Clique aqui para voltar à página inicialhttp://www.novomilenio.inf.br/baixada/bslivros08a82.htm
Última modificação em (mês/dia/ano/horário): 08/04/13 20:55:47
Clique aqui para voltar à página inicial de Baixada Santista

BAIXADA SANTISTA - LIVROS - Docas de Santos
Capítulo 82

Clique aqui para ir ao índicePublicada em 1936 pela Typographia do Jornal do Commercio - Rodrigues & C., do Rio de Janeiro - mesma cidade onde tinha sede a então poderosa Companhia Docas de Santos (CDS), que construiu o porto de Santos e empresta seu nome ao título, esta obra de Helio Lobo, em 700 páginas, tem como título Docas de Santos - Suas Origens, Lutas e Realizações.

O exemplar pertencente à Biblioteca Pública Alberto Sousa, de Santos/SP, pertenceu ao jornalista Francisco Azevedo (criador da coluna Porto & Mar do jornal santista A Tribuna), e foi cedido a Novo Milênio para digitalização, em maio de 2010, através da bibliotecária Bettina Maura Nogueira de Sá, sendo em seguida transferido para o acervo da Fundação Arquivo e Memória de Santos. Assim, Novo Milênio apresenta nestas páginas a primeira edição digital integral da obra (ortografia atualizada nesta transcrição) - páginas 648 a 660:

Leva para a página anterior

Docas de Santos

Suas origens, lutas e realizações

Helio Lobo

Leva para a página anterior

SEXTA PARTE (1926-1935)

Capítulo LXXXII

Pleitos vencedores

Noutros dois pontos teve também a empresa, durante o decênio, razão cabal e final: a interpretação que sempre deu aos melhoramentos do porto, como base à uniformidade legal do Brasil em tal matéria, e, também, a vitória em vários pleitos judiciais e fiscais que se arrastavam desde os anos anteriores. Deixando o primeiro caso para o capítulo seguinte, daremos resumo neste do ocorrido quanto ao segundo.

Conforme se viu em tempo, defendia-se a empresa em dois executivos fiscais, pela elevação de seu capital em 1897 e 1918. No decênio em curso foi ela ainda intimada a pagar nova soma e multa pelo aumento de seu capital, realizado em 1929. Tendo tido ganho de causa no segundo, e estando já de posse da carta de sentença para reaver a soma depositada, foi a empresa vencedora no primeiro (Supremo Tribunal Federal, sessão de 19 de agosto de 1932
[31] confirmando-se o acórdão de 7 de outubro seguinte [32]. Referiu-se a isso o Relatório da Diretoria de 1935:

Esta causa foi decidida, em grau de apelação, pela Corte Suprema, na sua sessão de 27 de julho.

Tratava-se de uma ação executiva fiscal, promovida numa das varas federais desta Capital, pela Fazenda Nacional, contra a Companhia Docas de Santos, para cobrança da importância de 3.000:000$000 (três mil contos de réis), a título de imposto de dividendo pelo aumento do capital da Companhia, levado a efeito em 1918, de 60 mil contos de réis, para 120 mil contos de réis, pela valorização, regularmente verificada, dos bens do seu patrimônio; e para a cobrança também da multa de réis 5:000$000, por suposta infração do Regulamento n. 13.051, de 5 de junho de 1918.

A Fazenda Nacional embargou aquela decisão. Os seus embargos já foram impugnados em tempo pela Companhia e sustentados pela embargante Fazenda Nacional. Atualmente, os autos, com o visto já do relator, estão em revisão entre os demais juízes da turma revisora, devendo ditos embargos ser julgados pelas Câmaras Reunidas da Corte Suprema, desde que fique completa a revisão do feito.

Com relação ao terceiro, a Companhia (29 de agosto de 1929) apresentou à Recebedoria do Distrito Federal guia para pagar Rs. 80:000$000 sobre o aumento de seu capital deliberado em assembleia de 25 de março desse ano e verificado em 10 de setembro seguinte. Não quis a Recebedoria receber essa importância, sob o fundamento de que a guia não estava selada ou o requerimento, pelo que voltou a Companhia em 2 de setembro para declarar que não estava sujeito a nenhum selo, nem mesmo esse de 80:000$000 sobre o aumento de capital, que deixava de pagar.

O diretor da Recebedoria não atendeu, pelo que a Companhia (30 de outubro) recorreu para o ministro. Esse recurso foi julgado pelo Primeiro Conselho de Contribuintes como perempto. Não se conformado, pediu a Companhia reconsideração ao mesmo Conselho, que, em sessão de 25 de junho de 1935, afinal tomou conhecimento do recurso, dando-lhe inteiro provimento para reconhecer a Companhia isenta do pagamento do selo sobre o aumento do capital, inclusive o da petição. A questão depende de recurso para o Ministério da fazenda.

Quanto aos pleitos judiciais, julgou-se um, originado no decênio, o do navio Coronel, afundado no canal da barra com o Denderah. Sobre esses naufrágios, disse o Relatório de 1932:

Continuam naufragados na barra o vapor alemão Denderah, e no porto, junto ao cais, em frente ao armazém n. 2, o vapor nacional Coronel.

O primeiro, afundado por colisão com um vapor do Lloyd Brasileiro, exatamente sobre o banco da barra, está prejudicando, consideravelmente, a entrada do porto, devido à situação em que ficou e ao crescimento do nível do banco, que já perdeu, em profundidade, cerca de 70 centímetros.

O segundo rouba ao cais cerca de 50 metros de extensão utilizável para atracação de vapores e, constituindo um obstáculo às correntes de maré, é causa de assoreamento.

É diferente nossa legislação sobre a matéria e, inevitavelmente, morosa a ação das autoridades no sentido de libertar os portos e suas vias de acesso desses obstáculos à navegação e à livre ação das correntes. A diretoria tem tomado todas as providências a seu alcance, para corrigir a situação. É lamentável que ainda não tenha sido possível remover os dois cascos e que, em breve, seja necessária despesa vultuosa para assegurar a profundidade na barra, cujo aterramento já está causando apreensões.

Intentou o proprietário do Coronel ação de indenização superior a 700 contos de réis contra a Companhia, sem resultado. Houve também uma ação de indenização, no valor de cerca de 12 contos [33].

Na cobrança fiscal de cerca de 74.000 contos assim concluía, em 1924, o recurso da Companhia ao ministro da Fazenda:

Perdoe v. excia. a extensão deste trabalho, que não foi possível abreviar, atenta à natureza do caso, o primeiro em que os agentes do fisco nacional querem obrigar uma empresa de obras públicas a pagar uma soma impossível, a fantástica soma de 74.834:414$525.

Por mais que a recorrente procurasse moeda para isso, não a encontraria.

Quer dizer que está decretada a expropriação violenta, ilegal, incrível das obras de melhoramentos do porto de Santos, que passaria para um condomínio entre a Fazenda Nacional, o denunciante e os exatores fiscais.

De 124.127:309$500 tinha passado para 74.834:414$525, soma ainda assim fantástica, que ficou em 1.478:046$055 e, afinal, em 14:567$400, que era o balanço que devia pagar a companhia antes da isenção e do que havia pago em excesso entre 1904 (quando foi concedida a mesma isenção) e 1907 (quando suspendeu o pagamento que, por inadvertência, ia fazendo).

Estas tinham sido as razões da decisão do referido Conselho de Contribuintes (Diario Official, 30 de março de 1935):

Quanto aos preliminares:

Em 1920, em representações feitas por escriturário do Tesouro e encaminhadas à Recebedoria, foi a Companhia Docas de Santos acusada de não haver pago o imposto de selo sobre ações e debêntures ao portador, por ela emitidas, nos anos de 1893 a 1919. Intimada a apresentar defesa, alegou a recorrente (fls. 16 a 25) gozar da isenção do pagamento de quaisquer impostos federais, por força da lei número 1.145, de 31 de dezembro de 1903, artigo 19, e termo de acordo firmado em 29 de janeiro de 1904, aditivo ao seu contrato de 14 de novembro de 1892.

Ouvido o autor das representações, feito o exame nos livros da Companhia e organizadas as demonstrações de fls. 146 a 155, proferiu o diretor da Recebedoria decisão de fls., condenando a recorrente ao pagamento de 1.478:946$055 e mais revalidações e multa.

Dessa decisão foi interposto recurso no prazo legal para o sr. ministro da Fazenda, vindo o processo a este Conselho, de acordo com o decreto n. 20.475, de 1931.

Funda-se a decisão recorrida no que dispunha o artigo 3º da lei número 25, de 30 de dezembro de 1891, que orçou a receita para 1892, assim redigido:

"As diretorias dos bancos, companhias e sociedades anônimas descontarão dos dividendos distribuídos e juros pagos aos respectivos acionistas e portadores de debêntures ao portador que serão recolhidos ao Tesouro Nacional, dentro de quinze dias do anúncio do pagamento dos mesmos dividendos e juros".

Considerou a Recebedoria em vigor esse dispositivo até dezembro de 1919, por entendê-lo de caráter permanente, apesar de não reproduzido nas leis orçamentárias subsequentes; e como contribuintes diretos do imposto os acionistas e debenturistas, sendo a Companhia simples coletora do mesmo.

Toda a questão gira em torno dessas duas teses.

Nas longas razões do seu recurso refuta a recorrente os fundamentos da decisão da recebedoria, renovando, com maior amplitude, os argumentos de defesa, apoiando as suas conclusões em acórdãos do Supremo Tribunal, em diversos regulamentos de selo e várias decisões administrativas.

Com relação ao mérito da questão:

Considerando, quanto à alegada vigência do artigo 3º da lei de 1891, que esse dispositivo "dizia respeito, fora de dúvida, à receita", conforme acentua o consultor da Fazenda, no seu parecer a fls. 266, e assim sendo, para que continuasse em vigor, indispensável seria a sua reprodução na lei n. 126-A, de 21 de novembro de 1892, que orçou a receita para 1893 e nas subsequentes, o que não se verificou; e

Considerando que: "As leis que estabelecem o orçamento da receita e da despesa foram, no período do Império, e são, no da República, rigorosamente anuais" (parecer do ministro Didimo da Veiga, publicado em folheto, em fevereiro de 1924, sobre questão idêntica);

Ainda mais: Considerando que: "A tradição jurídica revelada em toda a nossa legislação financeira confirma esse conceito (da anualidade orçamentária) desde que, para poderem as leis do orçamento reger relações que perdurem além do período anual, que é o tempo de duração de tais leis, têm estas estabelecidos preceitos restauradores dos dispositivos que pretendem revalidar, emprestando-lhe vida além do período de duração do orçamento" (trecho da obra Ensaios de Sciencia das Finanças e Economia Politica, do ministro Didimo da Veiga, transcrito pelo ilustrado representante da Fazenda, dr. Sá Filho, no recurso que interpôs da decisão deste Conselho, constante do acórdão n. 618, recurso publicado no Diario Official de 15 de abril de 1933, pág. 7.509, para o fim de demonstrar que o artigo 19 da lei n.1.145, de 30 de dezembro de 1903, era um dispositivo orçamentário de caráter ânuo, não mais em vigor por não haver sido revigorado na lei subsequente número 1.313, de 30 de dezembro de 1904, tendo o sr. ministro da Fazenda, na parte em que deu provimento a esse recurso, ratificado implicitamente esse argumento no despacho que proferiu.

Ainda:

Considerando que o mesmo autor, ministro Didimo da Veiga, na obra citada, à pág. 112, acentua que: "O orçamento é uma lei formal, constitucional e cientificamente anual; não contém dispositivos, por sua natureza, permanentes; os seus preceitos se protraem somente além do exercício financeiro, quando revalidados, ou por força de preceito geral restaurador das injunções das leis anteriores, ou em virtude de dispositivos especiais revigorando determinados preceitos".

Considerando assim que tais preceitos só têm validade além do período da duração do orçamento quando revigorados por lei expressa, orçamentária ou não, e isso mesmo acaba de reconhecer o Governo Provisório, que revigorou o parágrafo 9º do artigo 3º da lei orçamentária n. 2.919, de 31 de dezembro de 1914, por não haver sido reproduzido nas leis subsequentes, justificando esse ato com argumentos que sufragam a boa doutrina sustentada pelo ex-presidente do Tribunal de Contas e esposada pelo digno representante da Fazenda, dr. Sá Filho, no recurso acima referido, argumentos esses assim expostos: "Decreto número 22.393, de 25 de janeiro de 1933; declara que continua em vigor o disposto na 1ª parte do parágrafo 9º, do artigo 3º, da lei n. 2.919, de 31 de dezembro de 1914.

Considerando que esse decreto-lei, com caráter declaratório, dissipa as dúvidas e controvérsias sobre o assunto, e deixa bem patente a necessidade do revigoramento dos dispositivos de tal natureza; mas,

Considerando que, quando permanente fosse o citado dispositivo, nem por isso estaria a recorrente obrigada ao pagamento do imposto, na importância exigida, visto como goza ela da isenção do pagamento de todos os impostos federais, estaduais e municipais nos termos da lei n. 1.145, de 31 de dezembro de 1903, artigo 19; do decreto n. 4.228, de 6 de novembro de 1901, cláusula 25ª; da lei n. 813, de 23 de dezembro de 1901, artigo 14, e pelo estipulado em aditivo firmado pelo governo e a recorrente, em 29 de janeiro de 1904, ao contrato de 19 de novembro de 1892, dispositivos esses citados na ordem n. 287, de 22 de maio de 1907, dirigida à Delegacia Fiscal em São Paulo e transcrita no parecer do doutor consultor da Fazenda, a fls. 283, cujas conclusões são favoráveis à recorrente; por outro lado,

Por fim:

Considerando que o fato de recair o tributo sobre os acionistas ou debenturistas, e não sobre a Companhia, conforme opina a Recebedoria, é questão soberanamente resolvida pelo Supremo Tribunal Federal, que no acórdão n. 2.596, de 19 de abril de 1922, publicado no Diario Official, de 4 de julho do mesmo ano, proferiu na ação sumária proposta pela Companhia Luz Stearica, assim decidiu: "Acórdão negar provimento à apelação e confirmar a sentença apelada, que julgou a ação improcedente, porquanto o imposto sobre a renda sob a forma de imposto sobre os dividendos recai sobre os acionistas, considerados individualmente, e é completamente diverso da tributação de 300 réis por ação ao portador, que recaiu diretamente sobre a Companhia, e assim não o bis in idem".

Considerando que não colhe a alegação de haver sido esse acórdão proferido em espécie, porquanto o artigo 101 do decreto n. 7.751, de 23 de dezembro de 1909, determina que: "nos processos de recursos administrativos, os pareceres indicarão os precedentes que a jurisprudência das repartições houver estabelecido, e a que o Poder Judiciário tiver consagrado em julgados proferidos em casos que houverem constituído objeto da ação do artigo 13 da lei n. 221, de 20 de novembro de 1904";

Considerando que a jurisprudência firmada nesse acordo nada inovou, e antes reiterou o que já dispunham os regulamentos expedidos para a arrecadação do selo, nos anos de 1893, 1897 e 1900, os quais taxavam diretamente as companhias, e estas pagavam o imposto no seu próprio nome, e incorriam na multa do decreto n. 115-A, de 29 de novembro de 189, se não o pagassem, o que torna evidente que a incidência legal do tributo era sobre as companhias emissoras de tais títulos (decretos ns. 1.264, de 1893, artigos 24, n. 1, letra b e 31; 2.573, de 1897, artigo 28, n. 1, letra a; 3.564, de 1900, artigo 39, circular n. 12, de 20 de fevereiro de 1892, e aviso n. 39 da mesma data, do ministro da Fazenda);

Considerando, porém, que a isenção, de que goza a recorrente, somente lhe foi outorgada pelo contrato de 29 de janeiro de 1904, fundado na lei n. 1.145, de 31 de dezembro de 1892, e aviso n. 39 da mesma data, sendo, conseguintemente, devido o imposto referente ao período anterior.

Acordam os membros do Conselho de Contribuintes, por maioria de votos, dar em parte provimento ao recurso, para mandar cobrar somente o imposto devido sobre os debêntures dos anos de 1893 a 1903 aos quais a recorrente não gozava da isenção e que se eleva a 14:567$400, conforme a demonstração de fls. 148 a 149.

Conselho de Contribuintes, em 14 de julho de 1934. – Malaquias dos Santos, presidente. – José Augusto Alves, relator designado para o acórdão. – Vencido: - Alberto Marques, relator, com declaração de voto.

Mas foi na questão das capatazias, quer na sua existência legal, quer na de sua redução por ato unilateral da União, que a vitória foi total e definitiva. Aquela pode-se dizer que se vinha prolongando desde a inauguração do cais; e constituiu o motivo maior de impugnação por parte de S. Paulo. A segunda, nem por ser mais recente, constituiu menos fonte de ataques violentos à Companhia.

Foi a 30 de outubro de 1930 que julgou o Supremo Tribunal Federal, em grau de apelação, os embargos opostos por R. Alves de Toledo & C. e outros da decisão do juiz de 1ª Instância, que reconheceu à Companhia o direito às capatazias; apelante, ela também, da parte da mesma sentença que lhe negou direito à não redução das mesmas capatazias depois de 1916, conforme vimos. A sentença foi unânime no primeiro caso, tendo no segundo contrário o voto de um juiz.

Disse o corpo da sentença, entre outras considerações e depois de fazer o histórico da questão:

O ponto central desta lide é o saber se a ré tem o direito de cobrar não só a taxa de carga e descarga, como a de capatazias.

Sustentam os autores que, de acordo com a lei n. 1.746 de 1869, que autorizou o Governo a contratar a construção de docas e armazéns, nos diferentes portos do país, e a cláusula V do decreto de concessão n. 9.979 de 1888, o direito da ré está limitado a cobrar as seguintes taxas, pelos serviços prestados:

1) pela carga e descarga de mercadorias, em seu cais, exceto os objetos de grande volume e pouco peso – um real, por quilo;

2) pela carga e descarga daqueles objetos – três reais, por quilo;

3) por dia e por mero linear de cais, ocupado por navio a vapor – setecentos réis;

4) por dia e por metro linear de cais, ocupado por navios não movidos a vapor – quinhentos réis;

5) por mês ou fração de mês e por quilo de mercadoria ou qualquer outro gênero que houver sido, efetivamente, recolhido aos seus armazéns – dois reais.

A taxa de capatazias, que ela cobra, além das mencionadas, sustentam os autores, é indevida, estando ela incluída na de carga e descarga e tendo ambas o mesmo objeto, isto é, a retribuição do serviço prestado no embarque e desembarque de mercadorias e outras coisas conduzidas por água ou destinadas a ser assim conduzidas.

As contribuições decorrentes da concessão são contratuais, e, na falta de sua fixação, sob a forma contratual, a de capatazias não poderia ser cobrada, ou esta se reveste da feição extracontratual, e, observado o critério da sua percepção, consoante se arrecadava nas alfândegas, não se pode negar o aspecto variável a que estão sujeitas, não colhendo o argumento de que, tolerando a sua elevação, foi o Estado se vinculando à impossibilidade de as reduzir, na vigência de tal regime.

Mas não procedia essa argumentação:

Não têm razão os autores.

Desde a lei n. 1.746 de 1869, que rege os contratos para a construção de docas e armazéns, o serviço de capatazias foi sempre reputado uma coisa à parte e distinta das taxas destinadas à amortização do capital, empregado pelos concessionários naquela construção, e ao pagamento dos respectivos juros.

Refere-se àquelas taxas o artigo 1º, parágrafo 5º, da lei citada, nos seguintes termos:

"Os empresários poderão perceber, pelos serviços prestados em seus estabelecimentos, taxas reguladas por uma tarifa proposta pelos empresários e aprovada pelo Governo Imperial. Essa tarifa será revista, de cinco em cinco anos, mas a redução geral das taxas somente poderá ter lugar quando os lucros líquidos da empresa excederem de 12%.

Que naquelas taxas não se incluíram as de capatazias, de que ora se trata, deixa claro o parágrafo 7º, do mesmo artigo, que torna facultativo ao Governo encarregar às companhias de docas o serviço das capatazias e armazéns das alfândegas, sendo então reguladas por atos especiais da administração as relações da companhia com os funcionários incumbidos da percepção dos impostos aduaneiros.

Como se vê, em face da lei de 1869, a concessão podia ser feita, e o serviço das capatazias e armazéns continuar a ser efetuado, como dantes, pela administração pública, de modo que tal serviço nada tinha de comum com a concessão e com as taxas criadas para a amortização do capital empregado pelos concessionários e para o pagamento dos juros respectivos.

Lembrando que do edital de concorrência fora excluído aquele serviço e que do relatório Saboia e Silva ficou "bem claro que o mesmo serviço continuaria a ser feito pelo Governo, depois da concessão, para que ele chamara concorrentes", escreveu o acórdão:

Como se vê, o relatório a que alude, especialmente, o edital de concorrência, reputa a taxa de carga e descarga, como a de atracação, destinada à amortização do capital e ao pagamento do rjuro, sem nada ter de comum com a contribuição do serviço de embarque e desembarque, de guindastes e outros acessórios, que a Alfândega continuaria a fazer.

Segundo a exposição do engenheiro Saboia, pois, o que constituía objeto da concessão, como remuneratório do capital que no serviço deveria ser empregado, eram as taxas de carga e descarga e de atracação, coisas essas inteiramente distintas do serviço de capatazias, que se entendia, então, devia continuar a ser feito pelas repartições aduaneiras.

Portanto, o que os concorrentes ficaram sabendo, pelo edital, foi que esse último serviço não se incluiria na concessão, e que as taxas de carga e descarga não abrangiam as de capatazias.

Tanto mais quanto não se podiam confundir as duas taxas, carga e descarga e capatazias:

Na apelação n. 3.827, o juiz as discriminou, com exatidão.

A primeira é cobrada do navio, pela simples utilização do cais, para a carga e descarga das mercadorias que recebe ou entrega, em remuneração das despesas feitas com a dragagem e a desobstrução do porto, para o franco acesso a ele.

A segunda é a taxa que paga o dono ou consignatário da mercadoria, embarcada ou desembarcada pelo pessoal da empresa e com o auxílio de suas máquinas e aparelhos.

É a taxa que se paga, diz aquele juiz, em todos os portos do Brasil, em remuneração do serviço prestado pelo pessoal e material, guindastes e vagões, das alfândegas ou companhias concessionárias dos cais, com a braçagem e movimentação das mercadorias, desde o seu recebimento até a sua entrega nas portas externas dos armazéns e depósitos, e vice-versa, depois de feito o despacho aduaneiro, a arrumação dos volumes nos armazéns e depósitos e a sua abertura e consecutivo fechamento para a conferência das mercadorias.

Assim foi entendido o contrato pelas partes contratantes.

Depois de examinar essa interpretação na linguagem oficial, por nós citada atrás, a definição de capatazias, sua aplicação a todos os portos da República:

A ré, pois, e a administração pública, na inteligência do contrato que concluíram, de acórdão com a lei, sempre reputaram taxas inteiramente distintas e destinadas a retribuições de serviços diferentes – a taxa de carga e descarga e a taxa de capatazias.

Essa prática dos contratantes, no interpretar as cláusulas de sua convenção, é o mais precioso subsídio para a respectiva inteligência, é, no dizer de Ruy Barbosa, um elemento considerável de elucidação jurídica, e poderá ter, muitas vezes, a mais decisiva importância, ora contribuindo para esclarecer os pontos indecisos, ora dissipando, a respeito deles, toda a obscuridade.

Por isso, diz o brocardo: Quisque suorum verborum optimus interpres.

É precisamente essa a regra do artigo 131, n. III, do Código Comercial, assim concebida:

"O fato dos contraentes, posterior ao contrato, que tiver relação com o objeto principal, será a melhor explicação da vontade que as partes tiveram no ato da celebração do mesmo contrato".

Por fim, quanto ao despacho sobre água:

Não é preciso, para a cobrança da taxas das capatazias, que as mercadorias sejam levadas para os entrepostos ou armazéns da alfândega, a fim de se verificarem a sua conferência e despacho. As mercadorias podem ser conferidas e despachadas sobre água ou a bordo da própria embarcação, e pagam as respectivas taxas, sempre que, para o seu desembarque e transporte, são utilizados os serviços do pessoal e material das capatazias.

A lei n. 1.313 de 30 de dezembro de 1904, em seu artigo 19, é terminante a respeito:

"Nos portos em que há ou venha a haver obras de cais, dragagem ou outras, concedidas ou executadas por contrato ou administração, nos termos da lei n. 1.746, de 13 de outubro de 1869 e decreto n. 4.859 de 8 de junho de 1903, nenhuma mercadoria, seja qual for a sua natureza ou destino, que entre pela barra, poderá ser desembarcada, sem transitar por aqueles cais ou obras, sujeita sempre ao pagamento das taxas respectivas. Esta disposição se aplica, nos mesmos termos e em todos os casos, às mercadorias a embarcar".

Sobre as mercadorias, pois, que os autores despacharam a bordo, eram devidas as taxas de capatazias, de vez que foram descarregadas, como não podiam deixar de ser, no cais da ré, que fez o serviço de desembarque, com seu pessoal, aparelhos e máquinas, como se vê do documento de folhas 1.204.

Com relação à redução depois de 1916, não foi menos decisiva a palavra do Tribunal. Só Bento de Faria assinou neste ponto vencido.

Citando as disposições da lei n. 3.070-A, de 31 de dezembro de 1915, assim decidiu o acórdão:

Desses dispositivos resulta – e nem podia deixar de ser assim – que a redução somente poderia vigorar para as empresas que tivessem contrato com o Governo, tendo em vista as respectivas cláusulas e mediante acordo com os concessionários.

O que cumpre saber, pois, é se a apelante tinha acordado com o Governo qualquer coisa a respeito das taxas de capatazias, quando aquela lei entrou em vigor.

A ré, ora apelante, confessou que a taxa remuneratória dos serviços das capatazias não figurou no contrato da concessão, tendo sido, porém, objeto de uma proposta que fez o Governo, para que iniciara, em seu estabelecimento, o serviço de carga e descarga de mercadorias.

Declarou então o Governo, por ato de 28 de julho de 1892, que, "conquanto ainda não se achasse a empresa no caso de executar o serviço das capatazias, por não estarem montados os seus guindastes, podia ser concedida a autorização por ela pedida para cobrar as taxas de capatazias que a Alfândega de Santos arrecadava, mas somente das mercadorias que não fossem recolhidas à mesma Alfândega".

Mais:

Este regime provisório, assim estabelecido, tornou-se definitivo no ano seguinte.

É assim que o decreto n. 1.286, de 17 de fevereiro de 1893, aprovando o regulamento da ré, ora apelante, em seu artigo 20, após a fixação de diversas taxas, dispôs o seguinte, na terceira alínea:

"A armazenagem e capatazias que não forem cobradas pela Alfândega e pertencerem à Companhia serão cobradas de acordo com as que estão ou forem cobradas pela Alfândega de Santos".

Segundo esse dispositivo, portanto, as taxas de capatazias que a ré podia cobrar eram as que, na mesma ocasião, percebia a Alfândega de Santos, podendo, sem dúvida, variar, se as dessa Alfândega sofressem alguma modificação.

Sobre esse ponto é expresso o preceito regulamentar "de acordo com as que estão ou forem cobradas pela Alfândega de Santos".

Desde que, porém, o serviço das capatazias passou a ser feito exclusivamente pela ré,tanto que para isso ficou aparelhada, deixando de fazê-lo aquela Alfândega, e desde que nada se acertou sobre as respectivas taxas, segue-se que elas ficaram fixadas nas que estava cobrando o mesmo departamento aduaneiro,quando o serviço foi dele transportado, total e definitivamente, para as atribuições e deveres assumidos pela ré.

Concluindo:

Como se vê, as taxas de capatazias tornaram-se contratuais, mediante acordo das partes posterior à concessão e fixadas nas que a Alfândega cobrava, na ocasião em que o serviço passou a ser feito pela ré, de sorte que não poderiam mais variar ou diminuir, pela razão simples e intuitiva de ser impossível variarem, daí em diante, as que lhe serviam de paradigma.

Qualquer modificação, pois, que as taxas, mais tarde, sofressem, nas outras alfândegas da República, nenhuma repercussão poderia ter nas cobradas pela ré, porque as desta eram, unicamente, as que, em determinada ocasião, percebia a Alfândega de Santos, segundo o preceito regulamentar citado, que passou a ser uma cláusula adicional da concessão.

A redução, pois, introduzida pela lei n. 3.070-A, de 31 de dezembro de 1915, para as taxas das capatazias das alfândegas do país, somente poderia vigorar para a ré mediante acordo entre ela e o Governo, o qual, por sua vez, somente em um caso poderia impor a diminuição: quando se provasse excederem de 12 por cento os lucros líquidos da empresa.

Fora desse caso, a redução dependeria do acordo entre os contratantes, e os direitos resultantes do contrato escapam, segundo mandamento constitucional, à ação de qualquer lei posterior à sua aquisição.

Mas, como não se provou o excesso, previsto no contrato, de lucros líquidos, assim como que tenha sido a redução avençada entre as partes contratantes, ficou inoperante para as taxas da ré a modificação introduzida pela citada lei n. 3.070-A, quanto às taxas de capatazias nas alfândegas da República e nos portos melhorados por empresas particulares.

Não são, portanto, procedentes os fundamentos da sentença apelada, quanto à redução das taxas.

Pelo exposto, acordam negar provimento à apelação dos autores e dá-lo à ré, julgando, in totum, a ação improcedente. Paguem as custas os segundos apelantes.

Assinavam o acórdão os ministros Godofredo Cunha, presidente; Arthur Ribeiro, relator; Edmundo Lins, vencedor, com voto em separado; Muniz Barreto, com a ressalva referida, isto é, vencido quanto à possibilidade de redução das taxas; Geminiano da Franca, Cardoso Ribeiro, vencedor com voto em separado; Soriano de Souza; Pedro Mibielli e Hermenegildo de Barros, este de acordo com o voto que havia proferido na apelação do Amazonas entre a Manaus Harbour e J. G. Araujo. Era, pois, um acórdão unânime, que bem compensava a empresa de tanta oposição áspera, no seu quase meio século de existência.

Os dois votos vencedores, em separado, mais acentuaram o pensamento do acórdão. O de Cardoso Ribeiro tinha estas palavras ao referir os precedentes em favor da taxa:

Esses fatos assinalam, irrecusavelmente, a distinção legal e administrativa das duas taxas de cobrança de carga e descarga e de capatazias.

Consequentemente, a sentença não contém engano nesse particular e somente declarou o que já existia objetiva e subjetivamente.

Todos os atos governamentais posteriores, aprovando até 1919, ano anterior ao da propositura da ação, as contas da Companhia Docas, são outros tantos demonstrativos de que as taxas de cobrança formadoras de sua renda bruta, também definida por meio de um decreto, eram legítimas. Vários decretos foram expedidos regulando a matéria. Os autos o mostram. Reclamações foram feitas. Homens de governo que, sem favor, sem lisonja, mesmo porque quase todos já desapareceram do cenário da vida, podem ser colocados entre os nossos varões de Plutarco, indeferiram, desprezaram essas reclamações.

Floriano, Prudente, Campos Salles, Rodrigues Alves, Affonso Penna, Bernardino de Campos, Serzedello Corrêa, Joaquim Murtinho, David Campista, Leopoldo Bulhões, entre eles quatro nomes queridos de S. Paulo, todos o escol das administrações, prestigiaram sempre, na apreciação dos trabalhos e na interpretação do contrato das Docas de Santos, a cobrança de taxas que ela fazia. É desautorizada, pois, a conclusão dos autores, embora se apoie na palavra de Ruy Barbosa, de que "a cobrança das capatazias só se explica por erros inconcebíveis ou graças ilegítimas dos governos".

E quanto à sua redução, depois de citar também a lei n. 3.070-A, de 31 de dezembro de 1915:

E o Poder Executivo, aprovando, posteriormente a 1915, como consta dos autos, as contas da Companhia apelante, não deixou dúvida alguma de como entendeu a autorização, isto é, "respeitando os contratos", o que ficara clara e perfeitamente resolvido na emenda do Senado, fundamentada com o discurso do relator da receita, o sr. Leopoldo Bulhões, em sessão de 29 de dezembro de 1915, publicada no Diario do Congresso, de 1º de janeiro de 1916, fls. 255, resumo às fls. 1.308 v., discurso que tem este final expressivo:

"Com as Docas de Santos entrei em luta quando ministro da Fazenda, mas ela se submeteu à lei. Nunca tive motivos para atacá-las e elas nunca precisaram da minha defesa.

"Defendendo tarifas de capatazias que são aplicadas em todos os portos do Brasil, aponto as dificuldades e os prejuízos que poderão provir da uniformização que se pretende fazer das taxas estabelecidas para o porto do Rio de Janeiro".

Parece-me, em conclusão, que procede a apelação da Companhia Docas e deve ser provida para que o Poder Judiciário considere irredutíveis as taxas de capatazias por ela cobradas em conformidade com o decreto n. 7.578, de 4 de outubro de 1909, como já o fizeram os dois outros Poderes, quanto lhes competiu examinar o assunto.

No seu voto, Edmundo Lins examinou a definição de taxa de capatazias, carga e descarga, mostrando sua aplicação legal (taxas diferentes, por serviços diferentes, tal como mais de uma vez se viu atrás), estudando-a, texto por texto, nos outros portos do Brasil. E concluiu:

Ora, se, em todos os portos do Brasil, nos quais há concessão de docas, são dois serviços diferentes, pagos por taxas diferentes, a saber: o de capatazias e o de carga e descarga, assim também deve ser no porto de Santos, mormente quando quase todos os contratos posteriores se modelaram pelo que foi celebrado com a ré, ao qual, a respeito, expressamente se referem.

Além disto, foi a administração que invariavelmente assim decidiu:

Todos os Governos têm reconhecido o direito da ré a essas duas taxas. Assim é que, depois dos seis pareceres que se encontram às fls. 837 a 884, todos fundamentados, decidiu o ministro da Fazenda, dr. Bernardino de Campos, que não procedia a reclamação que lhe fora apresentada contra a ré, por estar cobrando a taxa de carga e descarga e a de capatazias (fls.873-884).

Assim também, e também depois de seis pareceres fundamentados, o decidiu o dr. David Campista (3º vol., fls. 886 e 887). Foi ainda o que, a 25 de julho de 1907, o conselheiro Affonso Penna informou ao Senado Federal, justificando, com a citação das respectivas leis, a cobrança, pela ré, das taxas de atracação, armazenagem, carga, descarga, capatazias, estiva de vagões e seu transporte (3º vol., fls. 893-895).

Ora, as concessões de serviços públicos de que terceiros terão de se utilizar, como a feita à ré, são contratos que, a favor dos mesmos terceiros, faz o poder público.

Quanto à redução da taxa por ato unilateral da União, não procedia um dos motivos da Companhia – o de que concordou com a elevação em 1896 mas não podia sofrer sem consenso sua diminuição porque "as taxas alfandegárias como parte integrante do orçamento da receita, podem variar cada ano, se assim o entender o Poder Legislativo, salvo se o contrário se convencionar expressamente".

Temos, porém, argumento mais decisivo – a declaração solene da própria ré e feito pelo mesmo jurisconsulto que, com tanto brilho, a patrocina nesta causa, isto é, que as taxas de capatazias não estão compreendidas no artigo 1º, § 5º, da lei n. 1.746 de 1869.

Esta declaração foi feita perante a Justiça Federal, quando se levantou a questão do exame de livros da ré.

Eis o que, tratando, exatamente, das taxas de capatazias, escreveu s. excia.:

"As taxas de capatazias não são destinadas a remunerar o capital da empresa ré, mas unicamente o respectivo serviço.

"Estas taxas não estão sujeitas à revisão quinquenal de que trata o artigo 1º, § 5º, da lei n. 1.746, de 13 de outubro de 1869.

"Este ponto está solvido pelo próprio Governo no Aviso n. 159, de 14 de junho de 1892". (C. de Mendonça, A Exhibição dos Livros da Companhia Docas de Santos, São Paulo, Tipografia Cardoso Filho & C., Rua Direita n. 35, pág. 113).

Procedia, porém, a outra razão de que "a Companhia convencionou, depois, com o Governo Nilo Peçanha, a irredutibilidade dessa taxa, que estava então cobrando, até que seus lucros líquidos excedessem de 12%":

Efetivamente, depois de estatuir, na cláusula primeira, que será considerada renda bruta da Companhia Docas de Santos a soma de todas as rendas, ordinárias ou extraordinárias, eventuais ou acessórias, que forem recolhidas, e depois de, na cláusula segunda, declarar o que se considerará despesa da Companhia, reza a cláusula terceira: "Fica fixada a quota de 40% da renda bruta, definida na cláusula primeira, para as despesas especificadas na cláusula segunda, e a quota de 60% da mesma renda bruta, como representativa da renda líquida da Companhia, para remuneração do capital empregado pela mesma, nos termos da cláusula quinta, até o limite máximo marcado no parágrafo quinto do artigo primeiro do decreto n. 1.746, de 13 de outubro de 1869".

Ex-vi desse decreto, a Companhia firmou um contrato com o Governo, a 25 de outubro de 1909, para cuja cláusula terceira transplantou, ipsis verbis, a cláusula terceira supra transcrita, tendo sido o contrato registrado no Tribunal de Contas.

Ora, o único limite máximo, marcado no parágrafo quinto do artigo 1º do decreto n. 1.746 supra citado, é o concernente aos 12% de lucros líquidos para poder o Governo, sem acordo com a Companhia, fazer a redução geral das taxas por ela percebidas.

Procedeu bem o Governo, ao celebrar esse contrato, ou, ao contrário, procedeu mal?

Ao Poder Judiciário falece, in totum, competência para decidi-lo.

Por fim:

Em conclusão:

1º) A taxa de capatazias era, até o Governo Affonso Penna, a alfandegária; porque assim a ré havia contratado; mas

2º) Do Governo Nilo Peçanha em diante, essa taxa alfandegária contratual tornou-se fixa e irredutível; porque, igualmente, a ré o contratou com esse Governo; ou, por outras palavras, a taxa que a ré então cobrava, deixou de ser a alfandegária e tornou-se contratual;

3º) Sendo, assim, irredutível essa taxa contratual, não pode ter sido reduzida pela lei n. 3.070-A, de 1915, como o pretendem os autores;

4º) Finalmente, nem foi intenção do legislador fazê-lo, como não fez o Governo até hoje;

5º Esses atos administrativos devem ser cumpridos pelo Poder Judiciário enquanto não forem anulados pela ação competente;

6º) Esta ação, se for por acaso proposta, deverá ser julgada improcedente, por serem ditos atos plenamente válidos, visto se fundarem em lei expressa.

7º) Impõe-se, consequentemente, o provimento da apelação da ré, para ser julgada, in totum, improcedente a ação
[34].

Foram julgados os embargos a 3 de outubro de 1930, quando se havia declarado a revolução. Estava enfermo, às portas da morte que veio logo depois, J. X. Carvalho de Mendonça. Substituiu-o Raul Fernandes, escrita e verbalmente, perante o Tribunal.

Uma das folhas cariocas aludiu levemente, no atropelo dos acontecimentos que se precipitavam, ao calor da acusação; mas havia passado o período agudo.

A exposição escrita, em cerca de 150 páginas impressas, os argumentos velhos que alinhou, os novos que produziu, eram a garantia de que não voltaria o Tribunal atrás. E não voltou. Quem quiser tomar conhecimento da questão, em seus pormenores, não tem senão que consultar esse memorial de Raul Fernandes, no qual a limpidez da exposição corre parelha com a solidez da argumentação
[35].

Por acórdão de 11 de agosto de 1932, confirmou o Supremo Tribunal Federal essa sentença
[36]. Referiu o Relatório da Diretoria de 1933:

É-nos grato noticiar aos senhores acionistas que foram julgadas definitivamente, pelo Supremo Tribunal Federal, a favor da Companhia, duas causas, importantes não só pelo vulto das quantias que nelas eram reclamadas, mas também porque, envolvendo questões de princípio sobre cobrança de taxas e pagamento de impostos, eram suscetíveis de repercussão prejudicialíssima, forçando-nos a restituições e pagamentos avultados e diminuindo no futuro a receita.

Tais foram as apelações n. 3.763 (apelantes Rodrigues Alves, Toledo & C. e outros, sobre a cobrança da taxa de capatazia) e n. 5.843 (apelante a Companhia e apelada a Fazenda Nacional, sobre imposto de dividendos pelo aumento de capital efetuado em 1897).

Também foi julgada improcedente, por sentença do juiz da 1ª Vara Federal do Distrito Federal, a ação de indenização intentada pelo proprietário do vapor Coronel, naufragado no porto de Santos.

Inauguração do monumento a Candido Gaffrée e Eduardo P. Guinle (1934)

Foto: reprodução da página 650-a


[31] 5.843 – Apelação cível. D. Federal. Acórdão. Vistos e examinados estes autos de apelação cível, do Distrito Federal, em que são apelantes a Comp. Docas de Santos e apelada a Fazenda Nacional, acórdão dar provimento ao recurso para absolver a recorrente, condenando a recorrida nas custas. I – O executivo foi intentado, para a Companhia Docas de Santos ser compelida a pagar o imposto e multa de aumento de capital, no valor de 600 contos. A ré defendeu-se, alegando que, na ocasião em que o seu capital foi aumentado, a tributação sobre os lucros das sociedades anônimas era regida pela lei 428, de 10 de setembro de 1896, que somente taxava os dividendos; e que o regulamento dessa lei, em que a autora se baseia, ampliando a tributação, era inconstitucional, conforme decisões da justiça. O juiz julgou o pedido procedente, desprezando a defesa. Houve apelação. O sr. ministro procurador geral opinou pela confirmação da sentença. II – A sentença é reformada e a ré absolvida. O aumento do capital deu-se em 1897; e, nessa época, o imposto que ora é exigido, estava adstrito aos dividendos. O regulamento que ampliou a lei 428, de 10 de dezembro de 1896, e que tem a data de 22 de julho de 1897, nessa parte, era manifestamente inconstitucional. Somente depois dessa época vieram leis tributando, tanto os dividendos, como outros produtos de ações que favoreciam aos acionistas; essas leis, porém, não podem ter efeito retroativo para alcançar o objeto desta causa. Rio de Janeiro, 19 de agosto de 1932. – E. Lins, presidente. – Hermenegildo de Barros. As assembleias gerais, em que foi resolvido o aumento de capital da apelante, foram celebradas em 18 e 27 de setembro e 6 de outubro de 1897. A Fazenda Nacional pretende tributar o ato, não de acordo com a legislação vigente na ocasião, mas de acordo com a lei posterior, que não pode ser aplicada com efeito retroativo. Com esse fundamento do acórdão, dou também provimento à apelação para julgar a ação improcedente. Aliás, eu a julgaria improcedente ainda por outro fundamento, qual o aduzido por mim ou outras apelações, como a de n. 3.966 da Companhia Morro da Mina.

[32] 5.843. D. Federal – Embargos. – Acórdão. – Vistos e examinados estes autos de embargos cíveis, em que são embargantes a Fazenda Nacional e embargada a Companhia Docas de Santos, acórdão rejeitar in limine os embargos, condenando a embargante nas custas. A matéria já foi tratada na decisão recorrida. É matéria velha. Os embargos não são relevantes. Rio de Janeiro, 7 de outubro de 1932. – Hermenegildo de Barros, presidente. – F. Whitacker, relator.

[33] "Tratava-se de uma ação ordinária promovida numa das varas federais desta Capital, por Americo Martins Junior & C., contra a Companhia Docas de Santos, para a cobrança da importância de 11:920$500, de pretendida diferença verificada de 7.947 quilos em uns amarrados com ferro (275) em barra, despachados na Alfândega de Santos, entrados pelo vapor Servian Prince, procedente de Nova York, em 13 de julho de 1920.

"Essa decisão, que foi unânime, deu provimento, mas apenas em parte, à apelação da Companhia, para condenar esta ao pagamento, não da importância pedida e dada como já liquidada, de onze contos e tanto, mas da importância que fosse liquidada na execução.

"Por se tratar de decisão unânime, a Companhia entrou em acordo com os autores, pagando a estes, por saldo principal, juros da mora e custas, a importância em dinheiro contado de Rs. 18:000$000, obrigando-se os mesmos autores a desistir da ação". Relatório da Diretoria, 1935.

[34] R. Alves de Toledo & C. e outros embargaram o acórdão. A. S. Paulo Tramway Light and Power C. se absteve, porém, de usar desse recurso. Ver também: Supremo Tribunal Federal. Apelação Cível n. 3.763. Distrito Federal. Taxa de Capatazia. Brevíssimo memorial da Companhia Docas de Santos. Rio de Janeiro. Tipografia do Jornal do Commercio, Rodrigues & C., 1930.

[35] Ver: Supremo Tribunal Federal. Embargos na Apelação Cível n. 3.763 (Distrito Federal). Embargantes: R. Alves Toledo & C. e outros. Embargada: A Companhia Docas de Santos. Memorial da Embargada pelo advogado Raul Fernandes. Rio de Janeiro. Tipografia do Jornal do Commercio, Rodrigues & C., 1931.

[36] Supremo Tribunal Federal. Apelação Cível n. 3.763. Apelantes: a Companhia Docas de Santos e R. Alves de Toledo & C. Apelados: os mesmos. – Vistos, relatados e discutidos estes autos de apelação civil do Distrito Federal, em que são embargantes R. Alves Toledo & C. e embargada a Companhia docas de Santos. Acórdão rejeitar os embargos opostos ao acórdão de fls. 1.349, que confirmam, de acordo com as notas taquigráficas retro. Paguem os embargantes as custas. Supremo Tribunal Federal, 11 de agosto de 1932. – E. Lins, presidente. – A. Ribeiro, relator.