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HISTÓRIAS E LENDAS DE CUBATÃO - VILA SOCÓ - (12)
O relato, na Última Hora, do Rio de Janeiro

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Uma das maiores tragédias de Cubatão, senão a maior, foi o incêndio de um oleoduto da Petrobrás que passava sob uma favela, Vila Socó, destruída pelas chamas com a morte de cerca de uma centena de pessoas, em 24/2/1984. Na segunda-feira seguinte, dia 27 de fevereiro de 1984, o jornal carioca Última Hora publicou matéria sobre a tragédia (acervo da Biblioteca Nacional, Rio de Janeiro/RJ - acesso em 21/2/2014 - ortografia atualizada nesta transcrição):
 
Segunda-feira, 27 de fevereiro de 1984 - edição 11.217/ano XXXIII:

Já chegam a 82 os mortos em Cubatão

São 82 os mortos da tragédia ocorrida na madrugada de sábado na Vila Socó, em Cubatão, São Paulo, quando explodiu um oleoduto da Petrobrás que vai do Porto de Santos à Refinaria Presidente Bernardes. A Petrobrás abriu inquérito para apurar o desastre e, ainda ontem, tranquilizou moradores de Miguel Pereira, Estado do Rio, temerosos de um vazamento no oleoduto Rio-Belo Horizonte, que corta a cidade, e cheirava fortemente a gasolina.

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Primeira página do jornal Última Hora de 26 de fevereiro de 1984

(Biblioteca Nacional - acesso 21/2/2014)

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Eleva-se para 82 número de mortos na tragédia de Cubatão

Subiu para 82 o número de mortos da tragédia ocorrida na madrugada de sábado em Vila São José (Vila Socó), em Cubatão, São Paulo, quando explodiu um oleoduto da Petrobrás na Refinaria Presidente Bernardes. À noite, permaneciam internados 12 feridos. A informação está contida no comunicado nº 4, expedido ontem à tarde pela Petrobrás, em Cubatão, cuja íntegra é a seguinte:

"Em virtude das notícias desencontradas a respeito das circunstâncias em que a Petrobrás teria sido comunicada da ocorrência de vazamento no oleoduto da Alemoa, o presidente Shigeaki Ueki determinou que sejam ouvidas todas as pessoas que possuam informações a respeito. Por esse motivo, a comissão interna de inquérito solicita a todos aqueles que prestaram declarações aos órgãos de comunicação que a procurem pessoalmente no terminal de Alemoa, em Cubatão.

"A Petrobrás esclarece ue sua intenção, com este pedido, é, além de apurar responsabilidades, tomar providências, junto com os órgãos envolvidos com o problema, para que episódios como esse jamais se repitam.

"A Petrobrás lamenta informar que, nesta madrugada (ontem) foram encontrados mais seis corpos nos escombros e seis feridos vieram a falecer, totalizando 82 mortos, sendo que 22 pessoas permanecem nos hospitais".

Processo criminal -  As pessoas que deram entrevistas aos jornais e emissoras de televisão, denunciando que o vazamento de gasolina no oleoduto da Petrobrás em Cubatão começou na manhã de sexta-feira, bem antes do incêndio que destruiu parcialmente a Vila Socó, estão sendo convidadas a comparecer ao Fórum e à Delegacia de Polícia. O depoimento desses moradores será básico para instruir o processo criminal, que poderá enquadrar funcionários da Petrobrás, inclusive diretores, em crimes passíveis de um a três anos de detenção.

Quem pediu a investigação do caso, visando apurar quem são os responsáveis, foi o procurador geral da República, Paulo Salvador Frontini, sábado à tarde. Ontem, o curador dos direitos do consumidor e da defesa do meio ambiente, Marcos Ribeiro de Freitas, designado para presidir o processo, fez um apelo aos moradores da Vila Socó, ou São José, para que ajudem a Promotoria. E os depoimentos que estas pessoas prestarem no Fórum ou na Delegacia serão a chave de toda a investigação, segundo o promotor.

Ele acredita que o fato de a Petrobrás ter, em nota oficial, praticamente assumido a responsabilidade pela indenização das vítimas já equivale a uma confissão de culpa. Funcionários e diretores responsáveis pela manutenção dos dutos, do Terminal de Distribuição de Petróleo (Tedep), poderão ser responsabilizados individualmente, enquanto diretores da Petrobrás poderão ser declarados coautores, se for comprovado que houve negligência, omissão ou imprudência.

Os funcionários poderão ser acusados de crime de incêndio (artigo 250 do Código Penal), crime de explosão (artigo 251), com mortalidade culposa, previsto no artigo 258. As penas variam de um a três anos, acrescidas de 1/6 até a metade da pena, porque houve mais de uma morte.

Segundo Marcos Ribeiro de Freitas, que também preside o processo contra a Petrobrás pelo vazamento de três milhões de litros de óleo em Bertioga, o incêndio de sábado em Vila Socó pode ensejar ainda mais dois tipos de ações, além de criminal: no plano civil e no plano administrativo. Na ação civil, os parentes das vítimas poderão reivindicar as indenizações pelas mortes e prejuízos. E no plano administrativo, a Petrobrás será, mais uma vez, responsabilizada por um desastre ecológico.

Cola - Outra grave denúncia foi feita ontem em Cubatão: a Petrobrás estaria usando cola Durepox para fechar os dutos de combustível que apresentavam vazamentos, "quase diários", de Santos a São Bernardo do Campo. O vereador José Fernandes Florentino, do PMDB, disse que recebeu essa informação de funcionários da Petrobrás, traumatizados com o acidente que matou quase 100 pessoas na Vila São José.

"Não posso garantir que isso esteja ocorrendo. Mas os setores responsáveis devem apurar essa possibilidade, porque os acidentes estão sendo muito frequentes. Os funcionários fizeram a denúncia em tom de desabafo, porque estão preocupados com a situação" - diz o vereador Florentino. Lembra que houve seis vazamentos de grandes proporções desde outubro nos dutos da Petrobrás no Estado de São Paulo.

Reunião - Os vazamentos em gasodutos da Petrobrás, como o que provocou o incêndio da Favela da Vila Socó, em Cubatão, serão um dos temas da reunião hoje, na sede da Petrobrás, no Rio, com a participação de todos os superintendentes de terminais e de oleodutos da empresa.

Segundo esclareceu o diretor de Transportes da Petrobrás, almirante Telmo Dutra de Rezende, a reunião tinha sido convocada antes mesmo da tragédia em Cubatão, e tem o objetivo de aperfeiçoar a operação dos terminais e oleodutos, sobretudo quanto aos aspectos de segurança envolvidos nas manobras de carga e descarga de petróleo bruto e seus derivados.

Inspeção - A Petrobrás não tem condições de constatar qualquer vazamento pela falta de integração com a Companhia Docas do Estado de São Paulo, que é responsável por um trecho do oleoduto, que finda no Cais da Alemoa.

Pelo menos foi isso o que quis dizer o presidente da Petrobrás, Shigeaki Ueki, em entrevista concedida logo após a explosão da Vila Socó. Ele explicou que, para se saber com que pressão a gasolina está sendo transferida, há necessidade de uma operação integrada, do início ao fim da linha, ou seja, da Refinaria Presidente Bernardes até o terminal no cais, onde existe um outro medidor. Evidentemente, há uma queda normal de pressão pela distância, mas se ela é anormal, significa que está havendo vazamento.

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Página 2 do jornal Última Hora de 26 de fevereiro de 1984

(Biblioteca Nacional - acesso 21/2/2014)

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Petrobrás acalma Miguel Pereira

Técnicos da Petrobrás, convocados às pressas pelo prefeito José Antônio da Silva, tranquilizaram ontem os moradores da Estância Aleluia, em Miguel Pereira, sobre a existência de novo vazamento no Oleoduto Rio-Belo Horizonte, que corta a cidade. O forte cheiro de gasolina e os sinais de terra molhada, que levaram diversas famílias a abandonar a área com medo de tragédia semelhante à de Cubatão, em São Paulo, não passavam de simples vestígios do vazamento ocorrido no dia 10.

"Não houve nenhum novo vazamento. Podem ficar tranquilos e permanecer em suas casas", garantiu o prefeito às famílias que residem na estância. Os rumores de que estaria ocorrendo outro vazamento começaram a circular de manhã bem cedo, quando a maioria dos moradores acordou com o forte cheiro de gasolina. Nas proximidades do oleoduto, o chão parecia molhado. Impressionados com a tragédia de Cubatão, anteontem, quando um escapamento de gasolina num oleoduto da Petrobrás provocou explosão e incêndio, matando mais de 60 pessoas, os moradores iniciaram uma debandada geral.

Avisado, o prefeito José Antônio imediatamente solicitou à Petrobrás a inspeção do local. Técnicos do órgão, depois de escavações, chegaram à conclusão de que não havia nenhum vazamento e que o cheiro de gasolina e a terra molhada eram apenas resquícios do acidente do dia 10. "Apesar de termos retirado todo o combustível que vazou no dia 10, logicamente deve ter ficado uma pequena quantidade, que se infiltrou no chão. Daí, o susto", comentou José Antônio, ao ler o relatório dos técnicos.

O Oleoduto Rio-Belo Horizonte, com 364 quilômetros de extensão, que liga a Refinaria de Caxias à de Belo Horizonte, foi inaugurado em 1964 e funcionou até 1982, quando foi desativado, motivando o loteamento Estância Aleluia. No dia 10 passado, um vazamento de gasolina que provocou prejuízos à fauna e flora da região, denunciou a reativação do oleoduto pela Petrobrás, decidida uma semana antes. Sobre a quantidade exata do combustível vazado, não se tem informação precisa, mas moradores do loteamento garantem que viram, pelo menos, três caminhões-pipa, cada um com capacidade para 15 mil litros, serem enchidos com a gasolina derramada.

Mesmo jornal, no dia 28 de fevereiro de 1984 (acervo da Biblioteca Nacional, Rio de Janeiro/RJ - acesso em 21/2/2014 - ortografia atualizada nesta transcrição):

Terça-feira, 28 de fevereiro de 1984 - edição 11.218/ano XXXIII:

Petrobrás admite haver outros locais perigosos como Cubatão

Problemas semelhantes aos que causaram a tragédia de Cubatão existem em outras regiões, revelou o presidente da Petrobrás, Shigeaki Ueki, que não especificou tais locais, embora advertindo que a empresa agirá com rigor para evitar futuros desastres. As 1.500 pessoas desabrigadas da Vila Socó - são 550 famílias - serão auxiliadas pela Petrobrás, segundo se anunciou em Cubatão, onde o IML informa que até agora já morreram 88 pessoas.

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Primeira página do jornal Última Hora de 28 de fevereiro de 1984

(Biblioteca Nacional - acesso 21/2/2014)

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Ueki admite que perigo continua

BRASÍLIA - O presidente da Petrobrás, Shigeaki Ueki, disse ontem não afastar a hipótese de culpa da empresa no acidente e Cubatão, onde já chega a 88 o número de mortos, principalmente por não ter sido mais rigorosa na expulsão dos moradores da área, bem como ao permitir que áreas perigosas como aquelas sejam repetidas vezes invadidas. Ueki acrescentou, no entanto, que as falhas não cabem exclusivamente à Petrobrás, mas também às autoridades de outros setores, estaduais e municipais.

Ueki admitiu que existem problemas semelhantes em várias outras regiões, mas não quis especificar os locais, frisando que a empresa passará a agir com mais rigor para evitar a repetição de tragédias. Acrescentou que a Petrobrás não está preocupada com os prejuízos sofridos e sim com a tragédia humana, e para tanto autorizou a indenização dos familiares das vítimas. Ueki frisou não dispor ainda de um levantamento completo da extensão da catástrofe, porque uma comissão especial está efetuando os inquéritos, inclusive com autonomia para a liberação de recursos que sejam solicitados pelo Governo de São Paulo e a Prefeitura de Cubatão.

Shigeaki Ueki lembrou que na área de Cubatão a Petrobrás chegou a aterrar o oleoduto a pedido de autoridades municipais, embora condenando a invasão da área pelos moradores, bem como os melhoramentos urbanos efetuados, também compreensíveis pelo objetivo de melhorar o padrão de vida dos invasores. Há cerca de 10 anos a Petrobrás enfrentou problema semelhante na Bahia, e também não houve a necessária compreensão por parte dos moradores das áreas invadidas e das autoridades, com o objetivo de evitar a consolidação de uma área de moradia onde passavam oleodutos.

A área destruída em Vila Socó, frisou o presidente da Petrobrás, não será reconstruída pela empresa, o Governo de São Paulo, nem a Prefeitura de Cubatão. "Todos os recursos necessários para o tratamento das vítimas serão liberados, e outras invasões devem ser evitadas a todo custo", disse Ueki.

Auxílio - A Petrobrás informa que começará a distribuir amanhã o auxílio financeiro às famílias da Vila São José, em Cubatão, no posto de atendimento que instalou ao lado do Centro Comunitário local.

O cadastramento dos beneficiados, que determinará o valor a ser pago, deverá terminar ao meio dia de hoje. Segundo levantamento feito pela Prefeitura de Cubatão e pelos assistentes sociais da Petrobrás, há cerca de 500 famílias desabrigadas, num total de aproximadamente 1.500 pessoas.

A Petrobrás está aguardando o desenho de casa-padrão, para o início da compra do material destinado à construção de casas para os desabrigados na nova localização na Vila Natal. A Prefeitura de Cubatão solicitou ao Governo do Estado, através da Dersa e DER, o equipamento necessário aos serviços de terraplenagem no lugar onde serão erguidas as casas.

A Petrobrás cedeu ônibus para levar crianças às escolas e trazê-las de volta, e continuou a distribuir alimentos aos desabrigados. Este auxílio continuará pelo tempo necessário. Além disso, a companhia entregou à Prefeitura de Cubatão 10 mil litros de óleo diesel e 10 mil litros de gasolina para a movimentação de seus veículos, empregados em serviços de assistência aos desabrigados.

Bahia - Em Pojuca, na Bahia, atingida por uma tragédia de proporções semelhantes à de Cubatão - quando um trem carregado de gasolina provocou um violento incêndio -, inúmeras famílias reclamam que nada receberam do prometido, nem indenização por seus mortos nem condições de moradia para os que tiveram as casas destruídas. Arlindo Almeida, sobrevivente da tragédia, reclama que a Rede Ferroviária Federal não o indenizou pela morte de seus dois filhos, apesar das promessas.

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Página 2 do jornal Última Hora de 28 de fevereiro de 1984

(Biblioteca Nacional - acesso 21/2/2014)

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Não foi por falta de avisos

Boa parte da população da Baixada Santista está exposta a incêndios e explosões - advertem há muitos anos técnicos e políticos. Assim, as expressões "cidade minada", "Cidade-bomba" e "barril de pólvora" não se aplicam apenas à Cubatão poluída e sofrida. As cidades vizinhas, litorâneas, bonitas, "refúgios" ecológicos de muitos turistas, também parecem assentadas sobre vulcões. Um desses "vulcões" está bem na entrada de Santos, segundo a Cetesb: o terminal da Alemoa.

E o acidente de sábado, ocorrido em Cubatão, apenas reavivou esse medo antigo que às vezes tira o sono dos moradores de Santos, São Vicente e Guarujá. Ainda ontem, muitos bombeiros e técnicos da Cetesb lembravam que, se no momento da explosão houvesse um vento Noroeste, os efeitos do incêndio seriam muito mais aterradores: o Curtume, Vila Nova e outros bairros de Cubatão sucumbiriam envolvidos pelo fogo.

As tubulações de combustíveis da Petrobrás constituem apenas um dos muitos "fatores de risco" dessa região. Os dutos da Petrobrás, sujeitos a novos acidentes, cortam grandes áreas de Cubatão, conforme foi denunciado durante a primeira reunião da comissão nomeada pelo governador Montoro, no sábado. As áreas ameaçadas: Rodovia Piaçaguera-Guarujá, Avenida dos Bandeirantes, Avenida Cruzeiro do Sul, na zona urbana de Cubatão. Fora os núcleos nas encostas também perigosas da serra, sujeitas a deslizamentos de terra: Morro do Piche, Pinhal do Miranda e, em Santos, bem na entrada da cidade, a Alemoa.

Na entrada de Santos, às margens da Rodovia, há outro vulcão que pode explodir a qualquer momento - adverte o gerente regional da Cetesb, Luís Carlos Lencioni Valdez. Trata-se do terminal da Alemoa, onde são armazenados os produtos químicos que são usados em Cubatão. São terminais marítimos da Petrobrás, da Dibal, de muitas indústrias, que ali mantêm grandes silos com líquidos a granel.

Além de todo perigo em potencial, a área tem o agravante de só ter um acesso para o trânsito de caminhões, o viaduto novo construído na Anchieta. O trânsito é congestionado permanentemente, por caminhões transportando os líquidos perigosos. As ruas são intransitáveis, sem calçamento. E o mais grave, segundo a Cetesb, é que a Prefeitura, intimada desde 1981 a fazer a drenagem da área, ainda não tomou providências.

"Sem drenagem, a Cetesb não pode obrigar as indústrias a fazer o controle da poluição. Os produtos químicos provenientes da limpeza dos tanques e do transbordo de material acabam extravasando para as ruas. E como não há escoamento de águas pluviais, esses produtos perigosos acabam nos mangues".

Advertência - O ministro das Minas e Energia, César Cals, disse ontem que o Governo do Estado de São Paulo ignorou as seguidas advertências da Petrobrás pedindo a retirada das pessoas que moravam na área do oleoduto em Cubatão e que, ao invés de serem retiradas, aquelas famílias foram fixadas na área, recebendo luz elétrica e escolas.

Cals disse que a última advertência da Petrobrás tinha sido feita em dezembro de 1983 e aparentemente não foi levada em consideração. Segundo o ministro das Minas e Energia, a Petrobrás não estaria assumindo a culpa pelo acidente quando se dispôs a pagar indenização às vítimas. Ele disse que não se pode deixar estas pessoas que sofreram tanto sem reparação. A Petrobrás, sendo uma empresa rica, pagará e, depois que o inquérito apontar os responsáveis pela catástrofe, eles deverão acertar com a estatal.

Pensão - O ministro da Previdência e Assistência Social, Jarbas Passarinho, disse ontem em Brasília que a Previdência Social garantirá às vítimas da explosão de Vila Socó, em Cubatão (SP), seus direitos como pensionistas, incluindo reabilitação profissional àqueles que pelas consequências do acidente não puderem mais exercer suas profissões.

Passarinho lamentou os acontecimentos ocorridos em Cubatão, onde a explosão causada por vazamento de gasolina do oleoduto da Petrobrás provocou mais de 80 mortes. Comentou que é difícil avaliar as causas da explosão, lembrando que a população sabia do vazamento de gasolina. Por outro lado, a tragédia poderia ter sido evitada mediante maior fiscalização, e acrescentou: "Todo somos responsáveis".

Cadastramento - No Centro Esportivo da Prefeitura, onde estão provisoriamente instaladas as 1.472 pessoas que perderam suas casas no incêndio de sábado, uma comissão da Petrobrás chamava através de um alto-falante os nomes de cada chefe de família, para o cadastramento dos pertences perdidos. A casa própria, o fogão, a cama, os pequenos objetos eram aos poucos lembrados um a um para o cálculo posterior da indenização a ser paga àqueles que perderam tudo, mas que pelo menos não perderam a vida.

No segundo dia depois da tragédia, o Centro Esportivo era palco de um espetáculo ambíguo. As arquibancadas estavam ocupadas por objetos e pessoas coloridas, que se moviam ruidosamente, enquanto as  inúmeras crianças corriam de um lado para outro, como se fosse tudo uma grande festa. O assunto, entretanto, em cada canto, mesmo na boca dos pequenos, era um só: a morte, a perda, o horror.

LBA - A presidente da Legião Brasileira de Assistência (LBA), Léa Leal, esteve no município paulista de Cubatão, visitando as vítimas do incêndio ocorrido no último fim de semana.

Na oportunidade, Léa Leal manteve reunião com o prefeito de Cubatão, Oswaldo Passarelli, e colocou a LBA à disposição da Prefeitura Municipal no atendimento aos sobreviventes do incêndio. Léa Leal anunciou, entre outras medidas de auxílio da LBA, a instalação de crianças em creches e centros sociais, reconstrução da Vila São José e cadastramento de seus moradores.

Mudança - BRASÍLIA - O presidente do Banco Nacional da Habitação, Nélson da Mata, prometeu, ontem, promover a construção, no prazo de 30 dias, a partir da conclusão dos trabalhos de terraplenagem dos terrenos, de 523 casas para a população desabrigada de Vila Socó. Ele disse que mandou um funcionário do banco para Cubatão e que, depois de dispor de todos os dados técnicos, vai avaliar a possibilidade de realizar a transferência integral da Vila Socó para a área designada pela Prefeitura da cidade.

Nélson da Matta definiu como projeto de emergência a construção do novo conjunto habitacional, que deverá ser financiado para os moradores com base no Promorar, uma linha de crédito do BNH na qual o mutuário paga prestações equivalentes a um máximo de 10% do valor do salário mínimo.

As acusações entre as autoridades prosseguiram na edição seguinte do jornal carioca Última Hora, na quarta-feira, 29 de fevereiro de 1984 (acervo da Biblioteca Nacional, Rio de Janeiro/RJ - acesso em 21/2/2014 - ortografia atualizada nesta transcrição):

Quarta-feira, 29 de fevereiro de 1984 - edição 11.219/ano XXXIII:

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Página 2 do jornal Última Hora de 29 de fevereiro de 1984

(Biblioteca Nacional - acesso 21/2/2014)

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Socó: Cals tenta culpar Montoro

SÃO PAULO - O ministro César Cals, das Minas e Energia, disse ontem em São Paulo que "era previsível" a tragédia ocorrida na Vila Socó, em Cubatão, mas atribuiu a responsabilidade do acidente ao Poder Público estadual, "que se tem descuidado no policiamento para impedir a invasão de terras existentes ao longo de oleodutos da Petrobrás".

O ministro garantiu que a Petrobrás alertou inúmeras vezes o Governo paulista - a última em dezembro passado - sobre o perigo que corriam os moradores daquela vila e não foi tomada nenhuma providência para evacuar o local.

"De qualquer forma" - acrescentou César Cals -, "acho que a Petrobrás agiu corretamente ao se preocupar em primeiro lugar com a situação das vítimas da Vila Socó, evitando discutir quem foi culpado pelo acidente. Depois disso, vamos apurar as responsabilidades".

César Cals chegou ontem de Brasília para despachos com empresários e visita a indústrias, devendo seguir amanhã cedo para Piracicaba. De lá, viajará no final da tarde para o Rio de Janeiro.

A presidente da LBA Léa Leal, seguindo orientação do ministro Jarbas Passarinho, esteve ontem em Cubatão visitando os desabrigados que se encontram alojados no Centro Esportivo Castelo Branco e determinou providências para que sejam fornecidas as segundas vias dos documentos de todos aqueles que os perderam no incêndio que praticamente destruiu a Vila Socó. A Legião integrou-se ao trabalho assistencial da Prefeitura de Cubatão e da Petrobrás. A segunda via dos documentos é muito importante, porque, sem a documentação em ordem, os desabrigados não podem receber a doação das moradias prometidas, nem os benefícios do INPS.

Léa Leal enviou recomendação a todas as superintendências estaduais da Legião para que façam pesquisas junto aos cartórios que tornem possível um rápido fornecimento dessas suas vias, já que, na maioria, os moradores da vila atingida pelo incêndio são pessoas vindas do Norte e Nordeste do País para São Paulo. O atendimento será feito através do Programa de Legalização do Homem Brasileiro, que, na atual administração da LBA, de 1979 até hoje, forneceu existência legal a 8 milhões e 943 mil pessoas em todo o País, na grande maioria crianças, que não possuíam sequer certidão de nascimento.

A Legião Brasileira de Assistência, para facilitar o trabalho de suas superintendências estaduais, especialmente as do Norte e Nordeste, enviará os respectivos atestados de pobreza e as fotografias dos desabrigados, para que o cadastramento e a expedição dos novos documentos sejam feitos o mais rapidamente possível.

Após acentuar que a LBA sempre procura socorrer os carentes em situações de emergência, como nas campanhas SOS-Sul, ajudando as vítimas das enchentes, e Nordeste Urgente, está ajudando as vítimas das secas, a sra. Léa Leal manteve contato, ontem, com o prefeito de Cubatão, José Osvaldo Passarelli, colocando os serviços e a técnica da LBA à disposição da Prefeitura e das pessoas atingidas pelo incêndio.

Hoje de manhã, Léa Leal receberá na sede da Legião, em São Paulo, uma comitiva chilena de técnicas da área social, fazendo uma exposição sobre os trabalhos que a LBA efetua no campo do desenvolvimento social.

Na edição de 1º de março de 1984, a tragédia continuava sendo destacada, com um comunicado da Petrobrás na capa e noticiário na página 2 do jornal carioca Última Hora (acervo da Biblioteca Nacional, Rio de Janeiro/RJ - acesso em 21/2/2014 - ortografia atualizada nesta transcrição):

Quinta-feira, 1 de março de 1984 - edição 11.220/ano XXXIII:

Comunicado Petrobrás

A Petrobrás reage energicamente contra a multa que a Cetesb lhe aplicou, sob a alegação de que não foi notificada, imediatamente, da ocorrência do vazamento em Cubatão. Dela recorrerá a Petrobrás, na forma de direito e para a manutenção do propósito elevado que deve orientar as decisões de tal natureza, especialmente quando elas se prestam a um sensacionalismo sob todos os aspectos condenável - como é o presente caso, quando se procura interpretar a penalidade como imputação formal de culpa, quando ela se refere exclusivamente à não-informação imediata do vazamento.

O recurso cabe plenamente, já que a multa foi aplicada precipitadamente, tirando-se partido do clima emocional criado pela tragédia para se procurar atingir uma instituição de conceito mundial, sem levar em conta que não houve a comunicação imediata por uma simples razão: o acidente verificou-se de madrugada, fora do horário administrativo e todo pessoal operacional da companhia se voltou para o socorro às vítimas, que, evidentemente, era o mais importante naquele momento.

Este foi um trágico acidente no qual todos nós estamos envolvidos, direta ou indiretamente. Diante do grande número de vítimas, a Petrobrás, juntamente com outros órgãos, não teve nenhuma outra preocupação senão prestar a maior, melhor e mais rápida assistência possível para socorrê-las. Providenciamos o atendimento de feridos, fornecemos alimentação aos desabrigados e ônibus para levar seus filhos à escola e vamos dar aos sem-teto as casas de que eles precisam, a serem erguidas em local situado fora da zona de segurança antes ocupada.

A atitude da Petrobrás em relação à tragédia de Cubatão ficou evidente desde o primeiro momento: uma firme atitude de ajuda às vítimas e de desejo de pleno esclarecimento do acontecido. Para apurar as causas do acidente, a companhia instituiu uma comissão de inquérito administrativo, e foi seu presidente quem solicitou ao excelentíssimo senhor governador de São Paulo que fosse instaurado inquérito policial para apurar responsabilidades.

Ainda é necessário um grande esforço conjunto para socorrer as vítimas e tomar uma série de providências para evitar a repetição de acidentes tão trágicos. A Petrobrás lamenta que a Cetesb divulgue com tanto destaque uma medida puramente administrativa, dando ensejo a um prejulgamento injusto e inaceitável. As duas comissões de inquérito prosseguem os seus trabalhos e devemos todos aguardar as conclusões. Confiemos nas autoridades e nos técnicos altamente responsáveis que compõem as duas comissões - a administrativa e a policial.

Petrobrás

Ministério das Minas e Energia

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Primeira página do jornal Última Hora de 1 de março de 1984

(Biblioteca Nacional - acesso 21/2/2014)

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Pás de cal no cenário da tragédia

SANTOS - Vinte e quatro toneladas de cal virgem, a granel, começaram a ser espalhadas, ontem, sobre os escombros de Vila Socó e sob as casas que ainda restaram do incêndio. Essa foi a primeira providência tomada pela comissão designada pelo governador do Estado para acompanhar os trabalhos de socorro às vítimas de Cubatão, depois que os moradores denunciaram a presença de mau cheiro, principalmente com a brisa da madrugada.

De acordo com o engenheiro Fernando Fantini Filho, da Cetesb, encarregado da operação, trata-se de um pré-tratamento do mangue, com aplicação de cal virgem sobre a água e nas margens, com a finalidade de evitar e prevenir a presença de vírus de origem orgânica. Ele explicou que é a mesma cal usada na limpeza de poços e com essa mesma finalidade está sendo aplicada em Vila Socó.

Refinaria volta a funcionar

SÃO JOSÉ DOS CAMPOS - A unidade de tratamento de óleo diesel da refinaria da Petrobrás em São José dos Campos voltou a funcionar somente na madrugada de ontem, após ficar paralisada durante aproximadamente 30 horas, devido a um incêndio propagado por volta das 18 horas de segunda-feira. O superintendente da refinaria, engenheiro Flávio Chaves, explicou que o acidente ocorreu devido ao corte imprevisto de energia elétrica por parte da Eletropaulo. O fogo foi debelado em menos de 10 minutos. Não causou vítimas, mas os moradores do Bairro Vista Verde, nas proximidades da refinaria, ficaram em pânico, temendo a repetição do acidente ocorrido em 1981, quando um vazamento de gás causou a morte de nove funcionários. O engenheiro Chaves, contudo, argumentou: "Não podemos classificar a anomalia de incêndio, mas de um acidente sem maiores consequências".

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Página 2 do jornal Última Hora de 1 de março de 1984

(Biblioteca Nacional - acesso 21/2/2014)

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