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ROTA DE OURO E PRATA
Navios: o Americana

1988-...

Toda a grandiosidade da indústria dos cruzeiros marítimos, com novos e gigantescos navios lançados ao mar na década final do século XX, esconde porém um fato negativo: nesses novos navios de cruzeiro não se procura viver a experiência diferente que o mar e a navegação oferecem em todos os seus aspectos mais significativos, e a ênfase a bordo dos navios de cruzeiro modernos é dada ao prolongamento do tipo de vida em terra firme, em detrimento dos elementos marinheiros e marítimos.

Prolongam-se, assim, os males da vida citadina e burguesa: agitação, estresse, impaciência, superficialidades e vícios, tudo isto sendo patrocinado pela frenética e constante agitação de bordo: cassinos, espetáculos de gosto duvidoso, máquinas caça-níqueis, discotecas, anúncios desta ou daquela atividade (já não sabem o que mais inventar para distrair os turistas), tudo - menos paz e tranqüilidade. Nesses cruzeiros marítimos, geralmente não se vai a lugar nenhum: passa-se, somente, embarcando e desembarcando no mesmo porto inicial.

Visitas curtas - Os navios fazem percursos, costeando as terras com escalas freqüentes (a cada um ou dois dias) e parando em porto para visitas extremamente breves. Ao cabo de uma meia dúzia destas passagens por terra, o passageiro cruzeirista não sabe bem onde se encontra, cansado das subidas e decidas, confuso pelo estresse e pela síndrome do "eu também vi ou quero ver".

A realização de um cruzeiro marítimo não é, porém, necessariamente uma experiência negativa, mas nada tem a ver com uma viagem marítima. Neste último caso, realiza-se uma travessia, vai-se de um porto de embarque para outro de desembarque, transfere-se corpo e espírito para outra dimensão, absorve-se o mar e o ambiente marinho como um elixir de mudança, a calma e a reflexão predominam, os ambientes de bordo tornam-se familiares e as pessoas têm tempo para conversar e se conhecerem melhor - o navio passa a ser um meio para uma viagem de reencontro com a natureza e com outros seres humanos.

Quando uma viagem marítima é realizada por um período relativamente longo (duas a três semanas), no convívio de um número não muito elevado de passageiros e com a realização de várias escalas espaçadas, onde em cada uma destas o navio permanece um ou dois dias (ao invés de apenas algumas horas), então torna-se possível alcançar a dimensão exata e as verdadeiras sensações derivadas de uma viagem por mar!


A embarcação fez a primeira escala em Santos em 3/1988, na linha interamericana da Ivaran

Pérola - Pérola rara no mundo da navegação moderna a oferecer tal oportunidade (comum em outros tempos menos frenéticos) é o navio misto de bandeira norueguesa Americana.

Concebido como combi-liner (combinado de passageiros e carga) pela armadora Ivarans Rederi, também conhecida como Ivaran, planejado e desenhado pelos arquitetos navais Arnesen e Christensen, de Oslo, o Americana representou a realização de audacioso projeto, sem paralelos precedentes, ou seja, a conjugação de navio de linha (com luxuosas acomodações para uma centena de passageiros) com navio de carga porta-contêineres (capaz de transportar em seus porões e convés até 1.100 contêineres, a uma velocidade de cruzeiro próxima a 20 nós ou 37 km/hora).

A solução arquitetônica encontrada para esta utilização dupla e combinada resultou na construção de uma superestrutura de quatro conveses na parte de popa do navio, que abriga todos os espaços destinados ao uso dos passageiros, enquanto da proa até tal superestrutura o espaço foi destinado ao transporte empilhado de contêineres.

Forte demanda - A Ivarans decidiu-se por tal tipo de navio no início dos anos 1980, em resposta a uma forte demanda proveniente, principalmente, de residentes norte-americanos - causada pela oferta estereotipada de cruzeiros marítimos convencionais, saindo, seja de Nova Iorque, Miami ou Los Angeles para o Caribe, e desejando uma ligação marítima não-convencional para a América do Sul.

Estabelecidos os planos gerais do futuro novo navio pelos arquitetos, a Ivarans solicitou ofertas de construção a vários estaleiros europeus e asiáticos, acabando por escolher a proposta da Hyundai Heavy Industries (do porto de Ulsan, Coréia do Sul): preço de construção igual a US$ 23 milhões, 80% dos quais financiados em dez anos a juros fixos de 8% anuais, prazo de entrega inferior a dez meses, opção de construção de dois outros navios similares com as mesmas condições.

Concluído o negócio, assinados os contratos, ocorreu, sob o número 464, o batimento da quilha do Americana (nome que já fora escolhido pela Ivarans) em 2 de maio de 1987.

Coréia do Sul e Japão - Casco e aparato propulsor foram de responsabilidade da Hyundai, enquanto guindastes, equipamento auxiliar de propulsão e os sistemas de navegação provieram do Japão.

Da Suécia vieram todos os móveis e painéis de decoração para os espaços destinados aos passageiros e tripulantes, que foram instalados seguindo os planos desenhados pelos arquitetos noruegueses Naerstad e seus colegas da firma F.S.Platou, de Oslo.

Nove meses exatos após o batimento de sua quilha, em fevereiro de 1988, o Americana, praticamente construído e aprestado, saiu dos estaleiros de Ulsan, sob o impulso de suas próprias máquinas, com destino a Long Beach, na Califórnia, atravessando o Oceano Pacífico.


O Americana escalou pela primeira vez no porto santista em março de 1988

Cinco conveses - Internamente, o transpax-contêiner havia sido dotado de cinco conveses em altura, além do convés de popa, que se situava a nível de casco, ligeiramente elevado em relação ao mesmo.

Neste convés de popa, situam-se a entrada principal para passageiros, os escritórios do comandante e do diretor de hotelaria, o hospital de bordo e uma loja de lembranças.

Nos três conveses imediatamente acima, numerados de baixo para o alto, encontram-se todas as diversas cabinas de alojamento, divididas em cinco categorias: internas individuais, externas individuais, duplas, de luxo e suítes.

O convés número quatro abriga, do lado de boreste, o salão de refeições, e do lado oposto, um salão de estar com serviço de bar e um pouco mais adiante uma sala-biblioteca de pequenas dimensões.

No último convés encontram-se a piscina e o lido de bordo, com bar anexo e churrasqueira. Na parte frontal deste sun-deck (convés de sol) é situada, em elevação, a ponte de comando, dominada, na parte posterior, pelas instalações da chaminé preta, vermelha em faixa com "C" branco e pelo mastro de sinalização e radar.

Na altura dos conveses de números 1 e 2, a cada lado de bombordo encontram-se dois botes salva-vidas e sempre à popa, mas a nível interior do casco foram situados os alojamentos da tripulação.

Honras marítimas - Após atravessar o Pacífico e realizar breve escala no porto de Long Beach, o Americana, via Canal do Panamá, alcançou Nova Iorque, onde foi recebido com as devidas honras marítimas por sete rebocadores, esguichando seus jatos d'água, e vários helicópteros. Era 1º de março de 1988.

Quatro dias mais tarde, o navio zarpava de seu terminal novaiorquino com destino à costa Leste da América do Sul, realizando a sua viagem inaugural de serviço. Havia, no entretempo, recebido seu batismo formal.

Após escalas em Baltimore, Norfolk, Savannah e Jacksonville, o Americana entrou pela primeira vez na Baía da Guanabara, às 9 horas de 13 de março, tendo realizado a viagem Nova Iorque-Rio de Janeiro em apenas oito dias, escalas incluídas.


Por US$ 20 milhões, a armadora colocou à venda o Americana
Foto: J.C.Rossini, março de 1997

Em Santos - Na tarde do mesmo dia, o navio largara amarras para Santos, onde entrou pela primeira vez no dia 14 de março, prosseguindo em seguida a sua viagem para o Rio da Prata.

Completam-se deste modo dez anos de serviço inigualável do Americana na Rota de Ouro e Prata, e este artigo festeja a ocasião.

Durante esta década, o transpax-contêiner levou dezenas de milhares de passageiros de um ponto a outro entre as Américas do Norte, Central e do Sul, e centenas de milhares de toneladas de carga em contêineres.

Experiência sensacional - Todos os que nele tiveram a sorte de poder navegar são unânimes: a experiência é sensacional, serviço de bordo impecável e digno de um hotel cinco estrelas, ordem, calma, silêncio e limpeza... Todos estes fatores positivos realçados pela verdadeira, bem próxima convivência com o mar, sua gente e seus portos, do espírito de marinharia, que o seu atual comandante, Knut Olsen, tão bem personifica.

Deste longo período decenal, nos últimos anos o Americana teve como porto cabo de linha norte-americano o porto de Nova Orleans, ao invés de Nova Iorque, servindo, na viagem Norte-Sul, nada menos do que seis portos e, no sentido oposto, outros 12.

Do total de 20 portos para uma viagem redonda (ida e volta), realizada em cerca de 50 dias, a um custo aproximado de US$ 100 por dia, só dois são tocados duas vezes: Rio de Janeiro e Santos. Isto significa que, por uma quantia próxima a US$ 5.000 e por quase dois meses a bordo, usufruindo os serviços esmerados, um passageiro do Americana pode conhecer 18 portos das Américas, 16 dos quais em países latino-americanos. Qual outro navio pode oferecer condições similares?

Está a venda - Apesar do enorme sucesso e prestígio do Americana, a Ivarans decidiu recentemente colocá-lo à venda, tendo atingido o limite de idade que é o parâmetro padrão da armadora norueguesa.

A oferta de venda leva na etiqueta o preço de US$ 20 milhões, praticamente o que foi pago pela construção do navio. Tal fato realça a qualidade do mesmo e seu excelente estado de conservação.

No momento, ele continua a serviço da Ivarans, a prestar serviços de transporte de contêineres e de passageiros no Caribe. Rota de Ouro e Prata espera que o Americana, se for adquirido por outro armador, possa permanecer navegando nas mesmas águas que sempre foram suas e com o mesmo tipo e nível de qualidade superior, oferecido sob a bandeira norueguesa e as cores da Ivarans.

Americana:

Outros nomes: nenhum
Bandeira: norueguesa
Armador: Ivarans Rederi
País construtor: Coréia do Sul
Estaleiro construtor: Hyundai (casco 464) (porto: Ulsan)
Ano da viagem inaugural: 1988
Tonelagem de arqueação bruta (t.a.b.): 19.203
Tonelagem líquida: 7.774
Tonelagem de peso morto (deadweight - tdw): 19.830
Comprimento: 176,71 m
Boca (largura): 26,01 m
Calado: 13,21 m
Velocidade média: 18,25 nós
Capacidade de contêineres: 1.120 TEUs
Motor: B&W 7S60MC, 14.726 hp

Artigo publicado no jornal A Tribuna de Santos em 14/6/1998