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CULTURA/ESPORTE NA BAIXADA SANTISTA - LYDIA
Lydia Federici (4 - crônica 348)

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Clique na imagem para voltar ao índice desta seçãoEm mais de três décadas de atuação diária, Lydia Federici publicou milhares de crônicas no jornal santista A Tribuna. A Hemeroteca Pública Municipal de Santos criou um Espaço Lydia Federici, onde estão expostos desde sua máquina de escrever até os troféus desportivos, bem como os organizados álbuns de recortes reunindo todos os seus textos publicados. Esta crônica foi publicada em 24 de fevereiro de 1963 em A Tribuna (ortografia atualizada nesta transcrição):
 
GENTE E COISAS DA CIDADE

Carnaval

Lydia Federici

Santos, no carnaval, apresenta um aspecto interessante. Tem mais gente de fora que santista. Como os santistas são de paz, apesar de donos da cidade, acontece uma coisa engraçada. Gritam e mandam os visitantes. Acontece, então, que, nesses quatro dias, os hábitos da cidade mudam. Santos sai de sua pacatez e transforma-se num rebuliço.

Nesse rebuliço, há coisas boas. E há, infelizmente, coisas que não prestam. Deixemos as boas de lado. Comentemos as ruins.

Você conhece, amigo, aquele ditado que diz que não é de pequenino que se vai ajeitando o pepino? Foi o que não aconteceu por aqui. Quando surgiram as primeiras brincadeiras sem graça, trazidas por brincalhões de outras bandas, logo imitadas por meninos afoitos daqui, que providências tomamos? Nenhuma. A não ser, em rodas pequenas de amigos, alguns comentários sobre os exageros vistos e sofridos em bailes. Nos desfiles de rua. No corso. E foi só.

Ora. Deixe passar a primeira má-criação de seu filho. Para ver quanto tempo demorará a segunda.

Foi exatamente isso que aconteceu. No carnaval do ano seguinte, a coisa foi pior. Diretores de clubes ficaram malucos para reprimir os abusos. Os guardas, nas ruas, não sabiam se pegavam o primeiro carro. Ou o grupo do segundo. Ou os garotos do que virava a esquina. Os abusos tinham proliferado. Em quantidade. E qualidade das brincadeiras. Brincadeiras? Pois sim.

Que fizemos nós? Esbravejamos. Comentamos. Resmungamos. Nada mais que isso. Achamos que era hora das autoridades tomarem providências. Aceitamos, conformados, suas desculpas de que não dispunham de homens suficientes para exercer o policiamento. E coibir os abusos. Estendemos-lhes as mãos? Não. Contentamo-nos em por as línguas a funcionar. E cada qual foi tratar de sua vida.

Outros carnavais vieram. Carnavais que poderiam ser de alegria. Mostrando a organização de blocos e escolas de samba a caprichar na festa. Mostrando um povo que, embora triste, sabia esquecer suas preocupações. Dançando. Pulando. Ou batendo, apenas, palmas, aos que saracoteavam com alegria.

Foi isso que aconteceu? Sem dúvida. Mas, entremeado aos espetáculos populares, que foi que veio também? Uma irresponsabilidade total. Por parte de um bloco que, a cada ano, recebia aderentes em massa à sua loucura. Não loucura de alegria. Mas loucura criminosa. Loucura que ofendia. Que causava prejuízos. Que acidentava.

"Basta. É demais. Onde vamos parar?" Foi isso que passou a estourar, em gritos e queixas, por toda a cidade. Do cais à praia. De Leste a Oeste.

E assim estamos nós. Diante, ou antes, dentro de outro carnaval.

Como será ele? Uma festa de alegria? De cores rodopiantes? Um espetáculo de movimento? Ou um desenrolar contínuo de abuso que, propiciados pelo comodismo de nossa inércia inicial, ninguém e nada conseguem mais segurar?


Imagem: reprodução do álbum de recortes de Lydia Federici, no acervo da Hemeroteca Municipal

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