: "Tenta de novo, Cascioninho!!!"

E o Cascioninho entrou em campo sob vaias, risos e assobios zombeteiros dos torcedores que, municiados de seus rádios portáteis, saudaram-me em latim, no cantochão e calão de uma torcida gregoriana.

E foi aquele mesmo Cascioninho que, numa noite de gala no Maracanã - num jogo entre Santos e Botafogo (sempre Botafogo) -, conseguiu despencar no interior do mortal fosso de segurança que circunda o gramado, despertando orgasmos na multidão em êxtase que acompanhava o cai-não-cai do repórter bambo (antes da queda) sobre uma tábua estreita que servia de ponte improvisada entre as bordas do fosso. Como havia um tombo provável na expectativa da galera, o agraciado fui eu.

Sobrevivente (o espetáculo deve continuar!), suportei o microfone, os hematomas e, mais tarde, os três gols de um Botafogo vencedor.

Concluída a tarefa de meu resgate, Garrincha recebeu as chaves de um Sinca Chambord azul, resplandecente, sob os refletores do Maracanã.

Estes episódios talvez não sejam engraçados, salvo para as testemunhas oculares e auditivas, que riram seu riso insolente diante de minhas burrices e vexames.

Eu os revelo para os moços de agora entenderem que a vida é marcada por tombos e erros. Ninguém chega a lugar algum sem superar as travas da própria língua, o medo do vestiário, o fosso aberto à espreita de cada passo e o riso debochado de uma multidão a torcer sempre contra.

Mas essas adversidades jamais podem nos impor derrotas definitivas e fatais, na arena cruenta em que a gente vence, a cada segundo, a luta incessante da vida.

(*) Vicente Cascione é advogado e professor decano de Direito Penal na UniSantos. Contato: vcascione@uol.com.br

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