Clique aqui para voltar à página inicial  http://www.novomilenio.inf.br/ano00/0004b017.htm
Última modificação em (mês/dia/ano/horário): 04/18/00 21:54:14
Vida de cachorro 

Mário Persona (*)
Colaborador

Um cão vive em média quinze anos. Não é muito, se comparado ao tempo de vida dos humanos. Quando um ser humano ainda não sabe discernir a mão esquerda da direita, o cachorro já está em idade de se reproduzir. A Internet é canina em sua cronologia. Seu relógio bate mais rápido que toco de cauda de cachorro contente. Mas sua vida não é curta como a do cão. Neste aspecto a Internet está mais para gato. Tem sete vidas.

Na cronologia do ciberespaço, eu diria que a Internet está passando hoje pela puberdade. Uma idade crítica, quando o corpo nem sempre obedece aos comandos do cérebro. É desajeitada, como quem cresceu rápido demais. E põe crescimento nisso! Tentar contar o número de usuários de Internet hoje é tão complicado quanto inventariar uma criação de coelhos.

A adolescência da Internet tem gerado alguns contratempos, principalmente para quem aposta todas as suas fichas em negócios que não passam de um rosto bonito na Web. Uma Miss de baile de debutantes, dessas que diz que leu "O Pequeno Príncipe" e sonha em ser modelo. Um belo dia aquele rostinho de boneca acorda cheio de espinhas. E a casa cai.

"Dia de cão" - Com uma Internet dona de um humor ainda na aborrecência, não é surpresa abrir o jornal e ler que investidores de empresas de Internet estejam tendo um dia de cão. Mas isto não significa que a coisa toda esteja podre. Como acontece em qualquer negócio novo, a Internet ainda vai causar algumas convulsões na economia, até se acostumar com a coleira das velhas regras de mercado. E no processo não faltarão aqueles que estão atrás de ganho fácil e satisfação sem efeitos colaterais. Do tipo que se livra de um simpático cãozinho comprado na feira de animais, quando descobre que o que entra pela boca precisa sair por algum lugar.

As quedas em Wall Street estão cada vez mais ligadas ao sentimento de pânico de investidores novatos. Gente que nunca foi mordida no mercado de ações. No atual momento de pujança dos Estados Unidos, muita gente tem visto o mercado de ações como uma alternativa para as formas convencionais de poupança. Com a facilidade de se comprar e vender o mundo com um clique do mouse, muitos americanos trocaram seus cents e dimes por ações de empresas de Internet. Criou-se a ilusão de uma poupança etérea, fazendo com que pessoas comuns virassem milionárias. Ou pelo menos pensassem assim. O casal Smith achou-se dono da Amazon.com e passou a enxergar seu dinheirinho da aposentadoria como quem enxerga mostrador de bomba de gasolina.

O garoto - Mas, na bolsa, nem tudo o que reluz é ouro. Negócios que hoje valem milhões viram papéis podres da noite para o dia. E aquele "garoto que começou em uma garagem", cujo site a revista disse que vale milhões, pode não ter dinheiro nem para o chiclete. Muitas das notícias de negócios milionários trazem, nas entrelinhas, um dinheiro que é tão virtual quanto o mundo cibernético onde desfilam as empresas ponto-com. A história que me contaram ilustra bem o que há por trás de algumas das "grandes" negociações da nova economia.

Um garotinho, de tanto ouvir falar em bolsa, ações, Nasdaq e coisas do tipo, decide trocar o nome de seu cãozinho para "Totó.com" e colocá-lo à venda. Por um milhão de dólares. O pai ri do garoto. O menino insiste, e logo aparece um investidor interessado no "Totó.com". Tão interessado, que acaba fechando negócio. "Quanto?", pergunta o pai, surpreso. "Um milhão de dólares!", responde o filho, radiante. O pai, ainda incrédulo, insiste: "E onde está essa grana toda?" "No quintal", responde o garoto confiante. "Dois gatinhos valendo quinhentos mil cada".

(*) Mário Persona é diretor de comunicação da Widesoft, que desenvolve sistemas para facilitar a gestão da cadeia de suprimentos via Internet.