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HISTÓRIAS E LENDAS DE BERTIOGA - BIBLIOTECA NM - HIDRELÉTRICA/100º
O pioneirismo de Itatinga (4-d)

Texto publicado no jornal santista A Tribuna, em 10 de outubro de 2010, na revista especial Itatinga 100 Anos, páginas 16 a 29:

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Itatinga 100 Anos

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Foto: Du Zuppani, publicada com a matéria, páginas 16 e 17

Uma rainha inglesa em plena Mata Atlântica

Qual é o estilo arquitetônico que predomina na Vila de Itatinga? Aqui, como em outros pontos que cercam a história desse empreendimento, ainda residem dúvidas

Para a arquiteta Ana Luísa Howard Castilho, autora do livro Itatinga - a Hidrelétrica e seu Legado (Editora Neotropica), a falta de documentos dificulta a análise. "É muito comum as pessoas se referirem ao local como uma vila inglesa. Todavia, certos aspectos me levam a ver certa influência norte-americana. Eduardo Guinle, por exemplo, era representante da General Electric no Brasil. Se o modelo é inglês, não era para a Inglaterra e sim para as colônias".

Para o também arquiteto Nelson Antonio Portéro Junior, esses traços norte-americanos também podem ser vistos na Vila de Paranapiacaba - peça chave para implantação da ferrovia Santos-Jundiaí, que levaria a produção cafeeira até o Porto de Santos.

Vitória - Ele acredita que o estilo vitoriano é a principal característica arquitetônica que marca a Vila de Itatinga, sua usina e as construções anexas.

O termo faz referência à Rainha Vitória, que governou a Inglaterra por 63 anos, sete meses e dois dias, de 1837 até a sua morte, em 1901.

Hoje, Itatinga seria um dos poucos exemplos que ainda restam no Brasil desse estilo. Entre 2002 e 2003, Portéro fez um amplo levantamento do patrimônio histórico-arquitetônico de Itatinga. Nesse trabalho, ele conseguiu resgatar uma série de detalhes e procedimentos construtivos típicos daquela época.


A arquitetura da Vila seria um dos poucos exemplos no País do estilo vitoriano
Fotos publicadas com a matéria, páginas 18 a 20

Pinho de riga - De acordo com o pesquisador, uma parcela significativa dos materiais usados nas edificações foi importada da Inglaterra. É o caso, por exemplo, da madeira pinho de riga, termo que faz referência à região de Riga, hoje capital da Letônia.

Essa madeira, de excelente qualidade e durabilidade, deu origem à maioria das 70 casas da Vila de Itatinga.

Elas foram pré-fabricadas na Europa e trazidas para o Brasil em navios a vapor, até Santos, de onde seguiram em chatas até o pequeno porto da futura usina, no Rio Itapanhaú, em Bertioga.

"Não houve uma adaptação às condições climáticas de um país tropica. Eles trouxeram o que havia pronto na Inglaterra da época", explica Portéro.

Neve nos telhados tripicais - É por isso que boa parte dos telhados tem um caimento entre 40 e 45 graus. Serviam para escoar a neve. "O normal, nas nossas condições, são inclinações inferiores a 30 graus".

O padrão das casas é simples, baseado em um projeto que atendia às necessidades expansionistas de uma Inglaterra em pleno auge econômico e político. Eram robustas, fáceis de transportar e montar.

Em Itatinga há dois tipos de residência. As mais modernas são de alvenaria e as mais antigas têm paredes de pinho de riga. Todas, porém, foram assentadas sobre pilotis (pilares ou colunas) de pedra, fazendo com que ostentem uma escadinha de acesso, em frente à porta principal.

"O objetivo era tornar o ambiente o mais saudável possível. Por isso, toda a base das casas era feita sem contato direto com o solo", explica Portéro.

A espera de uma locomotiva - Um detalhe particularmente interessante é a pequena arquibancada construída em frente ao campo do Itatinga Atlético Clube. A estrutura segue um modelo usado nas estações de trem - é alta e sem pilares, como se uma locomotiva fosse ali parar.

No estudo, o arquiteto também se preocupou em analisar o projeto de todo o complexo. Segundo ele, o planejamento demonstra que todas as edificações mais importantes, ocupadas por funcionários de chefia, como os engenheiros, foram instaladas nas proximidades da Casa de Força, onde se localizam as turbinas alemãs e os geradores ingleses.

Desse ponto, correndo em paralelo à estrada de ferro que sai do porto e vai até a Casa de Força, foram erguidas as moradias que dariam origem à Vila.

Já a Casa de Força, a Câmara D'água e a Captação (a 765 metros de altitude) foram construídas em pedras, retiradas desse trecho do alto da Serra do Mar.

Tombamento - A Casa de Força, a maior estrutura de Itatinga, assemelha-se a uma igreja. Seu formato é de uma letra 'T', com paredes grossas - cerca de um metro de largura.

Internamente, o edifício guarda preciosidades como os azulejos hidráulicos que revestem todo o piso, corrimões dourados, escadas em caracol e até um precursor dos modernos interfones, para que as pessoas pudessem se comunicar com quem estava no segundo pavimento.

Por essas e outras características, Nelson Portéro acredita que Itatinga reúne todas as condições para ser considerado um patrimônio histórico passível de tombamento.

Segundo o Conselho de Defesa do Patrimônio Histórico, Arqueológico, Artístico e Turístico (Condephaat), o órgão subordinado à Secretaria da Cultura do Estado de São Paulo, Itatinga já possui um processo de tombamento em andamento na Unidade de Preservação do Patrimônio Histórico.

Eco-parque - O trabalho, realizado por um historiador e um arquiteto da Secretaria, foi retomado recentemente, e encontra-se na fase de pesquisa e recolhimento de dados. As características apontadas pelo estudo devem servir para nortear as decisões do Condephaat.

O órgão ressalta, no entanto, que por estar em estudo de tombamento, a Usina Hidrelétrica de Itatinga já se encontra protegida pelo Condephaat. Ela pode ser reformada, por exemplo, mas os eventuais projetos devem ser submetidos à prévia aprovação do Conselho, assim como a mudança de uso do imóvel. Tudo para impedir que ele seja descaracterizado ou destruído.

Para Portéro, o futuro de Itatinga pode estar ligado à exploração turística da área. "Vejo o local como um eco-parque, tanto pelas suas características arquitetônicas únicas como pela exuberante natureza que cerca a área. É um patrimônio inigualável sobre vários aspectos, um exemplo vivo de um importante período da história do Brasil".


Corrimões impecavelmente dourados e escadas em caracol são originais da construção
Foto publicada com a matéria, páginas 22 e 23

Amor e luto

A Inglaterra do século 19 era a maior potência econômica do mundo. Berço da Revolução Industrial, seus costumes influenciaram a cultura de várias nações, inclusive do Brasil.

Nesse sentido, os mais de 60 anos de reinado da rainha Vitória foram cruciais na exportação desse modelo econômico, político, cultural e social. Batizada com o nome Alexandrina Vitória, a rainha do Reino Unido subiu ao trono em 1837. Em fevereiro de 1840, casou-se com o príncipe Albert, que era seu primo.

O parentesco pode levar a crer que se tratou de uma união artificial, muito típica entre soberanos europeus, cujos matrimônios tinham mais interesses políticos do que sociais. Porém, na verdade, o casamento da rainha Vitória é um raro caso de amor. Foi ela que pediu o príncipe em casamento, em uma cerimônia que passou para a história como a primeira vez em que uma noiva usou um véu.

Albert, com 42 anos, morreu em 1861, mudando por completo o comportamento da regente do trono inglês. Vitória, a partir de então, tornou-se conhecida como a Viúva de Windsor, uma mulher reclusa, que se manteve de luto e usou tão somente roupas pretas até sua morte, em 1901, quando chegou ao fim a chamada Era Vitoriana. Foi sucedida por seu filho, o futuro rei Eduardo VII.


Rainha Vitória
Foto publicada com a matéria, página 23


Arquibancada segue modelo usado nas estações de trem
Foto publicada com a matéria, página 24


ITATINGA - UMA USINA A FIO D'ÁGUA

A Usina Hidrelétrica de Itatinga, inaugurada em 10 de outubro de 1910, funciona em três etapas. A primeira é a captação, a quase 800 metros acima do nível do mar. Em seguida vem a Câmara D'água, onde se localizam as válvulas que controlam a vazão do líquido, que desce 640 metros por meio de cinco tubulações paralelas até alcançar a Casa de Força - que abriga as turbinas e os geradores. Acompanhem, no infográfico, todos os detalhes desse processo

Última Moradia - a 850 m de altitude fica a casa de Itatinga mais distante da Casa de Força

A USINA COMEÇA AQUi:  A CAPTAÇÃO: A Hidroelétrica de Itatinga capta a água direto do rio, em um ponto onde uma pequena curva forma a cachoeira Gaffrée, a 765 metros acima do nível do mar. Por isso, ela é chamada de usina a fio d'água, pois aproveita a força da correnteza do rio sem precisar barragem para estocá-la, como em Itaipu, por exemplo

DECANTAÇÃO - Cerca de 300 metros depois da captação, a água passa por um tanque, onde sua velocidade é reduzida e ocorre a decantação da areia presente na água

TÚNEL - Do ponto onde é captada, a água segue por cerca de 3 km, dos quais 940 metros em forma de túnel escavado na rocha até a Câmara D1água

A TUBULAÇÃO - começa com diâmetro d e900 milímetros, terminando com 110 milímetros já dentro da Casa de Força

POSTOS DE APOIO - Ao longo das tubulações, foram instaladas moradias. Os funcionários eram responsáveis pela manutenção dos tubos e da linha férrea

 CÂMARA D'ÁGUA - Aqui existem dois reservatórios com capacidade total de 700 mil litros. Là ficam as cinco válvulas que controlam a vazão

 DESCENDO PELO CANO - Desse ponto, a água desce 640 metros por meio de cinco linhas de tubos paralelos, de aço fundido, cada um com 6 metros de comprimento, totalizando 2.034 metros

CANAL DE FUGA - A potência nominal da usina de 15 MW, correspondendo à vazão de 3.300 mil litros por segundo do Rio Itatinga, que nasce no Parque das Neblinas e deságua na margem direita do Rio Itapanhaú, em Bertioga

DA USINA AO PORTO - O transporte da energia já produzida, depois de passar pelas turbinas, é feito de Bertioga a Santos por meio de fios e torres


[1] Cachoeira Gaffrée, o desvio de água do Rio Itatinga, onde a produção da energia começa


[2] Detalhe das comportas que regulam a vazão da câmara d1água em direção à casa de força


[3] O conjunto de tubulações paralelas que guia a água por mais de 2 quilômetros


[4] Vista da Casa de Força a partir do bonde funicular, no início da subida


[5] Na Casa de Força, as turbinas são da Voith (Alemanha) e os geradores da General Electric (EUA)


[6] Itatinga teve três locomotivas a vapor. A última delas, Itapema, foi desativada há cerca de cinco anos


POR ÁGUA ABAIXO - Os tubos ficam mais estreitos quanto mais se aproximam das turbinas. isso é feito para aumentar a pressão da água. A vazão é de 3.200 litros por segundo - 640 l/s por tubulação, que são presas umas às outras por meio de 2.200 juntas vedadas com chumbo derretido. Além delas, 64 maciços de ancoragem feitos de pedra com argamassa, sustentando os tubos


FIM DA LINHA? - Da casa de Força, as linhas de transmissão seguem por 30 quilômetros até a margem esquerda (Guarujá) do Porto de Santos. Lá, torres de 90 metros de altura levam a energia para o lado santista, em um vão livre de 520 metros


No detalhe, caderno de anotações do engenheiro Guilherme B. Weinschenck

Fotos publicadas com a matéria, páginas 26 e 27

Infográfico: Bruno Arena     -     Imagem de satélite: Google     -     Fotos: Du Zuppani