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Última modificação em (mês/dia/ano/horário): 03/26/09 11:05:46

 

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NOTÍCIAS 2009

Adjetivos definem a crise

Luciano Valente para Scritta

No último dia 19, a economista Míriam Leitão, em sua participação diária no programa da rádio CBN, comentou a decisão do Banco Central brasileiro de reduzir a taxa de juros em 1,5%, passando, assim, a ser de 12,5% ao ano — ainda uma das mais altas do mundo. O novo índice foi definido pelo Comitê de Política Monetária do mesmo banco. No entanto, mais do que o número, Míriam chamou a atenção para as expressões brandas com que o Banco Central define o atual cenário da economia.

A ata da reunião do Copom usa expressões como "desaceleração do crescimento", "sinais de estresse no mercado financeiro" e "cenários contracionistas" para definir o momento por que passamos. Para Míriam, o Banco Central brasileiro destoa dos seus pares em outros países do mundo, que usam expressões muito mais fortes, como "a maior crise dos últimos 80 anos", "mercados enlouquecidos" e "grande recessão".

Como a maior parte dos relatórios econômicos, a ata do Copom tem uma linguagem própria, expressões que se repetem e que têm um significado específico. "Cenário benigno para inflação cria espaço para flexibilização de política monetária", pode ser traduzido por: "A inflação tende a cair, o que abre espaço para redução dos juros". Como Míriam sentenciou, "Eles preferem falar assim do que falar em português".

Mais adiante na ata, o Banco fala em "desaceleração do crescimento". A economista mais uma vez considera a expressão um eufemismo, pois a redução de um índice de 6,4% para 3% só pode ser definida como queda e não uma simples desaceleração.

Linguisticamente, essas definições brandas por parte do Banco Central brasileiro vão ao encontro das frases do presidente Lula sobre a crise. Esses eufemismos, ou essa visão otimista do cenário macroeconômico global, contribuem bastante para os resultados das recentes pesquisas de opinião, em que o brasileiro não se mostra profundamente preocupado com a crise.

Como tudo no mundo, a crise é definida pela linguagem. As expressões usadas nos discursos da mídia e das pessoas mostram suas visões desse cenário. É importante que se esteja ciente de como essa linguagem deve ser trabalhada para que ela reflita uma real opinião. Lula já afirmou em uma entrevista polêmica que o médico não pode dizer ao paciente que ele "sifú", e sim animá-lo para o tratamento. Independentemente de concordar ou não com o vocabulário de nosso presidente, ele demonstra um poder de compreensão do uso da linguagem e tenta usá-la de acordo com seu interesse político, tentando evitar incertezas, desmotivação e até pânico na população. Num ambiente de crise, saber usar a linguagem a seu favor é sempre inteligente.


Fonte: www.scrittaonline.com.br