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GEOGRAFIA E ECONOMIA DE CUBATÃO - O Vale Perdido
Projeto O Vale Perdido - texto referencial

Esquecido por muito tempo, apesar de sua riqueza ambiental, o Vale Itutinga-Pilões começou no século XXI a ser o alvo de um projeto de resgate histórico, cultural e ambiental, o Projeto O Vale Perdido. Este material foi preparado pelo professor e geógrafo Cesar Cunha Ferreira, para os estudantes que visitam o vale conhecerem melhor essa importante região cubatense:


As águas límpidas do rio Cubatão são o mais surpreendente atrativo, segundo os alunos
Foto: Cesar Cunha Ferreira, 17/6/2004

O Vale Perdido

Vale é a denominação geográfica dada a um local entre duas encostas, esculpido pela força das águas dos rios (erosão fluvial) durante milhões de anos (água mole em pedra dura tanto bate até que fura, quebra, arrasta e arrebenta).

A palavra perdido do título refere-se à perda da memória do vale Itutinga-Pilões ou simplesmente, vale do rio Cubatão. O esquecimento e o desconhecimento da população para com esse patrimônio ecológico enfraquece a causa ambiental e nos tornam "órfãos da História". Você conhece realmente este local? Veremos...

Comece analisando o clima e note que, na maioria das vezes, a temperatura da cidade é maior que na floresta. Essa diferença ocorre, pois a quantidade de sombras das árvores impede que o Sol aqueça o solo. Aliás, o nosso clima é chamado de Tropical Atlântico e a média de temperatura é de 23ºC.

A abundância de chuva é outra característica climática marcante no vale do rio Cubatão, facilmente explicada por situar-se na Serra do Mar. Como seria isso? Lembre-se de que estamos próximos ao mar: o Sol aquece as águas deste mar, evaporando-as e transformando-as em nuvens, que, por sua vez, são empurradas pelas brisas oceânicas em direção ao continente. Estas nuvens chocam-se com a Serra do Mar e ali param, resfriando o vapor d’água e condensando-o em forma de gotas, que são as chuvas. Chove menos em São Paulo, que se localiza no Planalto Atlântico, do que em Cubatão, situado na Planície Costeira.

Isto explica também a presença de inúmeros riachos e cursos d’água, existentes ao longo da Serra do Mar, que contribuem para a formação do rio principal, neste caso o rio Cubatão. Quando chove, a bacia hidrográfica do rio Cubatão recolhe toda esta água descarregada pelas chuvas nas encostas através de seus afluentes e subafluentes, direcionando-a até o rio principal no fundo do vale. Ou seja, o vale se comporta como uma verdadeira calha natural.

Exemplo: rio principal: rio Cubatão; afluente: rio Pilões; e subafluente: rio Passareúva.


Trilha em meio de um bambual introduzido pela antiga
Fábrica Santista de Papel no início do século XX
Foto: Cesar Cunha Ferreira, 17/6/2004

Um fator importante para que isso ocorra com equilíbrio é a presença da vegetação. Ela é responsável pelo controle das águas que entra no rio durante e depois das chuvas. Sem as raízes das árvores, o solo não suportaria a força da chuva, o que causaria vários deslizamentos. Com a ausência do solo, a água correria livremente em direção ao rio, o que levaria ao transbordamento do rio, provocando enchentes inimagináveis na cidade.

Portanto, a função da vegetação durante as chuvas é absorver e reduzir a velocidade da água. As folhas amortecem o impacto das gotas de chuvas no solo; este, e as raízes que o fixam na encosta, reduzem a velocidade das águas que correm por estas encostas, retendo grande parte delas, liberando-as aos poucos. Isso explica porque, mesmo nos períodos sem chuva, o rio continua recebendo água. A água está retida sob o piso da floresta, fluindo lentamente em direção ao rio e seus afluentes.

Além do equilíbrio climático (ameniza a temperatura) e hídrico (evita grandes enchentes e ainda torna possível a captação de água que abastece grande parte das cidades vizinhas à Cubatão), o valor paisagístico e histórico também deve ser levado em consideração.

Afinal, qual é mesmo o nome dessa vegetação? Espero que você se lembre... Exato... é a Mata Atlântica. Hoje é considerada uma das florestas mais importantes do mundo; porém, é também a mais ameaçada de extinção.

Importante por quê? Além de tudo que foi citado, ela contém uma das maiores biodiversidades do planeta. Tanto sua flora como sua fauna possuem espécies sequer catalogadas pelos pesquisadores, portanto, ainda desconhecidas pelo homem - e, dentre as conhecidas, cerca de 20% das plantas e animais são endêmicos, ou seja, existem somente na Mata Atlântica, não encontrados em nenhum outro lugar do mundo.

Além de tudo, ainda é uma das mais ameaçadas, devido ao desmatamento diário e desgovernado da floresta. Para ser ter uma ideia, derruba-se uma área equivalente a 15 campos de futebol por hora na Mata Atlântica. No passado, a motivação para a supressão da Mata Atlântica era o plantio da cana-de-açúcar e do café e, em alguns casos, com uso da coivara. Hoje a miséria, a falta de moradia e o "desenvolvimento econômico" impulsionam a devastação da floresta Atlântica.

No vale do rio Cubatão, especificamente, encontramos sinais dos seguintes processos:

Bananicultura: antes do início da 1ª fase de industrialização do município cubatense, o vale do rio Cubatão tinha uma função agrícola exercida pelos sitiantes locais. A cidade de Cubatão chegou a ser um dos maiores produtores de banana do Brasil, exportando para a Argentina e outros países. Em razão disso, desmatou grandes áreas de floresta, inclusive as encostas e o fundo do vale do rio Cubatão. Hoje o plantio é fraco, resumindo-se a poucos sitiantes que mantém pequenas hortas e pomares de pouca relevância em comparação ao passado.

Industrialização: com a chegada das primeiras fábricas a Cubatão (Costa Muniz Indústria e Comércio, em 1895) e principalmente com a chegada da Companhia Santista de Papel (1918), houve a necessidade de recursos energéticos e espaço físico para as atividades fabris, e de garantir a moradia para as famílias dos  funcionários.

Desta forma, a Companhia Santista de Papel iniciou um processo incessante na história da devastação da Mata Atlântica: construiu uma vila operária e uma usina hidrelétrica, e utilizou água de primeira qualidade e a floresta como lenha para queimar nos seus fornos. Plantou eucaliptos em áreas desmatadas (reflorestamento), com o objetivo de obter sua própria matéria-prima, a celulose. Deve-se lembrar que o eucalipto encontrado no vale do rio Cubatão não é uma espécie nativa.

No segundo momento da industrialização, quando Cubatão se torna um grande polo industrial, a poluição atmosférica começou a danificar a folhagem da Mata Atlântica nas encostas da Serra do Mar. Após alguns anos, começaram a ocorrer inúmeros escorregamentos, pois - sem folhas - a vegetação não consegue proteger o solo do impacto direto das águas das chuvas, erodindo-o e encharcando-o, até deslizar morro abaixo.

Vias de transporte: com a industrialização e o crescimento da população da Baixada Santista, Cubatão - que sempre foi o portal de ligação entre o planalto e o litoral paulista - sentiu diretamente os efeitos da necessidade da circulação de pessoas e mercadorias entre o porto de Santos, as indústrias cubatenses e a cidade de São Paulo.

No vale do rio Cubatão, especificamente, temos a Via Anchieta, a rodovia dos Imigrantes e a Estrada de Ferro Sorocabana. Todas causaram e causam grande impacto ambiental, principalmente na fase de construção destas vias.

Favelização: com a construção da Via Anchieta, seus antigos operários, com a facilidade desse novo acesso, ocuparam desordenadamente as encostas da Serra do Mar, criando núcleos de habitação desestruturados, como as Cotas 200, 400 e 500 - acarretando, assim, mais desmatamento e mais poluição das águas do rio Cubatão por esgoto doméstico.

A outra fase de favelização no vale do rio Cubatão encontra explicação na expansão industrial, causando um grande movimento migratório (na sua grande maioria de nordestinos) em busca de emprego. Infelizmente, a falta de emprego, o enraizamento da pobreza  e a falta de moradias decentes tornaram o surgimento das favelas inevitável, expandindo-se assim sobre a Mata Atlântica, como é caso da Água Fria e Pilões, ambos localizados na entrada do vale do rio Cubatão.


Antigo pilar de sustentação da primeira ponte, tombada pela força das águas torrenciais
Foto: Cesar Cunha Ferreira, 17/6/2004

Próximo do fim

Em 1500, com a chegada dos colonizadores portugueses, a Mata Atlântica cobria uma área com mais de um milhão de quilômetros quadrados, estendendo-se do Rio Grande Norte até o Rio Grande do Sul. O que resta hoje é pouco mais de 5% - chamado de remanescentes, conservados principalmente nos parques e reservas florestais.

Nesses remanescentes da Mata Atlântica ainda sobrevivem uma fauna e flora ricas em muitas espécies, ou seja, possuem grande biodiversidade (contam-se em mais de 11 mil tipos de plantas e centenas espécies de animais). Porém, muitos ameaçados de extinção, como o macaco-prego, o bicho–preguiça, o tatu, a anta, o palmito e algumas espécies de orquídeas.

OBSERVAÇÃO:
A Mata Atlântica é composta por diversos tipos de vegetação. Ou seja, o conjunto de vegetações - como o mangue, a floresta de restinga e paludosa, a Floresta Atlântica e a Floresta Atlântica Úmida de Encosta - formam a Mata Atlântica.

É um verdadeiro refúgio da vida selvagem: há árvores muito próximas uma das outras, algumas espécies chegando a medir 20 metros, formando, com suas copas, uma teia de luz e sombra no solo. Nos galhos e nos troncos, cipós, musgos, epífitas e bromélias que representam cerca de 70% da variedade floral  da floresta, agarram-se para buscar a luz do Sol.

Esquilos, pássaros e macacos como o sagui, perambulam entre as copas à procura de alimento e refúgio. Nos riachos, rios e poções próximos as cachoeiras, podemos encontrar capivaras, lontras e outros animais que habitam, próximo à água, grande parte de sua vida. Mas, avistá-los na "mata fechada" é uma tarefa difícil, pois muitos são espécies em extinção e a maioria se abriga ao menor ruído do homem.

Das 300 espécies ameaçadas de desaparecerem no Brasil, 170 espécies têm como moradia permanente ou periódica a Mata Atlântica.

Mas nem todas as espécies se concentram no mesmo local: apesar da grande biodiversidade, existem animais e plantas que não ocorrem em determinadas áreas da Mata Atlântica. No caso do vale do rio Cubatão, podemos encontrar: a ariranha, gato-do-mato, jaguatirica, sussuarana, tamanduá de colete, mono-carvoeiro, lontra, anta, sabiá-cica, gavião pomba, guaxica, curió-bicudo, teiú, cobra-coral, jacuguaçu, rã, veado mateiro, onça-pintada, entre outros.

Na vegetação, podemos citar - além das bromeliáceas (orquídeas e epífitas em geral) -, formações arbóreas com ocorrência de jequitibá, ipê, cedro, guapiruvu, pau d’alho, imbiruçu, guabiroba, cambuci, palmito Jussara, peroba, guaramixaba, entre muitos outros.

Apesar do vale Itutinga-Pilões (vale do rio Cubatão) estar inserido, quase que totalmente, no Parque Estadual da Serra do Mar - ou seja, é uma área de proteção ambiental -, as pressões de ocupação ainda existem. Cabe a todos valorizar esse patrimônio ecológico, conhecer o meio-ambiente, aprender a conservá-lo, para que nós, no futuro, dotados de sabedoria e consciência, não repitamos os mesmos erros de nossos pais e dos nossos governantes, buscando meios alternativos de ocupação e da utilização da floresta. Só através do conhecimento reverteremos esse quadro.

Está nas mãos de vocês, futuros políticos, trabalhadores, educadores e cidadãos, proteger o que nos resta, para que o sentido literal  da expressão "o vale perdido" não se concretize numa dura realidade da incompetência humana em não saber racionalizar seus recursos naturais. Conhecer é um ato de proteção ambiental.

QUEM CONHECE, PRESERVA.


Travessia da ponte pênsil pela equipe de reportagem da TV Band Vale em 17/06/2004
Foto: Cesar Cunha Ferreira, 17/6/2004

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O Vale Perdido
Glossário do Vale Perdido