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SANTOS DE ANTIGAMENTE
Santos, na imprensa da Oceania (3)

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Graças às recentes iniciativas da Biblioteca Nacional da Austrália de digitalizar os principais jornais daquele país de 1803 a 1854, acompanhada também pela Biblioteca Nacional da Nova Zelândia com publicações de 1839 a 1932, é possível pesquisar essas coleções via Internet e encontrar notícias referentes a Santos nos séculos XIX e XX.

 

A febre amarela já era reportada em vários lugares do mundo, em notícias da imprensa australiana desde o primeiro ano dessa coleção de jornais (1803), mas só em 26 de dezembro de 1851 o jornal The Perth Gazette and Independent Journal of Politics and News registrou, em três linhas na página 5, esta referência à doença no Brasil e em Portugal, na cidade do Porto ("A febre amarela estava grassando no Porto, onde foi transmitida por um navio do Brasil"):

Um década depois, mais duas linhas de informação seriam incluídas na página 2 da edição de sábado, 10 de março de 1860, do The South Australian Advertiser, de Adelaide. Note-se que as informações demoravam até dois meses para chegar, assim a nota tem a data de 18 de janeiro daquele ano. Lacônica, procedente de Lisboa, informava que "os portos no Brasil estão sofrendo de febre amarela":

Com referência a Santos, o tema só apareceu em dezembro de 1891, mas de forma simultânea em inúmeros jornais do dia 17, a partir da informação de que o pânico estava estabelecido no porto santista, com a morte de muitos marinheiros. Esta notícia é do jornal The Argus, de Melbourne (estado de Victoria) de uma quinta-feira, 17 de dezembro de 1891 (página 2), na coluna de telegramas especiais da agência Argus em Londres:

 


FEBRE AMARELA NO BRASIL

Quatrocentos navios sem tripulação.

Londres, 15 de dezembro

A febre amarela está grassando no porto de Santos, no Brasil. Assim, tantos marinheiros estão sofrendo da doença que se afirma que 400 navios estão no presente sem tripulantes.

[Este telegrama apareceu em uma parte da edição de ontem]

 

No mesmo dia, o jornal The Mercury (de Hobart, Tasmania) noticiava na página 2, seção de telegramas da Europa recebidos pelo cabo submarino (oitava coluna), entre a nota de um arresto bancário em Londres e outra sobre a saúde precária do líder tribal Emin Pasha (e nota semelhante aparece em três linhas na terceira coluna, da mesma página):


FEBRE AMARELA - ESTRAGOS

A febre amarela está grassando em Santos, um porto marítimo na província de São Paulo, e o pânico reina, os habitantes fogem para a segurança. Quatrocentos navios no porto, principalmente mercantes para Liverpool e Hamburgo, estão agora sem tripulação.

 

Na cidade de Perth, o jornal The West Australian registrava, na página 4 desse dia, após uma nota sobre o preço de venda da manteiga australiana em Londres:

 


FEBRE AMARELA NO BRASIL - NAVIOS SEM TRIPULANTES

Londres, 15 de dezembro

A febre amarela está grassando com grande severidade na cidade portuária marítima de Santos, no Brasil. Há quatrocentos navios ali privados de suas tripulações devido à febre.

 

Igualmente o jornal The Advertiser, de Adelaide, registrava na página 5 desse dia 17, dois telegramas:

 


FEBRE AMARELA NO BRASIL

Centenas de pessoas morrendo

Londres, 15 de dezembro

A febre amarela irrompeu em Santos, cidade portuária no Brasil construída sobre uma situação pantanosa e sujeita a visitas de febre da malária. É relatado que as pessoas estão morrendo às centenas, e que 400 navios no porto não estão tripulados devido à devastação do flagelo e à deserção. O grande comércio de exportação do porto está, portanto, num impasse.

 

BRASIL - A agitação em São Paulo

Londres, 15 de dezembro

A agitação política que eclodiu recentemente na província de São Paulo, onde a lei marcial foi proclamada, está agora dominada.

 

A agitação paulista era de adversários do regime militar imposto ao país pelo segundo presidente brasileiro, o marechal Floriano Peixoto, que havia assumido em 23 de novembro daquele ano, devido ao falecimento de Deodoro da Fonseca. O noticiário sobre a febre amarela em Santos também aparecia em outros jornais australianos de 17 de dezembro de 1891, como The Brisbane Courier, de Queensland (no sumário de notícias, da página 4):

 


Uma grave epidemia de febre amarela tem ocorrido em Santos, uma das principais cidades marítimas do Brasil.

Na página 5 desse mesmo jornal, entre as mensagens enviadas pelo correspondente londrino pelo cabo telegráfico:

FEBRE AMARELA NO BRASIL

Londres, 15 de dezembro

Houve uma grave epidemia de febre amarela em Santos, um dos principais portos do Brasil, e afirma-se que há agora 400 navios ali sem tripulantes.

 

Logo abaixo, na mesma página do The Brisbane Courier, uma nota sobre a revolução em São Paulo:

A REVOLUÇÃO NO BRASIL

Londres, 16 de dezembro

Notícias foram recebida do Brasil, de que o governador da província de São Paulo, onde um surto insurrecional havia ocorrido, já renunciou.

 

Na mesma data (17 de dezembro de 1891), o The Maitland Mercury & Hunter River General Advertiser (jornal que existiu de 1843 a 1893 em New South Wales) registrou na página 5, entre os últimos cabogramas, depois da informação de que a rainha abriria pessoalmente a sessão do Parlamento inglês de 1892, e que a China oficializava a recusa em participar da Mostra de Chicago de 1893:

 


A grave epidemia de febre amarela atacou a cidade de Santos no Brasil. Já 400 da população se diz terem morrido, e os navios atracados no porto estão sem equipes por morte ou deserção.

 

Por fim, o mesmo texto apareceu na página 5 do jornal The Sydney Morning Herald, ainda no dia 17:

 


FEBRE AMARELA NO BRASIL

Londres, 15 de dezembro

Uma grave epidemia de febre amarela atacou a cidade de Santos, na província brasileira de São Paulo, Sul do Rio de Janeiro. Já 400 da população se diz terem morrido, e os navios atracados no porto estão sem equipes por morte ou deserção.

 

No dia seguinte, 18 de dezembro de 1891, The Brisbane Courier registrava na página 5, entre os cabogramas:

 

FEBRE AMARELA NO BRASIL

Londres, 16 de dezembro

Uma ordem foi emitida proibindo a entrada de vapores no Rio de Janeiro, devido ao surto de febre amarela em Santos.

 

Simultaneamente, The Argus, de Melbourne, citava na página 5 desse dia 18 de dezembro, entre os "telegramas especiais" enviados por sua agência em Londres, na Inglaterra:

 

A FEBRE AMARELA NO BRASIL

Londres, 16 de dezembro

Em conseqüência do surto de febre amarela no porto de Santos, no Brasil, os vapores estão proibidos de entrar no porto do Rio de Janeiro.
[Os telegramas acima apareceram em uma parte da edição de ontem.]

 

No sábado, 19 de dezembro de 1891, era a vez do jornal The Queenslander (que existiu de 1866 a 1939 em Brisbane, Queensland) noticiar, na primeira página (página 1.153, seção Miscelânia), tanto a febre amarela em Santos como a revolta contra o governo paulista:

 



 

Notícias do Brasil afirmam que a revolução eclodiu na província de São Paulo, e os funcionários locais foram depostos. O governador da província, no entanto, está resistindo aos insurgentes.
A febre amarela irrompeu em Santos, no Brasil, estando 400 embarcações sem tripulação.

O mesmo jornal The Queenslander registrou sobre esses assuntos, na página 1.215 (nº 15) da edição de 26 de dezembro de 1891:


 

Notícias foram recebidas do Brasil de que o governador da província de São Paulo, onde um surto insurrecional havia ocorrido, já renunciou.

Uma ordem foi emitida proibindo a entrada de vapores no Rio de Janeiro, devido ao surto de febre amarela em Santos.

Aliás, na página seguinte (16 da edição ou 1.215 do ano), havia outra notícia do Brasil:

Notícia foi recebida de uma perturbação grave em Pernambuco, no Brasil, onde um conflito ocorreu entre a população e a polícia, em que é relatado que sessenta pessoas foram mortas.

 

Finalmente, no sábado, 9 de janeiro de 1892, o jornal The West Australian (que existiu de 1879 a 1954 na cidade de Perth) estampou na página 5, entre os telegramas estrangeiros transmitidos via cabo pelo seu próprio correspondente:

 


FEBRE AMARELA NO BRASIL.
Alta mortalidade. 300 mortes diárias.

Londres, 8 de janeiro.

A febre amarela é neste momento muito grave na costa brasileira. No Rio de Janeiro, Bahia e Santos, a mortalidade é de 300 pessoas diariamente.

 

Na Nova Zelândia, a notícia da febre amarela em Santos também chegou no dia 16 de dezembro de 1891, sendo o telegrama publicado na página 2 do jornal Nelson Evening Mail, (primeiro jornal diário da cidade de Nelson, onde foi fundado em 5 de março de 1866):


FEBRE AMARELA NO BRASIL.

Rio de Janeiro, 15 de dezembro

A febre amarela irrompeu em Santos, ao Sul desta cidade. Um grande número de navios estão ali sem tripulantes.

 

Uma das notícias mais amplas sobre a epidemia foi a publicada na Nova Zelândia em 11 de janeiro de 1892, na página 4 do jornal Bay of Plenty Times (publicado na Baía de Plenty de 3/11/1875 a 16/5/1910):

 


YELLOW JACK AT SANTOS

As reported by the crew of the barque Inverurie, which arrived at Port Chalmers a few day ago, yellow fever is raging at Santos, the port of the town of San Paulo, a place of 40,000 inhabitants, 230 miles south west of Rio de Janiero, and one of the principal towns of Brazil. Pilot Milne, who went off to the vessel at Port Chalmers with sailing orders reports that as some of the Inverurie's crew were down with sickness he did not board her. The chief officer who was in command, informed him that prior to leaving Santos three of the crew died, while the second officer and two seamen were left ashore sick.


The harbour was full of vessels which were arriving daily, but in consequence of the fever no work could be done, while the seamen were dying like rotten sheep, and nearly half the shipmasters in the port had died. The Inverurie left Santos on November 5, and on the following day three of the crew were down with fever, four others were stricken on November 7, on which day the master, Captain Cranch, was taken ill. He became delirious on the 9th, and died on November 11, in lat. 39.40 S., long. 41.27 W. The seven men became convalescent on November 20, and were on a fair way to recovery when the vessel arrived off Otago Heads. The chief officer added that owing to the fever it would be impossible for any vessel to leave Santos for six or eight months to come."
 

Tradução livre aproximada:

"Bandeira" amarela em SANTOS

Conforme relatado pela tripulação da barca Inverurie, que chegou a Port Chalmers alguns dias atrás, a febre amarela grassa em Santos, o porto da cidade de São Paulo, um lugar de 40.000 habitantes, 230 milhas ao sudoeste do Rio de Janeiro, e uma das principais cidades do Brasil. Piloto Milne, que seguiu para o navio em Port Chalmers com ordens de navegação, relata que, como alguns da tripulação do Inverurie estavam derrubados com a doença, ele não queria ir a bordo. O oficial-chefe que estava no comando informou-lhe que, antes de deixar Santos, três dos tripulantes morreram, enquanto o segundo oficial e dois marinheiros ficaram em terra doentes.

 
O porto estava cheio de navios que chegavam diariamente, mas em conseqüência da febre nenhum trabalho poderia ser feito, enquanto os marinheiros estavam morrendo como carneiros podres, e quase a metade dos comandantes no porto tinha morrido. O Inverurie deixou Santos em 5 de novembro, e no dia seguinte três dos tripulantes estavam com febre, outros quatro foram atingidos em 7 de novembro, dia em que o mestre, o capitão Cranch, adoeceu. Ele se tornou delirante no dia 9, e morreu em 11 de novembro, em latitude 39,40 Sul, longitude 41,27 Oeste. Os sete homens entraram em convalescença em 20 de novembro, e estavam em bom caminho de recuperação quando o navio chegou ao largo de Otago Heads. O oficial-chefe acrescentou que, devido à febre, seria impossível para qualquer navio deixar Santos nos próximos seis ou oito meses.

 

O jornal Nelson Evening Mail, da cidade neozelandesa de Nelson, publicou também uma significativa descrição do que acontecia em Santos, na página 4 da edição de 16 de março de 1892 (volume XXVI, edição 61):

 

A FEVER-STRICKEN PORT.

Some time ago we had a telegram from Dunedin telling of the arrival of the barque Akaroa from the port of Santos, in Brazil. Captain Murray gave a terrible picture of the state of that place, where hundreds of sailors were dying every day. Mr. Hugh Lyell, of Auckland, the second mate of the Alastor, had died from yellow fever. The New York Herald has a description of the port, from which we take the following:

— The pestilential hole! The hotbed of yellow fever and smallpox!

Such is a brief description of Santos, the little town situated in one of the most magnificent harbors in the world.

Next to Rio Janeiro, in its approaches the Bay of Santos is the most picturesque of Brazil's many fine harbours. As you steam in from the sea the bungalows of the rich coffee merchants shimmer in the clear tropical sun, and the picturesque peaks of Serra do Mar rise in the morning mist.

It is hard to realise that disease, sickness, and death are perennial visitors here — that they never say farewell to beautiful Santos.

As the perfume of the wild swamp flower is the sweetest, however, so is the soil of fever-ridden Santos the richest; and thus it is that the bones of many brave sailors are now whitening on the sandy shores of the Barra.

Now you have the bar where the white-crested breakers roar and the sapphire sea changes its colour to a slimy, blackish green — an offensive sickening stench reaches your nostrils. The tide is low, and the starboard and port acres of blue mud are baking in a meridian sun.

Lean over the side and dip up a glassful of water from the inner harbour. A microscope will not be needed to show you millions of living germs, a cross between the animal and vegetable kingdom.

Circling round your head are a score or more of vultures — birds of ill omen — flapping their wings almost in your face. They have left a festering carcase on the beach to pick out some new victim on the incoming ship. These are the scavengers of Santos, who in their own peculiar way are not unimportant factors in the cleansing of the city.

Do you wonder now that if a ship leaves Santos with one-third of her original crew she is to be congratulated.

And yet, though Santos, from the low marshes surrounding it, might never become a perfectly healthy city, if proper sanitary rules were observed the death rate might be greatly decreased. Rio Janeiro was once almost as sickly as Santos, but a perfect system of drainage has done much to improve fevers of all types.

To the uncleanly habits of the lower classes is due much of the sickness that ravages sailors and landsmen alike.

The dark, handsome fellow that you see standing on the wharf as you approach the city is a Mamoluce — as Brazilians call a cross between the Indian and Anglo-Saxon. He is not a particularly brave individual, though there may be some of the Latin fire in his blood. Beside him, is a neat, flashily dressed Indian woman. She is dark, not copper coloured, like the Northern tribes, and has a reddish tinge in her rich brown cheek. Her crimson skirt in gathered in picturesque folds about her waist, and her white chemise falls negligently from one shoulder.

These are typical inhabitants of Santos, for the coffee merchants all live in handsome estates up in the interior or in bungalows on the beach.

However cleanly in person the native might be, his house and back yard are receptacles for garbage and filth of every kind. How it is possible for them to live within range of the stench that is waited to their homes by the trade winds is a mystery which has never been solved.

As you walk along the dark foul streets after nightfall a warning cry reaches you from above. By dint of practice you may be successful in dodging the slops that would otherwise have been poured over your head. These sink into the soft earth, which becomes moist at night from the heavy dews. In the morning the heat increases rapidly, steam arises from the ground and the odours are almost unbearable.

Sometimes in the afternoon a few black clouds appear to the eastward, the temperature is rapidly lowered, and rain pours down in great masses. The streets are flooded, and the torrent washes away filth and decayed matter. This is all that saves the few people that are left in the city. Their gain, however, is the sailor's loss, for everything is emptied into the stagnant harbour. In a few minutes the sun is out again, the ground once more baked and the water of the inner harbour heated to blood temperature.

Now comes the sailor's turn, for, fresh from a colder climate unacclimated, he is an easy prey to yellow fever and small-pox. Most of the large vessels unload at the railroad wharf, at which point almost all the drainage of the port empties. Some of the vessels draw too much water, and are therefore unloaded by means of scows. At low tide they quietly rest in soft mud. In addition to this they are now building a stone quay, and dredges are constantly upturning the poisonous mud that is supposed to contain the fever germs. Is it a wonder, then, that sometimes entire crews are stricken down?

The present sickness of Santos has added another trouble, that of stopping the means of transportation. Many vessels bringing merchandise to exchange for coffee are forced to wait weeks, sometimes months, before they can be discharged and loaded again. It is even said that there are now over one hundred vessels lying in the harbour of Santos awaiting their turns for dock room. So clogged have the wheels of commerce become that many captains leave their ships and return to England or America until their vessels are discharged and ready for sea again. Others remove their entire ship's crew into the interior, while the company's agent leases houses for them. Unless something of the kind is done no captain can expect to return home with the same crew that he brought to Santos.

Tradução livre aproximada:

Um porto parado pela febre

Algum tempo atrás tivemos um telegrama de Dunedin dizendo da chegada da barca Akaroa do porto de Santos, no Brasil. O capitão Murray deu uma imagem terrível do estado do lugar, onde centenas de marinheiros estavam morrendo todos os dias. Mr. Hugh Lyell, de Auckland, o segundo oficial do Alastor, havia morrido de febre amarela. The New York Herald tem uma descrição do porto, a partir da qual tomamos o seguinte:

- O buraco pestilento! O foco de febre amarela e varíola!

Essa é uma breve descrição de Santos, a pequena cidade situada em um dos portos mais belos do mundo.

Junto ao Rio de Janeiro, em suas proximidades a Baía de Santos é o mais pitoresco dos muitos portos aprazíveis do Brasil. Como você chega a partir do mar, os bangalôs dos ricos comerciantes de café brilham sob o claro sol tropical, e os picos pitorescos da Serra do Mar se destacam na névoa da manhã.

É difícil perceber que a enfermidade, a doença e a morte são visitantes constantes aqui - que nunca dizem adeus à bonita Santos.

Como o perfume da flor do pântano selvagem é o mais doce, no entanto, assim é que o solo cheio de febres de Santos é o mais rico, e assim é que os ossos de muitos bravos marinheiros estão branqueando nas praias arenosas da Barra.

Agora você tem a barra onde o penacho branco da ressaca ruge e o mar safira muda sua cor para um viscoso verde escuro - um cheiro enjoativo ofende suas narinas. A maré está baixa, e a estibordo e bombordo acres de lama azul estão assando num sol meridiano.

Incline-se sobre a borda e mergulhe um copo na água do interior do porto. Um microscópio não será necessário para mostrar-lhe milhões de germes vivos, um cruzamento entre os reinos animal e vegetal.

Circulando em volta de sua cabeça há um ou mais abutres - as aves de mau agouro - batendo as asas quase em seu rosto. Eles deixaram uma carcaça apodrecendo na praia para pegar alguma nova vítima na entrada do navio. Estes são os catadores de Santos, que em sua própria maneira peculiar não são fatores de pouca importância na limpeza da cidade.

Você se espanta agora que, se um navio deixa Santos com um terço de sua tripulação original, ela está de parabéns.

E ainda, apesar de Santos, com os pântanos baixos que a rodeiam, nunca possa se tornar uma cidade perfeitamente saudável, se forem observadas regras sanitárias adequadas a taxa de mortalidade pode ser bastante reduzida. Rio de Janeiro já foi quase tão doentio como Santos, mas um perfeito sistema de drenagem tem feito muito para melhorar as febres de todos os tipos.

Aos hábitos imundos das classes mais baixas se deve muito da doença que assola marinheiros e conterrâneos igualmente.

O companheiro, moreno, bonito que você vê de pé no cais à medida que se aproxima a cidade, é um mameluco - como os brasileiros chamam um cruzamento entre o índio e o anglo-saxão. Não é um indivíduo particularmente corajoso, embora possa haver algum fogo em seu sangue latino. Ao lado dele, está uma elegante e brilhantemente vestida mulher índia. Ela é escura, não cor de cobre como as tribos do Norte, e tem uma coloração avermelhada em seu rosto castanho rico. Sua saia carmim se junta em dobras pitorescas sobre sua cintura, e sua camisa branca cai por negligência de um ombro.

Estes são habitantes típicos de Santos, pois os comerciantes de café vivem todos em bonitas fazendas no interior ou em bangalôs na praia.

Por mais limpo pessoalmente que o nativo possa ser, sua casa e o quintal são recipientes para lixo e sujeira de todo tipo. Como é possível para eles viverem em meio ao fedor que é levado para as suas casas pelos ventos alísios, é um mistério que nunca foi resolvido.

Se você anda pelas imundas ruas escuras após o anoitecer, um grito de alerta chega até você de cima. À força de prática, você pode ser bem sucedido em esquivar-se das águas sujas que iam ser derramadas sobre sua cabeça. Estas afundam na terra macia, que fica úmida em noite do orvalho pesado. De manhã, o calor aumenta rapidamente, o vapor se levanta do chão e os odores são quase insuportáveis.

Às vezes, no período da tarde, algumas nuvens negras aparecem para o Leste, a temperatura é rapidamente reduzida, e chuva cai em grandes massas. As ruas ficam inundadas, e a correnteza lava sujeira e matéria deteriorada. Isso é tudo o que salva as poucas pessoas que permanecem na cidade. Seus ganhos, no entanto, são a perda do marinheiro, pois tudo é esvaziado para o porto estagnado. Em poucos minutos, o sol aparece novamente, o chão é mais uma vez cozido e as águas do porto interior aquecidas à temperatura do sangue.

Agora começa a transformação do marinheiro, pois, recém chegado de um clima mais frio, não aclimatado, ele é uma presa fácil para febre amarela e varíola. A maioria dos grandes navios descarregam no cais ferroviário, altura em que quase toda a drenagem do porto esvazia. Alguns dos navios exigem maior profundidade e são, portanto, descarregados por meio de barcaças. Na maré baixa, eles descansam calmamente na lama mole. Além isso, eles agora estão construindo um cais de pedra, e as dragas estão constantemente remexendo a lama tóxica que se supõe conter os germes da febre. É uma maravilha, então, que, por vezes, tripulações inteiras sejam derrubadas?

A doença presente em Santos tem outro problema, o de parar o meio de transporte. Muitas embarcações trazendo a mercadoria de troca para o café são obrigadas a esperar semanas, às vezes meses, antes que possam ser descarregadas e carregadas novamente. Já foi dito que existem mais de cem navios parados no porto de Santos à espera de sua volta para o atracadouro. Tão obstruídas estão as rodas do comércio que muitos capitães deixam os navios e retornam à Inglaterra ou América, até os seus navios serem descarregados e aprontados para o mar novamente. Outros removem a tripulação inteira do seu navio para o interior, enquanto o agente da empresa aluga casas para eles. A menos que algo seja feito, nenhum capitão pode esperar voltar para casa com a mesma equipe que trouxe para Santos.

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